Francisco no Angelus deste domingo: “talvez também nós, neste momento, carregamos em nossos corações algum peso ou algum sofrimento, que parecem nos esmagar. Então é hora de remover a pedra e sair ao encontro de Jesus, que está próximo”.
“Não ceda ao pessimismo que deprime, ao medo que isola, ao desânimo pela recordação de más experiências, ao medo que paralisa”! O Papa Francisco introduzindo a recitação do Angelus comentou a passagem do Evangelho deste V Domingo da Quaresma, a ressurreição de Lázaro, “querido amigo de Jesus”, para sublinhar que Jesus “dá vida mesmo quando parece não haver mais esperança” e “convida-nos a não deixar de acreditar e esperar, a não nos deixarmos esmagar por sentimentos negativos”.
“Acontece, às vezes, sentir-se sem esperança, aconteceu com todos, ou encontrar pessoas que perderam a esperança: amarguradas”, com “um coração ferido”, “por causa de uma perda dolorosa, uma doença, uma decepção, um erro ou uma traição sofrida, por um grave erro cometido”, observou o Pontífice.
“Às vezes ouvimos as pessoas dizerem: ‘Não há mais nada a ser feito!’ e fecha a porta a toda esperança. Estes são momentos em que a vida parece um sepulcro fechado: tudo é escuro, ao redor vemos apenas dor e desespero”. Em vez disso, Jesus “nos diz que isto não é assim, o fim não é este, que nestes momentos não estamos sozinhos, pelo contrário, que precisamente nestes momentos Ele se aproxima mais do que nunca para restaurar nossa vida”. Jesus chora, o Evangelho diz que ele chora diante do sepulcro de Lázaro, e Jesus chora conosco, como chorou por Lázaro: o Evangelho repete duas vezes que ele se comoveu e sublinha que Ele chorou”.
Jesus, continua Francisco, “aproxima-se de nossos sepulcros e nos diz, como então: ‘Tire a pedra'”. “Tire a pedra: a dor, os erros, também os fracassos, não os escondam dentro de vocês, em um quarto escuro e solitário, fechado”. Tire a pedra: tire tudo o que está dentro, jogue-a em mim com confiança, sem medo, porque estou com você, amo você e desejo que viva novamente”.
E, como a Lázaro, acrescenta o Papa, “repete a cada um de nós: vem para fora! Levante-se, retome o caminho, recupere a confiança! Eu levo você pela mão, como quando você era uma criança aprendendo a dar seus primeiros passos”. “Tire as ataduras que o prendem, por favor não ceda ao pessimismo que deprime, não ceda ao medo que isola, não ceda ao desânimo por causa da recordação de más experiências, não ceda ao medo que paralisa. Eu o quero livre e vivo, não o abandonarei e estou com você”. “Não se deixe aprisionar pela dor, não deixe morrer a esperança: volte à vida”. “Eu pego você pela mão e trago você para fora” da escuridão, diz Jesus.
Esta passagem, capítulo 11 do Evangelho de João, nos faz tão bem lê-la, enfatiza o Papa. “É um hino à vida”, diz, “e nós o lemos quando a Páscoa está próxima. Talvez também nós, neste momento, carregamos em nossos corações algum fardo ou algum sofrimento, que parece nos esmagar. Alguma coisa ruim, algum pecado feio, algum erro da juventude”, acrescenta Francisco.
“Então é o momento de remover a pedra e sair ao encontro de Jesus, que está próximo”. “Conseguimos abrir nossos corações e confiar nossas preocupações a Ele? Abrir o sepulcro dos problemas e olhar para além da soleira, em direção à sua luz? Ou será que temos medo disso? E, por sua vez, como pequenos espelhos do amor de Deus, será que conseguimos iluminar os ambientes em que vivemos com palavras e gestos de vida? Damos testemunho da esperança e da alegria de Jesus? Nós pecadores, todos nós?”.
Francisco dirigiu-se novamente aos confessores: “Caros irmãos, não esqueçam que vocês também são pecadores e no confessionário não sejam torturadores, mas perdoem tudo”.
O Papa concluiu: “Maria, Mãe da Esperança, renove em nós a alegria de não nos sentirmos sozinhos e o chamado a levar luz à escuridão que nos circunda”.
Neste dia em que você completaria cem anos do seu nascimento (22 de março de 1923), começo o dia lhe escrevendo essas linhas para lhe agradecer o tanto que aprendi de você e como o seu testemunho espiritual e teológico é atual e pode responder a muitos desafios que, hoje, enfrentamos no Brasil e no mundo. Todos/todas nós que tivemos a graça de conviver com você queremos sinalizar isso nas Igrejas e no mundo.
Pessoalmente, o conheci desde que você chegou ao Recife, convidado por Dom Helder Camara, em 1964, para ajudá-lo a organizar os estudos teológicos. Você ficou hospedado no Mosteiro de São Bento no qual, na época, eu era noviço. Você era, então, um padre jovem, tímido e com uma ironia fina que se manifestava no modo de sorrir e de reagir às pessoas que se aproximavam para conhecer um teólogo que já vinha da Europa com certa fama. Você respondia às perguntas com outras perguntas que sempre levava as pessoas a aprofundar mais o assunto.
Nos anos seguintes, fui seu aluno de teologia no Seminário de Camaragibe e mais tarde (1968) no Instituto Teológico do Recife (ITER). Com você aprendi não apenas a estudar os tratados teológicos, mas a procurar fazer Teologia, em diálogo com os estudos acadêmicos, mas principalmente a partir da inserção amorosa no mundo dos pobres. No terceiro ano de Teologia, estudava o tratado dos Sacramentos, quando você precisou viajar por um mês a Europa. No lugar de chamar um professor para substituí-lo, você escolheu um aluno da classe para coordenar as aulas sobre Sacramentos na sua ausência e o escolhido fui eu. A partir dali, descobri que tinha uma vocação para o estudo mais profundo da Bíblia e para fazer Teologia. Você me ajudou a descobrir que deveria ser teólogo das bases e não apenas da academia.
Em 1968, a pedido de Dom Helder, você escreveu um documento de subsídios teológicos preparatórios à 2ª Conferência Geral do Episcopado Latino-americano em Medellín. Este documento com propostas de profunda transformação política para o continente caiu nas mãos dos militares da ditadura e você foi expulso do Brasil. Dez anos depois, quando você pôde voltar, o reencontrei ainda mais ecumênico e ligado às bases. A partir de então, seus livros serão cada vez mais escritos em linguagem simples e dirigidos às pessoas de base e não apenas aos ambientes da teologia.
Nos primeiros anos deste século, no Mosteiro ecumênico e inserido em que vivi na Cidade de Goiás, tive a alegria de, a cada ano, receber você e Mônica para viverem conosco o Tríduo Pascal e celebrarmos juntos a Páscoa de um modo novo e profundamente inserido com os vizinhos mais pobres. E falamos que quando você achasse que seria o caso, quem sabe, poderia vir morar conosco. No entanto, a conjuntura levou a você e a mim para situações diferentes. Eu, por doença, voltei a morar em Recife. Por solidariedade, você e Mônica foram acompanhar mais de perto Dom Luis Cappio e a diocese da Barra na defesa do rio São Francisco e na vivência de uma ecoteologia das águas e da Terra da qual todos nós precisamos.
Em meio a um encontro que assessorava em Salvador, você partiu sem aviso prévio e o seu corpo foi plantado pelos irmãos e irmãs, junto ao túmulo do padre-mestre Ibiapina, no Santuário da Santa Fé em Solânia- PB. A sua mensagem profética de doutor da Igreja dos Pobres continua viva e atuante. Encoraja-nos na missão de renovar a Igreja no caminho do evangelho e transformar o mundo para acolher em seu seio o reinado divino.
As notícias da nossa Igreja Católica não são muito alvissareiras. As comunidades eclesiais de base resistem e cada vez mais se tornam comunidades humanas (ecumênicas) de base, enquanto a Igreja oficial continua falando em pequenas comunidades. O papa propõe um processo sinodal. A maioria das dioceses já mandou ao Vaticano o resultado de suas consultas às bases. A maioria dessas sínteses são vergonhosamente genéricas e sem quaisquer propostas concretas de mudanças. Apesar de todos os esforços do papa Francisco, o clero é cada vez mais clerical e avesso à Sinodalidade. A maioria das paróquias ressuscita devocionalismos barrocos da época da minha bisavó, enquanto o mundo sofre aumento descomunal da pobreza, agravamento da crise ecológica e várias guerras internacionais nos países pobres, para experimentarem as armas fabricadas nos países ricos.
Do lado nosso, no Recife e propomos para o Brasil todo um Mutirão da Profecia. Por todo o país se organizam grupos cristãos com gente de várias Igrejas que, no dia 7 de setembro, junto ao Grito dos Excluídos, expressarão de forma atualizada um novo “Pacto das Catacumbas” como compromissso de vivermos a fé como Igreja dos Pobres, em comunhão com a mãe-Terra e junto aos povos originários, comunidades negras e todo o mundo dos empobrecidos/as.
Muito obrigado por nos ter sempre inspirado a vivermos este caminho. Interceda por nós e nos abençoe. Abraço do irmão Marcelo Barros.
Comunidade Quilombola Família Araújo, de Betim, MG: exemplo inspirador. Por Frei Gilvander Moreira [1]
Celebração e Festa da conquista da 1a Comunidade Quilombola de Betim, MG: a Comunidade Quilombola Família Araújo, dia 19/03/23. Fotos: Alenice Baeta
Dia 19 de março de 2023, dia de São José, entrará para a história como um dia histórico na Comunidade Quilombola Família Araújo, de Betim, MG, situada à Rua Hum, 77, no Jardim Brasília, atrás do Hospital Regional do SUS. Reunimos mais de 100 lideranças populares para celebrarmos e festejarmos a conquista da 1ª Comunidade Quilombola da cidade de Betim, na região metropolitana de Belo Horizonte, MG, que se apresentou como Comunidade Quilombola e já conquistou o Certificado de autorreconhecimento expedido pela Fundação Cultural Palmares (FCP ) do Governo Federal.
Na parte da manhã realizamos uma inesquecível celebração de ação de graças inter-religiosa ao Deus da vida, aos ancestrais e todos os bons espíritos que guiaram nossa luta pelo território. A palavra foi compartilhada e várias pessoas do Quilombo Família Araújo e muitos da Rede de Apoio resgataram a maravilha que está sendo a conquista do território, exorcizando a brutal ameaça de despejo apoiado pela Comunidade durante os últimos anos. Alegria irradiava em todos os rostos. A fraternidade flui. Todos/as irmanados/as na luta pelos direitos quilombolas. Foi servida uma saborosa feijoada no almoço comunitário preparada em mutirão, a partir da receita da matriarca Dona Zulmira. Na parte da tarde uma vibrante roda de samba embalou todos/as que festejavam. Houve também um momento solene em que três lideranças das Comunidades Quilombolas de Belo Horizonte (Quilombo Mangueiras, Quilombo Souza e Quilombo Manzo) entregaram “oficialmente” à Comunidade o Certificado de autodefinição expedido pela Fundação Cultural Palmares (FCP), reconhecendo a Comunidade Tradicional como Quilombola . “Quilombo Reconhece Quilombo!” Esta lema assumiu a todos/as presentes uma mística libertadora com partilha de palavra, gestos, sabores e cânticos quilombolas.
O Sr. José Preto, de saudosa memória, patriarca da Comunidade Quilombola Família Araújo, após peregrinar por vários municípios trabalhando com sua família em serviço braçal, trabalhou na limpeza urbana da cidade de Betim por quase 40 anos. Dona Zulmira, a matriarca do Quilombo Araújo, mulher de uma sabedoria incrível e de uma fé inabalável, diante das brutais ameaças de despejo, sempre dizia “daqui só saio para ir para o cemitério em um caixão ”.
Há quase 40 anos, um ex-prefeito de Betim, autorizou verbalmente o sr. Zé Preto a construir uma humilde casa no terreno, que era ermo e longe do centro da cidade. Entretanto, nos últimos 40 anos, a cidade foi se expandindo e a região se tornou muito valorizada pelo mercado imobiliário. O Hospital Regional do SUS [2]foi construído ao lado da Comunidade e a pressão dos especuladores imobiliários tem animado de forma vertiginosa. Com isso, nos últimos cinco anos, a “Família Araújo” passou por uma brutal “sexta-feira da paixão”, pois o atual prefeito de Betim, Vitório Mediolli, que governa para atender os interesses dos empresários, subjugando o povo empobrecido cada vez mais, entrou com um processo de reintegração de posse que, em meados do ano de 2022, já tinha transitado em julgado com uma decisão absolutamente inconstitucional e injusta, inclusive com anuência do Ministério Público de Minas Gerais. Ao lado da casa da matriarca dona Zulmira e do patriarca Zé Preto, os filhos e filhas construíram outras seis casas dignas e adequadas para morar, com preocupação ecológica. Quintais bem cuidados, com plantações de árvores frutíferas, hortaliças,
As sete famílias Araújo, hoje, compondo a Comunidade Quilombola Família Araújo, aflitas com a pressão infernal pelo despejo feito pela prefeitura de Betim, que insistia diariamente para eles saírem das casas, com ameaças de que os tratores poderiam chegar a qualquer momento para demolir as casas, buscaram socorro na vizinha Comunidade do Beco Fagundes, no Jardim Teresópolis, onde estava em uma grande Rede de Apoio resistindo às investidas brutais também do prefeito Medioli para demolir mais de 100 moradias, jogar as famílias na rua, para construir shopping, teleférico e cascata de água artificial, ou seja, roubar o território e as moradias das famílias humildes para repassar o terreno para os empresários lucrar. Inadmissível aceitar uma violência como esta.
Ao ver sete famílias, todos os membros negros, morando em sete casas lado a lado, com quintais produtivos e puxar a história da família, foi fácil concluir e dizer que estávamos diante de uma Comunidade Quilombola típica e tradicional, mas que não tinha informação sobre seus direitos e que, portanto, ainda não tinha se autodeclarado como Comunidade Quilombola Tradicional, como lhe era de direito. Os advogados populares Dr. Ailton Matias e Dr.
A comunidade estava sofrendo um processo cruel de violação em seus direitos mais profundos, tendo a sua memória ancestral e sua história invizibilizadas e apagadas com este processo injusto de despejo e de desterritorialização. Chamamos, assim, a historiadora Ana Cláudia Gomes e Patrícia Brito, que, com experiência na defesa dos bens culturais e patrimoniais históricos e arqueológicos, e iniciamos uma série de reuniões e estudos que desaguou em um Documento técnico com mais de 100 páginas em que são demonstradas todas as características de uma Comunidade Quilombola.
Em seguida aconteceu Assembleia na qual a Comunidade se autodeclarou na presença do advogado da Federação Quilombola de Minas Gerais N’Golo, Dr. Matheus Mendonça. Reuniões com a Defensoria Pública de Minas (DPE-MG), a Defensoria Pública da União (DPU) e com o Ministério Público Federal (MPF) e reivindicação à Fundação Cultural Palmares (FCP) foi o caminho trilhado para conquistarmos a Certificação da Fundação Palmares . Informamos ao juiz de 1ª instância, que tinha determinado o despejo, e, diante da autodeclaração da “Família Araújo” como Comunidade Quilombola, imediatamente ele abriu a mão do processo, pois tinha se tornado “incompetente juridicamente” e remeteu os autos à Justiça Federal, que agora terá que esperar o INCRA [3]titular da comunidade. O Quilombo Araújo poderá inclusive requerer indenização por danos morais e materiais, porque o terror feito pela prefeitura de Betim para despejá-los levou a enormes prejuízos materiais e morais.
Na luta coletiva conquistamos judicialmente, dia 5 de maio de 2022, a suspensão do despejo e da demolição das casas da COMUNIDADE TRADICIONAL QUILOMBOLA FAMÍLIA ARAÚJO. Conquistamos também o envio dos autos (processo) para a JUSTIÇA FEDERAL, a partir da Ação CIVIL COLETIVA – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE – da Defensoria Pública de MG, da lavra da Dra. Ana Cláudia Alexandre, defensora pública da área de Conflitos Agrários e socioambientais, que peticionou alegando que “a área de 1.851,02m² se trata de área ocupada pela Comunidade Tradicional Quilombola. Exigimos o procedimento administrativo de REURBs.” Escreveu o juiz: “trata-se de ação em que se discute se a área cuja reintegração de posse é pretendida constituiria comunidade quilombola, portanto, afeta a competência da JUSTIÇA FEDERAL. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou que o julgamento de conflitos sobre posse de terra que envolve comunidades quilombolas cabe à Justiça Federal. Ressoa evidente que as demandas judiciais as quais envolvem a posse dessas áreas repercutem, de todo o modo, no processo demarcatório de responsabilidade da autarquia federal agrária. Logo é inarredável o interesse federal em tais demandas, razão pela qual deve ser assegurada a competência da Justiça Federal para o seu processamento e julgamento, sob supervisão do art. 109, I, da Constituição Federal. Declino da competência para o conhecimento, processo e julgamento do presente feito para a SUBSECÇÃO DA JUSTIÇA FEDERAL DE CONTAGEM/MG, para onde determino redistribuição do processo, em caráter de urgência. E que a União seja arrolada no polo passivo do processo.”
O processo judicial que autorizava o Município de Betim a despejar e demolir as casas da Comunidade Quilombola Família Araújo não levou em consideração o caráter coletivo do litigio, nem a condição de pessoas envolvidas – crianças, adolescentes e idosos – o que torna nulo todo o processo, vez que em nenhum momento a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais foi intimada para atuar no processo, conforme determinado a Lei. A decisão de mandar despejar e demolir as casas foi, ainda, proferida sem serem apreciadas provas fundamentais que os membros da Comunidade Quilombola Família Araújo somente obtiveram após o “trânsito em julgado” do processo originário, tais como: a) Termo de doação da área entregue à Família Araújo no ano 2000 pelo então prefeito da cidade Jésus Lima; b) Processo Administrativo, originário do ano de 2002 e não finalizado, que buscava o reassentamento prévio de todas as famílias da comunidade; c) uma autodeclaração enquanto Comunidade Quilombola Família Araújo realizada em fevereiro de 2022.
Gratidão a todos/as que estão se somando nesta luta justa, legítima e necessária. Com luta e com garra conquistamos direitos. Só perde quem não luta de forma coletiva por direitos. Quem luta coletivamente conquista direitos. Esta vitória da Comunidade Quilombola Araújo, de Betim, MG, gera esperança para muitas outras Comunidades injustiçadas no campo e na cidade e encorajará muita gente a seguir na luta por direitos e por tudo o que é justo.
Comunidade Quilombola Família Araújo, um exemplo inspirador, em Betim, MG.
21/03/2023
Obs .: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.
1 – 1ª Comunidade Quilombola de Betim, MG: Quilombo Família Araújo: exemplo inspirador. Fé na luta!
2 – Viva a cultura popular! 1ª Comunidade Quilombola de Betim, MG: Quilombo Família Araújo. Que beleza!
Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, CEBs, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com. Página: http://www.gilvander.org.br
CPT e MST lutam pela terra, por educação do campo e pelo fim do trabalho escravo. Por frei Gilvander Moreira[1]
Jornada em defesa da Reforma Agrária em Alagoas, com o lema “Vida digna no campo: essa é a nossa luta!” Foto: Gustavo Marinho
Após abraçarem a luta pelo rompimento das cercas do latifúndio, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), desde 1975, e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), desde 1984, perceberam que lutar por educação pública de qualidade, especificamente Educação do/no Campo, e com base nele, também era, é e será sempre imprescindível, pois sem conhecimento crítico e criativo não acontece emancipação. O MST e a CPT buscam na sua atuação prática e coletiva a conjugação de forças que sejam de fato uma ecologia de saberes, baseada no reconhecimento da pluralidade de conhecimentos heterogêneos, sendo a ciência moderna apenas um deles, em interações sustentáveis e dinâmicas. “A Ecologia de Saberes baseia-se na ideia de que o conhecimento é interconhecimento”, diz Boaventura de Souza Santos (SANTOS, 2010, p. 53). Assim, o conhecimento científico, que Boaventura Souza chama de Pensamento Abissal, é apenas uma das formas de conhecimento e, pior, atrelado aos poderes econômicos e políticos, desqualifica outros conhecimentos conquistados graças à interação construída na luta coletiva pela conquista da terra.
Gradativamente, a atuação da CPT e do MST passou a priorizar a educação popular, segundo a pedagogia libertadora de Paulo Freire, como ferramenta que faz avançar a luta por emancipação humana. Importante recordar que a educação popular e a pedagogia de Paulo Freire – de todas as freirianas e todos os freirianos – nasceram e se desenvolveram nas entranhas da luta pela terra em relação estreita com as camponesas e os camponeses exploradas/os e expropriados/as pelo latifúndio e pelo capitalismo. Na organização interna e nas lutas concretas pela terra, luta por território, pelas relações de protagonismo que se estabelecem, um significativo processo pedagógico passa a ser tecido. Processo que busca romper as cercas do latifúndio, da ignorância e da privatização do conhecimento e, por outro lado, democratizar a terra e o conhecimento, afirmando assim a centralidade da luta pela terra e do trabalho coletivo nas lutas da CPT e do MST. No livro Pedagogia do Oprimido, Paulo Freire se refere constantemente à terra como matriz pedagógica que tem um grande potencial emancipatório.
A concepção que fez nascer a CPT afirma que a terra é dom (dávida) de Deus, pertence a Deus. Esta noção vem da Bíblia e está ali presente em diversas passagens. A Campanha da Fraternidade de 1986, com o tema “Fraternidade e terra” e o lema “Terra de Deus, terra de irmãos,” contribuiu para legitimar a atuação da CPT, do MST recém-criado, para fomentar o nascimento de centenas de movimentos populares camponeses e fortaleceu a mobilização popular para inscrever na Constituição de 1988 a prescrição de desapropriação de latifúndios que não cumprem a função social para fins de reforma agrária.
Mesmo pertencendo a Deus, a terra, expropriada do campesinato nas sociedades capitalistas, só se torna dos camponeses e das camponesas – sem dinheiro para comprá-la -, se for conquistada na luta coletiva. Assim se deu com os povos da Bíblia, em todos os povos do mundo e acontece atualmente no Brasil na luta dos Movimentos Populares do campo. Para resgatar seus territórios invadidos por ‘brancos’ capitalistas, os indígenas lutam desde antes de Sepé Tiaruju até hoje; os negros lutam pela terra desde antes de Zumbi dos Palmares e Dandara, por meio dos quilombos, até aos quilombolas de hoje; os camponeses expulsos da terra lutam pelo resgate de suas terras desde antes de Antônio Conselheiro e Canudos, passando pelo Contestado, Ligas Camponesas, até hoje com o MST e tantos outros movimentos camponeses.
“A terra é de quem nela trabalha”, eis uma concepção defendida pela CPT desde sua origem há 48 anos. Na diversidade de visões sobre a terra podemos encontrar coincidências: com uma ou outra visão, mas as identidades serão diferentes. A terra é espaço disputado e é lócus sobre o qual se afirmam ou se destroem identidades.
Estima-se que cerca de sete milhões de pessoas negras foram arrancadas da África – pátria de origem, terra de liberdade -, e em navios negreiros trazidos à força para nosso país. Vendidos como mercadoria, ‘peça por peça’, foram usados e abusados como força de trabalho nos engenhos de açúcar, sobrevivendo nas senzalas, depois na mineração e ainda hoje perduram milhares de trabalhadores submetidos a situações análogas à escravidão. No final do ano de 2014 o Brasil tinha 155,3 mil pessoas em situação análoga à escravidão, segundo o relatório Índice de Escravidão Global 2014, da Fundação Walk Free, divulgado dia 17/11/2014. De acordo com a organização, 0,078% dos brasileiros estão nesta condição. Pela primeira vez, segundo o levantamento, o número de pessoas resgatadas em situação de trabalho forçado no setor da construção civil (38% dos casos) foi maior que no setor rural do país. De acordo com a Fundação Walk Free, o Brasil atraiu bilhões de dólares em investimentos para a execução da Copa do Mundo de 2014, o que propiciou o aumento do número de casos em áreas urbanas. O relatório também destaca que a exploração sexual concentrou um grande número de pessoas em situação de trabalho forçado por causa do grande fluxo de turismo nas doze cidades-sede da Copa do Mundo. O relatório da Fundação Walk Free ressaltou que a cidade de Fortaleza concentrou boa parte dos casos de abuso sexual de crianças por turistas. O documento ressalta que ainda há muitas crianças trabalhando como empregadas domésticas. Em 2013, segundo a organização, 258 mil pessoas entre 10 e 17 anos estavam trabalhando como trabalhadoras domésticas no Brasil. Segundo um dos autores do relatório Kevin Bales, também há preocupação com a participação de crianças no tráfico de drogas. De acordo com a Fundação Walk Free, outro dado relevante no país é o fato de muitos bolivianos e peruanos serem explorados na indústria têxtil. Mais da metade dos 100 mil imigrantes bolivianos que entraram no Brasil de forma irregular e são facilmente manipulados por meio da violência, das ameaças de deportação e da servidão por dívida, segundo a pesquisa.[2] Lamentavelmente, a chaga do trabalho escravo contemporâneo continua aberta, conforme atesta a Campanha Permanente pela erradicação do trabalho escravo. E o estado de Minas Gerais está sendo nos últimos anos o estado campeão em trabalho escravo, o que é uma vergonha brutal para o povo mineiro.
Referências
SANTOS, Boaventura de Souza. Para além do Pensamento Abissal: Das linhas globais a uma ecologia de saberes. In: SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias do Sul. Cortez Editora, 2010.
14/03/2023
Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.
1 – “Firmes e fortes na luta. Não arredamos o pé do nosso território” (Xukuru-Kariri, em Brumadinho/MG)
2 – “Indígenas sem território sofrem muito. Na luta, esperança p humanidade” (Xukuru-Kariri, Brumadinho)
3 – Pedro, Alenice e Dep. Bella Gonçalves: Ministro Sílvio Almeida, Rodoanel e anulação da Resolução, JÁ
4 – Ministro do Lula, Sílvio Almeida, de DH em reunião com Mov. de luta contra Rodoanel e Resolução Zema
5 – Ministro do Lula, Sílvio Almeida, dos Direitos Humanos, ouve os clamores contra o Rodoanel na RMBH
6 – Lula e Ministros, o Rodoanel na RMBH será Rodominério, sem Consulta Prévia e sem licenciamento. V.2
7 – No colo do Lula lutas contra o Rodoanel e pela Anulação da Resolução do Zema, q viola Convenção 169
8 – “1º livro que li foi meu avô. Luta pelo Território é luta pela vida de todes” (Dep. Célia Xakriabá)
9 – Dep. Célia Xakriabá (PSOL/MG) na UFMG: “Indigenizar a cidade e a Política. Aquilombar, sim! Mística!
Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, CEBs, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com. Página: http://www.gilvander.org.br
Abaixo a desigualdade
De gênero contra a mulher
Abaixo a misoginia
E preconceitos quaisquer
O dia 8 de março
Precisa de estardalhaço
E muita luta requer
Sociólogo e Educador Ambiental, 67. É coautor do livro “Brejos de Altitude em Pernambuco e Paraíba: História Natural, Ecologia e Conservação” (disponível aqui) e de cartilhas didáticas de educação ambiental (disponíveis aqui: série Joca Descobre…).