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‘Os Movimentos Populares no mundo são a alavanca de uma grande transformação social’, afirma o papa Francisco

Já está à venda na internet um interessante e importante livro sobre o magistério do papa Francisco, publicado pela Livraria Editora Vaticana, que foi organizado e elaborado pela Pontifícia Comissão para a América Latina – CAL guiada por alguns meses pelo acadêmico uruguaio Guzmán Carriquirry.

Dois são os principais elementos relevantes do volume: o tema dos diversos artigos, que é os Movimentos Populares em diversos continentes e países, e a Apresentação do livro escrita e assinada pelo Santo Padre Francisco.

Para esse volume contribuíram de forma especial e valiosa diversas pessoas – estudiosos, especialistas, jornalistas, eclesiásticos – coordenados por Carriquirry. Os textos são de Gianni La Bella, padre Michael Czerny, cardeal Peter Turkson, o sociólogo italiano Thomas Leoncini e o mexicano Rodrigo Gerra.

Outros artigos foram assinados por Juan Grabois, fundador do Encontro Mundial dos Movimentos Populares, o bispo auxiliar de Buenos Aires, dom Gustavo Carrara; a responsável da edição semanal em espanhol do L’Osservatore Romano Silvina Pérez e os argentinos Hernán Reyes Alcaide e Alberto Molina.

Compartilhamos a Apresentação do livro, escrita e assinada pelo papa Francisco.

A reportagem é publicada por Il Sismógrafo, 19-08-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

Apresentação do Papa Francisco

Estou particularmente alegre pelo lançamento deste volume, fruto da reflexão de muitas vozes, de um grupo de estudiosos de distintos setores e competências, que fizeram uma releitura da experiência dos chamados “Movimentos Populares”, reconstruindo a gênese, os eventos, o desenvolvimento e o significado que esse ciclo de encontro teve. Um evento inédito na história recente da Igreja, sobre o qual é útil voltarmos.

Esse arquipélago de grupos, associações, movimentos, trabalhadores precarizados, famílias sem teto, camponeses sem terra, ambulantes, limpadores de vidro em semáforos, artesãos de rua, representantes de um mundo de pobres, de excluídos, dos não considerados, dos irrelevantes, que tem cheiro “de bairro, de povo, de luta” representam, no panorama do nosso mundo contemporâneo, uma semente, uma renovação que como o grão de mostarda dará muito fruto: a alavanca de uma grande transformação social.

O futuro da humanidade “não está unicamente nas mãos dos grandes dirigentes, das grandes potências e das elites. Está fundamentalmente nas mãos do povo, em sua capacidade de se organizar e também em suas mãos que regam com humildade e convicção esse processo de mudança” [1].

Esse povo de pequeninos que defini como “poetas sociais”, homens da periferia, que uma vez ao centro, como é bem narrado no volume, com sua própria bagagem de lutas desiguais e de sonhos de resistência, vieram a colocar na presença de Deus, da Igreja e dos povos, uma realidade muitas vezes ignorada, que graças ao protagonismo e a tenacidade de seu testemunho, saiu à luz.

 Pobres que não se resignaram ao sofrer na própria carne o despojo e a injustiça, mas sim que escolheram, como Jesus, dócil e humilde de coração, de rebelar-se pacificamente de “mãos limpas” contra ela.

Os pobres não são somente os destinatários preferidos da ação da Igreja, os privilegiados da sua missão, mas são também sujeitos ativos. Por isso tenho a intenção de expressar, em nome da Igreja, essa galáxia de homens e associações, que desejam a felicidade do “vivir bien” e não daquele ideal egoísta da “vida boa”, minha genuína solidariedade. Decidindo acompanhá-los em sua caminhada autônoma.

Essa rede de movimentos transnacionais, transculturais e de diversas culturas religiosas representa uma expressão histórica tangível, no modelo poliédrico [2] onde na base se encontra um diverso paradigma social, o da cultura do encontro. Uma cultura que tem a ver com o outro, o diferente de si. Da leitura desse volume, que espero que ajude a tantos a compreender em profundidade, a dar maior luz e significado ao valor dessas experiências, quero brevemente destacar alguns aspectos que me parecem importantes, na esperança que as palavras que dirigi a eles tenham contribuído a suscitar nas consciências de quem rege os destinos deste mundo, um renovado sentido de humanidade e justiça, a mitigar as condições hostis nas quais os pobres vivem no mundo.

Uma grande alternativa social

Os Movimentos Populares, e esse é o primeiro que quero destacar, em minha opinião representam uma grande alternativa social, um grito profundo, um sinal de contradição, uma esperança de que “tudo pode mudar”. Em seu desejo de não se uniformizar nesse sentido único, centrado sobre a tirania do dinheiro, mostrando com sua vida, com seu trabalho, com seu testemunho, com seu sofrimento que é possível resistir, atuando com coragem boas decisões e a contracorrente. Gosto de imaginar esse arquipélago de descartados do sistema, que está comprometendo ao planeta inteiro, como sentinelas que – ainda no escuro da noite – perscrutam com esperança um futuro melhor.

O momento que estamos vivendo está caracterizado por um cenário inédito na história da humanidade, que tratei de descrever através de uma expressão sintética: “mais que uma época de mudanças, é uma mudança de época”, que é necessário compreender. Uma das manifestações mais evidentes dessa mutação é a crise transnacional da democracia liberal, fruto da transformação humana e antropológica, produto da “globalização da indiferença”, a qual aludi tantas vezes, gerou um “novo ídolo”: o do medo e a da segurança, onde hoje um dos sinais mais tangíveis é a familiaridade que tantos têm com as armas e a cultura do desprezo, característica de nossa época, que um notório histórico de nosso tempo definiu como a “a era da raiva”. O medo é hoje o meio de manipulação das civilizações, o agente criador de xenofobias e racismo. Um terror semeado nas periferias do mundo, com saques, opressões e injustiças, mas que exploram, como vimos no nosso passado recente, também nos centros do mundo Ocidental.

Os Movimentos Populares podem representar uma fonte de energia moral, para revitalizar nossas democracias, cada vez mais claudicantes, ameaçadas e postas na mesa de discussão em inumeráveis fatores.

Uma reserva de “paixão civil”, de “interesse gratuito pelo Outro”, capaz de regenerar um renovado sentido de participação, na construção de novos agregados sociais que representam uma candidatura, que mostra uma consciência mais positiva do Outro. O antídoto ao populismo e à política-espetáculo está no protagonismo dos cidadãos organizados, em particular daqueles que criam – como é no caso de tantas experiências presentes nos Movimentos – em seu cotidiano, fragmentos de outros mundos possíveis que lutam para sobreviver à escuridão da exclusão, de onde “crescerão grandes árvores, surgirão bosques cheios de esperança para oxigenar esse mundo” [3].

Os Movimentos Populares expressam como a “força do nós” é a resposta à “cultura do eu” que mira unicamente a satisfação dos próprios interesses, cultivando – apesar de sua própria precariedade – o sonho de um mundo distinto e mais humano.

crescimento das desigualdades, agora globalizadas e transversais – e não somente, econômicas, mas sim sociais, cognitivas, relacionais e intergeracionais –, é reconhecido unanimemente como um dos mais graves desafios com os quais a humanidade terá que lidar nas próximas décadas. Fruto de uma economia cada vez mais separada da ética, que privilegia o lucro e estimula a competição, provocando uma concentração de poder e de riqueza, que exclui e que coloca à porta bilhões de homens e mulheres como “pobre Lázaro”.

O “presente” para milhões de pessoas é hoje uma condenação, uma prisão, marcada pela pobreza, pelo despojo, pela falta de trabalho, porém sobretudo pela ausência de futuro. Um inferno ao qual devemos pôr fim. Nesse sentido, os Movimentos Populares, com sua “resiliência” – representam uma resistência ativa e popular esse sistema idolátrico, que exclui e que degrada, e com sua experiência contam como a rivalidade, a inveja e a opressão não são necessariamente agentes de crescimento, mostrando, pelo contrário, que também a concórdia, a gratuidade e a igualdade podem fazer crescer o produto interno bruto.

As três Ts

O direito às três Ts: terra, teto, trabalho, direitos inalienáveis e fundamentais, representam os pré-requisitos indispensáveis de uma democracia não somente formal, mas sim real, na qual todos os homens, independentemente de sua renda ou de sua posição na escala social, são protagonistas ativos e responsáveis, atores do próprio destino. Sem participação, como alguns ensaístas deste livro bem argumentaram, a democracia se atrofia, chega a ser uma formalidade porque deixa o povo fora da construção do seu próprio destino.

Quero dar uma palavra sobre a terceira dessas Ts, que segundo a Doutrina Social da Igreja é um direito sagrado. Nos últimos anos, o mundo do trabalho mudou vertiginosamente. As recaídas antropológicas dessas transformações são profundas e radicais, e seus efeitos não são de todo claros. Estou convencido há tempo que no mundo pós-industrial não há futuro para uma sociedade na qual somente existe o “dar para ter” ou o “dar por dever”. Se trata “de criar uma nova via de saída à sufocante alternativa entre as teses neoliberais e as neoestatais”.

Os Movimentos Populares são, nesse sentido, um testemunho concreto, tangível, que mostra que é possível contrastar a cultura do descarte, que considera os homens, mulheres, crianças e anciões como excedentes inúteis – e muitas vezes danosos – do processo produtivo, através da geração de novas formas de trabalho, centradas na solidariedade e a dimensão comunitária, em uma economia artesanal e popular. Por tudo isso decidi unir minha voz e sustentar a causa de tantos que realizam os ofícios mais humildes – na maioria das vezes, privados do direito de remuneração digna da seguridade social e de uma aposentadoria.

Nesse estado de paralisia e desorientação, a participação política dos Movimentos Populares pode vencer a política dos falsos profetas, que exploram o medo e o desespero e que pregam um bem-estar egoísta e uma segurança ilusória. Tudo o que disse a eles, como bem demonstra esse volume, está em plena sintonia com a Doutrina Social da Igreja e com o magistério dos meus predecessores. Espero, nesse sentido, que a publicação desse livro seja um modo para continuar – ainda que seja a distância – a reforçar essas experiências, que antecipam com seus sonhos e com suas lutas, a urgência de um novo humanismo, que ponha fim ao analfabetismo de compaixão e ao progressivo eclipse da cultura e da noção de bem comum.

Notas:

[1] Encontro com os Movimentos Populares, Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, 9 de julho de 2015.
[2] Evangelii Gaudium
[3] Encontro com os Movimentos Populares, Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia, 9 de julho de 2015.

Fonte: IHU-Unisinos

Argentina: polentazo contra el hambre

Frente al aumento del precio de los alimentos por encima del 50 por ciento en el último año, diversas organizaciones sociales ofrecieron polenta en el Obelisco y en distintos puntos de la Ciudad de Buenos Aires en una jornada de lucha “contra el hambre” y contra la política económica del gobierno de Mauricio Macri. “Polenta es el alimento al que nos reducen a consumir en un contexto de inflación, ajuste y despidos”, señaló Marianela “Pini” Navarro, del Frente de Organizaciones en Lucha (FOL).

El “Polentazo Nacional” tuvo lugar en el centro porteño y en 17 provincias. La protesta, que arrancó poco después de las 11, llegó a contabilizar una columna de más de cinco cuadras de militantes sobre la Avenida 9 de Julio, donde sobresalió una bandera de gran tamaño con la inscripción “El hambre no es una elección”. Los manifestantes, entre los que se encontraban muchos llegados de distintos puntos del país, se concentraron en el Obelisco y las estaciones Constitución y Retiro. A las 11.30 comenzó la concentración y pasado el mediodía comenzaron a servir la polenta.

La marcha, a la que adhirieron también agrupaciones de izquierda, fue impulsada por el FOL y el Frente Popular Darío Santillán. “Día a día aumenta la inflación, se reduce el salario y cierran fábricas, dejando a miles de familias sin un plato de comida”, denunciaron .

Entre las consignas de la protesta figuró el pedido de aumento en los salarios, la exigencia de un paro activo y nuevos puestos de trabajo, entre otras. “Este modelo económico de hambre y exclusión hace que cada día más familias queden en la calle y se acerquen a los comedores populares”, remarcaron en un comunicado, en el que también exigieron la sanción e implementación urgente de la Ley de Emergencia Alimentaria. “¡La deuda es con el pueblo! ¡Fábrica que cierra, fábrica que se recupera por sus trabajadores/as! ¡Salud y educación pública, laica y de calidad! ¡Tierra y vivienda digna para todxs! ¡Tarifas acordes a los salarios y estudio de los aumentos aplicados por el gobierno de Macri ilegalmente y en beneficio de las empresas y no de lxs usuarixs!”, planteó el FOL en un comunicado, que cerró con un llamado a “investigar la deuda externa del Gobierno con el FMI”.

Ollas y platos vacíos

La organización social Barrios de Pie llevará a cabo hoy en todo el país la “Jornada Nacional de Ollas y Platos Vacíos: la pobreza no puede esperar”. En Capital, los militantes se concentrarán en el Obelisco a partir de las 11. “La cantidad de familias en situación de calle en las principales ciudades de nuestro país es solo la expresión más visible de una situación que no para de agravarse. Y el Gobierno no solo no logra desplegar un plan de asistencia ante la emergencia, sino que muestra sus límites también en ese aspecto”, expresó la organización en la convocatoria a la jornada. “La pobreza no puede esperar y hace falta dar respuestas más contundentes ante una situación tan delicada”, agregó. “No podemos ser indiferentes ante las ollas y los platos vacíos en las mesas de muchos vecinos y vecinas de nuestros barrios.”

Fuente: Página 12

https://www.pagina12.com.ar/209258-polentazo-contra-el-hambre

Movimentos populares e organizações de base, no Brasil: Refontização como condição de retomada de seu potencial transformador

Solidários a quem, nos últimos tempos, vem chamando a atenção de nossas organizações de base – em especial dos movimentos populares (inclusive os mais ligados à chamada “Igreja na Base” – para a necessidade e urgência de esboçarem sinais convincentes de uma autocritica, ousamos retomar a reflexão, desta vez, para ponderar acerca de um fenômeno pouco destacado em textos analíticos da atual crise, em que vive mergulhada nossa sociedade, e que tem a ver com os descaminhos daquelas forças sociais historicamente vocacionadas a atuarem como sujeitos de transformação.

Referimo-nos a uma espécie de desfontização, isto é, à crescente tendência de subestimação ou mesmo de abandono de suas principais fontes de inspiração, seja no tocante às forças que se querem inspiradas na Filosofia da Práxis (da qual o legado Freireano, é instigante interlocutor), seja daquelas que têm na corrente conhecida como Teologia da Libertação, suas fontes principais de referência. As linhas que seguem, têm como objetivo ajudar a retomar o debate sobre esta questão. Iniciamos por refrescar a memória de elementos axiais, característicos do nosso processo organizativo e formativo, e de mobilização, vivenciado em final dos anos 70/ inicios dos anos 80, no Brasil e na América Latina. Em seguida, cuidamos de assinalar uma sucessão de revezes históricos de nossas organizações de base, graças ao abandono ou à insuficiência de seu empenho organizativo, formativo e de luta, inspirado em suas principais fontes de referência. Por último, tratamos de fornecer algumas pistas, a título de ensaio de passos, na busca de retomada, em novo estilo, da necessária refontização.

  1. Breve rememoração de nossas referências teórico-práticas… 

Em fins dos anos 70/começos dos anos 80, ainda durante a ditadura civil-militar, chama a atenção o fecundo investimento exercitado pelos movimentos populares e por nossas organizações de base em bebermos principalmente em duas fontes organicamente articuladas: a do legado marxiano (em interlocução com a Educação Popular de matrix Freireana) e a da “Igreja na Base” (inspirada principalmente na Teologia da Libertação).

 Em cada uma dessas principais referências teórico-práticas, tratemos de rememorar os pontos considerados mais fortes.

No caso do legado marxiano, nossa atenção se voltava, fundamentalmente para os seguintes aspectos:

– o esforço continuado em fazer uma análise objetiva  da realidade objetiva, isto é: potenciar o empenho numa leitura acurada, servindo-nos de conceitos considerados mais eficazes de uma aproximação mais objetiva da complexidade daquele contexto histórico. Neste sentido, cuidávamos em priorizar conceitos tais como: “Modo de produção”, “Formação social “luta de classes”, “Mais valia”, “Classe Trabalhadora”, “Consciência de Classe”, “Estado”, “Alienação”,  cuja aplicação se buscava sempre ancorar em relevantes princípios como o do Movimento, o da transformação universal, o da interconexão, o da unidade dos contrários, etc. Eram princípios como estes que, trabalhados à base da prática como critério de verdade, ajudavam os militantes – homens e mulheres – a ter claras distinções tais como origem de classe, posição de classe, protagonismo nas decisões tomadas pela base, alternância de cargos e funções, a função de delegação, entre outras.. Mas, não se tratava apenas de ter clareza sobre tais conceitos. Mais importante ainda se sentia a necessidade de se examinar se e como cada um deles se aplicava ao contexto concreto, também no exercício de análise de conjuntura. De modo semelhante, tínhamos como fundamental um cuidadoso exercício (coletivo e pessoal) de levantar sobre a realidade em análise os mais diversos ângulos sob os quais ela precisava ser analisada, isto é, não se poderia contentar com um exame apenas, do ponto de vista econômico, mas igualmente examinar como os fatos econômicos se associavam organicamente ao contexto político e cultural.

Se enraizavam diversas formas de atuação desses militantes, seja no campo da organização, seja no terreno do processo formativo, seja nas ações de mobilização e lutas sociais mais diretas. Não apenas em cada uma destas, mas sobretudo em seu interrelacionamento. Tratemos de trazer alguns exemplos ilustrativos, acerca disto.

No campo organizativo, por exemplo, aprendia-se que a força e a eficácia de nossas ações organizativas residiam no jeito de nos organizarmos.  Um desses jeitos – e não o menos importante! – consistia em que, se o nosso grande objetivo era o de ajudarmos a construir as bases de uma sociabilidade alternativa à barbárie capitalista, tínhamos, não apenas de nos esforçarmos (coletiva e pessoalmente) em manter sempre aceso este rumo, ou seja, manter firmes os traços fundamentais do rumo almejado, da nova sociedade, mas igualmente nos comprometermos com os caminhos coerentes com tal rumo. A liberdade que almejávamos só seria acessível por caminhos também de liberdade. Isto já nos predispunha a manter-nos alertas em relação aos modos convencionais de organização, como os seguidos pelas forças sindicais hegemônicas, pelos grupos partidários convencionais. Estávamos convencidos de que tínhamos que seguir à contra-corrente de suas práticas e concepções.

Em termos práticos, isto significava,, do ponto de vista organizativo, priorizar iniciativas tais como:

– Levar um estilo de vida próximo das bases;

– Criar e promover núcleos (pequenas comunidades, conselhos populares, círculos de cultura ou que outro nome tivessem), nos mais variados lugares: nas fábricas, nos bairros periféricos, nas universidades, nos colégios, nas pequenas comunidades rurais, nos ambientes de trabalho, etc.);

– Assegurar condições para o exercício da autonomia, em relação ao Mercado e ao Estado, por meio do autofinanciamento, recorrendo aos “tostões” de seus membros, como contribuição regular;

– Assegurar a tomada de decisões pela base, compartilhando-as à outras instâncias, por meio de seus delegados e delegadas;

– Garantir o rodízio ou alternância de cargos e funções, de modo que, passado o período de sua gestão, quem está na coordenação volte para a base, e quem é da base venha ocupar a coordenação;

– Investir no estudo continuado dos bons clássicos e contemporâneos;

– Promover a circulação regular de revista e jornais, de caráter informativo e formativo…

O diferencial desse jeito organizativo reside no investimento e cultivo incessante do protagonismo comunitário, isto é, na ação animada, sob os mais diversos aspectos, pelo conjunto dos protagonistas, não se abrindo brecha para oportunistas e controladores individuais ou de pequenos grupos. Mas, isto só se torna exequível, se e quando o processo organizativo caminha de braços dados com o processo formativo. Um coordenar ou um pequenos grupo de direção até  pode tentar controlar a base, mas só se esta não estiver metida num processo de formação crítica, capaz de anular qualquer esboço de manipulação por parte de um membro ou dirigente ou de um pequeno grupo. Lá onde isto não teml ugar, o campo fica escancarado à ação deletéria de espertalhões, com vistas à imposição dos próprios interesses e projetos, com e pior: com a urgência  e coonestação da própria base, aí transformada em massa de manobra.

Um de tantos casos, nesse campo, se dá, quando a forte desconfiança que antes se tinha do Estado, enquanto capaz de protagonizar mudanças substantivas do interesse dos “de baixo”, passa ser usado e abusado, como instrumento de mudança de mudança social, conforme a aposta e interesses de um pequenos grupo, ávido de poder e de alcançar seu projeto, por mais que insista em tratar-se de um um projeto “da Classe Trabalhadora”…

Acrescentar: Autonomia, postura ética, crítica e autocrítica

  1. Em que resultaram a crescente inobservância e o abandono das fontes teórico-práticas de referência?

Em vez da busca de uma nova sociedade, a opção recaiu no investimento em um novo Estado…. Diversos são os dados de pesquisa dando conta dos frutos alcançados por nossas organizações de base e movimentos populares, enquanto foram levadas a sério suas principais fontes de referência, inclusive no campo de conquistas relativas à reforma agrária. À medida, porém, que tais referências prático-teóricas passaram a ser secundarizadas ou mesmo abandonadas, eis que graves consequências foram sucedendo-se, dentre as quais destacamos algumas, de passagem:

-o aliancismo como estratégia “necessária”, dando lugar contribuindo progressivamente para a perda de identidade de classe, bem como da autonomia em relação ao mercado capitalista e ao seu Estado;

-inversão de prioridades ético-políticas: em vez de fortalecimento dos núcleos, a corrida pelos espaços estatais…

– Em vez de um sindicalismo de base e combativo, prevalece um sindicalismo de resultados e atuando como correia-de-transmissao do Partido…

-Dependência dos recursos do Estado e do Mercado, em vez da aposta nos próprios tostões…

-Em vez de decisões pela base, o investimento progressivo numa condução feita uma pessoa ou por um pequeno grupo…

-Em vez da aposta em projetos populares, a avidez pelas grandes obras, denunciadas, no período da ditadura civil-militar, a justo título, como “obras faraônicas” (a exemplo das grandes hidrelétricas e da própria transposição de água de São Francisco;

-A embriaguez pelo poder acirra a estratégia de agradar dois senhores…

– O enraizamento nos espaços populares sede lugar à opções por espaços privilegiados e o consequente abandono das bases…

  1. Que lições recolher, em vista da necessária retomada, em novo estilo?

Diante de tantos e tão graves reveses, impõe-se recolher lições ainda que duras, no sentido de um efetivo exercício de autocrítica, menos por palavras e mais por práticas convincentes. Exercício de autocrítica a ser seguido de iniciativas concretas, em vista da retomada, em novo estilo, do Trabalho de Base, tanto no que se refere às ações de caráter organizativo, tanto no tocante às tarefas formativas, quanto aos compromissos de mobilização. Tarefas estas a serem retomadas a partir das referências teórico-práticas acima mencionadas.

Concretamente, que passos poderiam ajudar nesta retomada do trabalho de base, que tal pensar nas seguintes sugestões sugestões?

-Não seria interessante mostrar sinais concretos de autocritica, não tanto por palavras ou promessas, mas por práticas efetivas?

-Em vez da avidez por vanguardismos inconsistentes, po que não participar em pé de igualdade de uma retomada, em novo estilo?

– Que tal retomar a criação e ampliação de núcleos e conselhos populares?

– Não será o caso de combatermos o caciquismo, retomando as práticas comunitárias  características das origens, reinvestir no mecanismo da alternância e no princípio da delegação?

-Que tal retomar práticas por meio de condições favoráveis ao exercício da autonomia (em relação ao Estado e ao Mercado), por meio do autofinanciamento?

– No plano formativo, que tal reinvestir na memória histórica dos oprimidos valorizando e incentivando o estudo comunitário da contribuição dos movimentos populares no mundo, na A. Latina e no Brasil?

– O que dizer do incentivo à leitura em grupo de biografias de figuras revolucionários e revolucionárias de ontem e de hoje?

– Que tal, em vez de centrar toda a atenção formativa apenas na esfera política, ampliar o alcance da formação, de modo a alcançar tantas outras dimensões do processo de humanização?

-Por que não retomar as relações internacionalistas, em novo estilo?

-Não será fundamental priorizarmos a necessidade de mudança de estilo de vida (mais próximo da população, com sobriedade e simplicidade de vida, priorizar as lutas em defesa e promoção da Mãe-Terra?

– Em breve, não será o caso de fortalecer a sociedade civil, empoderando-a, com base na reconquista da confiança e da solidariedade popular?

Rememoração retroprospectiva de um movimento popular a caminho de sus 50 anos

Ontem como hoje, os movimentos sociais populares continuam sendo o principal segmento da sociedade civil responsável, juntamente com outras organizações de base, pelas mudanças sociais mais relevantes.

Trata-se de um amplo leque de movimentos sociais, caracterizados por suas respectivas bandeiras de luta. São movimentos sociais, sindicais e populares (sem esquecer dos sindicatos patronais…) do campo e da cidade, protagonistas de uma extensa diversidade de lutas sociais que, didaticamente, podemos classificar por meio de certas categorias:

Classe:

Nesta categoria, cuidamos de distinguir entre organizações e movimentos da sociedade civil que atuam em direção oposta: os que lutam para preservar e ampliar seus interesses de classe dominante, de um lado; e, de outro, aqueles movimentos sociais, sindicais e populares, que lutam para mudar as relações hegemônicas vigentes. Tomamos o cuidado, todavia, de distinguir, mesmo no âmbito dos que também se chamam movimentos populares, entre os que se empenham em defender e promover apenas suas respectivas bandeiras de luta (terra, moradia, aumento salarial, etc.) e os que, também fazendo isto, priorizam os interesses da Classe Trabalhadora, entendida como composta por todos-os-que-vivem-do-seu-trabalho”. Neste sentido, nem todo movimento popular se caracteriza como um movimento classista.

Espacialidade: aqui situamos os movimentos sociais populares do campo e o das cidades, a lidarem, cada qual, com suas bandeiras específicas;

Gênero: são movimentos diversos a propugnarem pela igualdade nas relações sociais de gênero. A despeito do registro da existência de alguns grupos ou movimentos protagonizados por homens, trata-se, em sua enorme maioria de movimentos sociais femininos e feministas, a lutarem contra uma tendência crescente de crimes e violências contra a condição feminina, oscilando de feminicídios a estupros, agressões múltiplas, discriminações, flagrantes desigualdades sociais (nas relações de trabalho, na percepção salarial, nas estatísticas de desemprego…);

Etnia: aqui nos voltamos para aqueles movimentos sociais populares protagonistas de causas de natureza étnica: desde os povos originários vitimas das formas mais perversas de colonização e de neocolonialismo, a desrespeitarem gravemente seus direitos mais elementares (sua cultura, seus territórios, suas crenças, seu tipo de organização…) às comunidades quilombolas, vítimas como os povos originários, de semelhantes mazelas históricas, ainda passando por outros povos tradicionais, das florestas, das águas, pescadores, ribeirinhos, etc.

Geração: alcançam os vários segmentos populares, a partir de suas características etárias, tais como o Movimento das Crianças e Adolescentes (MAC), os vários movimentos estudantis, outros mais protagonistas do mundo das artes e da Cultura, e até alguns segmentos de pessoas idosas.

Além destas categorias, devem ser lembrados muitos movimentos populares que se organizam a partir de motivações específicas, ligadas às mais diversas Políticas Públicas.

Dentre tantos movimentos populares, aqui tratamos, de passagem, apenas de um deles: O quase cinquentenário Movimento das Comunidades Populares (MCP), organizado em vários Estados e Regiões do Brasil, e, durante essas décadas, assumindo distintos nomes, conforme a conjuntura sócio-política apresentada.

O MCP é sucedâneo da JAC (Juventude Agraria Católica), uma das cinco expressões da chamada Ação Católica Especializada, voltada para a ação cidadã de jovens cristãos católicos, ligados ora ao meio estudantil (JEC), ora mais associados à Classe Média (JIC), ora ao meio universitário, (JUC) que, em resistência à Ditadura Civil-Militar, acabou desembocando na formação da Ação Popular, juntamente com outros segmentos de esquerda), ora ao meio operário (JOC, que constituiu a expressão mais relevante da Ação Católica Especializada), ora protagonistas da causa camponesa (JAC).

É na JAC que tem origem o MCP. Tendo em vista a crescente onda de violência e repressão movidas contra as organizações de resistência popular, os vários segmentos da Ação Católica Especializada passaram a ser vítimas de crescente perseguição, inclusive de desbaratamento por parte da Ditadura, razão pela qual seus sobreviventes passam a atuar pela sigla MER (Movimento de Evangelização Rural). Estamos nos anos 70. Tempos tenebrosos, de uma correlação de forças profundamente desigual. As organizações de resistência à Ditadura Civil-Militar, em seu período mais violento, enfrentam desafios acima de suas forças: passam a ser, uma após outra, dizimadas, sob vários aspectos. É aí que começam a ganhar força os espaços eclesiais, graças, não apenas a uma geração de bispos profetas (Dom Helder, Dom Paulo Evaristo Arns, Dom Ivo Lorscheiter, Dom Antônio Batista Fragoso, Dom José Maria Pires – para destacar apenas estes, de um elenco mais amplo), mas também à atuação cidadã de alguns segmentos eclesiais progressistas (as CEBs, o CIMI, a CPT, a ACR, o MER, a CPO, as Comissões de Justiça e Paz, as PCIs, os CDDHs, o CEBI, entre outros, e teologicamente bem fundamentados na Teologia da Libertação (sobre tais segmentos, já tivemos oportunidade de refletir, algumas vezes (cf. textos de alder calado). Graças aos compromissos assumidos, desde o Pacto das Catacumbas (1965), e fortalecidos pela Conferência Episcopal Latino-Americana de Medellín (1968), esses segmentos eclesiais passaram a ser o principal vetor de resistência ao regime ditatorial, permitindo o acolhimento em seus núcleos de muitos sobreviventes à perseguição crescente movida pelo regime imperante.

O MER constitui, por conseguinte, um desses segmentos de resistência que, pela sua radicalidade, veio a enfrentar, não raramente, algumas dificuldades em seu relacionamento com a hierarquia. Por esta razão e por outros fatores conjunturais, o MER houve por bem assumir outros nomes, conforme a tendência da conjuntura. De MER passou um tempo assumindo-se como uma corrente sindical de trabalhadores independentes (CTI), enquanto tempos depois, optou por atuar como um movimento de comissões de lutas (MCL), até desaguar, nos anos 2000, assumindo-se como Movimento das Comunidades Populares.

Relevante assinalar, na cinquentenária trajetória do MCP, alguns traços que tem conseguido guardar, através de distintas conjunturas:

– mantém-se enraizado nos mais diversos ambientes e lutas populares, no campo e na cidade. Marca decisiva para qualquer organização que se pretenda comprometida com as causas libertárias de construção de um novo modo de produção, de um novo modo de consumo e de um novo modo de gestão societal, mantendo-se leal, não apenas ao rumo aonde busca chegar, como também às veredas compatíveis com tal rumo;

– tem buscado manter-se autônomo, quer em relação ao Mercado, quer em relação às instâncias governamentais;

– sua meta de autonomia não se esgota em decisões formais: trata de optar por caminhos concretos que viabilizem seu desiderato: seja pelas vias da automanutenção, viabilizada pelos tostões em caixa-comum, para financiar suas atividades;

– mantendo, a duras custas, seu periódico formativo e informativo, “Jornal A Voz das Comunidades”, fazendo questão de fazê-lo chegar às mãos de seus membros, não apenas como instrumento informativo, mas sobretudo como ferramenta de formação contínua;

– fomentando atividades de visitas, reuniões, encontros, atos de mobilização, nos distintos setores em que se acha organizado (de modo a abranger, entre outros, Juventude, Cultura, Saúde, Moradia, experiências agroecológicas, Artes, trabalhos coletivos, mutirões, etc., etc.);

– tem mantido a realização de seus Encontros (municipais, estaduais, nacionais), durante os quais cuida de examinar a conjuntura e daí extrair um plano de lutas, com ampla participação de seus membros…

Sob esse clima, é que se deu a realização do mais recente Encontro do MCP, na Paraíba, realizado em sua sede, em Santa Rita – PB, no Alto das Populares, sobre o qual cuido, a seguir, de fornecer uma breve notícia.

Tratou-se de um Encontro de confraternização de antigos e novos militantes, inclusive em vista da visita de antigos militantes do MER, vindos de outros Estados, principalmente da Paraíba, desde o Alto Sertão (Carrapateira, Cajazeiras, Uiraúna, Patos…), do Agreste (Itabaiana, Mogeiro), do Brejo (Alagoa Grande), de Mamanguape, da Área Metropolitana de João Pessoa (João Pessoa, Santa Rita, Bayeux).

Carinhosamente preparado o ambiente pelos anfitriões, a partir das oito horas do dia 22 de outubro próximo passado, foram chegando os participantes, e cumprimentando-se alegremente, em volta de uma mesa, servindo-se de um apetitoso café da manhã. Por volta das 9 horas, ouve-se o chamado de Tiago, a quem fora delegada a tarefa de expressar as boas-vindas aos participantes, bem como de introduzi-los à programação do Encontro. Tiago pergunta aos presentes com que motivações vieram ao Encontro, foram convidados para que objetivos. Sucede-se uma roda de intervenções, já com a indicação de que cada qual cuide de apresentar-se: nome, vindo de onde, de que Estado, de que região, de que Assentamento, comunidade, sindicato, fazendo que atividades, etc.

Vivenciada esta fase, e reavivada a programação do dia, passou-se à exibição de um vídeo que, por meio de uma ampla sucessão de fotos (tomadas em distintas etapas de MCP), por meio de músicas características do movimento, e por meio de faixas ou escritos, tratou-se de rememorar o MCP, em suas distintas etapas. Este procedimento propiciou aos participantes um estímulo especial de reencontro com seu movimento. A partir daí, nova roda de intervenções, em que antigos e novos militantes, a partir de sua atuação específica no MCP, passaram a destacar momentos mais impactantes de sua vivência, de sua relação com o movimento.

Ainda na parte da manhã, propôs-se que se formassem quatro grupos, para refletirem sobre questões ligadas a facetas da trajetória do MCP, numa perspectiva avaliativa, e sobre as urgências atuais que o movimento se sente mais desafiado a priorizar. Aqui também se incluiu alguma discussão sobre os principais pontos do mais recente Encontro nacional do MCP, realizado em Feira de Santana – BA.

Após um saboroso almoço, preparado por militantes do movimento, a exemplo de Maíra, os participantes retomaram os trabalhos, a começar pela socialização dos principais pontos levantados nos grupos, a que se seguiu nova roda de intervenções, sendo os participantes estimulados a considerarem em suas falas o que consideravam constituírem as grandes prioridades do MCP, e como, a partir da realidade de sua área (sindical, assentamento, etc.), poderiam organizar-se para levar a termo tais prioridades, tomando em consideração os onze eixos de lutas, tirados no último Encontro nacional, com foco mais forte em cima das lutas em torno da escandalosa dívida pública.

A coordenação deste Encontro, em Santa Rita, assumiu o compromisso de socializar oportunamente uma síntese deste encontro. O propósito destas linhas, é claro, não foi este, mas o de ressaltar alguns aspectos do cotidiano de um movimento popular e de suas atividades que vêm resistindo ao tempo – ele está a dois anos de completar meio século! -, de modo consequente, a despeito dos tremendos desafios enfrentados e a serem enfrentados. Uma inspiração de resistência propositiva para as classes populares, em tempos sombrios. Viva o MCP!

Olinda, 09 de novembro de 2017.

Papa Francisco, um homem de muita coragem!

Por João Pedro Stédile

Estive recentemente no III Encontro mundial de movimentos populares em diálogo com o Papa Francisco, realizado no Vaticano de 2 a 5 de novembro de 2016. Participaram mais de 200 delegados de 60 países, representando movimentos inseridos nas lutas sociais de três áreas: Trabalho, terra e Teto.

Do Brasil estávamos em oito delegados escolhidos pelos movimentos dessas áreas.

O encontro se insere num processo permanente de debate que iniciamos em 2013, do qual resultou o primeiro encontro no Vaticano em outubro de 2014, depois um segundo mais massivo e latinoamericano, quando reunimos mais de 5 mil militantes populares em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia. E agora o terceiro encontro, de novo no Vaticano.

Esse processo de debates e diálogos entre o Papa Francisco e os movimentos populares, partiu de uma vontade política do Papa, de dialogar e dar protagonismo aos movimentos populares em todo mundo, como estimulo à organização dos trabalhadores e dos mais pobres, como esperança e necessidade para as mudanças necessárias no sistema capitalista.

Por isso, os delegados são escolhidos entre os dirigentes de movimentos populares, de todos os continentes, com a maior pluralidade possível e existente de: etnias, religiões, idade, culturas e com equidade de gênero. Ele pediu que se evitasse levar agentes de pastorais da igreja católica, pois teriam outros espaços. Mas sempre participam também desse processo de dialogo, representantes do Vaticano, em especial da Pontifícia Comissão de Justiça e Paz, e alguns bispos e cardeais, que tenham vínculos reais com os movimentos populares em suas regiões.

No primeiro encontro, a base do dialogo foi o debate sobre a realidade e a causa dos problemas que vivem os trabalhadores nas três esferas da luta social. Foi apresentado um amplo diagnóstico e reflexões sobre as soluções necessárias. Usando sempre o método ver-julgar-agir. O Papa Francisco construiu um documento, que na essência se resumiu na defesa de um programa de que não deveríamos ter mais: “Nenhum camponês sem terra; Nenhum trabalhador sem direitos e nenhuma família sem moradia digna!”

Entre o primeiro e o segundo encontro seguiu-se um diálogo em torno dos problemas ambientais, dos agrotóxicos, das sementes transgênicas, em que o Papa consultou muitos especialistas, teólogos, bispos e movimentos que atuam nessa área.

E o resultado foi uma esplêndida Encíclica, “Louvado seja!” aonde o Papa sistematiza reflexões, analisa as causas dos problemas ambientais e propõem soluções.

O Texto é a mais profunda e rica contribuição teórica e programática sobre o tema produzida em todos os tempos. Uma contribuição que nem mesmo a tradição teórica de esquerda havia produzido.

Depois no segundo encontro na Bolívia, com presença marcante de afro-descendentes, povos indígenas e povos com conflitos em seus territórios, como o povo Curdo, avançou-se para o direito ao território. O Papa inseriu em suas reflexões o conceito de que todo o povo tem o direito a soberania popular sobre o seu território. E avançou-se também na concepção de que os bens da natureza que existem nesses territórios devem ser aproveitados em benefício de todo povo, ou seja trata-se de um bem comum e não apenas um recurso a ser transformado em mercadoria e renda extraordinária, como querem as empresas capitalistas que exploram os bens da natureza, como os minérios, petróleo, água e biodiversidade.

Agora, no terceiro encontro estava na pauta dos debates, novos temas relacionados com os graves dilemas que a sociedade moderna está enfrentando em todo mundo.

O primeiro tema foi a questão do estado e da democracia.

Tivemos aqui a participação também do ex- Presidente Pepe Mujica, do Uruguai, e de outros dirigentes políticos progressistas que enviaram reflexões. Há uma crítica generalizada em todo mundo, que a forma de funcionar do estado burguês não representa mais as bases republicanas dos interesses da maioria. Porque a democracia representativa, formal, burguesa, não consegue mais expressar apenas pelo voto, o direito e a vontade da maioria da população.

O capital sequestrou a democracia pela forma de organizar as eleições.

E sobre esse tema o Papa reagiu e foi contundente que assombrou a todos, quando definiu de que na realidade existe um estado mais que excludente, um estado terrorista, que usa do dinheiro e do medo, para manipular a vontade das maiorias.

O dinheiro expressa a força do capital que sobrepassa as instituições democráticas, e o medo, imposto à população pela manipulação midiática permanente.

Entre todos participantes ficou a certeza de que precisamos aprofundar o debate em nossos países, para construir novas formas de participação política do povo, que de fato, garanta o direito do povo participar do poder político em todos os espaços da vida social. E ninguém tem uma receita, uma fórmula, depende da construção real na luta de classes de cada pais. A realidade é que esses processos eleitorais atuais não são democráticos e nem permitem a realização da vontade do povo.

Outro tema debatido, que representou avanços em relação aos encontros anteriores, foi o tema dos migrantes econômicos e dos refugiados políticos. A Europa vive uma verdadeira tragédia com os refugiados do Oriente médio e da África.

Milhões, repito milhões de pessoas estão migrando todos os dias, de todas as formas, de barco, caminhando quilômetros e quilômetros para fugir da morte rumo a Europa, e lá encontram mais exclusão e xenofobia, sendo que apenas estão lá, porque as empresas europeias são as principais fornecedoras de armas para a Arábia Saudita e governos repressores da região.

Nesse sentido a reflexão dos movimentos seguiu na linha do direito a um território e da luta contra a xenofobia. Do direito a autodeterminação dos povos e contra as guerras. As guerras não resolvem nenhum conflito social e apenas criam mais problemas sociais, além de ceifar a vida de milhares de pessoas, em geral os mais pobres e trabalhadores. Todos os seres humanos são iguais, na sua natureza e nos seus direitos.

Aqui emergiu a ideia de que devemos incorporar em todos nossos programas a proposta da igualdade. A igualdade de oportunidades, de direitos e deveres, é a unica base de uma sociedade realmente democrática.

E nesse tema o Papa Francisco revelou toda sua coragem, ao denunciar de que quando um banco vai a falência, logo surgem bilhões de euros para salvar seus acionistas. Porém quando um povo está em dificuldade e migra, nunca há recursos públicos para ajudá-los e encontra-se todo tipo de desculpas possíveis. O Papa denunciou o sistema capitalista como autor dessa tragédia humana, contemporânea que estamos vivendo, de exclusão, de superexploração dos migrantes e dos refugiados, não só na Europa, mas em diversas regiões mundo, aonde os países ditos ricos, se protegem dos pobres e migrantes, praticando ainda mais exclusão. Nunca se ergueram tantos muros de exclusão, em tantos países, como agora!

Como veem os debates foram muito interessantes. E devem seguir, por muito tempo ainda, graças a abertura e generosidade do Papa Francisco. Todos os documentos na íntegra e os discursos do Papa vocês poderão encontrar na página http://movimientospopulares.org/

De nossa parte, da delegação brasileira, levamos uma faixa de FORA TEMER, em plena praça da Basílica de São Pedro, denunciando o golpe por aqui e saímos convencidos de que além de São Francisco de Assis, agora temos mais um Francisco, revolucionário na igreja.

Tentativa de criminalização do MST é inaceitável, diz Dilma

Presidenta, afastada por um golpe, enviou nota de solidariedade à Escola do movimento, que foi invadida por policiais civis nesta sexta-feira (4)

Em defesa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a presidenta afastada Dilma Rousseff enviou nota de solidariedade à Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), que foi invadida por policiais civis nesta sexta-feira (4). Na nota, Dilma disse ser inaceitável que se tente criminalizar o movimento.

Para ela, há um processo assustador de retrocesso no Brasil, que foi iniciado com o golpe, e mantém em curso um “Estado de Exceção no País”.

“É lamentável que a semana termine com novos assaltos aos direitos civis e a tentativa de criminalizar os movimentos sociais. O atropelo às regras do Estado de Direito, com a adoção de claras medidas de exceção, deve ser combatido. É uma ameaça à democracia que envergonha o País aos olhos do mundo”, ressaltou.

A presidenta também disse não ser possível ficar que a população fique calada diante da violência do Estado contra quem quer que seja. “Não podemos aceitar conviver com cenas em que policiais submetem estudantes a algemas e ao cárcere. Isso é inadmissível em uma democracia”, ressaltou.

Confira a nota na íntegra:

Estado de Exceção

É assustador que o retrocesso que vem ocorrendo no Brasil, iniciado com o Golpe, mantenha o perigoso curso de construção de um Estado de Exceção no País.

A invasão da Escola Nacional Florestan Fernandes, ligada ao MST, é um precedente grave. Não há porque admitir ações policiais repressivas que resultem em tiros e ameaças letais, ainda mais em uma escola.

Tampouco é aceitável que se criminalize o MST. Não vamos ficar calados diante da banalização da violência do Estado contra quem quer que seja. Não podemos aceitar conviver com cenas em que policiais submetem estudantes a algemas e ao cárcere. Isso é inadmissível em uma democracia.

É lamentável que a semana termine com novos assaltos aos direitos civis e a tentativa de criminalizar os movimentos sociais. O atropelo às regras do Estado de Direito, com a adoção de claras medidas de exceção, deve ser combatido. É uma ameaça à democracia que envergonha o País aos olhos do mundo.

Dilma Rousseff

Fonte: MST
http://www.mst.org.br/2016/11/05/tentativa-de-criminalizacao-do-mst-e-inaceitavel-diz-dilma.html

Cidadão-pastor-profeta: traços entrelaçados no perfil de Francisco, Bispo de Roma

A dois meses de completar seus 80 anos, e há menos de quatro anos no exercício de seu ministério, Francisco, Bispo de Roma, segue sendo extraordinário “fermento na massa”, sendo reconhecido, mundialmente, como uma liderança de novo tipo. Com efeito, por seus gestos, escritos e palavas, não tem cessado de sacudir caducas estruturas societais e eclesiásticas. Que, em seus âmbitos específicos, mas interligados, (des)governam o nosso mundo e ameaçam a qualidade de vida da Mãe-Terra, dos humanos e de toda comunidade dos viventes. A este quadro horrendo, Francisco não se cansa de ousar moleculares passos de enfrentamento, em vista de superação.

Por onde quer que passe, lança sementes portadoras de alternatividade, seja por meio de suas viagens apostólicas pelos vários continentes, seja pelas suas homilias, discursos, mensagens, seja pelas suas entrevistas, seja pelos seus escritos, seja, sobretudo, pelos seus gestos. Triste é constatar que, salvo exceções, tanto em relação a lideranças civis, quanto a lideranças eclesiásticas, ele parece uma voz no deserto, da qual se acham distantes, a anos-luz, aquelas autoridades. Não obstante tal dilema, ele segue firme – a despeito, aqui, ali, de algumas fragilidades -, convencido, como Dom Helder Câmara e outras figuras, de que “o deserto é fértil”…

O propósito das linhas que seguem, é de buscar ilustrar três traços seus, que nos parecem merecer destaque especial, sobretudo se e quando tomados dinamicamente interrelacionados: o de cidadão, o de pastor e o de profeta. Aqui, chama a atenção a feliz coincidência desta tríplice dimensão com as mesmas dimensões características da vocação de todo Batizado, de toda Batizada: a de ser vocacionado/vocacionada a tornar-se, pelo Batismo, “sacerdote, profeta e rei”, ou seja, numa tradução atualizada e expressa com certa inversão de temos: cidadadã(o) (“rei”), pastor(a) (“sacerdote”) e profeta/profetisa (dimensão ética, nos diversos âmbitos – intra-inter-extraeclesial).

Bergoglio apresenta-se, com frequência, como um simples mortal, como um pecador, a mendigar, de público, oração, sempre que pode fazê-lo. Apresenta-se como uma pessoa comum, nem melhor nem pior do que as outras: um irmão entre irmãos e irmãs, quaisquer que sejam sua condição social, sua procedência geográfica, seu credo, seu grau de instrução, seu gênero, suas opções de vida…. Grande e respeitosa é sua atenção, ao receber ou cumprimentar uma pessoa pobre ou marginalizada quanto a com que recebe ou cumprimenta um potentado… Não costuma fazer acepção de pessoas, e se alguma preferência mostra, é pelas pessoas mais pobres, mais sofridas. Provas? São numerosas. Quem ele costuma convidar, durante a cerimônia do Lava-pés, na Quinta-Feira Santa? Onde e com quem escolheu morar, no limite de sua função? Quem escolheu como interlocutores privilegiados (refiro-me aos encontros mundiais de delegados de movimentos populares, sobre os quais diremos uma palavra mais adiante)… Em suas incansáveis viagens pelo mundo, a quem se dirige, habitualmente? Como se comporta no meio das multidões, em praças públicas? A quem abraça? De quem recebe, em plena praça, uma cuia de chimarrão (e toma!)?

Francisco comporta-se, antes de tudo, como um cidadão comum, como alguém que testemunha sua autoridade pelo serviço, a despeito das estruturas pesadíssimas em que se acha envolto… Isto significa seu empenho em testemunhar um mundo de irmãos e irmãs, um mundo em que todos, todas caibam, com dignidade. O anúncio do Evangelho que faz, prioriza a condição de GENTE, razão de ser de seu admirável alcance universal – para muito além da Igreja Católica, das Igrejas Cristãs ou de outras expressões religiosas ou sem qualquer credo religioso -, o que nos faz lembrar a figura de outro Francisco, o de Assis; e, antes deste, o testemunho de Jesus de Nazaré: “Os governantes deste mundo tiranizam as nações… mas entre vocês, não seja assim. Quem quiser ser o maior, torne-se o servidor de todos, pois o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e para dar Sua vida em favor de muitos.” (cf. Mc 10, 42-45).

O Bispo de Roma, reconhecendo-se sempre frágil e necessitado da graça divina, cuida de não restringir sua condição de cidadão a belas palavras. Toma iniciativas. Uma delas é sua intrigante decisão de ouvir, não representantes das grandes potências, mas delegados e delegadas dos mais pobres, organizados em movimentos populares ou em organismos similares, razão por que, já pela terceira vez, está convidando uma centena de representantes de movimentos populares e de outras organizações de base, dos vários continentes, a participarem do 3º Encontro Mundial de Movimentos Populares, tendo sido realizado o primeiro, em 2014 (em Roma), o segundo, em Santa Cruz de la Sierra (na Bolívia), em 2015, enquanto está marcado para os próximos dias 3 a 5 de novembro vindouro, de novo, em Roma, organizado pelo Conselho Pontifício de Justiça e Paz.

A quem queira compreender mais a fundo a dimensão especificamente cidadã do Bispo de Roma – não esquecer que aqui cuidamos de destacar a dimensão cidadã, de modo profundamente articulado a dimensão de pastor e de profeta -, é fundamental acompanhar, mais de perto, como se desenrolaram os dois primeiros encontros mundiais de movimentos populares, bem como o que está previsto, em novembro próximo.

Para o acompanhamento dos primeiros, sugiro acesso a textos já compartilhados (cf.textosdealdercalado). Recomendamos, em especial, que se veja/ ouça a fala de Francisco, dirigida ao participantes do Segundo Encontro Mundial de Movimentos Populares, em Santa Crus de La Sierra: https://www.youtube.com/watch?v=FSalbM4cFYQ.

Embora tendo frisado bem, neste ponto, a dimensão cidadã do perfil de Bergoglio insistimos em sua intima conexão com as outras duas dimensões aqui tratadas – a de pastor e a de profeta. No próximo ponto, cuidamos mais diretamente da dimensão pastoral.

Também aqui, o atual Bispo de Roma, tem exercido seu ministério, de modo reconhecidamente atípico, em relação aos seus predecessores imediatos. Destaquemos algumas ocorrências que apontam nesta direção, tomando seu particular empenho de trabalhar pela construção da unidade na diversidade, característica fundamental da missão de pastor, no Movimento de Jesus. O Bom Pastor (confira, por ex. O capítulo 10 do Evangelho de João) é aquele que dá a vida pelas suas ovelhas; é aquele que, deixando as noventa e nove já reunidas, vai atrás daquela desgarrada. E não se trata de restringir tal missão pastoral ao âmbito intraeclesial, nem mesmo inter-eclesial. Sua missão vai além: ocupa-se das condições em que vive toda a humanidade, em especial as maiorias empobrecidas. O que acima foi descrito, comporta traços do seu empenho e compromisso com uma humanidade renovada. Neste item, restringimo-nos ao âmbito inter-eclesial, ou seja, ao seu particular empenho em busca da unidade dos cristãos. Algumas de suas iniciativas, nesse sentido, são recentes, enquanto uma próxima está prevista para acontecer daqui a uma semana. Foram amplamente noticiados seus encontros com lideranças de Igrejas Ortodoxas, tanto o mais recente, que se deu em viagem apostólica a Lesbos como outro, realizado no aeroporto de Havana (Cuba), nos quais, ainda que de maneira modesta e despretensiosa, cuidou de juntar-se aos seus irmãos Patriarcas Ortodoxos, para rezarem juntos em prol da unidade dos Católicos Ortodoxos e Romanos. Não se trata de uma meta fácil, sobretudo tomando-se em consideração, não apenas a complexa teia de relações internas a ambos esses mundos, como também os 800 anos de separação…

Ainda nesse empenho de unidade entre os Cristãos, há de se destacar a solicitude de Francisco, Bispo de Roma, em atender ao convite de lideranças da Igreja Luterana a participar, na Suécia, no dia 31 de outubro de 2016, das comemorações dos 500 anos da Reforma Protestante. São atitudes dignas de registro da parte do Bispo de Roma em seu esforço de contribuir para unidade dos Cristãos.

A terceira ênfase aqui proposta, em função da tríplice dimensão (cidadão-pastor-profeta) incide sobre o exercício da profecia especialmente ao interno da Igreja Católica Romana. De passagem, aqui nos restringimos a leves indicações, baseadas em seus escritos mais importantes, dos quais destacamos a Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”. Nesta resite uma proposta pastoral profética dirigida às autoridades, bem como ao conjunto dos distintos segmentos componentes da Igreja Católica Romana. Trata-se de uma fecunda proposta de governo eclesial para os próximos anos. Nela, destacam-se preocupações tais como: a vocação cristã à alegria, inspirada apelo evangelho; a centralidade do povo de Deus na organização eclesial; às sérias tentações e apelos ao clericalismo; a centralizada dos pobres como núcleo fundamental das mensagens evangélicas; profunda crítica profética contra a ordem econômica dominante;qual espiritualidade se requer para o enfrentamento dos desafios dentro e fora da Igreja Católica.

Seu mais recente escrito, mundialmente conhecido, constitui uma expressão de síntese cidadão – pastor – profeta, do perfil do Bispo de Roma, a medida que “Laudato sí” representa um chamamento universal, a implicar conversão contínua de cidadãos e de cristãos, no enfrentamento exitoso nos desafios socio-ambientais, o cuidado com a nossa “casa comum.

João Pessoa, 24 de outubro de 2016

Recomeço

A destruição da ordem política constitucional, a destruição da democracia como sistema de governo, é obviamente, lamentabilíssimo. Ainda mais pelo que isto acarreta de extinção de direitos sociais, humanos e trabalhistas.

Volta-se ao império do parasitismo sobre o setor produtivo, a especulação predomina sobre o esforço criativo. O Brasil está nesse cone de sombra. Ninguém sabe quanto tempo isto irá durar, pois um governo, para se manter, debe ter legitimidade. Um golpe tenta se impor pela força, como vem acontecendo.

O engano, a mentira, como armas para empossar os vencidos nas últimas eleições presidenciais. O setor mais retrógrado e amoral da politica brasileira, aliado a um judiciário claramente partidista e uma imprensa manipuladora e avessa à verdade, estão no comando do maior país da América Latina.

Isto é lamentável, verdadeiramente. Mas não serão as lamentações as que irão trazer de volta o bem perdido. Teremos que construir novamente um projeto de país para todos, um país includente. Aplicar nossos esforços, os esforços do setor sadio da sociedade, aquele que se move pela solidariedade e pela cooperação, aqueles setores como os movimentos sociais, que agem positivamente na construção de redes solidárias e na defesa de direitos.

Recompor todo esse tecido miúdo que a semeadura do ódio e do preconceito minou e debilitou. Apostar num novo Brasil, onde exista a possibilidade da coexistência em paz das diferenças. Esse país não poderá ser detido pelas forças negativas e amorais hoje no comando do governo da nação.

Más bien la vida

Dejaría el cansancio. El miedo, la aprensión. El rencor. La rabia. La indignación.

Todo lo que el golpe infame e indigno viene despertando en mí. Maldito golpe fascista. Todo por dinero. Destruir un país para devolverlo a la situación de exclusión y marginalidad social, que fue siendo revertida en buena medida a partir de las gestiones nacionales de los gobiernos del PT.

Poder dejar aquí toda esa rabia. Esos ladrones y canallas. Esas ladronas y canallas. Toda esa gente mezquina y vil va a morir igual que nosotros. Igual que las hormigas que en la base de la sociedad tejen solidaridad y justicia. Fraternidad y esperanza.

Esos mercenarios y esas mercenarias van a morir un día, igual que nosotros. En realidad, ya han muerto, y nosotros no moriremos. El amor no muere, esto sabemos. Quien ama no muere. Aquella parte nuestra que es amor, permanece para siempre.

Quisiera ahora, esta misma noche, ahora mismo, poder dejar aquí todo este dolor. Toda esta rabia. Toda esta maldita incomprensión. ¿Adónde se van a llevar todo el dinero que han robado de los cofres públicos?

¿Adónde quieren llevar un país que empezó a redimirse de su pasado de exclusión social y marginalidad social, en buena medida gracias a las gestiones nacionales del PT? ¿Por qué tanta dificultad en compartir los bienes sociales, la educación, la salud, la habitación, la cultura?

¿Por qué tanto odio a los diferentes? ¿Por qué tanta dificultad en compartir lo que es de todos? Si esta noche pudiera, solamente hasta mañana. Solamente hasta que salga el sol. Solamente hasta que los pájaros otra vez me digan que amaneció otro día.

Pensar que esta pesadilla del golpe fascista fue solamente eso: una pesadilla. Si mañana ya otra vez la vida fuera el bien más precioso. Si ya no hubiera más la pesadilla atroz de las muertes de defensores de derechos humanos, que mueren como moscas.

Si pudiera otra vez ser ese niño que jugaba y solamente disfrutaba de la vida. Y los colores y los dibujos. Y ya entonces no la muerte. Entonces ya no el miedo.

Poder pensar que el mundo será para siempre un buen lugar. Diversidad. Pluralidad. Multiplicidad. Humanidad. Desperté. Soy yo de nuevo. Es la vida.