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MPF denuncia militar e legista pela morte sob tortura de militante do PCB em 1975

José Maximino, de 62 anos, morreu de infarto após ser torturado durante dias no DOI-Codi de São Paulo

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia contra o coronel do Exército Audir Santos Maciel e o médico legista Harry Shibata pelo homicídio de José Maximino de Andrade Netto, militante do PCB, em 1975. Com 62 anos, ele morreu devido a um infarto do miocárdio, “provocado pelas intensas sessões de tortura a que foi submetido”. O caso está na 1ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária de São Paulo.

De acordo com a denúncia do MPF, Maximino, um ex-integrante da antiga Força Pública, antecessora da PM, foi retirado de casa, em Campinas (SP), e levado para a capital “sem qualquer mandado de busca ou de prisão”. Na época, o DOI-Codi era comandado por Maciel. Já o médico deveria avaliar o estado dos presos, para que a tortura continuasse ou fosse interrompida. “Ao perceber que a vítima não sobreviveria por muito tempo, Shibata mandou que Maximino fosse retirado do DOI-Codi e abandonado em frente de sua casa, em 18 de agosto de 1975”, diz o MPF. Ele morreu no mesmo dia.

Operação Radar

O Ministério Público que o caso se insere na chamada Operação Radar, que tinha o chamado Partidão como alvo, apesar de a legenda ser contrária à luta armada. “Realizada entre 1973 e 1976, (a operação) resultou na morte de 11 membros do Comitê Central do partido e na prisão de 679 filiados.”

O oficial e o legista (que é alvo de outras denúncias similares) estão sendo denunciados por homicídio duplamente qualificado – por motivo torpe (perseguição política) e com uso de tortura. Além disso, o MPF pede a perda de cargo público de ambos e o cancelamento das aposentadorias.

Fonte: Rede Brasil Atual

 

Ministério Público chancela acordo com punições à Volkswagen por apoio à ditadura

Por Vitor Nuzzi

O acordo no caso Volkswagen relativo ao apoio da empresa à ditadura foi definitivamente confirmado nesta sexta-feira (15) pelo Ministério Público Federal. “A ausência de precedente que pudesse servir de parâmetro para as obrigações pactuadas não impediu a construção do acerto, bem como a alta probabilidade de que se tenha alcançado, por meio do TAC em análise, reparação muito mais efetiva e célere do que aquela que possivelmente seria obtida no caso de uma eventual judicialização”, afirma em sua decisão Carlos Alberto Vilhena, subprocurador-geral da República e procurador federal dos Direitos do Cidadão.

Ele se refere ao termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado em setembro do ano passado entre diversas instâncias do Ministério Público e a Volks. Com isso, é arquivado inquérito civil (IC), aberto cinco anos antes, que apurava as responsabilidades da empresa. O subprocurador considerou “plenamente atendido o objeto do IC em exame, instaurado para apurar a participação da Volkswagen do Brasil no regime ditatorial vigente no Brasil entre os anos de 1964 e 1985, bem como nas violações aos direitos humanos praticadas durante esse período”.

Acordo “paradigmático”

Vilhena analisava pedido de reconsideração feito por entidades críticas aos termos do acordo – e responsáveis pela abertura do inquérito, em 2015. Ele observou que um TAC privilegia “soluções viáveis em detrimento das soluções ideais, notadamente quando se trata de conflitos complexos”. Mesmo com ressalvas, o subprocurador considerou “paradigmático” o acordo.

“Isso porque, ausente precedente a respeito do tema, este TAC, além de se constituir em verdadeiro leading case administrativo, abre caminho para futuras responsabilizações e possibilita que a sociedade brasileira avance na discussão do respeito devido aos direitos humanos, principalmente aos de seus trabalhadores, pelas empresas instaladas em território nacional”, afirma. Ao mesmo tempo, Vilhena considera que prolongar a discussão “traz o risco de nunca se chegar a conclusão alguma, resultando em prejuízos irreversíveis para a memória e a verdade dos trabalhadores afetados pelas condutas da VW do Brasil no período em análise”.

Página na história

A decisão foi comemorada pelo presidente da Associação Heinrich Plagge (que reúne ex-funcionários da montadora), Tarcísio Tadeu Garcia Pereira. “Vitória de todos os trabalhadores e da democracia. Estamos escrevendo uma importante página na história”, afirmou, em vídeo.

Ele homenageou alguns dos ex-trabalhadores da Volks. Amauri Danhoni, Antonio Torini, o próprio Henrique Plagge, que dá nome à associação, além de Lúcio Bellentani, presidente da entidade até 2019, quando morreu. “E a todos os companheiros que já se foram”, acrescentou Tarcísio. Na semana que vem, deverá ser convocada assembleia para discutir os próximos passos formais.

Indenizações

Em resumo, a Volkswagen deverá fazer uma “declaração pública”, em jornal de grande circulação, sobre seu apoio à ditadura. Além disso, pagará R$ 4,5 milhões ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDDD) e igual valor ao Fundo Especial de Despesa de Reparação de Interesses Difusos Lesados. Outros R$ 10,5 milhões serão destinados a “entidades que desenvolvam projetos de promoção da memória e verdade em relação a violações a direitos humanos ocorridos no Brasil” durante a ditadura.

Essas entidades serão o Memorial de Luta por Justiça (iniciativa da OAB-SP e do Núcleo de Preservação da Memória Política) e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). O Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (Caaf), da universidade, é responsável pela análise das ossadas da vala clandestina de Perus. Por fim, embora não constasse no TAC, a empresa dará a quantia de R$ 16.862.400 à associação dos ex-trabalhadores.

Fonte: Rede Brasil Atual

(15-01-2021)

 

Do golpe militar a Bolsonaro: as lições não aprendidas pelo Brasil

Brazilian President Jair Bolsonaro arrives to take part in the Navy Day celebrations at the Marines Corp headquarters in Brasilia, on December 13, 2019. (Photo by EVARISTO SA / AFP)

Por João Tancredo
O Brasil completa, neste 31 de março, 56 anos do golpe militar de 1964 tendo na presidência da República um inescrupuloso admirador do regime autoritário instaurado a partir dali. Como permitimos tamanho retrocesso?
A transição pactuada na Constituição de 1988 com os algozes da democracia incluiu no pacote uma espécie de amnésia histórica, uma condescendência com as bárbaras violações de direitos cometidos pelo Estado. De lá pra cá, imperou o entendimento de que este foi o acordo possível, de que todo resto era um problema menor e pouco se fez em nome da memória e da justiça. Mesmo as louváveis iniciativas das Comissões de Anistia e da Verdade não tiveram força para reorientar os rumos.
O Brasil apenas varreu para debaixo do tapete o entulho autoritário. Ali embaixo estavam os pobres que seguiram sofrendo com o cerceamento da liberdade, a censura, a extorsão, a tortura e as execuções promovidos arbitrária e cotidianamente por meio da militarização de suas vidas e territórios. Comentei sobre este processo em artigo publicado em 31 de março do ano passado.
As Forças Armadas nunca deixaram de festejar sua “revolução”. A elite econômica jamais se interessou em reconstruir essa história. As elites da governabilidade política e jurídica mantiveram, firmemente, vistas grossas. A complacência com as declarações fascistas de Bolsonaro ao longo de sua vida parlamentar representa apenas a ponta do iceberg que conserva há séculos a cultura autoritária brasileira.
A chegada de Bolsonaro ao topo do poder, que deve ser explicada por um conjunto diverso de fatores, passou por mobilizar essa cultura autoritária. Agora, definitivamente, o entulho já não cabe mais debaixo do tapete.
A rotina do presidente é atacar. A lista é interminável: mulheres, negros, indígenas, LGBTs, sem-terra, sem-teto, imigrantes, ambientalistas, ONGs, advogados, cientistas, professores, universidades, funcionalismo público, sindicatos, imprensa, artistas, Congresso Nacional, adversários políticos, STF, ONU, chefes de Estado… Intolerante à diversidade, Bolsonaro agride qualquer um que não se submeta a ele.
Os ataques incendeiam milícias digitais contra os atacados e, não raro, estão ancorados em outro hábito: a mentira. O bolsonarismo, ao mesmo tempo, usa ostensivamente as fake news e, diante de qualquer crítica, denuncia ser vítima desse expediente. O governo Bolsonaro mente compulsivamente também para defender suas constantes mudanças de posição. Intolerante à verdade, Bolsonaro tortura os fatos até que eles sirvam aos seus propósitos.
Tendo o caos como método, o governo confunde a população, que já não sabe ao certo no que acreditar, e inviabiliza sua participação no debate público. A transparência, condição essencial para o avanço das democracias, vira um joguete nas mãos do presidente. Não por acaso, ele editou uma medida provisória, felizmente derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada, desobrigando o governo a cumprir os prazos da Lei de Acesso à Informação. Intolerante à transparência, Bolsonaro sequestra informações que devem ser públicas.
A barbaridade de Bolsonaro atingiu seu ápice em um dos momentos mais dramáticos da história brasileira recente. Em plena pandemia da covid-19, ele menospreza os perigos do vírus e convoca a população a ir às ruas pelo “bem da economia”. Como todo fascista, Bolsonaro, na verdade, é intolerante a qualquer resistência ao seu projeto de poder, ainda que este custe a vida de milhões de pessoas.
Nós já deveríamos ter aprendido com a ditadura militar a tragédia que esta concepção política traz a sociedade brasileira.
O autor  é advogado.

Edição: Rodrigo Chagas

Fonte: Brasil de Fato

Comissão Nacional da Verdade apresenta Relatório à OEA

Após exposição, feita em Washington (EUA), Comissão Interamericana de Direitos Humanos parabeniza governo brasileiro pelo trabalho

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) apresentou à Organização dos Estados Americanos (OEA), em 11 de dezembro de 2014, seu Relatório sobre graves violações de direitos humanos ocorridas no Brasil entre 1946 e 1988, com destaque ao período da ditadura militar (1964-1985). A exposição foi feita em sessão especial sobre o direito à verdade, organizada pelo conselho permanente da OEA, em Washington, nos Estados Unidos.

Carolina Melo, assessora da CNV, e Carla Osmo, pesquisadora do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), apresentaram os três volumes do Relatório e as conclusões de dois anos e meio de trabalho, tempo de vigência da CNV em que foram apurados crimes cometidos pelo Estado brasileiro.

Ao final da sessão, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão com a função de promover e observar o respeito aos direitos humanos na região dos Estados americanos, parabenizou a CNV e o governo brasileiro pela conclusão do Relatório. Segundo a CIDH, “a luta contra as graves violações de direitos humanos e a publicação dos resultados do trabalho da Comissão da Verdade contribuem para o fortalecimento do Estado democrático de direito e para a democracia nas Américas e no mundo e dão voz e esperança às vítimas e seus familiares”.

Leia a íntegra do Relatório da Comissão Nacional da Verdade:
Fonte: Comissão Nacional da Verdade
(14-01-2015)

A escolha é entre seguirmos vivendo, ainda que de forma insatisfatória, ou matarmos uns aos outros pelas ruas

“O anseio meu nunca mais vai ser só / Procura ser da forma mais precisa / o que preciso for/ pra convencer a toda gente / que no amor e só no amor / há de nascer o homem de amanhã” (Geraldo Vandré, “Bonita”)

decisão que estaremos tomando neste domingo (28) transcende ideologias. É uma opção entre seguirmos vivendo, ainda que de modo insatisfatório, ou nos matarmos uns aos outros pelas ruas.

Temos, de um lado, o representante de um partido de esquerda que deixou de verdadeiramente lutar contra os poderosos desta sociedade, limitando-se a tentar ser por eles aceito como sócio minoritário. Não é, nem de longe, o governo que eu quero.

Só que, do outro lado, está um amontoado de ferrabrases alucinados por imporem ao restante da sociedade, a ferro e fogo, seus valores e modo de ser, numa esquisita associação com os oportunistas de sempre e os piores fisiológicos do esgoto da política brasileira.

Com o Fernando Haddad corremos o risco de voltar ao pacto dos explorados com os exploradores que perdurou enquanto Lula era presidente da República, no qual o primeiro contingente cedia muito e recebia em troca algumas migalhas, enquanto o segundo contingente cedia um tiquinho e recebia em troca privilégios injustificados e uma relativa paz social.

Com o Bolsonaro a promessa é de turbulências de todo tipo, com hordas caçando quem pensa, age, transa ou tem cor diferente, além de previsíveis confrontos com o Legislativo e o Judiciário quando suas propostas inconsequentes esbarrarem na dura realidade dos fatos e a opção for abandoná-las ou enfiá-las pela goela da sociedade adentro à base da porrada nas instituições e nos cidadãos.

Teríamos, reunidos num governo só: 

— a índole irascível de um Jânio Quadros, que não suportava o questionamento de seus planos mirabolantes e acabou tentando obter poderes ditatoriais mediante um autogolpe desastrado;
— a falta de um verdadeiro partido de sustentação, que obrigou Fernando Collor a montar um amplo esquema de corrupção para agraciar seus companheiros de primeira hora e saciar o apetite pantagruélico dos parlamentares de aluguel, até que os partidos poderosos uniram-se para dar um fim ao seu mandato; e
— a crassa incompetência econômica de Dilma Rousseff, principal responsável pela pior recessão brasileira de todos os tempos. 

Não é preciso ser nenhum Nostradamus para vaticinar que seria mais um governo sem prazo de validade de um quadriênio (só por milagre completaria um único ano!). 

Tão logo os iludidos pela pregação fantasiosa/rancorosa de Bolsonaro caíssem em si, constatando que os problemas antigos não estariam sendo resolvidos e muitos novos sendo criados, as cobranças começariam, depois as manifestações de rua, depois a repressão, depois mais revolta, depois mais repressão, até chegarmos ao caos, talvez a um autogolpe, talvez a um golpe militar. 

Este último é antiquado? Já parecia ser página virada em 1964, pelo menos em termos de grandes nações, mas reabrimos o ciclo e muitos outros vieram na esteira!

Enfim, votar contra Bolsonaro é o primeiro passo para o apaziguamento da sociedade brasileira, quando ela completa quatro anos perdidos por causa de um radicalismo que detona tudo e nada constrói, criando um ambiente tão desfavorável aos investimentos que a economia permanece indefinidamente patinando sem sair do lugar, enquanto o povo sofre e se desespera com uma penúria sem fim.

Sei que a decadência irreversível do capitalismo atingiu um novo patamar e não conseguiremos sequer reeditar a pequena melhora da década passada, mas ainda há como o sistema ao menos oferecer um respiro para os mais pobres recuperarem o fôlego. E nem isto teremos com o país em chamas, a consequência lógica da sociopatia extremada de Bolsonaro e o furor homicida de suas hordas de seguidores, caso o louco venha a assumir a administração do hospício.

Já deixamos pelo caminho muitos valores fundamentais da vida civilizada ao longo desta década maldita. Agora, a porta que se abre é para sairmos definitivamente da civilização, trocando o amai-vos uns aos outros pelo odiai-vos uns aos outros e por matai-vos uns aos outros.

Amanhã poderemos ter nossa última chance de impedir que o Brasil vire um péssimo lugar para se viver nos próximos anos e até sabe-se lá quando.

Temos nas mãos o nosso destino, o daqueles a quem amamos e o dos que virão depois de nós. Se cedermos à tentação de um desabafo inconsequente, não só estaremos brincando com fogo, mas condenando todos os brasileiros a se queimarem também! (Celso Lungaretti)

Mino Carta se vê como Deus revelando a verdade sagrada. E o resto do mundo o vê como Napoleão de hospício.

Incorrigível, Mino Carta volta a engrossar o lobby italo-brasileiro na caça a Cesare Battisti, em besteirol  publicado na Carta Capital e reproduzido pela Folha de S. Paulo, com o evidente objetivo de influenciar a decisão que a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal tomará amanhã (24), ou salvando o escritor da tramoia eivada de ilegalidades com que se pretende entregá-lo à vendeta italiana ou repetindo a ignóbil decisão adotada em 1936, quando autorizou a extradição de Olga Benário para a Alemanha nazista.

Quando li o texto do Mino, tão rancoroso quanto inconsistente, pensei até em refutá-lo ponto por ponto. Mas, isto caberia caso houvesse algo a refutar. Não há nada. 

É uma narrativa que não se sustenta em evidência nenhuma, testemunha nenhuma, comprovação nenhuma, citação nenhuma. Apenas na megalomania desmedida de um indivíduo que pensa ser tão superior aos comuns mortais a ponto de apenas dar a público o que, no seu entender, é a verdade definitiva e incontestável, ponto final. Chamavam-no, não sem um tanto de ironia, de imperador, mas ele já ultrapassou tal estágio. Agora seu discurso é de quem, intimamente, acredita ser Deus. Pena que, para a maioria dos leitores dotados de espírito crítico, ele não passe de um Napoleão de hospício…

Eis a tábua dos 10 mandamentos ditados por Mino Carta para serem entregues à plebe ignara, que os deve aceitar sem o mais ínfimo questionamento, decorá-los e depois repeti-los com muita fé e devoção:

1º que os biógrafos estão todos errados e o Cesare não teria nascido e sido criado numa família comunista;

2º que, também na contramão de tudo que autores isentos já publicaram, ele teria sido um criminoso comum, só se politizando na prisão;

3º que, nos anos de chumbo, a Itália teria continuado a ser um Estado democrático de Direito e não a democracia com áreas cinzentas a que se referiu com muita propriedade Tarso Genro (havia eleições, as instituições funcionavam, mas a Justiça e a polícia agiam como nas piores ditaduras, o que foi reconhecido até pelo grande Norberto Bobbio);

4º que não teriam ocorrido arrependimentos arrancados sob torturas na Itália, sendo, portanto, mentirosos todos quantos denunciaram maus tratos, todos os que os documentaram e todas as entidades de defesa dos direitos humanos que cansaram de protestar contra as sevícias e as mortes delas decorrentes;

5º que os jovens militantes de esquerda não teriam aderido à luta armada em razão do seu profundo desencanto com a traição histórica cometida pelo Partido Comunista Italiano ao se mancomunar com a reacionária, corrupta e mafiosa Democracia Cristã, mas sim por instigação da eterna vilã, a CIA (!!!);

6º que Battisti não correria perigo se extraditado para a Itália, embora carcereiros tenham declarado à imprensa que ansiavam por matá-lo e um ministro de Estado haja afirmado quase a mesma coisa, babando de ódio;

7º que os processos italianos dos anos de chumbo teriam sido “conduzidos por uma Justiça independente dentro de um conceito democrático inquestionável”, embora as leis de exceção vigentes naquele melancólico período possibilitassem até que um suspeito permanecesse em prisão preventiva (sem haver sofrido condenação nenhuma, portanto) durante 10 anos e meio (!!!), tendo sido revogadas quando a Itália acordou de sua histeria antibrigadista;

8º que os Proletários Armados pelo Comunismo assaltariam “para garantir seu sustento (!!!) e não para retaliar ultradireitistas culpados de atos violentos (nem nos delírios dos promotores italianos encontramos afirmação tão estapafúrdia, é a história reescrita ao sabor dos preconceitos!):

9º que o relatório mais tendencioso jamais apresentado por um ministro em toda a história do STF, o de Cezar Peluso 100% contra Battisti, em 2009, teria sido um “impecável pronunciamento”;

10º e que eu, apelidado de “setores da chamada esquerda nativa”, teria encarado o “terrorismo como um movimento de resistência similar à luta armada em que alguns brasileiros se engajaram contra a ditadura” (o que nunca declarei, tendo apenas constatado que aqueles equivocados contestadores italianos, levados ao desespero pela traição histórica do PCI, sofreram uma repressão que, em tudo e por tudo, se assemelhou ao festival dos horrores dos DOI-Codi’s e aos julgamentos farsescos que tinham lugar nas auditorias militares).

Já que o Mino não se deu sequer ao trabalho de tentar comprovar qualquer um destes disparates (tarefa impossível!), deixo aos leitores as conclusões. Que necessidade eu teria de repisar o que já é do conhecimento de todos os que procuram informar-se com autores isentos?

Encerro com a reedição de um artigo meu de abril de 2014, que considero muito relevante neste instante, por dizer tudo que se precisa saber sobre a autoridade moral que Mino Carta não tem para deitar falação sobre Cesare Battisti:

“ENQUANTO MALHÃES LANÇAVA CORPOS EM RIOS, MINO CARTA BATIA BUMBO PARA MÉDICI”

Em 1970 ele escrevia editoriais puxando o saco…

Quando Mino Carta fez de sua revista um house organ no pior sentido da palavra, infestando-a de textos panfletários e lobistas que secundavam a caça a Cesare Battisti deflagrada por Silvio Berlusconi, cansei de desafiá-lo para defender sua postura inquisitorial numa polêmica.

Adivinhava que se acovardaria, como sempre se acovardou. 

Já amarelara em 2004, quando uma repórter da Carta Capital me entrevistou sobre o 25º aniversário da Lei da Anistia e ele ordenou, na enésima hora, que fossem suprimidas todas as referências ao meu nome. 

Também naquela ocasião mandei uma veemente contestação da atitude despótica que, com a mesma prepotência dos censores da ditadura, ele tomou.


Em vão: não deixou que publicassem, nem respondeu. Estava ciente de que todo seu poder de nada valeria num confronto de textos, pois eu pulverizaria facilmente sua algaravia pomposa. 

A que se devia tal antipatia gratuita? É simples: ele odeia os contestadores de 1968. Sempre nos detestou. Como boa parte dos comunistas da velha guarda, naquele ano decisivo ele se posicionou, junto com os partidões da Itália e da França, do outro lado da barricada. Entre as forças da ordem e os jovens rebeldes, ficou com as primeiras.

…do ditador mais sanguinário de todos.

E contraiu ódio eterno pelos verdadeiros esquerdistas, que expuseram a cumplicidade dos PC’s com a burguesia (o PC francês tudo fez para minar o apoio dos operários à revolução que já estava nas ruas, enquanto o italiano compartilhou o poder com ninguém menos que a Democracia Cristã, podre até a medula).

Então, mesmo sem ter identificação ou simpatia pelo Demétrio Magnoli, não posso deixar de aplaudir as estocadas certeiras que ele deu no Mino Carta, na Folha de S. Paulo.

Começa citando a ode ao golpe de 1964 que o próprio Mino fez publicar na Veja de 1º de abril de 1970 (ou seja, o editorial que ele assinava com suas iniciais, MC), ajudando os milicos a soprarem as seis velinhas:

Propostos como solução natural para recompor a situação turbulenta do Brasil de João Goulart, os militares surgiram como o único antídoto de seguro efeito contra a subversão e a corrupção (…). 

Mas, assumido o poder, com a relutância de quem cultiva tradições e vocações legalistas, eles tiveram de admitir a sua condição de alternativa única. E, enquanto cuidavam de pôr a casa em ordem, tiveram de começar a preparar o país, a pátria amada, para sair da sua humilhante condição de subdesenvolvido. Perceberam que havia outras tarefas, além do combate à subversão e à corrupção —e pensaram no futuro.

Como polemista, Magnoli fez picadinho…

Hoje, muitos companheiros desavisados mostram deferência e respeito por esse sujeitinho que via os Ustras e Curiós como “único antídoto de seguro efeito contra a subversão e a corrupção” (exatamente a desculpa esfarrapada que utilizaram para a usurpação do poder), atribuía-lhes relutância em incidirem nas práticas hediondas (todos que passamos pelas câmaras de tortura podemos afiançar que, sádicos como eram, eles extraíam visível prazer do que faziam), louvava a preocupação deles com o futuro (qual, a de assegurarem a própria impunidade antes de serem enxotados?) e a firmeza com que botavam “a casa em ordem” (nela impondo a paz dos cemitérios!)

Espero que doravante passem a ser mais seletivos em suas devoções, não engolindo gato por lebre.

Enfim, está certíssimo o Magnoli ao jogar na cara do Mino o seguinte:

Enquanto Paulo Malhães lançava corpos em rios, Mino Carta batia bumbo para Médici.

…do lobista do Berlusconi.

A censura não tem culpa: os censores proibiam certos textos, mas nunca obrigaram a escrever algo.

Os proprietários da Abril não têm culpa (ou melhor, são culpados apenas pela seleção do diretor de Redação): segundo depoimento (nesse caso, insuspeito) de um antigo editor da revista e admirador do chefe, hoje convertido, como ele, ao lulismo, Carta dispunha de tal autonomia que os Civita só ficavam sabendo do conteúdo da Veja depois de completada a impressão.

Desta vez, mesmo que encontre uma insuspeitada e até agora inexistente coragem, de nada lhe adiantará. Não existe resposta nem justificativa possíveis.