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CPMF: requiescat in infernum.

Por que a popularidade da presidenta Dilma Rousseff despencou a ponto de torná-la ainda mais malquista do que os calamitosos Sarney e Collor?

 Creio que a já fracassada (o governo acaba de desistir) tentativa de recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira ajuda a equacionar a questão.

Até agora, eram vistos como vilões maiores a recessão econômica e o mar de lama que as investigações do mensalão e do petrolão escancararam. O estelionato eleitoral de 2014 parecia ter ficado para trás.

 No entanto, a extrema repulsa com que foi unanimemente recebida a ideia de ressuscitar a CPMF dá o que pensarmos.

Em 1993, ela foi vendida como uma solução para o custeio da Saúde Pública, com o respeitável doutor Adib Jatene emprestando ingenuamente sua imagem ilibada para uma pilantragem a mais dos políticos, sempre à cata de novos pretextos para tosquiarem os cidadãos.

O povo engoliu de boa fé a patranha e ficou espumando de raiva quando lhe caiu a ficha de que o objetivo real da patifaria jamais fora o de melhorar a Previdência Social, mas sim o de rechear os cofres do governo.

Ainda assim, o mesmo peixe podre foi vendido novamente no período 1997/2007, só que ninguém mais o comprou por livre e espontânea vontade. Foi enfiado goela dos governados adentro.

Extinta para alívio geral, esta herança maldita do FHC continuou atraente para os governos petistas, que a quiseram exumar em 2008, 2011 e, agora, em 2015. Negativo. O povo não é bobo, acreditou uma vez e nunca mais! Detesta os que tentam engambelá-lo de novo.

Seria interessante uma pesquisa que avaliasse o quanto pesa, na rejeição de Dilma, o fato de ela haver vencido a eleição de 2014 fazendo alarmismo a respeito da política econômica dos seus dois principais rivais, tendo depois adotado exatamente o mesmo receituário neoliberal.

Quem votou contra o arrocho fiscal ao votar em Dilma, agora percebe que foi feito de bobo e jogou seu voto no lixo. Fustigado pela inflação, pelo aumento das tarifas, pelo desemprego, pela perda de poder aquisitivo, em quem há de colocar a culpa?

Na Dilma, claro, pois foi ela quem prometeu mantê-lo a salvo de todos esses fantasmas.

Cujo arrastar de correntes é cada vez mais insuportável.

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Se plantar mais do mesmo, Dilma colherá mais do mesmo.

Continuam viajando na maionese Dilma Rousseff e a ala chapa-branca do PT (aquela que não dá a mínima para as bandeiras históricas do partido e adere até ao neoliberalismo quando isto lhe convém).

A presidenta vinha evitando aparições na TV com dia e hora marcados, para que os adversários não convocassem humilhantes panelaços. Mudou de idéia e dará a luz de sua (des)graça no próximo programa do PT, que vai ao ar no dia 6, em rede nacional. Alguém dúvida de que os opositores articularão, nas redes sociais, o panelaço mais barulhento de quantos houve até agora?

Ela decidiu também que procurará cativar os governadores e líderes da oposição, no sentido de que abracem a causa da governabilidade e orientem suas bancadas a não abrirem mais rombos na canoa furada do ajuste do Levy.

Haverá muita discurseira engana-trouxas e, noves fora, os parlamentares vão continuar defendendo apenas seus interesses, não os do povo ou do País. Dilma dá a impressão de que ainda crê em Papai Noel e coelhinho da Páscoa…

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, um dos alvos da ofensiva dilmista e lulista, já disse que “o momento não é para a busca de aproximações com o governo, mas sim com o povo”. Raposa velha não atira boias para inimigo que está afundando.

Enfim, o PT continua acreditando que atingiu seu pior momento em 35 anos de existência por causa da superexposição dos escândalos de corrupção na grande mídia (adversa como sempre!), de erros na forma de comunicar-se e de não haver sido suficientemente persuasivo na cooptação dos rivais.

Enquanto insistir na auto-ilusão, seguirá em direção ao abismo. A direita golpista, começando pelo Reinaldo Azevedo, exultou com a notícia de que a Dilma sairá da sua reclusão para receber mais tortas na cara. Com sua teimosia em considerar correto e imutável tudo que fez até agora, ela não para de levantar bolas para o time adversário marcar pontos.

Vou repetir mais uma vez, talvez alguém a bordo do Titanic finalmente me escute: o iceberg que afundará o governo atende pelo nome de recessão. E recessão é o pseudônimo do Joaquim Levy. Enquanto o cidadão comum sentir-se empobrecendo dia a dia, rejeitará Dilma e o PT na mesmíssima proporção.

Então, não adianta querer sair do buraco com mais do mesmo, pois o resultado será… mais da mesma rejeição estratosférica atual.

Para salvar-se, Dilma terá de devolver o Levy à sua insignificância, anunciar uma guinada de 180º na política econômica e tentar reconquistar o apoio popular.

Se depender dos banqueiros, dos ruralistas, dos grandes capitalistas em geral, das parlamentares, etc., ela não iniciará 2016 no Palácio do Planalto. Se cair nos braços do povo (como o Lula já recomendou), talvez escape da degola.

Ou, pelo menos, terá um epitáfio digno, de quem tombou defendendo os explorados, não um do tipo “aqui jaz uma presidenta que seguiu as pegadas de Margaret Thatcher e Angela Merkel, mas não possuía a competência de ambas”.

DENÚNCIA

Não sou de ficar anunciando de 10 em 10 minutos os meus artigos no Facebook e no Twitter, como vejo muitos fazerem. Posto-os apenas uma vez, pois detesto esses artifícios típicos da propaganda, “quanto mais aparecerem, maior a chance de serem notados”, etc.

Mesmo assim, há internautas com índole totalitária tentando fazer com que não apareçam sequer uma vez. Ao anunciar meu artigo deste domingo (26), fui impedido:

essa mensagem possui conteúdo bloqueado: Sua mensagem não pode ser enviada pois ela tem conteúdo que outras pessoas no Facebook denunciaram como abusivo.

Os mesmos que vira-e-mexe tiram o meu blogue do ar, fazendo-me perder uns 15 minutos para reativá-lo, agora empenham-se em excluí-lo do Facebook. Direitistas ou governistas dá no mesmo, têm alma de censores.

E do tipo fanáticos, como os do Santo Ofício, não meros tarefeiros na linha da dª Solange da ditadura militar.

Quanto ao Facebook, é moderninho por fora e medieval por dentro. Quer dizer que qualquer ação concertada de inimigos políticos é suficiente para tirar-se um articulista do ar, sem comunicação prévia nem chance nenhuma para apresentar defesa?!

Torquemada vive.

Obs. Por curiosidade, tentei divulgar esta denúncia e o Facebook a aceitou. Tentei novamente anunciar o artigo político e constatei que continua embargado. Ou seja, trata-se de um bloqueio automático, que é ativado quando existe tal ou qual palavra no texto. Qualquer semelhança com a burrice da censura dos milicos não é mera coincidência.

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Pasmem: Reinaldo Azevedo chamou Lula de “velho reacionário”!

O velho revolucionário que vos escreve considera extremamente grosseiro o tratamento dado por Reinaldo Azevedo ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao referir-se a ele, em seu artigo semanal para a Folha de S. Paulo, como “velho reacionário”. A inversão de valores me fez lembrar os golpistas de 1964 tentando colar naquela quartelada infame o rótulo de “revolução”…

Ao mesmo tempo em que rasgava seda para FHC, afirmando que ele “fala a um país nascente”, “com discrição e sem pretensões de exercer alguma forma de liderança”, a versão genérica do corvo Carlos Lacerda pintou Lula como um “chefão petista [que] vaga por aí como alma penada, sem se dar conta de que a sua militância já é coisa do passado”

Quem acompanha meu trabalho sabe muito bem que não me alinho automaticamente com as posições do Lula. Mas, quando RA o ataca por conclamar as bases do PT e a CUT a reagirem ao festival de neoliberalismo que assola o Palácio do Planalto, a coerência me coloca (como sempre, aliás) em posição diametralmente oposta à dele: para mim, ao rechaçar firmemente a capitulação total do Partido dos Trabalhadores à ortodoxia econômica do patronato, Lula vive o seu melhor momento desde que deixou o poder.

 

E, ao tentar salvar da mais completa descaracterização a agremiação que ele (e não a ex-pedetista Dilma Rousseff) criou, Lula está também evitando que o cidadão comum passe a encarar a esquerda como farinha do mesmo saco do amoralismo, oportunismo e fisiologismo que sempre caracterizaram a política brasileira.

RA está hor-ro-ri-za-do com o ressurgimento do Lula combativo de outrora:

Agora ele anuncia uma cruzada para mobilizar as esquerdas e os movimentos sociais em defesa do PT. A agitação sindical que promove, e não alguma suposta conspiração de Eduardo Cunha, derrotou o governo na votação sobre o fator previdenciário.

Mas, o PT tem mesmo de ser defendido do desespero da presidenta Dilma, que tenta escapar do impeachment tornando-o desnecessário, ao fazer tudo que a direita faria se chegasse ao poder, e ainda mais.

A derrota do governo na votação sobre o fator previdenciário foi, isto sim, uma luz no fim do túnel, abrindo a perspectiva de que as medidas anti-sociais do pacote recessivo não sejam, no frigir dos ovos, aprovadas.

Pois, se aprovadas, farão a atual recessão evoluir para depressão, infligindo sofrimentos inimagináveis aos explorados. Não estamos na Europa, aqui os coitadezas morrem de fome!

FHC volta às manchetes: seria um 'vagabundo', segundo ele próprio

Foto: Antonio Cruz/Abr

No dia 11 de maio de 1998, ele era presidente da República e disse que quem se aposenta antes dos 50 é “vagabundo”.
Ele falava da pressão fiscal, ao defender a sua reforma da Previdência. Leia em http://bit.ly/1xbkXcz (FSP, 12/05/1998) e http://bit.ly/1xbl5bO (FSP, 13/05/1998). Está gravado e disponível no YouTube, mas as matérias são claras sobre a declaração. A imprensa cobriu amplamente.
O que ele “esqueceu” de dizer, à época, é que ele próprio se aposentou aos 37 na USP, e sua então esposa aos 55.
FHC trabalhou apenas 12 anos nesta universidade e, à época, ganhava R$ 5.450. Hoje, por estes serviços prestados, ganha mensalmente R$ 22.151 (http://bit.ly/1xblA5X), que é o valor corrigido ao longo do tempo.
O motivo das matérias, agora, é outro: a crise na USP (http://bit.ly/1xblWcI).
Mas não deixa de ser curioso.
Nada contra, claro, as pessoas ganharem o que lhes é devido. Há uma lógica para cada vencimento, de acordo com a complexa rede de legislações de cada período. Em todo lugar do mundo é assim. É complicado mesmo.
No entanto, com a ajuda da História, a gente consegue entender como funciona o pessoal do “empreendedorismo”.

DE HORA EM HORA, GILMAR MENDES PIORA: QUER AMORDAÇAR A WEB!

O pior ministro da história do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, representou à Polícia Federal pedindo a abertura de investigação contra a Wikipédia por estar reproduzindo denúncias contra ele apresentadas pela revista CartaCapital.

 E antecipou que vai solicitar ao Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, uma investigação do uso de recursos públicos para financiamento de blogues de conteúdo crítico ao governo e instituições do Estado.

 Também o PSDB anda incomodado com seus críticos virtuais (vide aqui): fez uma representação à Procuradoria Geral Eleitoral, pedindo que investigue o blogue Conversa Afiada (do Paulo Henrique Amorim) e o site Luís Nassif OnLine, pedras no sapato de José Serra e sua combalida campanha para prefeito de São Paulo.

 Como expressão do meu mais enfático repúdio a todas as tentativas de implantação da censura na internet, reproduzo em seguida os trechos do brilhante trabalho jornalítico de Leandro Fortes e Maurício Dias, matéria de capa da edição 708 da CartaCapital, que tanto incomodaram o contumaz discípulo de Torquemada (não só atuou como um típico inquisidor no Caso Battisti, como agora quer colocar uma reportagem jornalística no index…), O valerioduto abasteceu Gilmar. Jamais tendo recebido um centavo sequer de publicidade por meus blogues, estou imune a tais tentativas de intimidação.

…quando se iniciar o julgamento do chamado mensalão no Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes estará com sua toga ao lado dos dez colegas da corte. Seu protagonismo nesse episódio está mais do que evidenciado. Há cerca de um mês, o ministro tornou-se o assunto principal no País ao denunciar uma suposta pressão do ex-presidente Lula para que o STF aliviasse os petistas envolvidos no escândalo,  bandidos, segundo a definição de Mendes.

À época, imaginava-se que a maior preocupação do magistrado fosse a natureza de suas relações com o bicheiro Carlinhos Cachoeira e o ex-senador Demóstenes Torres. Mas isso é o de menos. Gilmar Mendes tem muito mais a explicar sobre as menções a seu nome no  valerioduto  tucano, o esquema montado pelo publicitário Marcos Valério de Souza para abastecer a campanha à reeleição de Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais em 1998 e que mais tarde serviria de modelo ao PT.

O nome do ministro aparece em uma extensa lista de beneficiários do caixa 2 da campanha. Há um abismo entre a contabilidade oficial e a paralela. Azeredo, à época, declarou ter gasto 8 milhões de reais. Na documentação assinada e registrada em cartório, o valor chega a 104,3 milhões de reais. Mendes teria recebido 185 mil.

Esse pacote de documentos foi entregue (…) à delegada Josélia Braga da Cruz na Superintendência da Polícia Federal em Minas Gerais. Além de Mendes, entre doadores e receptores, aparecem algumas das maiores empresas do País, governadores, deputados, senadores, prefeitos e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Os pagamentos foram feitos pela SMP&B Comunicação, empresa do ecumênico Marcos Valério de Souza. Todas as páginas são rubricadas pelo publicitário mineiro, com assinatura reconhecida em cartório no final do documento…

Um dado a ser considerado é o fato de que, em janeiro de 2009, Mendes ter concedido o habeas corpus que libertou Souza da cadeia. Também foi libertado, no mesmo ato, Rogério Lanza Tolentino, que aparece na lista do valerioduto como beneficiário de 250,8 mil reais ‘via Clésio Andrade/Eduardo Azeredo’. O ministro do Supremo entendeu que o decreto de prisão preventiva da dupla não apresentava ‘fundamentação suficiente’.

O ministro Gilmar Mendes aparece entre os beneficiários do caixa 2 da campanha da reeleição de Eduardo Azeredo em 1998, operado por Marcos Valério

Quem desponta na lista de doadores, sem nenhuma surpresa, é o banqueiro Daniel Dantas. Foram 4,2 milhões de reais por meio da Cemig.

 ABAIXO-ASSINADO PEDE IMPEACHMENT

 

Por essas e outras, continua tendo tudo a ver o pedido de impeachment de Gilmar Mendes, apesar de o inacreditável José Sarney, como presidente (que há muito deveria ter deixado de ser…) do Senado ter arquivado, em maio de 2011, uma consistente representação do advogado Alberto de Oliveira Piovesan neste sentido.

Um abaixo-assinado apoiando a atitude do corajoso advogado e pleiteando o impeachmet pode ser acessado  aqui.

E, facilitando o trabalho de quem quiser fazer outra tentativa, prestando um enorme serviço às nossas instituições, eis o embasamento do pedido de Piovesan, aqui. Basta acrescentar a profusão de novos motivos que vieram à tona desde então.

Piovesan arguiu a “Lei nº 1079, de 10 de abril de 1950, (…) eis que (…) há indícios de incidência do item 5 do artigo 39”: um ministro do STF proceder “de modo incompatível com a honra, dignidade e decôro de suas funções”.

Com base no que a CartaCapital apurou, Mendes poderia, talvez, ser enquadrado também no ítem 2: “proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa”.

 Além da reportagem que fez o destrambelhado ministro soltar os cachorros contra a Wikipedia, há outra que deixou sua imagem em frangalhos: uma longa matéria sobre o Supremo, de autoria de Luiz Maklouf Carvalho, que a revista Piauí publicou há dois anos, em suas edições  47 e 48 (vide íntegra aqui).  Piovesan a citou várias vezes para corroborar sua denúncia.

 Vale a pena recapitularmos os principais trechos em que Mendes foi citado.

LIGAÇÕES PERIGOSAS – 1

Outro advogado que atua no Supremo é José Luis de Oliveira Lima, Juca para os amigos. Ele é o patrono do maior e mais famoso processo que tramita na casa – o do  mensalão, relatado pelo ministro Joaquim Barbosa, no qual defende o ex-ministro José Dirceu. No final do ano, na véspera do Natal, em parceria com Márcio Thomaz Bastos, Oliveira Lima conseguiu do ministro Gilmar Mendes uma liminar que tirou da cadeia um dos seus clientes mais conhecidos, o médico Roger Abdelmassih, denunciado por crimes sexuais contra pacientes.

Quatro meses depois, numa segunda-feira de maio, Oliveira Lima homenageou o ministro Gilmar Mendes com um jantar em seu apartamento. ‘É o mínimo que ele merece, pela gestão revolucionária que fez no Supremo’, explicou Oliveira Lima. Convidou trinta criminalistas, entre os mais prestigiados de São Paulo. Gilmar Mendes foi com a esposa, Guiomar, que discursou. Márcio Thomaz Bastos foi um dos primeiros a se retirar. ‘Não vejo nenhum conflito ético em comparecer a esse jantar’, me disse Gilmar Mendes. ‘Nem eu’, afirmou o anfitrião.

LIGAÇÕES PERIGOSAS – 2

…Gilmar Mendes estava a postos na manhã seguinte, um sábado, dando uma aula no Instituto Brasiliense de Direito Público. O idp é uma faculdade particular que fica numa área de 6 mil metros quadrados da Asa Sul. Ela pertence a três professores: Inocêncio Coelho, Paulo Branco e Gilmar Mendes. ‘É tudo perfeitamente constitucional’, ele disse, acrescentando que constituiu os advogados Sepúlveda Pertence e Sergio Bermudes a abrir processo contra publicações e jornalistas que afirmaram ou insinuaram o contrário.

Durante a presidência de Gilmar Mendes, Joaquim Falcão, professor de direito constitucional da Fundação Getulio Vargas, foi juiz-conselheiro do Conselho Nacional de Justiça. Um dos casos que lhe caiu nas mãos foi uma representação contra o juiz Ari Ferreira de Queiroz, de Goiânia. O juiz era sócio-proprietário do Instituto de Ensino e Pesquisa Científica, uma escola semelhante à de Gilmar Mendes, embora mais modesta. A representação visava impedir que Queiroz fosse, simultaneamente, juiz e dono de uma faculdade.

Na decisão, Falcão determinou ‘o imediato desligamento do magistrado de sua qualidade de sócio-cotista e a desvinculação total da imagem do magistrado e do Instituto’. O juiz Queiroz, de Goiânia, acatou a decisão. Por que Falcão não levou a questão ao plenário do Conselho Nacional de Justiça, presidido por um dos sócios proprietários do Instituto Brasiliense de Direito Público? Porque Falcão achou que Gilmar Mendes teria maioria dos votos a seu favor.

LIGAÇÕES PERIGOSAS -3

Minha ideia era viver o ócio com dignidade, só que o Sergio me aperreou”, contou Guiomar…

‘Conheço o Sergio há muitos anos, desde que entrei no STF. (…) Quando me viu aposentada, me aperreou. Queria que eu cuidasse da gestão do escritório dele de Brasília… organizei as coisas do meu jeito e resolvi ficar. Ele me paga, líquidos, 14 mil reais por mês. Eu cuido da gestão do escritório. Não advogo, mas talvez venha a advogar.’

Gilmar Mendes e Sergio Bermudes começaram pelo ódio. O primeiro, quando advogado-geral da União, chamou o segundo – renomado professor de direito e dono de respeitada banca cível no Rio – de ‘chicanista’ em um programa de televisão…

Perguntei a Sergio Bermudes como se haviam reconciliado. (…) Contou que no primeiro encontro que tiveram, ambos palestrantes de um simpósio universitário, cumprimentaram-se como se nada tivesse acontecido. Depois, ele mandou um livro de presente; e Mendes mandou-lhe outro. A raiva virou amizade.

Mendes e Guiomar já se hospedaram nos apartamentos de Sergio Bermudes no Rio, no Morro da Viúva, e em Nova York, na Quinta Avenida. Também usam a sua Mercedes-Benz, com o motorista. Logo depois da solenidade de transferência da presidência do Supremo para Cezar Peluso, Mendes e Guiomar embarcaram em uma viagem de cinco dias a Buenos Aires – presente de Sergio Bermudes, que os acompanhou.

Perguntei a Gilmar Mendes se não cogitara abdicar de julgar os processos do escritório de Sergio Bermudes que tramitam pelo Supremo – são dezenas, e ele é o relator de alguns. ‘De jeito nenhum’, ele respondeu. ‘Nesse caso também teria que me declarar suspeito nos processos do Ives Gandra, que escreveu livros comigo, e de outros advogados que são meus amigos.’ Mas nem pelo fato de sua mulher trabalhar no escritório de Bermudes? ‘Isso não é motivo’, respondeu…’

LIGAÇÕES PERIGOSAS – 4

O primeiro palanque no qual Peluso subiu, horas depois de eleito presidente, em 10 de março, foi numa festa do site Consultor Jurídico, o Conjur. O palanque foi montado no salão principal do Supremo para comemorar o lançamento da edição de 2010 do Anuário da Justiça, publicado pelo site e pela Fundação Armando Álvares Penteado, a Faap. Mendes, Celso de Mello, Toffoli, Britto e Lewandowski estavam no tablado de honra com Peluso.

O Anuário é uma revista grossa que é produzida a um custo de cerca de 400 mil reais, bancados pela Fundação Armando Álvares Penteado. A tiragem é de 20 mil exemplares, dos quais 12 mil são distribuídos pela Faap em gabinetes de ministros, parlamentares, governadores e prefeitos. Ele funciona como um quem-é-quem do Judiciário, entremeado de anúncios de escritórios de advocacia. ‘O Anuário dá uma contribuição decisiva para conhecer o Poder Judiciário brasileiro’, disse Gilmar Mendes no seu discurso. ‘É jornalismo judicial especializado.’

O dono do Conjur e editor do Anuário é o jornalista Márcio Chaer, proprietário também de uma assessoria de imprensa, a Original 123. As empresas estão instaladas numa casa de três andares na Vila Madalena, em São Paulo. O site faz uma cobertura intensa e extensa dos eventos e decisões do Poder Judiciário. Chaer é amigo de Guiomar e Gilmar Mendes. Troca e-mails e telefonemas amiúde com o juiz.

A Faap responde a condenações e processos por crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro. Alguns desses processos estão no Supremo. A pessoa jurídica do Conjur, a Dublê Editorial, também tem processos tramitando no tribunal. ‘Não vejo problema nenhum de lançar o Anuário no Supremo’, disse Mendes. O primeiro lançamento foi feito em 2007, quando a presidente era a ministra Ellen Gracie. Ela se declara suspeita quando recebe processos que envolvam a Faap. Joaquim Barbosa acha ‘um escândalo’ que o Anuário seja lançado no Supremo.

O professor de direito Conrado Hübner Mendes, doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo e autor do livro Controle de Constitucionalidade e Democracia, tem outra opinião: ‘O Anuário pode até produzir informações de interesse público, mas não é isso que está em questão. Uma empresa privada não deveria ter o privilégio de ter seu produto promovido dentro do próprio tribunal. A integridade das instituições depende da separação entre o público e o privado.’

ALÍVIO PARA DANIEL DANTAS

‘…evitamos um namoro explícito com o estado policial. Havia um quadro explosivo que nos levava a um modelo em que a polícia mandava no Ministério Público e em juízes da primeira instância. Era preciso arrostar esses abusos. E eu tive medo de ter medo.’

É aqui que entra o banqueiro Daniel Dantas, alvo da Operação Satiagraha. Mendes mandou soltá-lo duas vezes, concedendo-lhe habeas corpus quando o juiz Fausto de Sanctis quis manter o dono do Opportunity na prisão. Mendes considerou que o juiz, erradamente, se subordinara ao Ministério Público e ao delegado encarregado da investigação, Protógenes Queiroz. De Sanctis não quis dar entrevista a respeito: Por impedimento legal não posso falar de fato concreto, as decisões falam por si, disse-me ele.

Juiz é elemento de controle do inquérito, não é sócio da investigação, afirmou Gilmar Mendes, sobrevoando Salvador. Ele contou os antecedentes de sua primeira decisão: A  Guio  me ligou, dizendo que podiam prender até a Andréa Michael, da Folha de S.Paulo. O governo estava de cócoras em relação aos abusos da polícia. Eu tinha que dar um basta naquilo, fosse Daniel Dantas ou fosse qualquer um.’ ‘Guio’ é Guiomar Mendes, esposa do ministro.

Outro risco de estabelecimento de um ‘estado policial’ surgiu, segundo Mendes, quando a revista Veja publicou uma reportagem sustentando que um telefonema de Mendes com o senador Demóstenes Torres havia sido gravado ilegalmente, e apresentou como evidência a transcrição da conversa. Com a certeza de que fora grampeado por um órgão do Executivo, Mendes ligou para Fernando Henrique Cardoso. Eles são amigos. Nos tempos de Gilmar na presidência, Fernando Henrique entrava pela garagem do Supremo.

‘Eu estava numa fazenda’, contou Fernando Henrique em São Paulo. ‘O Gilmar estava indignado. Disse que ia reagir à altura, chamando às falas o presidente Lula. Eu o incentivei a ir em frente.’ Mendes foi. ‘Não há mais como descer na escala da degradação institucional’, declarou ele à imprensa. ‘Gravar clandestinamente os telefonemas do presidente do STF é coisa de regime totalitário. É deplorável, ofensivo, indigno.’ No dia seguinte, uma delegação do STF integrada por Mendes, Ayres Britto e Cezar Peluso foi ao Planalto sem ter sido convidada. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva os recebeu.

No encontro, os três juízes deram como certo que gente do Executivo bisbilhotava a mais alta corte e o Congresso, e cobraram providências. Enfático, o ministro Franklin Martins, da Comunicação Social, argumentou que a denúncia do grampo não tinha comprovação porque o áudio não aparecera. E disse que o governo não podia ser responsabilizado sem provas. Os ministros mal reconheceram sua interlocução. Lula mais ouviu do que falou. Dias depois, à guisa de reparação, mas sem explicitá-la, determinou que o delegado Paulo Lacerda saísse da chefia da Agência Brasileira de Inteligência.

DEGRADAÇÃO DO JUDICIÁRIO

[Dalmo de Abreu] Dallari conheceu Gilmar Mendes quando este era advogado-geral da União e auxiliava o ministro Nelson Jobim, da Justiça, em questões indígenas. ‘Tive uma péssima impressão dele nas reuniões em que nos encontramos; eu defendendo os índios, e ele desenvolvendo uma argumentação típica de grileiro de luxo, de quem vê o índio como empecilho ao desenvolvimento nacional’, disse. ‘Depois houve uma denúncia, da revista Época, mostrando que ele, na Advocacia-Geral da União, contratava o seu próprio estabelecimento de ensino para dar cursos a servidores de lá. Para mim, isso é corrupção.’

Em maio de 2002, Dallari publicou na Folha de S.Paulo um artigo, ‘Degradação do Judiciário’ [vide aqui], com essas e outras acusações. ‘Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional’, diz um dos trechos. O argumento técnico era que Mendes não tinha reputação ilibada, exigência constitucional para o posto.

Ainda à frente da Advocacia-Geral, Mendes pediu que o procurador-geral da República o defendesse. O procurador entrou com uma ação penal contra Dallari pelos crimes de injúria e difamação. Enquanto o processo tramitava, o Senado aprovou a indicação de Mendes, com quinze votos contrários, de um total de 72, um número bastante alto. O juiz federal Sílvio Luís Ferreira da Rocha sentenciou que o artigo de Dallari se enquadrava no adequado direito de crítica, sem configurar ofensa à honra, e determinou o arquivamento do caso. Mendes não recorreu.

‘Não retiro uma vírgula do que escrevi’, disse Dallari exibindo a sentença… [e] continua a criticar Mendes: ‘A gestão dele como presidente foi muito negativa, com excesso de personalismo. Em busca de autopromoção, agiu como um verdadeiro inquisidor’.

LEIA TAMBÉM, NO BLOGUE “DIÁRIO DE CAMPANHA DO LUNGARETTI” (clique p/ abrir):

UM APOIO DO QUAL O GIANNAZI E EU MUITO NOS ORGULHAMOS: O DE CARLOS LUNGARZO

Especial: tudo sobre o impeachment de Gilmar Mendes

O advogado Alberto de Oliveira Piovesan solicitou ao presidente do Senado, José Sarney, que instaure processo de impeachment contra o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, “com base na Lei nº 1079, de 10 de abril de 1950, (…) eis que (…) há indícios de incidência do item 5 do artigo 39 da referida lei”. Ou seja, Piovesan alega que Mendes procedeu “de modo incompatível com a honra, dignidade e decôro de suas funções”.

A íntegra do pedido de impeachment pode ser acessada aqui.

E quem quiser ser signatário de um abaixo-assinado apoiando a atitude do corajoso advogado, deve clicar aqui.

Para mais detalhes sobre a trajetória de Mendes, recomendo a artigo com que lhe dei o bota-fora quando deixava a presidência do STF sob rasgados elogios da Folha e do  Estadão: Lá se vai o sujeito de toga, sob o desdém dos sujeitos na esquina (vide aqui).

Piovesan fundamentou o pedido, principalmente:

  • em “depoimento público do jurista Dalmo de Abreu Dallari, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, datado de 9 de novembro de 2010, inserido no site ‘Observatório da Imprensa’, onde afirma ter havido empenho e parcialidade do ministro Gilmar Ferreira Mendes ao julgar aspecto da chamada ‘Lei da Ficha Limpa’, de modo a beneficiar pessoa com quem tem ligação antiga [Jader Barbalho], e até induzindo a imprensa a publicar fatos não verdadeiros relacionados à referida lei” (o artigo de Dallari está aqui)
  • e nas informações sobre Mendes constantes numa longa reportagem sobre o STF que o repórter Luiz Maklouf Carvalho escreveu e a revista Piauí publicou, em duas edições consecutivas, há dois anos. Embora a Piauí restringisse o acesso virtual a assinantes, a íntegra pode ser encontrada aqui.  Expõe as entranhas da mais alta corte do País, sendo, portanto, leitura das mais instrutivas neste momento em que se julga o mensalão.

Disso tudo Piovesan conclui:

…[as] notícias […] levantam sérias dúvidas, até que sejam devidamente apurados os fatos em regular processo que só pode correr perante o Senado Federal, sobre a isenção e independência do ministro Gilmar Ferreira Mendes no desempenho de suas funções, dúvidas que fatalmente ocasionam a perda do necessário requisito de neutralidade em qualquer decisão judicial que proferir deve ter e parecer ter.

Como minha contribuição pessoal a tão meritória, necessária e até tardia iniciativa –há muito eu a vinha sugerindo–, garimpei o que há de mais relevante sobre Mendes na ótima reportagem da Piauí sobre o STF:

LIGAÇÕES PERIGOSAS – 1

Outro advogado que atua no Supremo é José Luis de Oliveira Lima, Juca para os amigos. Ele é o patrono do maior e mais famoso processo que tramita na casa – o do  mensalão, relatado pelo ministro Joaquim Barbosa, no qual defende o ex-ministro José Dirceu. No final do ano, na véspera do Natal, em parceria com Márcio Thomaz Bastos, Oliveira Lima conseguiu do ministro Gilmar Mendes uma liminar que tirou da cadeia um dos seus clientes mais conhecidos, o médico Roger Abdelmassih, denunciado por crimes sexuais contra pacientes.

Quatro meses depois, numa segunda-feira de maio, Oliveira Lima homenageou o ministro Gilmar Mendes com um jantar em seu apartamento. ‘É o mínimo que ele merece, pela gestão revolucionária que fez no Supremo’, explicou Oliveira Lima. Convidou trinta criminalistas, entre os mais prestigiados de São Paulo. Gilmar Mendes foi com a esposa, Guiomar, que discursou. Márcio Thomaz Bastos foi um dos primeiros a se retirar. ‘Não vejo nenhum conflito ético em comparecer a esse jantar’, me disse Gilmar Mendes. ‘Nem eu’, afirmou o anfitrião.

LIGAÇÕES PERIGOSAS – 2

…Gilmar Mendes estava a postos na manhã seguinte, um sábado, dando uma aula no Instituto Brasiliense de Direito Público. O idp é uma faculdade particular que fica numa área de 6 mil metros quadrados da Asa Sul. Ela pertence a três professores: Inocêncio Coelho, Paulo Branco e Gilmar Mendes. ‘É tudo perfeitamente constitucional’, ele disse, acrescentando que constituiu os advogados Sepúlveda Pertence e Sergio Bermudes a abrir processo contra publicações e jornalistas que afirmaram ou insinuaram o contrário.

Durante a presidência de Gilmar Mendes, Joaquim Falcão, professor de direito constitucional da Fundação Getulio Vargas, foi juiz-conselheiro do Conselho Nacional de Justiça. Um dos casos que lhe caiu nas mãos foi uma representação contra o juiz Ari Ferreira de Queiroz, de Goiânia. O juiz era sócio-proprietário do Instituto de Ensino e Pesquisa Científica, uma escola semelhante à de Gilmar Mendes, embora mais modesta. A representação visava impedir que Queiroz fosse, simultaneamente, juiz e dono de uma faculdade.

Na decisão, Falcão determinou ‘o imediato desligamento do magistrado de sua qualidade de sócio-cotista e a desvinculação total da imagem do magistrado e do Instituto’. O juiz Queiroz, de Goiânia, acatou a decisão. Por que Falcão não levou a questão ao plenário do Conselho Nacional de Justiça, presidido por um dos sócios proprietários do Instituto Brasiliense de Direito Público? Porque Falcão achou que Gilmar Mendes teria maioria dos votos a seu favor.

LIGAÇÕES PERIGOSAS -3

Minha ideia era viver o ócio com dignidade, só que o Sergio me aperreou”, contou Guiomar…

‘Conheço o Sergio há muitos anos, desde que entrei no STF. (…) Quando me viu aposentada, me aperreou. Queria que eu cuidasse da gestão do escritório dele de Brasília… organizei as coisas do meu jeito e resolvi ficar. Ele me paga, líquidos, 14 mil reais por mês. Eu cuido da gestão do escritório. Não advogo, mas talvez venha a advogar.’

Gilmar Mendes e Sergio Bermudes começaram pelo ódio. O primeiro, quando advogado-geral da União, chamou o segundo – renomado professor de direito e dono de respeitada banca cível no Rio – de ‘chicanista’ em um programa de televisão…

Perguntei a Sergio Bermudes como se haviam reconciliado. (…) Contou que no primeiro encontro que tiveram, ambos palestrantes de um simpósio universitário, cumprimentaram-se como se nada tivesse acontecido. Depois, ele mandou um livro de presente; e Mendes mandou-lhe outro. A raiva virou amizade.

Mendes e Guiomar já se hospedaram nos apartamentos de Sergio Bermudes no Rio, no Morro da Viúva, e em Nova York, na Quinta Avenida. Também usam a sua Mercedes-Benz, com o motorista. Logo depois da solenidade de transferência da presidência do Supremo para Cezar Peluso, Mendes e Guiomar embarcaram em uma viagem de cinco dias a Buenos Aires – presente de Sergio Bermudes, que os acompanhou.

Perguntei a Gilmar Mendes se não cogitara abdicar de julgar os processos do escritório de Sergio Bermudes que tramitam pelo Supremo – são dezenas, e ele é o relator de alguns. ‘De jeito nenhum’, ele respondeu. ‘Nesse caso também teria que me declarar suspeito nos processos do Ives Gandra, que escreveu livros comigo, e de outros advogados que são meus amigos.’ Mas nem pelo fato de sua mulher trabalhar no escritório de Bermudes? ‘Isso não é motivo’, respondeu…’

LIGAÇÕES PERIGOSAS – 4

O primeiro palanque no qual Peluso subiu, horas depois de eleito presidente, em 10 de março, foi numa festa do site Consultor Jurídico, o Conjur. O palanque foi montado no salão principal do Supremo para comemorar o lançamento da edição de 2010 do Anuário da Justiça, publicado pelo site e pela Fundação Armando Álvares Penteado, a Faap. Mendes, Celso de Mello, Toffoli, Britto e Lewandowski estavam no tablado de honra com Peluso.

O Anuário é uma revista grossa que é produzida a um custo de cerca de 400 mil reais, bancados pela Fundação Armando Álvares Penteado. A tiragem é de 20 mil exemplares, dos quais 12 mil são distribuídos pela Faap em gabinetes de ministros, parlamentares, governadores e prefeitos. Ele funciona como um quem-é-quem do Judiciário, entremeado de anúncios de escritórios de advocacia. ‘O Anuário dá uma contribuição decisiva para conhecer o Poder Judiciário brasileiro’, disse Gilmar Mendes no seu discurso. ‘É jornalismo judicial especializado.’

O dono do Conjur e editor do Anuário é o jornalista Márcio Chaer, proprietário também de uma assessoria de imprensa, a Original 123. As empresas estão instaladas numa casa de três andares na Vila Madalena, em São Paulo. O site faz uma cobertura intensa e extensa dos eventos e decisões do Poder Judiciário. Chaer é amigo de Guiomar e Gilmar Mendes. Troca e-mails e telefonemas amiúde com o juiz.

A Faap responde a condenações e processos por crimes contra a ordem tributária e o sistema financeiro. Alguns desses processos estão no Supremo. A pessoa jurídica do Conjur, a Dublê Editorial, também tem processos tramitando no tribunal. ‘Não vejo problema nenhum de lançar o Anuário no Supremo’, disse Mendes. O primeiro lançamento foi feito em 2007, quando a presidente era a ministra Ellen Gracie. Ela se declara suspeita quando recebe processos que envolvam a Faap. Joaquim Barbosa acha ‘um escândalo’ que o Anuário seja lançado no Supremo.

O professor de direito Conrado Hübner Mendes, doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo e autor do livro Controle de Constitucionalidade e Democracia, tem outra opinião: ‘O Anuário pode até produzir informações de interesse público, mas não é isso que está em questão. Uma empresa privada não deveria ter o privilégio de ter seu produto promovido dentro do próprio tribunal. A integridade das instituições depende da separação entre o público e o privado.’

ALÍVIO PARA DANIEL DANTAS

‘…evitamos um namoro explícito com o estado policial. Havia um quadro explosivo que nos levava a um modelo em que a polícia mandava no Ministério Público e em juízes da primeira instância. Era preciso arrostar esses abusos. E eu tive medo de ter medo.’

É aqui que entra o banqueiro Daniel Dantas, alvo da Operação Satiagraha. Mendes mandou soltá-lo duas vezes, concedendo-lhe habeas corpus quando o juiz Fausto de Sanctis quis manter o dono do Opportunity na prisão. Mendes considerou que o juiz, erradamente, se subordinara ao Ministério Público e ao delegado encarregado da investigação, Protógenes Queiroz. De Sanctis não quis dar entrevista a respeito: Por impedimento legal não posso falar de fato concreto, as decisões falam por si, disse-me ele.

Juiz é elemento de controle do inquérito, não é sócio da investigação, afirmou Gilmar Mendes, sobrevoando Salvador. Ele contou os antecedentes de sua primeira decisão: A  Guio  me ligou, dizendo que podiam prender até a Andréa Michael, da Folha de S.Paulo. O governo estava de cócoras em relação aos abusos da polícia. Eu tinha que dar um basta naquilo, fosse Daniel Dantas ou fosse qualquer um.’ ‘Guio’ é Guiomar Mendes, esposa do ministro.

Outro risco de estabelecimento de um ‘estado policial’ surgiu, segundo Mendes, quando a revista Veja publicou uma reportagem sustentando que um telefonema de Mendes com o senador Demóstenes Torres havia sido gravado ilegalmente, e apresentou como evidência a transcrição da conversa. Com a certeza de que fora grampeado por um órgão do Executivo, Mendes ligou para Fernando Henrique Cardoso. Eles são amigos. Nos tempos de Gilmar na presidência, Fernando Henrique entrava pela garagem do Supremo.

‘Eu estava numa fazenda’, contou Fernando Henrique em São Paulo. ‘O Gilmar estava indignado. Disse que ia reagir à altura, chamando às falas o presidente Lula. Eu o incentivei a ir em frente.’ Mendes foi. ‘Não há mais como descer na escala da degradação institucional’, declarou ele à imprensa. ‘Gravar clandestinamente os telefonemas do presidente do STF é coisa de regime totalitário. É deplorável, ofensivo, indigno.’ No dia seguinte, uma delegação do STF integrada por Mendes, Ayres Britto e Cezar Peluso foi ao Planalto sem ter sido convidada. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva os recebeu.

No encontro, os três juízes deram como certo que gente do Executivo bisbilhotava a mais alta corte e o Congresso, e cobraram providências. Enfático, o ministro Franklin Martins, da Comunicação Social, argumentou que a denúncia do grampo não tinha comprovação porque o áudio não aparecera. E disse que o governo não podia ser responsabilizado sem provas. Os ministros mal reconheceram sua interlocução. Lula mais ouviu do que falou. Dias depois, à guisa de reparação, mas sem explicitá-la, determinou que o delegado Paulo Lacerda saísse da chefia da Agência Brasileira de Inteligência.

DEGRADAÇÃO DO JUDICIÁRIO

[Dalmo de Abreu] Dallari conheceu Gilmar Mendes quando este era advogado-geral da União e auxiliava o ministro Nelson Jobim, da Justiça, em questões indígenas. ‘Tive uma péssima impressão dele nas reuniões em que nos encontramos; eu defendendo os índios, e ele desenvolvendo uma argumentação típica de grileiro de luxo, de quem vê o índio como empecilho ao desenvolvimento nacional’, disse. ‘Depois houve uma denúncia, da revista Época, mostrando que ele, na Advocacia-Geral da União, contratava o seu próprio estabelecimento de ensino para dar cursos a servidores de lá. Para mim, isso é corrupção.’

Em maio de 2002, Dallari publicou na Folha de S.Paulo um artigo, ‘Degradação do Judiciário’ [vide aqui], com essas e outras acusações. ‘Se essa indicação vier a ser aprovada pelo Senado, não há exagero em afirmar que estarão correndo sério risco a proteção dos direitos no Brasil, o combate à corrupção e a própria normalidade constitucional’, diz um dos trechos. O argumento técnico era que Mendes não tinha reputação ilibada, exigência constitucional para o posto.

Ainda à frente da Advocacia-Geral, Mendes pediu que o procurador-geral da República o defendesse. O procurador entrou com uma ação penal contra Dallari pelos crimes de injúria e difamação. Enquanto o processo tramitava, o Senado aprovou a indicação de Mendes, com quinze votos contrários, de um total de 72, um número bastante alto. O juiz federal Sílvio Luís Ferreira da Rocha sentenciou que o artigo de Dallari se enquadrava no adequado direito de crítica, sem configurar ofensa à honra, e determinou o arquivamento do caso. Mendes não recorreu.

‘Não retiro uma vírgula do que escrevi’, disse Dallari exibindo a sentença… [e] continua a criticar Mendes: ‘A gestão dele como presidente foi muito negativa, com excesso de personalismo. Em busca de autopromoção, agiu como um verdadeiro inquisidor’.

P.S.: Infelizmente, o pedido de impeachment era notícia antiga e o inacreditável José Sarney o mandou arquivar em maio de 2011, prestando mais um desserviço às instituições brasileiras. Novo é só o abaixo-assinado.

Embora meu equívoco seja indesculpável, tenho uma atenuante: a digna iniciativa de Piovesan e a medíocre resposta de Sarney deveriam ter recebido da mídia destaque muito maior do que receberam na época. A imprensa está sendo tão omissa no cumprimento do seu papel que até nos confunde…

RECOMENDO TAMBÉM AS  MATÉRIA PARADIGMÁTICAS  DO BLOGUE “DIÁRIO DE CAMPANHA DO LUNGARETTI”:

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UMA MISSÃO QUE ASSUMO: A LUTA CONTRA OS PRECONCEITOS

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Jobim: sua remoção demorou uma eternidade

A menos que acontença o improvável e Nelson Jobim ressurja das cinzas, este será meu último artigo a seu respeito.

 

A situação por ele criada, com suas seguidas, inconsequentes e inaceitáveis incontinências verbais, teve o único desfecho possível: a demissão.

 

Mas, o pior malefício que ele cometeu dificilmente será desfeito.

 

Foi Jobim quem, numa reunião ministerial decisiva, confrontou Tarso Genro e Paulo Vannuchi, encabeçando a corrente contrária à revisão da Lei de Anistia. Para opróbrio do Brasil, tal posição acabou prevalecendo.

 

Em plena ditadura militar, os altos escalões do arbítrio concederam um habeas corpus preventivo a si próprios (mandantes) e a seus esbirros (torturadores), para evitar que se fizesse justiça quando da redemocratização do País.

 

Absurdamente, a Nova República, presidida por um lambe-botas dos antigos déspotas,  esqueceu o festival de horrores que a antecedeu.

 

Os dois Fernandos e o inapetente Itamar Franco deixaram tudo como estava no que tange a punições, embora FHC tenha, pelo menos, instituído as comissões de Anístia e de Mortos e Desaparecidos Políticos, para apurarem os crimes e injustiças do período de exceção, concedendo reparações aos sobreviventes e aos herdeiros das vítimas.

 

A chegada de Luiz Inácio Lula da Silva ao poder reavivou as esperanças de que tanto as bestas-feras, quanto os canalhas que removeram suas focinheiras, respondessem finalmente por seus atos.

 

Mas, com participação decisiva de Nelson Jobim, o Ministério resolveu, no final de 2007, que o Governo Federal não proporia a revisão da anistia de 1979.

 

Um ano mais tarde, quando a questão chegou à Justiça, a posição da União, expressa por sua Advocacia Geral, foi de que a Lei de Anistia colocara uma pedra sobre o assunto. E, todas as vezes em que a AGU foi chamada a dar seu parecer, alinhou-se com a impunidade.

 

Não é de estranhar-se que o Congresso Nacional tenha olimpicamente ignorado o assunto; e que o Supremo Tribunal Federal, em 2010, haja ratificado o entendimento do Executivo.

 

Até hoje, não se conseguiu desatar o nó atado em 2007 por Jobim e os ministros reacionários e/ou pusilâmines que lhe garantiram maioria.

 

Foi naquele momento que Jobim, prestando um enorme desserviço à Nação, desqualificou-se irremediavelmente para o Ministério. Sua remoção demorou uma eternidade.

Jobim rises again: ataca ministras e diz que Lula é boca suja

Esta imagem NÃO é da série
“Jim das Selvas”. Só parece.

Confesso: não vi o Roda Viva com o porta-recados dos milicos no Ministério. O “Vai! Vai! Vai! Não vou!” jobiniano já me cansou. Na categoria  pastelão, prefiro os Irmãos Marx.

 

Mais abnegado, o Jânio de Freitas assistiu e relata:

…Jobim pôde dissimular à vontade, sempre precisando, a cada pergunta não desejada, ‘voltar um pouco mais atrás’ e enveredar por uma historiada que nunca chegou à resposta pedida.

 

Quem são os idiotas, afinal? Lá veio uma enrolação incompreensível, puxada de décadas, sem nexo e sem fim. E o seu texto metido no original da Constituição ao revisá-lo, qual é? ‘É preciso voltar mais atrás’, e nada. Por que a Avibrás, uma empresa bem equipada e competente, está de fora nos planos para a indústria de defesa? Nada…

 

E ainda os chutes: ‘Pela mata, [contrabandista, presume-se] não passa, quem conhece a Amazônia como eu conheço, sabe disso’.

Se fosse assim, não haveria extrativistas de castanhas e de seringueiras, madeireiros e nem sequer índios. Jobim conhece a periferia de umas trilhas militares, nunca participou de expedição floresta adentro, não sabe que a mata amazônica é das mais transitáveis. Assim em diante.

A dissimulação sem cobrança deu-se bem.

Só discordo da última frase. Eu e muitos articulistas destacamos que foram das mais incompreensíveis suas juras de amor eterno à presidente Dilma Rousseff no Roda Viva, com Jobim parecendo querer conservar o cargo depois de tornar imperativa sua demissão ao declarar que os arquivos secretos da ditadura evaporaram, que os outros ministros são idiotas e que votou em José Serra na última eleição.

 

Dilma já perdeu três oportunidades de se livrar do pior ministro herdado de Lula.

 

Esta imagem NÃO é do filme “Apertem
os cintos… o piloto sumiu”. Só parece.

Tem a quarta agora, pois, na revista Piauí que chegará às bancas nesta 6ª feira (05/08), ele qualifica as negociações sobre o sigilo eterno dos documentos oficias como “muita trapalhada” e deprecia novamente colegas do Ministério, no caso Ideli Salvatti (“muito fraquinha”) e Gleisi Hoffmann (“nem sequer conhece Brasília”).

 

Além disto, novamente faz salamaleques para FHC (“O Lula diz palavrão, o Fernando é um lorde”) e ainda se vangloria de haver dado um calaboca na própria Dilma, quando esta lhe indagou se José Genoíno seria útil no Ministério da Defesa.

 

“Presidenta, quem sabe se ele pode ou não ser útil sou eu” — teria sido sua resposta.

 

Não vou discutir a utilidade do Genoíno. Mas, a inutilidade da presença do Jobim no Ministério é gritante.