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Clamores dos Povos, da Amazônia e das águas

Clamores dos Povos, da Amazônia e das águas.  Por frei Gilvander Moreira [1]

Castanheiras sacrificadas em plena Semana Santa de 2024, em Itaituba, no Pará. “Malditas sejam todas as cercas” (Dom Pedro Casaldáliga). Fotos: Frei Gilvander

De 22 de março a 1º de abril de 2024, participamos de Missões na Amazônia, na Prelazia de Itaituba, no Pará. Chama nossa atenção, primeiro, a imensidade da Amazônia, com cidades muito longe umas das outras; depois da exuberância da Floresta Amazônica que ainda resiste de pé com toda sua riquíssima biodiversidade, com igarapés e rios na superfície do solo e os rios aéreos que são quase invisíveis a olho nu, mas transportam uma quantidade de água maior do que os rios de superfície . São estes rios aéreos da Amazônia que garantem chuvas no centro-oeste, sudeste e sul do Brasil, no Uruguai, Paraguai e Argentina. Se eles secarem, a Amazônia se desertificará.

Com calor escaldante, nas cidades, pessoas oriundas de muitas outras terras indicam que a migração forçada tem sido um traço da cultura e da história dos Povos no Brasil. Fomos muito bem acolhidos pelo bispo dom Wilmar Santin, pelas irmãs Carmelitas e pelas lideranças leigas da Prelazia de Itaituba. Os mais de trinta missionários/as foram subdivididos/as em equipes em diversas paróquias de Itaituba. Visitamos e celebramos em várias comunidades rurais, de posseiros e de ribeirinhos. Nestas comunidades existem e resistem a um grande grau de preservação da floresta amazônica e de sua biodiversidade, mas para chegar a essas comunidades, formadas por muitas fazendas grandes com grandes currais e muita monocultura de capim, queda que após a derrubada da floresta, a criação de gado segue atrás. Na Amazônia, a injustiça agrária campeia, pois imensas quantidades de terra continuam aprisionadas em cativeiro, invadidas por grileiros fazendeiros e/ou empresários e/ou madeireiros, que expulsam posseiros, ribeirinhos, indígenas e assentados da reforma agrária.

Comentários impactados ao ouvir que a região de Itaituba foi, nas décadas de 1980 e 1990, um dos grandes polos de extração de ouro do Brasil. “ O aeroporto aqui era um dos mais movimentados. Descia e subia avião teco-teco um atrás do outro ”, nos disseram várias pessoas idosas. Os ribeirinhos dizem que sentem saudade de quando o Rio Tapajós, um dos maiores afluentes do Rio Amazonas, tinha águas límpidas e cristalinas, “ tempo em que a gente podia beber água com a própria mão ”, mas com a expansão do garimpo as águas do o rio Tapajós ficou barrento e contaminado com mercúrio. Volta e meia encontramos peixes doentes e muitas pessoas já morreram com mercúrio no corpo causado pelo garimpo que joga mercúrio nas águas e vai para os peixes e para os corpos das pessoas.

Diante da cidade de Itaituba, do outro lado do rio Tapajós, no distrito de Miritituba, já existem seis portos graneleiros, um da Cargil, outro da Bunge e de outras empresas do agronegócio, com grandes silos que recebem em média 1.800 carretas bitrem lotadas de soja do agronegócio do centro-oeste do Brasil e são embarcadas em balsas gigantes (umas vinte balsas amarradas umas às outras) sendo empurradas por rebocadores com vários motores da Scania. De Itaituba até Santarém a soja é transportada nas gigantescas barcaças 24 horas por dia. No embarque da soja, uma quantidade significativa de soja acaba caindo nas águas do Rio Tapajós, o que atrai grandes cardumes de peixes em busca de alimentação, que ao comer a soja acaba assimilando também a carga brutal de agrotóxicos na produção da soja em monocultura do agronegócio. Os ribeirinhos pescadores pescam os peixes que são a principal carne na sua alimentação. Resultado: adoecimento, depressão, autoextermínio em grau nunca visto na história das comunidades.

No segundo semestre de 2023, as Comunidades Ribeirinhas, de Posseiros e também os Povos das cidades na Amazônia sofreram em demasia com uma das maiores secas na Amazônia, uma onda de calor infernal e com nuvens gigantes de fumaça oriunda das queimadas na Floresta Amazônica. Dona Maria José, da Comunidade Ribeirinha de Barreiras, no município de Itaituba, PA, relata comovida: “ Foi de cortar o coração de dor ao vermos a mortalidade de nossos peixes deficientes de água e principalmente porque a água dos rios, igarapés e lagoas estavam quase fervendo. Nós fomos sacrificados aqui, porque era quase impossível tomar banho, porque a água do rio ou das torneiras saia quente demais. Para piorar a situação. durante vários meses tivemos que sobreviver dentro de uma nuvem gigante de fumaça, vinda das queimadas na Floresta. Era tanta fumaça que as pessoas não conseguiam enxergar o Rio Tapajós aqui ao nosso lado. Aconteceram acidentes com voadeiras e rabetas (canoas com motor), porque com tanta fumaça não se via nem a cinco metros de distância. Com o barulho do motor da voadeira ou rabeta, não se podia entender que vinha outra em direção direta. Os Postos de Saúde e os hospitais da região ficaram superlotados de pessoas com pneumonia, doenças nos olhos, alergias e outras doenças respiratórias. A gente sentiu que estava em uma sexta-feira da paixão, como a sofrida por Jesus Cristo. Estamos preocupados com o próximo verão. E como péssimo sinal, o Rio Tapajós, agora no final de março de 2024, está muito mais baixo do que estava em março do ano passado, pois está chovendo bem menos. O progresso é cada vez mais brutal e invadindo nossos territórios e nossos modos de vida. Esta narrativa pude conferir com muitas outras pessoas da comunidade. Todos diziam: “ Foi isso mesmo que aconteceu. É pura verdade ”.

Sabemos que uma multinacional do Canadá, em parceria com uma empresa brasileira, está instalando mais um megaprojeto de mineração de ouro na região de Itaituba. “ Instalamos um linhão de energia exclusivo para este projeto de mineração ”, nos disse um engenheiro elétrico. Em 1998, a CELPA (Centrais Elétricas do Pará) foi privatizada e passou a se chamar Rede Energia. Em 2012, a Equatorial Energia S/A adquiriu o controle da quase falida Rede Energia por apenas 1 real. O povo paraense está reclamando muito da privatização da energia, porque o preço mensal da energia está sendo muito caro e falta energia com muita frequência. Nas vilas rurais todo o dia falta energia muitas vezes. Sem energia, o povo fica sem água, porque se precisa de energia para bombear a água de poços artesianos, queimam-se com frequência os eletrodomésticos, não há como ligar ventiladores para amenizar o calor e as pessoas com diabete ou diálise ficam sem poder ser medicadas. Quem pode se vira comprando gerador próprio com motor movido à gasolina, o que consome os poucos recursos econômicos que as famílias têm. Eis outra injustiça que se abate sobre o povo paraense. Energia é bem comum e é injusto reduzi-la a mercadora para se lucrar na bolsa de valores.

Ficamos felizes ao chegar à Casa de Formação da Prelazia de Itaituba, ao lado da cidade, e passar por entre várias castanheiras centenárias imponentes. Degustamos castanha do Pará e várias outras delícias da culinária paraense, mas ao retornarmos da Missão, dia 31 de março, fomos tomados de um espanto profundo ao vermos que tinham sido derrubados cinco daquelas castanheiras que admiramos, cada uma com mais de 60 metros de altura , com troncos com mais de um metro de diâmetro. Quem cortou? Quem mandou cortar essas castanheiras? O IBAMA deu licença? Uma das árvores símbolo da Amazônia, as castanheiras são madeira de lei, há lei que proíbe cortes, mas ouvimos também de muitos ribeirinhos que o IBAMA e a Polícia Federal são implacáveis ​​com os ribeirinhos e condescendentes/cúmplices com grandes e poderosos desmatadores. Uma pessoa nos informou que este bairro aqui era uma mata de castanheiras. Foram todas derrubadas para construir o bairro. Estes troncos gigantes das castanheiras derrubadas serão vendidas e se transformarão em móveis de luxo não sabemos em qual capital do brasil ou do exterior.”

Na bacia do Rio Tapajós há Povos Indígenas, entre eles o Povo Mundurucu com mais de 13 mil parentes que resistem e estão lutando vários pela demarcação de seu território. Igrejas evangélicas e (neo)pentecostais estão se espalhando no meio dos povos indígenas e das comunidades ribeirinhas e nas cidades também, muitas delas desrespeitando as culturas dos povos originários e solupando lutas coletivas pelos direitos dos povos.

Enfim, a Amazônia, os Povos Amazônicos e todos os seres vivos da Amazônia estão clamando por cuidado, respeito e solidariedade. Preservar a Amazônia e o que ainda resta de todos os biomas e ecossistemas se tornou uma questão de sobrevivência para a humanidade. Os clamores são ensurdecedores. Feliz quem os ouviu e se compromete com a superação do capitalismo, máquina bárbara de mais vidas, e do agronegócio, com suas monoculturas e mineração, que estão causando brutais sextas-feiras de paixão em plena terceira década do século XXI!

03/04/2024

Obs .: As videorreportagens nos links, abaixo, verso sobre o assunto tratado, acima.

1 – Leonardo Boff na Palavra Ética da TVC/BH, com frei Gilvander: Sínodo da Amazônia. 23/11/2019

https://www.youtube.com/watch?v=AXnHmvGduQ4

 

 

 

 

 

2 – “Lavando os pés uns dos outros e beijando os pés do próximo.” – Comunidade Ribeirinha de Barreiras, no município de Itaituba, no Pará – 28/03/2024

https://www.youtube.com/watch?v=dezisC2YUVA

3 – Os Ladrões e Poluidores das Água – Vídeo produzido pela FASE – Solidariedade e Educação – Março/2024

https://www.youtube.com/watch?v=WgttwkaH6tQ

4 – Realidade/desafios das CEBs do Oeste e Amazônia no XV Intereclesial das CEBs, Rondonópolis/MG. Víd11

https://www.youtube.com/watch?v=eDlFAkMDzDY

5 – Amazônia. O Resgate dos Yanomani, com a urbanista Regina Fittipaldi

https://www.youtube.com/watch?v=e3jwrYDiwDY

6 – Estudo: Em três décadas a Amazônia perde o equivalente aos estados de SC, PR, SP, RJ e ES/JN/02-7-2020

https://www.youtube.com/watch?v=4o7F5Tsua0w

7 – Desmatamento na Amazônia é o maior dos últimos dez anos – JN – 19/01/2021

https://www.youtube.com/watch?v=xYZ9x_IXIBg

 

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. Autor de livros e artigos. E “cineasta amador” (videotuber) com mais de 6.000 vídeos de luta por direitos no youtube, canal “Frei Gilvander luta pela terra e por direitos”. E-mail:  gilvanderlm@gmail.com  –  www.gilvander.org.br  –  www.freigilvander.blogspot.com.br       –        www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

Em Cuba o Socialismo democrático segue brilhando

Em Cuba o Socialismo democrático segue brilhando. Por frei Gilvander Moreira[1]

Em Havana, capital de Cuba, na Fortaleza de San Carlos de La Cabaña, de 15 a 25 de fevereiro de 2024, aconteceu a 32ª Feira Internacional do Livro de Havana, a maior Feira de Livro do mundo, que é realizada há 32 anos, anualmente. A Fortaleza de San Carlos de La Cabaña foi construída no século XVIII como uma das fortalezas que defendiam a cidade de Havana contra ataques inimigos e saques piratas. La Cabaña foi declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO[2], juntamente com a cidade velha de Havana, em 1982, ano em que foi realizada a primeira Feira Internacional do Livro de Havana.

O Brasil foi o país convidado de honra desta 32ª Feira. Com organização da Embaixada do Brasil em Cuba e do Ministério da Cultura, sob a liderança da ministra Margareth Menezes, na delegação brasileira estavam mais de 65 escritores, artistas e intelectuais, entre os quais Conceição Evaristo, Frei Betto, Emicida, Aylton Krenak. Tive a alegria de ir com algumas pessoas de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo que realizaram o sonho de conhecer e conviver um pouco com muitas pessoas cubanas, em Cuba. Eu tinha estado em Cuba em dezembro de 2006, ocasião em que pude conviver com muitas pessoas cubanas em Havana e escrever o artigo CUBA: os desafios de um grande povo “ilhado”.[3] Digo ilhado entre aspas, porque o bloqueio que o império estadunidense continua impondo a Cuba há mais de 60 anos é brutal, pois tudo que o Povo Cubano precisa importar demora chegar a Cuba e custa de quatro a seis vezes mais caro. Se não fosse o bloqueio, Cuba seria hoje um dos países mais desenvolvidos economicamente do mundo, pois tem um povo guerreiro e muito preparado sob todos os aspectos.

Após os dez dias da Feira do Livro em Havana, a Feira do Livro acontece ao longo do ano nas 15 Províncias (estados) de Cuba, nas escolas, universidades, hospitais, penitenciárias. Em 2024, a 32ª Feira teve a participação de 45 países e apresentação de mais de mil novos títulos de livros. Cerca de três milhões de livros foram doados ou vendidos em preços variados e muitos podem ser baixados gratuitamente em pdf[4]. Com o tema Ler é construir identidade, a Feira Internacional do Livro de Havana promove a leitura como uma das principais atividades para a formação da consciência individual e coletiva e do pensamento crítico autêntico.

Foi encantador e inesquecível ver a multidão de jovens que participou ativamente da 32ª Feira Internacional do Livro de Havana. Ver e ouvir escritores, tais como Conceição Evaristo, Emicida, nos leva a dialogar com o mais profundo do nosso ser e nos inspira a sermos melhores como humanos, pois diante da brutal Emergência Climática com eventos extremos cada vez mais frequentes e letais, embora haja tempo para muita coisa, só não há tempo a perder para superarmos a barbárie que é o capitalismo e construirmos uma sociedade socialista, democrática, com sustentabilidade ambiental e respeito à imensa pluralidade cultural.

Pela literatura e por todas as artes, encontramos e convivemos com nossos ancestrais e com pessoas de outros tempos, tal como José Martí, nascido em Havana e considerado o Apóstolo da Pátria em Cuba, esteve nas celas de La Cabaña em sua juventude como prisioneiro político por sua atividade revolucionária. Martí foi um dos maiores poetas e escritores da cultura hispânica, precursor da Revolução Cubana. Seu compromisso político permeou toda a sua obra. Em 1891, José Martí escreveu que “as trincheiras de ideias valem mais do que as trincheiras de pedra” e “o conhecimento liberta”. A ignorância e a cegueira impostas pela ideologia dominante escravizam e matam, muitas vezes usando e abusando do nome de Deus e de textos sagrados. Por exemplo, o absurdo que é crentes e (neo)pentecostais apoiarem o Estado de Israel genocida, por estar dizimando o Povo Palestino há mais de 76 anos com requintes de crueldade, porque imaginam que judeu é cristão e crê em Jesus Cristo. Ledo engano! Salvo raras exceções, os judeus não acreditam em Jesus Cristo como Filho de Deus. A Bíblia dos judeus não tem o Novo Testamento Cristão, pois não acreditam que Jesus Cristo seja o Messias, enviado de Deus. Os judeus não têm um “Novo Testamento”, têm a Mishná, que são comentários de rabinos que ajudam na interpretação dos textos do Antigo Testamento.

Além de participar da 32ª Feira do Livro em Havana, tivemos tempo para conviver com pessoas cubanas encantadoras. Viajamos umas 17 horas de ônibus em Cuba, de Havana para Cienfuegos, Trinidad, Varadero…, ida e volta. Que maravilha ver com nossos próprios olhos que em Cuba não existe, ou quase não existe, engarrafamento de trânsito, não há rios poluídos, não há agrotóxicos na alimentação – a comida é produzida com adubação orgânica na linha da agroecologia e tem sabor de comida de verdade -, não há violência social, não há drogas, as praças são do povo e continuam sendo lugares de encontros e de boas conversas, sem medo de assaltos. Os jovens estão sempre carregando, com os seus livros, instrumentos musicais e/ou uniformes de esportes, demonstrando que têm acesso amplo à educação e, se quiserem, à música e ao esporte. Saúde, educação, cultura e esporte são prioridades nas políticas públicas.

Em todas as quadras de todos os bairros de Cuba existem funcionando os Comitês de Defesa da Revolução (CDRs)[5] que vigiam para que os imperialistas não minem o processo revolucionário socialista em curso, organizam mutirões de limpeza das áreas públicas e ações de apoio e solidariedade com as pessoas que precisam. Em Cuba existe de fato um Sistema Único de Saúde, o público. Lá não tem planos de saúde, pois não existem hospitais privados. Não há universidades privadas. A saúde e a educação do povo não são mercadorias, mas bens comuns que precisam ser cuidados com absoluta prioridade. O povo é culto, tem consciência histórica e de cabeça erguida afirma “Fidel somos todos nós, os 11 milhões de cubanos”. O comandante Fidel vive e viverá sempre no Povo Cubano inspirando e guiando na defesa da revolução socialista.

Em Cuba não tem a poluição visual do exagero de propaganda que há aqui no Brasil e nos outros países capitalistas. O patrimônio histórico e arquitetônico é muito rico e diversificado, pois há nas cidades cubanas muitos hospitais, cinemas, teatros, museus e obras de restauração de belíssimas ruínas e edificações únicas, prédios atribuídos aos estilos barrocos, neoclássicos, ecléticos, art déco e art Nouveau. Cuba possui importantes núcleos arquitetônicos e históricos considerados “Patrimônio da Humanidade” pela UNESCO. Em Cuba, o povo admira e respeita a bandeira cubana, os mártires da revolução cubana, Fidel, Che Guevara, Camilo Cienfuegos e a todos os homens e mulheres que doaram as suas vidas pela causa revolucionária. Todos os/as lutadores/as da história são reverenciados/as.

Pessoas contaminadas pela ideologia capitalista trombeteada aos quatro ventos pela mídia empresarial, propriedade de algumas famílias riquíssimas, caluniam e difamam o socialismo democrático vivenciado em Cuba, porque sabem que se o povo latino-americano e africano descobrirem as belezas, as verdades, a justiça e a ética do socialismo democrático praticado em Cuba, o capitalismo, máquina brutal de moer vidas, desabará como um gigante com pés de barro. Emicida iniciou sua fala em Havana, na 32ª Feira do Livro dizendo: “Muitos nos perguntam “por que ir a Cuba?”, mas a melhor pergunta é “por que não ir a Cuba?””

Voltei de Cuba com a certeza de que o império estadunidense está caindo e Cuba continuará sendo uma estrela cintilante apontando o caminho que a humanidade deve trilhar para impedirmos a “queda do céu”, na linguagem do xamã Yanomami Davi Kapenawa, e um Apocalipse, não querido pelo Deus da vida, mas que está sendo causado pela idolatria do mercado que é tocado a todo vapor pelas grandes mineradoras, pelos agronegociantes e capitalistas do capital especulativo que não enxergam nem um dedo diante dos olhos, além do luxo e do poder que os deixam obcecados.

Enfim, o heroico povo cubano faz-nos acreditar que os ideais libertários, a utopia de emancipação da humanidade da opressão capitalista de exploração humana e da natureza, é possível de se realizar e necessária. Mesmo brutalmente bloqueada e perseguida pelo imperialismo estadunidense, Cuba nos inspira e alimenta esta certeza. “Até a vitória, sempre!”, como bradava Fidel e Che Guevara. E o povo revolucionário respondia em um só brado: “Venceremos!”

27/02/2024

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima. Em breve publicaremos no youtube, no canal “Frei Gilvander luta pela terra e por direitos”, muitos outros vídeos filmados em Cuba em fev./2024.

1 – Visita a Cuba: Havana e Capitólio por dentro. Fev./2024. Video 1 (Visita a Cuba: La Habana y el Capitolio desde dentro)

2 – Cuba: visita guiada ao belíssimo e suntuoso Capitólio, em Havana. Fev./2024. Video 2 (Cuba: visita guiada al hermoso y suntuoso Capitolio, en La Habana)

3 – Cuba: bloqueio, resistência e direitos sociais. Osvaldo Manuel Bosch entrevistado por frei Gilvander Luís Moreira, em Belo Horizonte, MG, Brasil. 20/09/2016.

4 – Tributo a Tilden Santiago: sua trajetória religiosa e na política – PT, embaixador do Brasil em Cuba

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. Autor de livros e artigos. E “cineasta amador” (videotuber) com mais de 6.000 vídeos de luta por direitos no youtube, canal “Frei Gilvander luta pela terra e por direitos”. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       www.twitter.com/gilvanderluis        –     Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

[3] https://gilvander.org.br/site/cuba-os-desafios-de-um-grande-povo-ilhado-por-frei-gilvander/

[4] Veja www.filcuba.cu

[5] Visitamos um CDR na cidade de Trinidad, que é Patrimônio Histórico da Humanidade, e também o Museu dos Comitês de Defesa da Revolução, em Havana.

Por pouco, nova ditadura, mas Ditadura Nunca Mais!

Por pouco, nova ditadura, mas Ditadura Nunca Mais! Por Gilvander Moreira[1]

Dia 08 de janeiro de 2024 aconteceram em várias capitais de estados do Brasil Atos Públicos em defesa da Democracia que, como flor sem defesa, precisa ser cuidada e construída cotidianamente, pois os arroubos tirânicos de extrema-direita continuam rondando. Em Minas Gerais, o Ministério Público realizou o Ato “8 de janeiro Nunca Mais”, um tributo ao Regime Democrático, caracterizando a tentativa de golpe ocorrida em Brasília dia 8 de janeiro de 2023 como “atos abomináveis, inaceitáveis e que devem ser punidos exemplarmente”. Em Brasília, no Congresso Nacional, aconteceu o Ato “Democracia Inabalada”, ato de reafirmação e celebração da Democracia brasileira, marcando um ano do fatídico dia da infâmia e da cólera: tentativa de golpe frustrado planejado pelo bolsonarismo, a extrema-direita inconformada com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para presidente do Brasil pela terceira vez.

É necessário recordar para manter na memória, para não esquecer e julgar, e para que não se repita. Na tarde de 8 de janeiro de 2023, a Praça dos Três Poderes em Brasília foi invadida por uma multidão ensandecida, com a cumplicidade da Polícia Militar do Distrito Federal que “escoltou a turba golpista”, deixando de cumprir sua missão constitucional de proteger a Praça dos Três Poderes e seus Prédios de ataques de vândalos. Arruaça e quebra-quebra no Congresso Nacional, no Palácio do Planalto e no Supremo Tribunal Federal (STF) foi o que o povo viu atônito, parte ao vivo por TVs e via internet.  Vidraças, poltronas, portas, obras de arte foram quebradas… Um rastro de destruição… Abjetos atos golpistas. Para além das depredações e dos prejuízos causados ao Patrimônio Público, a turba invasora afrontou e desrespeitou a vontade popular, pois rejeitou o resultado das eleições feitas por urnas eletrônicas comprovadamente seguras.

Entretanto, o presidente Lula, bem assessorado pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, e outros/as, não caiu na armadilha de decretar GLO, que é Garantia da Lei e da Ordem, remédio extremo que daria muitos poderes para os generais das Forças Armadas. Perspicaz, Lula decretou Intervenção na Segurança Pública do Distrito Federal que, sob o comando de Ricardo Cappelli, conseguiu controlar e asfixiar a tentativa de golpe ao entardecer de um dos mais tristes dias da história do Brasil, o 8 de janeiro de 2023, e encaminhar no dia seguinte a prisão de mais de 1.400 golpistas que estavam acampados em “incubadoras” golpistas ao lado do Quartel do Exército em Brasília. As instituições democráticas reagiram e impediu-se que a barbárie ocorrida em Brasília virasse um fogo incontrolável.

Os atos de barbárie que tiveram seu cume em 8 de janeiro de 2023, em Brasília, tratam-se do ápice do desdobramento de um processo golpista militar, empresarial e midiático iniciado em 2016, que retirou do poder a presidente eleita Dilma Rousseff, sem que ela tivesse cometido crime de responsabilidade, e instalaram um desgoverno de usurpadores e golpistas. O dia 8 de janeiro de 2023 aconteceu, porque foi permitido pelo STF e Ministério Público Federal o golpe de 2016, em seguida, a prisão sem provas de Lula para permitir a eleição em 2018 do Inominável. A elite brasileira, a grande imprensa e os chefes de igrejas (neo)pentecostais foram os arautos do plano macabro para colocar na presidência em 2018 um fascista de extrema-direita que, em quatro anos de desgoverno, deixou um rastro de destruição sob todos os aspectos.

Nos pronunciamentos e nas ações das autoridades do Governo Federal, do STF e Senado Federal ficou evidenciado que: os discursos de ódio e de intolerância foram o combustível para os atos golpistas; os golpistas não passaram e nunca passarão; todos/as que participaram dos atos golpistas diretamente, ou financiando, ou estimulando, ou sendo mentores intelectuais devem ser levado às barras do STF, julgados e condenados. Prisão, já, para quem participou, pagou, planejou e financiou!  “Sem anistia!”, eis o grito de luta do povo brasileiro que sabe o valor da democracia.

O presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso afirmou: “8 de janeiro de 2023 não foi um ato isolado, foi o cume de processo golpista planejado, organizado e fomentado por discursos negacionistas, de ódio e de intolerância. Funcionários do STF relataram que após marretadas no Plenário do Supremo, muitos invasores se ajoelharam e rezaram com as mãos para o céu. Que desencontro espiritual é este?” De fato, estamos colhendo a tempestade semeada por 34 anos de pontificado de João Paulo II e Bento XVI que semearam movimentos espiritualistas, fundamentalistas e moralistas como se fosse o jeito cristão de ser e agir. A mercantilização da fé cristã por pretensos “pastores, bispos e apóstolos” que usam a fé do povo simples, abusam do nome de Deus para juntar dinheiro e, assim, em vez de ser cuidado como rebanho sofrido que acorre às igrejas com espadas de dores transpassando seus corações, esse povo é tosquiado por falsos pastores e falsos sacerdotes. Os políticos profissionais, os mais asquerosos, sabendo que ao longo da história passar-se por pessoa religiosa rende muito voto, aproveitaram do espiritualismo moralista construído no meio do povo religioso pelas “igrejas eletrônicas” e apresentaram o lema, isca sedutora, ao dizer “Brasil acima de tudo! Deus acima de todos! Deus, Pátria e Família”. Esse foi o lema de quase todos os ditadores e tiranos da história: Mussolini e Hitler, por exemplo. Falam em Deus, mas são idólatras; falam em Pátria, mas a destroem e falam em Família, mas massacram as famílias com políticas de morte.

É evidente que é necessário e urgente regulamentar as redes sociais/virtuais, a internet e as big techs como fez ultimamente a Europa, a Austrália e o Canadá. Não dá para continuar mais a internet como “terra sem lei”. O Congresso Nacional ainda não regulamentou com sensatez a internet, porque está composto por uma maioria de centro, direita e de extrema-direita, a quem interessa deixar a porta aberta para a avalanche de fake news, de negacionismo e discursos que solapam as instituições democráticas.

A democracia exige vigilância constante e permanente, mas não pode ser reduzida a democracia formal e burguesa. Só votar é muito pouco, pior ainda sob a agressão de fake news e do poder econômico que compra voto de forma deslavada. A democracia verdadeira é um processo que se constrói com lutas permanentes por direitos humanos, sociais, trabalhistas, ambientais, previdenciários, direitos da natureza etc.

Só pode existir liberdade para as pessoas na democracia. Liberdade não é fazer o que quiser. Liberdade pessoal exige responsabilidade social, ambiental e geracional. Liberdade de expressão está garantida pela Constituição de 1988, mas liberdade de expressão não inclui autorização para se cometer crimes.

Todos os/as golpistas estão sendo julgados e, independente da condição social, se é civil ou militar, pobre ou empresário, político ou não, todos precisam ser responsabilizados dentro do devido processo legal, por questão de justiça e também para que a impunidade não estimule outras aventuras golpistas. Anistia será antessala de novas investidas golpistas. Por isso, SEM ANISTIA! Apaziguamento é inaceitável, pois implica fazer de conta que não aconteceram crimes brutais e pôr esparadrapo sobre ferida que precisa ser curada com justiça e jamais com anistia.

No Brasil o que existe não é apenas ‘polarização’, palavra do discurso pós-moderno que esconde a contradição existente em uma sociedade capitalista, onde a classe dominante segue insistindo em superexplorar a maioria do povo que integra a classe trabalhadora e camponesa.

Com união e mobilização o povo brasileiro e as instituições selaram um pacto de rotundo “Não ao fascismo”. Mas as ameaças continuam rodando. Se a tentativa de golpe tivesse sido vitoriosa, a “caça às bruxas”, a quem luta por direitos humanos, sociais e ambientais, estaria a todo vapor prendendo, torturando e matando de mil formas; a Amazônia seria reduzida em chamas em poucos anos, como vinha sendo devastada com a cumplicidade e incentivo do desgoverno federal do inominável. “A boiada continuaria passando”. O Brasil continuaria sendo pária no mundo e sendo dilapidado em seus bens naturais e humanos.

Apesar dessa vitória da democracia, reiteramos que não podemos nos contentar com apenas democracia formal e representativa. Temos que seguir lutando coletivamente por democracia plena, o que acontecerá quando implementarmos reforma agrária popular, reforma urbana, preservação ambiental, direitos humanos, direitos trabalhistas, direitos previdenciários, direitos das próximas gerações, direito da natureza, superação da idolatria do mercado, demarcação dos territórios dos Povos Indígenas e Tradicionais…, o que só será possível em uma sociedade socialista, para além do capitalismo, sistema que na fase atual gera fascismo e políticos de extrema-direita.

10/1/2024

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Ato Interreligioso em BH/MG em defesa da democracia, da vida, pela paz e contra golpistas/opressores

2 – Não às reformas dos golpistas: Lestão das CEBs, Volta Redonda/RJ, 21-23/4/17. 4a parte

3 – Contra o golpe de Estado, marcha e bloqueio da Linha Verde em BH pelas ocupações urbanas. 28/04/16

4 – Em Belo Horizonte, MG, 80.000 pessoas na luta contra o golpe: o que a Rede gLOBO esconde. 19/03/16

5 – Povo na luta em Belo Horizonte contra Golpe, por direitos e em defesa da democracia, dia 20/08/15

6 – Votar em Projeto de Vida ou de Morte? Na Democracia ou no fascismo?- Por frei Gilvander – 26/10/2022

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       www.twitter.com/gilvanderluis        –     Facebook: Gilvander Moreira III

Assentamento de Capim de Cheiro: 50 anos de lutas, resistências e conquistas

Assim como sói acontecer em relação a outros anos, também 2023 tem concentrado uma gama de efemérides relevantes. Por exemplo, no plano eclesial, não devemos esquecer a celebração, em 1º de maio, de 50 anos do manifesto  intitulado “Eu ouvi os clamores do meu povo”, firmado por 11 Bispos do Nordeste (Dom Hélder Câmara, Dom Antônio Batista Fragoso, Dom José Maria Pires, Dom Francisco Austregésilo Mesquita, Dom Severino Mariano de Aguiar, entre outros) e 8 superiores religiosos da mesma região. Sobre ele, já tivemos oportunidade de rememorar seus traços mais fortes. (Cf. https://textosdealdercalado.blogspot.com/2016/07/eu-ouvi-os-clamores-do-meu-povo-um.html).

 

Nas linhas que seguem, nos limitamos a ressoar aspectos que me pareceram mais relevantes da comemoração de 50 anos das lutas, resistência e conquista da comunidade do Assentamento Capim de Cheiro, no município de Caaporã-PB, realizada no dia 18 próximo passado.Uma das animadoras de referência, Tânia Souza, da Coordenação da CPT, da Arquidiocese da Paraíba, acompanhada da Ir. Verônica (das Irmãs Doroteias), logo cedo pela manhã me ofereceu carona para a comemoração, ao lado de Luiz Sena e Pe. Jean.

 

Ao chegarmos ao Assentamento de Capim de Cheiro, já encontramos montada a estrutura de organização deste dia memorável: uma tenda coberta, cadeiras em linha, brinquedos para crianças, música tocando e diversas pessoas a nos acolherem, alegremente. Enquanto nos sentamos, a conversar com animação, pessoas da equipe local nos convidaram para tomar um café.

 

Por volta das 10 horas, o pessoal da Coordenação do Assentamento – nas pessoas de  Iolanda e  Luis Augusto – deu início à comemoração. Luis Augusto deu as boas-vindas, como membro da Coordenação, anunciando a programação do dia , bem como seus objetivos. Iolanda, por sua vez, convidou Pe. Jean o Presbítero Teofanes e mais duas outras pessoas a tomarem assento à mesa, em frente ao público.

 

Em seguida, retornando a palavra ao Pe. Jean, este deu início ao primeiro momento daquela comemoração: O momento orante, fazendo questão de lembrar que não se tratava nem de uma Missa nem de um Culto, mas de um breve exercício de espiritualidade. Tratou, então, de convidar o Presbítero Teofanes para conduzir uma reflexão sobre aquele momento. Ele, em sua reflexão, inspirou-se inicialmente no Salmo 24. Em seguida, convidando a Equipe de animação a entoar, junto com a comunidade, um canto de louvor antes da leitura do Evangelho, leitura extraída de Lucas 6, 20-26, acerca das bem-aventuranças e das maldições. Convidou o Diácono Alder Júlio a uma breve reflexão sobre a leitura recém-proclamada.

 

A seguir, Iolanda convida João Muniz a cantar o hino da Comunidade, tendo-se acompanhado pela Banda da CPT bem como um cordel preparado por ele, narrando a história dos 50 anos de lutas e resistência daquela comunidade. Foi, então, convidado Gabriel, filho da primeira geração de protagonistas – homens e mulheres – de Capim de Cheiro, a dar seu testemunho desta memória histórica.

 

Gabriel cuidou de recordar o contexto histórico das primeiras lutas travadas pela comunidade. Tratava-se de famílias de agricultores exploradas pelos proprietários de um extenso canavial, cujo território alcançava o Estado vizinho de Pernambuco. Gabriel rememora momentos de conflitos agudos enfrentados por aquelas famílias, fazendo questão de destacar o protagonismo de pessoas como Manoel, “Munguba” , Dona Lourdes entre tantos outros, fazendo questão de destacar a convivência fraterna de pessoas de diferentes religiões (Católicos, protestantes, espíritas, pessoas sem confissão religiosa). Lembra que ainda era criança, quando seu pai, já cansado pela idade, não desistia da luta, mesmo quando Gabriel teve que ir ganhar a vida  em São Paulo. Por insistência do pai, retorna a Capim de Cheiro, com a sua esposa Maria do Carmo, e desde então, se juntaram de novo naquela resistência que culminaria com a conquista da Terra há 30 anos atrás.

 

Ao mesmo tempo, fez questão de sublinhar a contribuição profética que várias pessoas da Arquidiocese da Paraíba, há começar por Dom José Maria Pires, bem como de figuras corajosas como a Irmã Tonny, Irmã Marlene, Frei Hermano José, Frei Anastácio, Tânia, Genaro, Wanderley Caixe, entre tantas outras pessoas.

 

Passou, então, a convidar as pessoas presentes a rezarem a oração universal do Pai Nosso. Dando prosseguimento, Pe.Jean, sempre lembrando a presença e a contribuição decisivas das mulheres daquela Comunidade, desde as origens e de suas resistências convidou os participantes a fazerem seu ofertório, solicitando às mulheres para abençoarem o pão produzido pela Comunidade, que foi por todos partilhado.

Chegou o momento em que Pe. Jean solicita que a sra Maria do Carmo trouxesse seu filhinho bebe, para, sob a canção “Feliz Natal”, dar a bênção final.

 

Encerradas as atividades da manhã, todos foram convidados a saborear uma deliciosa feijoada comunitariamente preparada e partilhada.

 

Após o almoço, a Coordenação convidou todos a tomarem assento na sede  da Associação, para assistirem a um curto documentário registrando  relatos sobre a trajetória de lutas, conquistas e resistências do assentamento Capim de Cheiro. De volta à tenda todos puderam acompanhar as apresentações previstas para a parte da tarde.

 

O sentimento principal de aí vivenciamos foi o da importância de fazer memória dos relevantes acontecimentos protagonizados por mulheres e homens daquela Comunidade apoiados pela CPT e outros parceiros e aliados.

 

João Pessoa, 23 de Dezembro de 2023.

Fonte: https://textosdealdercalado.blogspot.com/2023/12/assentamento-de-capim-de-cheiro-50-anos.html

Se não reduzir a mineração no quadrilátero aquífero, BH e RMBH ficarão sem água

Se não reduzir a mineração no quadrilátero aquífero, BH e RMBH ficarão sem água – Por frei Gilvander Moreira[1]

Com o avanço brutal da mineração no Quadrilátero Aquífero e Ferrífero de Belo Horizonte (BH) e Região Metropolitana (RMBH), se a mineração não for reduzida para o mínimo necessário, os quase 6 milhões de pessoas de BH e RMBH ficarão sem água, sem agricultura famíliar, sem ambiente, enfim, sem condições objetivas de vida, será a desertificação da região. Só não percebe isto quem está cegado pela ideologia da mineriodependência, do progressismo e pela idolatria do mercado, ou é de má-fé ou egocêntrico, está ganhando dinheiro fazendo funcionar a máquina de guerra da mineração que gera acumulação de capital para 1% da sociedade e miséria e violência socioambiental para 99% do povo e toda a biodiversidade. Os sinais e as provas são inúmeros. Não há só fumaça, mas fogo mesmo. Vamos mencionar alguns abaixo.

Assim como a cidade de Itabira, em Minas Gerais, após mais de 80 anos de mineração devastadora, está praticamente dentro de crateras da mineradora Vale S/A e ostentando o triste título de uma das cidades do Brasil com maior número de suicídio e de pessoas com depressão – “Itabira, apenas um quadro na parede”, denunciava o poeta Drummond -, as 34 cidades da RMBH, em visão panorâmica aérea, parecem estar cada vez mais encurraladas por crateras de mineração com danos socioambientais brutais. Pior: está aumentando de forma estarrecedora o número de novos projetos de mineração na RMBH. São dezenas. Em BH, se não fosse a luta hercúlea do Quilombo Manzo e de muitos movimentos socioambientais, a situação seria bem mais grave, pois as mineradoras insistem em liquidar com o pouco de Serra do Curral que ainda resiste.

As 17 audiências do Plano de Desenvolvimento Integrado da RMBH (PDDI-RMBH), em agosto de 2023, demonstraram que as 34 cidades da RMBH estão em acelerado processo de conurbação, ou seja, é exorbitante o número de novos loteamentos e a expansão da maioria das cidades da RMBH. As áreas rurais estão sendo ocupadas por novos bairros, loteamentos e ocupações irregulares. Foi denunciado com ênfase que a causa maior da escassez hídrica e da desigualdade em BH e RMBH se deve à hegemonia das mineradoras que estão causando brutais devastações socioambientais e impondo a mineriodependência de forma atroz. O povo de Brumadinho está adoecido. A Fiocruz comprovou a existência de metais pesados no sangue de muita gente de Brumadinho. O número de suicídio está crescendo.

O projeto do desgovernador de Minas Gerais, Romeu Zema, de construir um “Rodoanel” na RMBH é inadmissível, porque será na prática um rodominério, ou seja, infraestrutura para as mineradoras continuarem expandindo a mineração na RMBH, o que é insuportável. Em nome dos direitos da natureza e dos direitos das próximas gerações, ético se faz implementar mineração zero em BH e RMBH, mas o Governo de MG, sob os ditames da extrema direita e vassalo do neocolonialismo capitalista, segue em conluio com as grandes mineradoras e as grandes empresas asfixiando as condições de vida de quase 6 milhões de habitantes e de bilhões  de seres vivos que têm direito de viver na RMBH. A toque de caixa, a SUPRI[2] e a Câmara de Atividades Minerária do COPAM[3], como uma casa de horrores, aprova todos os grandes projetos de mineração ao arrepio dos estudos imparciais que demonstram que serão brutalmente danosos ao ambiente e à sociedade.

No último dia 19 de outubro (de 2023), aconteceu na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na Comissão de Meio Ambiente, a 2ª Audiência Pública buscando garantir a preservação da Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito, MG, e reivindicando o arquivamento do Projeto de Lei 387/23, que visa mudar o perímetro da Estação Ecológica de Aredes para que a mineradora Minar volte a minerar no coração da Estação Ecológica de AREDES. Reivindicamos que a Comissão de Meio Ambiente dê parecer pró-arquivamento do PL 387. Em um país com relações sociais injustas, o simples fato de requentar este famigerado PL pela 3ª vez nas três últimas legislaturas, seria o suficiente para indiciar como criminosos os que defendem este crime planejado e anunciado.

Os donos da mineradora Minar e seu séquito de “técnicos” preferiram não participar da 2ª Audiência Pública, certamente porque na 1ª Audiência Pública e na Visita Técnica na Estação Ecológica de Aredes passaram vexame e vergonha ao terem todos seus pretensos argumentos desmascarados como infundados e propaganda mentirosa. Não foram trazidas também as pessoas manipuladas que lotaram um ônibus da 1ª vez, pago por adeptos da mineradora Minar, sem saber o que fariam na ALMG, vieram apenas para receber salário de uma pessoa escravizada por dia, para marcar presença e vaiar quem defendia AREDES. Triste ver pessoas vulneráveis sendo usadas por exploradores que vendem a propaganda de que “mineração traz emprego e desenvolvimento”. Mentira! Quando uma mineradora emprega alguém desemprega em massa, pois asfixia outros modelos de economia e gera a danosa mineriodependência.

Na 2ª Audiência Pública vieram representantes da SEMAD[4], do IEPHA[5] e um diretor de Parques responsável por cuidar de AREDES. Não disseram coisa com coisa, se esquivaram de se posicionar sobre o PL 387 que, se aprovado, devastará a Estação Ecológica de AREDES, mas com evasivas deram a entender que o posicionamento do desgoverno de MG é pró-PL 387, o que significa o governo de MG de joelhos diante do lobby para minerar e devastar AREDES. Prova disso é que o autor do PL 387/23 é o deputado João Magalhães (do MDB), líder do Zema na ALMG.

Estarrecedor é que o PL 387 já tenha sido aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da ALMG com apenas arremedo de estudos feitos pela própria mineradora Minar, que contratou consultores sem conteúdo, que não conhecem o contexto ambiental, hídrico e patrimonial de Aredes. Como uma serpente e em silêncio, os ‘representantes’ da mineradora MINAR mudaram agora a estratégia, mas continuam a fazer lobby junto às Comissões da ALMG e junto à SEMAD do Governo Zema, haja vista o comportamento dos representantes do Estado (SEMAD, IEF e IEPHA) que foram de corpo presente à Audiência Pública, mas devem ter sido adestrados para não falar nada contra o famigerado PL, tendo em vista o aparelhamento da atual gestão do Governo de Minas Gerais com os interesses da mineração e do capital. Vergonhoso o despreparo técnico dos representantes do governo estadual que ali compareceram. O Ministério Público de Minas Gerais já expediu Recomendação advogando o arquivamento do PL 387 por ser profundamente danoso aos interesses da Estação Ecológica de Aredes e sem consistência técnica alguma, confirmando as denúncias da população e a Nota Técnica realizada pelos pesquisadores que atuam na região e entregue para as deputadas estaduais Bella Gonçalves (PSOL) e Beatriz Cerqueira (PT).

A Estação Ecológica de Aredes foi criada em 2010 por causa da luta justa para se salvar um pouco dos brutais danos que a própria mineradora Minar tinha causada em Aredes. Foi preciso uma Ação Civil Pública para exigir que se salvasse AREDES, porque a mineradora Minar tinha deixado três crateras e até hoje ainda tem passivo (danos) ambiental produzido por ela em Aredes. Ou seja, a Minar cometeu muitas infrações e irregularidades, violentou Aredes, de forma impiedosa. Não tem nenhuma moral para tentar voltar a praticar mais crimes em AREDES. Absurdo também é o fato do “PL 387” para minerar em Aredes, arquivado nas últimas duas legislaturas, estar sendo requentado pela 3ª vez.

São muitos os “capitães do mato” que defendem e fazem lobby pela aprovação do PL 387/23 na ALMG para a mineradora Minar voltar a cometer outros crimes socioambientais, históricos, arqueológicos e culturais na Estação Ecológica de Aredes, mas eles evitam mostrar a cara, pois é motivo de grande vergonha defender uma atrocidade como esta. Eis algumas, abaixo.

O município de Itabirito vem sendo sacrificado pela mineração há mais de 300 anos; primeiro, mineração de ouro, e nas últimas décadas, de ferro. Com altitude de 1.586 metros, o Pico Itabirito, com tombamento estadual e definido como Patrimônio Natural, segundo a Constituição de Minas Gerais, desde 1989, está há várias décadas como “Jesus na Cruz”, dilacerado, com todo o seu entorno carcomido, sua base e com seus pés roídos pela mineração que não respeita nada. Pico do Itabirito, crucificado pelas mineradoras, está exposto em uma sexta-feira da paixão sem fim que as mineradoras com o apoio do Estado vem impondo diariamente.

Nos últimos anos, a mineradora Vale fez uma “muralha da China” em Itabirito para conter o tsunami de rejeitos minerários das barragens de Forquilha I, II, III, IV e V, a 11 Km de distância no vizinho município de Ouro Preto. Trata-se de uma muralha de concreto compactado que, segundo a Vale S/A, custou 1,2 bilhão de reais, com mais 350 metros de extensão de uma montanha a outra, com 30 metros de espessura e 94 metros de altura. Esta megaobra já impactou o singelo São Gonçalo do Bação e sua população.

Aredes é um extraordinário sítio arqueológico, onde existiu a Fazenda Aredes, marco zero do povoamento no munícipio de Itabirito, com testemunhos arqueológicos exuberantes, conforme muito bem demonstrado em uma robusta obra literária organizada pela pesquisadora Alenice Baeta intitulado: “Aredes – Recuperação Ambiental e Valorização de um Sítio Histórico e Arqueológico, publicada em 2016.

A mineradora Minar insiste em minerar mais uma montanha em Aredes de campos ferruginosos e de vegetação rupestre com espécies endêmicas, ou seja, que só existem ali e em mais nenhum lugar do mundo. Estes campos rupestres de Aredes irrigam os Córregos Silva e Aredes, que se tornam o Córrego Mata-Porcos que, ao desaguar no rio Itabirito, lhe acrescenta 40% de água de classe especial, o que garante o abastecimento público da cidade de Itabirito. E o rio Itabirito, ao se encontrar com o rio das Velhas, tem praticamente o tamanho e o volume de água do rio das Velhas, que, na capitação de Bela Fama, em Nova Lima, oferece cerca de 50% do abastecimento público de BH e RMBH. Ou seja, minerar mais em Aredes irá secar os córregos Silva e Aredes, o que inviabilizará o abastecimento público das cidades de Itabirito, BH e RMBH.

Além da Mineradora Minar, em Itabirito, há outros quatro brutais projetos de mineração insistindo para cravar suas garras nas poucas montanhas que resistem: a) Em São Gonçalo do Bação estão insistindo em construir mais um Terminal de carregamento de minério de ferro, sinal de que, segundo o prefeito de Itabirito, “a mineradora Vale tem projetos para mais 150 anos de mineração na região”; b) Entre Aredes e  São Gonçalo do Bação está iniciando outro projeto de mineração na belíssima Serra do Lessa, que pretende explorar 110 milhões de metros cúbicos de minério por ano em uma montanha da localidade, por 40 anos, com cerca de 650 carretas por dia transitando, o que deixará uma cratera de 130 metros de profundidade; c) Tem também projeto minerário da Várzea do Lopes Leste, da Gerdau; d) E a empresa Monteminas Minérios, do projeto de mineração Água Brava ao lado da Serra do Lessa.  São Gonçalo do Bação está sendo circundado e sufocado por estas obras e minerações, sendo que se trata de um distrito munido de um vulnerável e rico conjunto arquitetônico, arqueológico e paisagístico composto por bens culturais variados, com clara vocação para o turismo cultural, artístico e ambiental de base comunitária.

Portanto, em respeito às próximas gerações, faz-se necessário arquivar o PL 387 na ALMG, nunca mais requentá-lo e reduzir muito a mineração na região do Quadrilátero Aquífero e Ferrífero de BH e RMBH. Eis o caminho para a vida saudável!

24/10/2023.

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Aprovar PL 387/23 na ALMG p mineradora Minar minerar dentro da Estação Ecológica será absurdo brutal

2 – Alenice Baeta: Aula Magna! Necessidade de preservar a Estação Ecológica de AREDES. Repúdio ao PL 387

3 – Jeanine: Preservemos a Estação Ecológica de AREDES e o Monumento Natural da Serra da Moeda, JÁ!

4 – Dep. Bella: “PL 387/23 não pode ser aprovado na ALMG. Preservemos a Estação Ecológica de AREDES, MG

5 – Dep. Beatriz: “E a posição da SEMAD e do ZEMA sobre a Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG?”

6 – Edton: Minerar na Estação Ecológica de AREDES, Itabirito/MG, vai deixar Itabirito, BH, RMBH sem água

7 – Luiz, do MAM: Zema em conluio c mineradoras. Preservar Estação Ecológica de AREDES p garantir água..

8 – Capitães do mato insistem em continuar escravizando povos/ambiente, agora tb. c PL 387/23 na ALMG

9 – Thomás Toledo: Prefeito e vereadores de Itabiritos/MG, cúmplices da mineriodependência. Viva AREDES!

10 – Frei Gilvander e Dep. Bella pedem arquivamento do PL 387 na ALMG, que visa minerar em AREDES, MG

11 – Mineradora Minar quer devastar AREDES, nascedouro de Itabirito/MG, com PL 387/23 que visa minerar

12 – Visita Técnica a AREDES conclui q PL 387/23 deve ser arquivado. Estação Ecológica em Itabirito/MG

13 – Minar diz q minerar em AREDES afetará ruínas e fontes d’água. Dep. Bella e frei Gilvander: arquive!

14 – Não há como minerar na Estação Ecológica de AREDES sem devastar sítio histórico e acabar com águas

15 – Se calarmos, montanhas gritarão! Minar deixa 3 crateras, passivo ambiental e invade AREDES c PLACA

16 – Crateras deixadas pela Minar foram convertidas ambientalmente: Estação Ecológica AREDES/Itabirito/MG

17 – Visita Técnica de deputados/a à Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG. Arquive o PL 387/23!

18 – Peça de Teatro sobre História de AREDES, Itabirito/MG: Arquive PL 387/23 que visa minerar em AREDES!

19 – Trabalho arqueológico na Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG: Arquive o PL 387/23 na ALMG!

20 – Exposição AREDES na Estação Ecológica de AREDES, Itabirito/MG: Arquive o PL 387/23, que visa minerar

21 – No interior de uma das ruínas da Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG: Arquive o PL 387/23!

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       www.twitter.com/gilvanderluis        –     Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Superintendência de Projetos Prioritários da Secretaria de Desenvolvimento Social e do Conselho de Política Ambiental do estado de Minas Gerais.

[3] Conselho de Política Ambiental do estado de Minas Gerais.

[4] Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do estado de Minas Gerais, responsável para avaliar os projetos de mineração.

[5] Instituto estadual do Patrimônio Histórico e Artístico do estado de Minas Gerais.

A justiça de Deus na luta pela Terra

XXVII Domingo Comum:  Mt 21, 33- 43.

A parábola da Justiça na luta da Terra

Neste domingo, o evangelho de Mateus 21, 33- 43 nos traz a história, comumente chamada de “parábola dos vinhateiros assassinos”. Possivelmente, a história teve várias versões e para compreendê-la, é importante tentar captar o núcleo primitivo da história que vem de Jesus.

Em 1981, época da ditadura militar, em São Geraldo do Araguaia, pequena cidade nas margens do rio, a polícia tinha prendido os dois padres franceses, Francisco Guriou e Aristides Camio e alguns lavradores. No final daquela tarde, as pessoas viram baixar do céu um helicóptero e dele sair o famoso Coronel Curió, figura conhecida pelo autoritarismo e violência a favor do latifúndio. Este mandou abrir a Igreja, tocar o sino e reunir a população. O coronel coordenou o culto. Leu essa parábola dos vinhateiros assassinos e interpretou: “Ao prender padres e lavradores, estamos cumprindo o que, nessa parábola, Jesus disse que é o modo de Deus agir. Ele está do lado dos proprietários e castiga lavradores que querem se apoderar da terra que Deus deu aos fazendeiros ricos”.

Evidentemente, qualquer pessoa de bom senso rejeita essa interpretação grosseira e fundamentalista da parábola. Conforme a exegese, o senhor dessa história não é um capitalista que mora na cidade e tem uma terra no campo. Conforme a parábola, ele trabalha pessoalmente na sua vinha. Ele mesmo a rodeia com uma cerca e constrói uma torre para protegê-la dos ladrões. É a mesma imagem usada em Isaías 5: “Meu amigo tinha uma vinha, ele mesmo a plantou, cercou com uma cerca”.

 

No primeiro testamento, a vinha era o povo de Israel. Jesus amplia a alegoria de Isaías e do salmo 80. Agora, a imagem da vinha não se refere mais apenas ao povo bíblico, mas ao reinado divino no mundo. A vinha de Deus é o projeto de um mundo organizado conforme o projeto divino da aliança de toda a humanidade, na base da paz e da justiça. Para Jesus, os dirigentes do templo que se centram no religioso seriam como os lavradores que mataram os enviados. O proprietário ama a vinha. Jeremias já havia dito: “Desde que os pais de vocês saíram do Egito até hoje, vos enviei os meus servos, os profetas. Mas, vocês não quiseram escutá-los”(Jr 7, 25- 26).

É certo que Jesus tirava suas parábolas de fatos ocorridos na época. A história contada na parábola retrata a situação social e econômica da época de Jesus. O país estava dividido em grandes latifúndios e os proprietários eram, em geral, estrangeiros ricos. Assim, era compreensível que os lavradores locais sentissem ódio e revolta contra os proprietários usurpadores da terra que Deus tinha dado para o seu povo. Pela legislação judaica antiga, se o proprietário da terra morresse ou desaparecesse e não tivesse herdeiros, a terra se tornava automática e legalmente propriedade dos que nela trabalham. Isso explica porque, na parábola contada por Jesus, os lavradores, pensando que o filho tinha herdado a terra (portanto, o pai tinha morrido), decidem matar o filho. Se o filho morresse, eles poderiam ficar legalmente como proprietários. Provavelmente, Jesus colheu essa história de um fato ocorrido na época. Ele parece ter contado essa história para mostrar que a violência não resolve os problemas da justiça. No entanto, a comunidade do evangelho de Mateus a retomou e fez dela uma alegoria sobre a responsabilidade que os chefes religiosos do Judaísmo tiveram na condenação que Jesus sofreu e na sua morte.

De acordo com o evangelho, os sacerdotes e religiosos do templo reagiram mal à parábola, porque se sentiram insultados e acusados até de assassinato. Essa história também nos incomoda, porque talvez ainda reagimos  à sua profecia, por demais crítica à religião e ao poder religioso.

De fato, Jesus parece generalizar. Não faz distinções entre religiosos bons e religiosos maus. Chama todos os sacerdotes e religiosos do templo de aproveitadores que tomam para si a vinha que é do Senhor. Acusa todos de serem responsáveis pela morte dos profetas, enviados/as de Deus. De um lado, isso é comum na linguagem dos profetas. Do outro, é claro que, quando queremos atualizar a parábola, precisamos compreender que Jesus visa denunciar um tipo de religião baseada no culto e na lei.

Imagine alguém afirmar  que todos os pastores que praticam Teologia da Prosperidade são ladrões e, ao menos, corresponsáveis pela miséria do povo oprimido. De fato, ao menos no Brasil, há muitos grupos religiosos, dioceses e paróquias católicas que mantêm um estilo de fé mais devocional, espiritualista e religioso. Em sua maioria, esses religiosos estão mais ligados à classe alta e média. Têm poucos contatos com os pobres.

Na parábola anterior, lida no domingo passado (Mt 21, 28 – 32), o evangelho nos dizia que a vinha é uma só: o projeto divino no mundo. Dizia que os dois filhos recebem do Pai o mesmo mandato: vão trabalhar na minha vinha. E a vinha do Pai é o mundo. É a vida e não a religião. Esta parábola de hoje acusa os religiosos de terem se apossado da vinha de Deus, como se fosse propriedade deles e não do Pai. O evangelho denuncia: eles provocam a morte do Cristo, não mais no seu corpo físico, mas no corpo social dos pobres e pequeninos. “O que fizestes a um desses pequeninos, foi a mim que fizestes” (Mt 25, 33…).

No Brasil, muitos/as religiosos/as sustentam uma Política responsável pela exploração de lavradores, extermínio dos povos indígenas, massacre da juventude negra nas periferias das cidades. Além disso, esse tipo de Política provoca a destruição da Amazônia e dos biomas em todo o Brasil. É fundamental libertar a fé cristã de uma sacralidade que legitima a indiferença social mascarada de religiosidade. Se os cultos não ajudam as pessoas a serem mais humanas e mais “famintas e sedentas de justiça”, não são evangélicos e sim farisaicos e hipócritas. Se, nas paróquias e dioceses, a eucaristia  é celebrada como se fosse manifestação de poder sacral e mantém estilo de cerimônia medieval nada têm a ver com a ceia que Jesus nos mandou fazer em sua memória. Novenas, terços e bênçãos do Santíssimo Sacramento com ostensórios dourados podem parecer espirituais, mas nada têm a ver com o evangelho do profeta Jesus de Nazaré que mandou seus discípulos cumprirem sua missão sem levar túnicas, nem bolsas e aonde chegarem, a única mensagem deveria ser a Paz que o reinado divino deve trazer. Ainda hoje, muitos ministros de Igreja fazem o que aqueles vinhateiros da parábola fizeram ao se apossar da vinha do Senhor. E Jesus conclui a parábola dizendo, não que a vinha será destruída, mas que será tirada desses maus administradores e será dada a outros que possam torná-la fecunda.

A vinha de Deus é o mundo e, portanto, os administradores novos aos quais Deus confia a sua vinha não é somente uma Igreja. É a humanidade renovada e crítica que trabalha por um mundo novo possível. Como cristãos e cristãs, somos chamados/a a colaborar com essa profecia que vai além das Igrejas, mas da qual nós devemos participar e incentivar.

Luta e Resistência Indígena na RMBH cresce e fortalece

Luta e Resistência Indígena na RMBH cresce e fortalece. Por frei Gilvander Moreira[1]

Retomada Terra Mãe, em Betim, MG, com algumas lideranças, jovens e crianças indígenas Warao. Setembro de 2023. Foto: Alenice Baeta, CEDEFES. 

Nos últimos anos, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) aconteceram seis Retomadas Indígenas: 1) Retomada Kamakã, em Esmeraldas; 2) Retomada Pataxó, em São Joaquim de Bicas; 3) Retomada Katurama, em São Joaquim de Bicas; 4) Retomada Kamakã Mongoió, em Brumadinho; 5) Retomada Xukuru-Kariri, em Brumadinho; e 6) Retomada Terra Mãe, do Povo Indígena Warao, de refugiados da Venezuela, que aconteceu no início de setembro de 2023, na cidade de Betim.

Na Retomada Terra Mãe, do Povo Warao, dezenas de famílias de parentes indígenas, além de outras etnias, com centenas de famílias sem-terra e sem-teto, ocuparam um grande terreno, mais de 100.000 metros quadrados (mais de dez hectares, o que equivale a mais de dez campos de futebol), propriedade que estava abandonada, ociosa, sendo espaço para depósito de lixo e entulho; propriedade que não cumpria sua função social em Betim, cidade com uma brutal desigualdade socioeconômica e com uma das maiores presenças de povos periferizados de toda a RMBH.

No terreno da Retomada Terra Mãe houve uma ocupação em 2011, que foi despejada com brutal pressão da polícia militar doze anos atrás. Na ocasião, o juiz da Vara Agrária de Minas Gerais mandou arquivar o processo, porque a parte autora não demonstrou interesse em continuar o processo. Diz-se que o terreno é espólio de herança. O fato é que estava abandonado muitas décadas antes de 2011, houve o despejo e o terreno continuou abandonado. Como a Constituição Federal de 1988 exige que toda propriedade cumpra sua função social, uma propriedade que não cumpre sua função social deixa de existir, como interpretam muitos juristas e constitucionalistas. Ou seja, a CF/88 não protege propriedade que não cumpre sua função social.

Sobre a Retomada Terra Mãe em meados de setembro agora (2023), um juiz de 1ª instância, da 1ª Vara Cível da Comarca de Betim, mandou reintegrar na posse quem não exercia a posse. Pior, com uma decisão que viola e desrespeita a decisão de nove ministros do Supremo Tribunal Federal que, no final da pandemia da covid-19, na ADPF 828, determinou que todos os Tribunais Estaduais e Federais criassem Comissões de Conflitos Fundiários que fizessem visita técnica in loco, audiência de conciliação e buscassem alternativas dignas e prévias que evitassem despejos que implicassem em jogar famílias ao relento nas ruas. Há também decisão do ministro Alexandre de Moraes que obriga o poder público a fazer políticas públicas que resolvam a situação de milhares de irmãos e irmãs que estão em situação de rua em centenas de cidades brasileiras.

Para nossa surpresa, um desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais não acatou um Agravo de instrumento da Defensoria Pública de MG, que exigia a suspensão da liminar de reintegração sobre a Retomada Terra Mãe, mas diante da manifestação da FUNAI[2], que manifestou interesse no processo e de arguição da Defensoria Pública da União e do Ministério Público Federal requerendo que a competência para julgar o caso deve ser da Justiça Federal, diante da realidade de que se trata de Retomada Indígena e quem julga sobre questões relativas aos indígenas é a Justiça Federal, suspendeu a reintegração até que seja julgado de quem será a competência jurídica, se da justiça estadual ou da justiça federal.

Dia 27 de setembro de 2023, os povos da Retomada Terra Mãe bloquearam a BR 262 em Betim, MG, próximo ao local da Retomada, em protesto contra o anúncio já feito pela Polícia Militar de que faria o despejo na madrugada seguinte, dia 28 de setembro último (2023). A Polícia Militar de MG foi truculenta. Atirou no povo, jogou bombas de gás lacrimogêneo no meio da multidão que bloqueava a BR. Várias pessoas foram feridas. Idosos, mães e crianças também foram atacados com gás lacrimogênio. O direito de manifestação foi violentado pela PM de MG. E mais: fiscalização sobre a BR 262 é competência da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que não apareceu. Estranhamente e usurpando sua competência, quem apareceu em um piscar de olhos foi a PM de MG, que chegou com brutalidade absurda. Um sargento chegou imbicando um revólver no rosto de uma liderança indígena. Entretanto, os povos indígenas e sem-teto não arredaram o pé e continuaram a manifestação protestando contra o despejo iminente. Fizeram a PM recuar e reocuparam novamente a BR 262, o que causou mais de 15 Km de congestionamento. O povo dizia de cabeça erguida que jamais aceitará despejo e gritava: “Se o despejo vier, a BR vai parar! Bloquearemos a BR quantas vezes forem necessárias!”

No Censo do IBGE, de 2022, em Belo Horizonte e Região Metropolitana, 6.476 pessoas se autodeclararam INDÍGENAS. Em Belo Horizonte, 2.692; em Contagem, 796; em Betim, 761; Ribeirão das Neves, 362; São Joaquim de Bicas, 356; Santa Luzia, 211; Ibirité, 140; Esmeraldas, 137; Sabará, 117; Sete Lagoas, 117; Brumadinho, 113; Vespasiano, 112; Nova Lima, 81; Lagoa Santa, 78; Juatuba, 76; Igarapé, 67; Pedro Leopoldo, 49; São José da Lapa, 37; Matozinhos, 26; Rio Acima, 18; Mateus Leme, 27; Sarzedo, 15; Jaboticatubas, 13; Capim Branco, 13; Itatiaiuçu, 13; Mário Campos, 11; Itaguara, 09; Caeté, 08; Florestal, 08; Confins, 05; Raposos, 05; Rio Manso, 01; Baldin, 1; Taquaraçu de Minas, 01.

No ano de 2007, uma pesquisa do Centro de Documentação Eloy Ferreira (CEDEFES)[3], estimava a existência aproximada de sete mil indígenas em Belo Horizonte e RMBH. Cumpre evidenciar que o Censo do IBGE, de 2022, certamente mostra uma subnotificação, porque segundo vários/as recenseadores/as me disseram não era em todas as casas que o sistema abrir para perguntar se tinha outras pessoas indígenas, ou quilombolas, ou … Alguns recenseadores me disseram: “Quando o sistema abria em uma casa para anotarmos a existência naquela casa de outras pessoas indígenas, nas próximas casas, o sistema não abria mais. Com certeza o número de indígenas, de quilombolas etc. é muito maior do que o que foi anotado. Parece que tinha a estruturação no programa para não mostrar toda a verdade e viabilizar subnotificação, o que causa danos na formatação de políticas públicas. Não podemos esquecer que o Censo do IBGE, em 2022, aconteceu no desgoverno de Bolsonaro. Precisa verificar os pontos falhos do Censo em 2022.” Portanto, podemos inferir que ao redor de cada uma das 6.476 pessoas que se autodeclaram como indígenas na RMBH deve existir um número bem maior. Podemos deduzir que possivelmente o número de indígenas em Belo Horizonte e RMBH seja no mínimo duas ou três vezes mais do que o atestado pelo Censo do IBGE, ou seja, podemos estimar que exista acima de 13 mil indígenas em Belo Horizonte e RMBH. Em Betim, onde o Censo atestou a presença de 761 indígenas deve ter mais de 1.600 mil. Imaginemos o número de brasileiros que estão em todas as cidades que de fato são indígenas, mas que ainda não se autodeclararam por muitos motivos. Enfim, o número de indígenas desterritorializados e em contexto urbano deve ser maior do que o último censo do IBGE atestou.

O Brasil é muito mais indígena que muitos imaginam. Viva a luta indígena!

 

04/10/2023.

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Povo Indígena Warao da Venezuela na Ocupação/Retomada TERRA MÃE, Betim/MG: “Não aceitamos despejo!”

2 – Terra Mãe, nova Ocupação de Povo indígena Warao e centenas de sem-teto, em Betim/MG. Despejo, NÃO!

3 – Respeito à decisão do STF na ADPF 828! Povo indígena Warao não aceita despejo na Ocupação TERRA MÃE

4 – 300 famílias na Ocupação/Retomada TERRA MÃE, em Betim/MG: Povo indígena Warao e centenas de sem-teto

5 – Ocupação TERRA MÃE: E decisão do STF p não despejar sem alternativa prévia? Povo indígena e sem-teto

6 – “Novo nascimento na Retomada/Ocupação TERRA MÃE, Betim/MG.” “PM matou 2 Sem Teto Bandeira Vermelha”

7 – Leo Péricles/UP, Poliana/MLB e Isa/MNDH na RETOMADA/OCUPAÇÃO TERRA MÃE, BETIM/MG: “Negociação, SIM!”

8 – Betim/MG: “Não arredamos o pé da luta pela moradia. PM violenta conosco. RETOMADA/OCUPAÇÃO TERRA MÃE

9 – Povo REOCUPOU a BR em Betim/MG após repressão da PM/MG: RETOMADA TERRA MÃE na luta contra despejo.v3

10 – Povo fez PM recuar e bloqueou de novo BR em Betim/MG: luta por moradia da Ocupação Terra Mãe. Víd 2

11- PM de MG reprime com truculência Bloqueio da BR em Betim/MG: luta por moradia da Ocupação Terra Mãe

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       www.twitter.com/gilvanderluis        –     Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Fundação Nacional dos Povos Indígenas.

[3] BAETA, Alenice M. Indígenas nas Cidades; memórias ‘esquecidas’ e direitos violados. In: ECODEBATE, 2021.  Cf. https://www.cedefes.org.br/indigenas-nas-cidades-memorias-esquecidas-e-direitos-violados-artigo-de-alenice-baeta/

 

MST realiza o 23º Encontro Estadual de Educadoras e Educadores do Campo na Bahia

Por Daniel Violal

Atividade ocorreu de 7 a 9 de setembro, na Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto, em Prado, região do extremo sul do estado

Cerca de 400 educadores e educadoras que atuam nas áreas de assentamento e acampamento do MST no estado da Bahia, realizaram entre os dias 7 a 9 de setembro, o 23º Encontro Estadual de Educadoras e Educadores do Campo na Bahia.

A atividade aconteceu na Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto, em Prado, região do extremo sul da Bahia. O tema do encontro deste ano foi “Educação do Campo rumo aos 40 anos do MST: diálogos, resistências e perspectivas”.

Durante os três dias de atividades, foram debatidos questões sobre a realidade da educação nas escolas do campo em áreas de reforma agrária e de comunidades rurais, além de estudo de temas, como a conjuntura da Educação do Campo; a diversidade e sujeitos LGBTQIA+ nas Escolas do Campo do MST, a Educação Étnico-racial, a Educação de Jovens e Adultos (EJA) na Educação do Campo, a Agroecologia nas escolas do campo e o Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis do MST, dentre outros temas importantes para a Educação do Campo nas áreas de assentamentos.

Fotos: Daniel Violal e Ana Terra/coletivo de comunicação do MST-BA

Para Sintia Paula, da coordenação do setor Educação do MST na Bahia, o encontro é um espaço de formação e diálogo de todos aqueles que estão envolvidos com a Educação do Campo no estado baiano. “O 23° Encontro Estadual de Educadores do MST da Bahia, é um importante espaço de luta, resistência e construção da educação do campo. Trazendo o debate da agroecologia, currículo e classes multisseriadas como fortalecimento e permanente luta contra o fechamento das escolas do campo”, afirmou.

Também teve destaque o papel central do MST na luta pela Reforma Agrária e pela democratização do acesso à terra. Os educadores e educadoras ressaltaram a necessidade de valorizar e fomentar a educação popular, que busca promover a participação ativa das comunidades na construção do conhecimento, levando em consideração as particularidades e necessidades do campo.

Dentre os desafios enfrentados, a criminalização dos movimentos sociais se tornou um ponto de pauta central. Os participantes debateram as estratégias utilizadas para deslegitimar e silenciar as ações do MST, assim como outras organizações sociais que lutam por direitos e justiça. No entanto, apesar das adversidades, o debate também mostrou a importância de se manter firme na resistência e na busca por formas de fortalecimento da articulação dos movimentos sociais. A solidariedade entre as diversas organizações e o compartilhamento de experiências foram destacados como estratégias fundamentais para enfrentar os desafios e avançar nas conquistas.

Para Antônio Paraguai, da Direção Estadual do MST na BA foi uma satisfação receber o encontro estadual de educadores e educadoras na regional. “Pelo momento que estamos vivendo de mais um ataque da extrema direita à nossa organização através de uma CPI contra MST. O extremo sul da Bahia sempre foi alvo, por conta das lutas que travamos contra as grandes empresas do monocultivo de eucalipto. E o encontro teve uma simbologia enorme de mostrar para a sociedade que também lutamos por educação de qualidade para os nossos jovens, adultos e crianças”, conclui Antônio.

Além dos educadores e educadoras e dirigentes do MST locais, estaduais e nacionais, estiveram presentes Luzeni Carvalho, professora da UNEB do Campus X de Teixeira de Freitas/BA; Alex Verdério, professor da UFRB; Felipe Campelo, da coordenação pedagógica da EPAAEB e representantes de outros movimentos e lideranças locais.

O encontro foi encerrado no sábado (09). Durante três dias teve muitos momentos de debate, que proporcionou um espaço de reflexão e troca de experiências sobre os desafios e perspectivas da Educação do Campo no contexto político atual. As discussões sobre a conjuntura política e sobre as tentativas de criminalização dos movimentos sociais reforçou a importância da luta por uma educação inclusiva, de qualidade e comprometida com a transformação social.

O autor é membro do Coletivo de Comunicação do MST-BA

Editado por Solange Engelmann

Fonte: MST

11-09-2023

CPI que tentou criminalizar MST chega ao fim com relator indiciado por crimes

Deputado Coronel Zucco(Republicanos – RS), presidente da Comissão, e deputado Ricardo Salles(PL-SP), relator da CPI. – Bruno Spada / Câmara dos Deputados

Do Brasil de Fato

As atividades da CPI do MST foram encerradas até a apresentação do relatório final, no dia 14 de setembro. A ordem partiu do presidente da comissão, o deputado federal Zucco (Republicanos-RS) e foi comunicada aos parlamentares que integram o grupo na tarde desta segunda-feira (4).

A mensagem da Secretaria do CPI do MST diz: “Por determinação do Presidente, Deputado Zucco, informo que tendo em vista as recentes medidas regimentais e judiciais que inviabilizaram a continuidade das ações, depoimentos, quebras de sigilo e outras providências necessárias ao esclarecimento dos fatos relacionados à indústria de invasões de terras no Brasil, esta Presidência informa aos Senhores e Senhoras Parlamentares integrantes desta Comissão Parlamentar de Inquérito que não haverá nenhuma outra reunião ou audiência até a oportuna apreciação do relatório final.”

Mais cedo, uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) frustrou a ala bolsonarista da CPI do MST, que tem tido dificuldade de jogar luz na comissão, que segue ocultada na opinião pública.

Os depoimentos que estavam previstos para esta segunda-feira na CPI do MST foram suspensos por decisão do STF. A comissão ouviria dois funcionários do Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral), o presidente do órgão, Jaime Messias Silva, e o gerente-executivo da autarquia, José Rodrigo Marques Quaresma.

A decisão irritou Zuco e o relator da CPI do MST, o deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), que se reuniram para tratar do assunto. À tarde, veio a decisão do presidente da comissão.

A deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) celebrou a decisão: “Uma CPI que iniciou sem nenhum fato determinado, numa tentativa rasa de criminalização de um dos maiores movimentos sociais do mundo. Agora, a CPI termina com o relator, deputado-réu, indiciado por crimes contra o erário e o presidente investigado por misoginia. Fomos vitoriosos porque defendemos a verdade e a democracia, agora vamos lutar para que o relator e o presidente sejam responsabilizados pelos crimes que cometeram ao longo dessa CPI”.

Reação a um modelo justo e ecológico

O MST tem sido atacado por setores reacionários no Brasil não por conta de qualquer crime que tenha cometido, mas sim pelo seu modelo agroecológico e que luta por justiça no campo e reforma agrária, conforme determina a Constituição Federal.

O arroz agroecológico do MST, por exemplo, ganhou evidência no debate político ao figurar, segundo o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), como a maior produção orgânica da América Latina.

Graças ao conhecimento acumulado pelos próprios agricultores – e com ajuda das universidades e órgãos públicos locais –, tanto a área plantada quanto a produção total estão crescendo, mesmo diante de um encolhimento da produção nacional de arroz.

Edição: Rodrigo Durão Coelho/Brasil de Fato e Redação da Revista Consciência.