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Papa: para o Bom Pastor somos valiosos sempre, insubstituíveis

O Papa rezou o Regina Caeli com os fiéis reunidos na Praça São Pedro neste IV domingo da Páscoa, dedicado a Jesus Bom Pastor. Em sua alocução, Francisco se deteve numa frase repetida três vezes pelo Mestre: “O bom pastor dá a vida por suas ovelhas”.

O Pontífice recordou que ser pastor, especialmente no tempo de Cristo, não era só uma profissão, mas significava compartilhar jornadas inteiras, e também noitadas, com as ovelhas, de viver em simbiose com elas. Com efeito, Jesus explica que não é um mercenário que não se importa com as ovelhas, mas Ele as conhece, chama por nome. E mais: Jesus não é só um bom pastor que compartilha a vida do rebanho, é o Bom Pastor que por nós sacrificou a vida e, ressuscitado, nos deu o seu Espírito.

“Eis o que quer nos dizer o Senhor com a imagem do Bom Pastor: não só que Ele é o guia, o Chefe do rebanho, mas sobretudo que pensa em cada um de nós, e nos pensa como o amor da sua vida. Pensemos nisto: eu para Cristo sou importante, Ele pensa em mim, sou insubstituível, valho o preço infinito da sua vida. E isso não é um modo de dizer: Ele deu realmente a vida por mim, morreu e ressuscitou por mim, por quê? Porque me ama e encontra em mim uma beleza que eu frequentemente não vejo.”

Quantas pessoas hoje se consideram inadequadas ou até mesmo erradas, prosseguiu o Pontífice. Ou se pensa que o nosso valor depende dos objetivos que conseguimos alcançar, do sucesso aos olhos do mundo, dos julgamentos dos outros: “Hoje, Jesus nos diz que nós para Ele valemos muito e sempre. E então, para reencontrar a nós mesmos, a primeira coisa a fazer é colocar-nos na sua presença, deixar-nos acolher e levantar pelos braços amorosos do nosso Bom Pastor”.

Francisco então dirigiu algumas perguntas aos fiéis: “Consigo encontrar todos os dias um momento para abraçar a certeza que dá valor à minha vida? Consigo encontrar um momento de oração, de adoração, de louvor, para estar na presença de Cristo e deixar-me acariciar por Ele?”. E concluiu:

“Irmão, irmã, se o fizer, redescobrirá o segredo da vida: lembrará que o Bom Pastor, Ele que deu a vida por você, por mim, por todos nós. E que, para Ele, somos todos importantes, cada um de nós, todos. Que Nossa Senhora nos ajude a encontrar em Jesus o essencial para viver.”

Fonte: Vatican News

A fé pascal que cura a nós e a Mãe Terra

4º Domingo da Quaresma:  Jo 3, 14 – 21. 

A fé pascal que cura a nós e a mãe Terra

Neste 4º domingo da Quaresma (ano B), o evangelho lido é João 3, 14- 21 no qual a conversa de Jesus parece se alargar de Nicodemos para todos/as nós. No começo é Jesus quem fala. Depois, fica claro que é a própria comunidade do evangelho que fala de Jesus na terceira pessoa. O evangelho começa por uma referência ao episódio da serpente de bronze, contado no livro dos Números (Nm 21 4 ss). Jesus tinha dito a Nicodemos que para se acolher bem o reinado divino no mundo é necessário novo nascimento. Aqui ele deixa claro que esse novo nascimento não é algo tranquilo. É conflitivo e se realiza à medida que assumimos a cruz, como foi o caso de Jesus e como ele apontou para os discípulos e discípulas.

Nos evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas, por três vezes, Jesus anuncia ao grupo a sua decisão de ir a Jerusalém enfrentar as autoridades religiosas e a cruz será a consequência disso. O quarto evangelho substitui essa linguagem da cruz por uma expressão própria: a elevação do filho do Homem (Jo 3, 14 e 12, 23). Aquilo que para o senso comum seria o máximo da humilhação e do castigo (ser suspenso em um instrumento de tortura como a cruz), o 4º evangelho vê como elevação e como glória, isso é, sinal da presença de Deus.

Essa passagem usa como figura da cruz de Jesus a antiga serpente de bronze, levantada no deserto. Conforme o relato bíblico, o povo sofria uma epidemia de feridas. Quem olhava para a serpente era curado.

Em todo o Oriente Antigo, era comum o culto da Serpente como divindade curadora e da fertilidade. Mesmo com toda a rigidez dos profetas contra os cultos estrangeiros, no próprio templo de Jerusalém, onde era proibida qualquer imagem, havia uma serpente de bronze. Conforme os textos bíblicos, o mesmo Moisés que fora implacável contra o culto do bezerro de ouro, aceitou a serpente de bronze. Rejeitou a cultura popular quando, no caso da adoração ao bezerro de ouro, porque aquele tipo de religiosidade afastava o povo da caminhada libertadora. Aceita no caso da serpente, porque ali se trata de curar, portanto, defender a saúde e a vida.

Muitos cristãos ainda interpretam os cultos afro-brasileiros como sendo idolatria, do mesmo modo que os profetas da Bíblia condenavam os cultos cananeus. Isso está errado porque iguala tudo. Não percebe que a mesma Bíblia que rejeita e condena o culto do bezerro de ouro aceita a imagem da serpente de bronze que era uma divindade dos cananeus, do mesmo jeito que era o bezerro de ouro. No entanto, enquanto o bezerro de ouro representava o desejo de riqueza, a serpente era símbolo de cura das doenças e defesa da vida.

Ao se comparar com a serpente de bronze no deserto, Jesus assume a caminhada libertadora e mostra que quer atualizá-la agora para todo mundo. Historicamente, a cruz é terrível instrumento de suplicio. De fato, representou a violência do sistema contra o profeta rebelde que desafiou os religiosos. No entanto, a comunidade do Discípulo Amado quer nos mostrar na cruz mais do que isso. O amor transforma a cruz em instrumento de cura e salvação. Não porque Deus tenha necessidade da morte do seu Filho para salvar o mundo, mas porque o seu amor chega ao ponto de, através de Jesus, se oferecer aos inimigos como dom e oferta de vida. Essa é a loucura da cruz. Esse evangelho diz que Deus amou tanto o mundo que lhe entregou o seu Filho. O modo de falar recorda o modo como Abraão aceita entregar  o seu filho Isaac, quando pensa que Deus lhe pede isso (Gn 22). No caso de Jesus, a doação da vida vai até o final, porque não se trata de um sacrifício e sim de testemunho (martírio).

Jesus revoluciona o modo de revelar Deus. Mostra que Deus não pode ser identificado com o poder supremo, nem com uma divindade que premia os que lhe obedecem e castiga aos que lhe resistem. O Deus de Jesus é só Amor e só pode amar. Não pode legitimar guerras nem religiões de cruzadas. É um Deus carente. Se no primeiro testamento, se revelou vestido de fumaça e fogo, nos evangelhos se reveste de carne: a nossa carne. É um Deus que se entrega na entrega de amor que Jesus faz. O evangelho conta que, no horto, Jesus viu o seu grupo em risco. Então, se entregou para salvá-los: “Se é a mim que buscais, deixai que esses possam ir livres” (Jo 18 8).

Seria pretensão e arrogância querer explicar o tamanho e as razoes desse amor. Ele nos é oferecido para que também nós aceitemos viver isso. Isso é o sentido da Páscoa. Essa é a proposta da Campanha da Fraternidade que liga a conversão pascal à nossa abertura e disponibilidade para entrar em uma cultura de “amizade social”. Se Deus amou tanto o mundo que chegou a entregar o seu Filho Único, esse amor é fonte de comunhão e de amizade social que devemos desenvolver e aprofundar.

A Páscoa de Jesus e a fé profética

3º Domingo da Quaresma: Jo 2, 13- 25. 

A Páscoa de Jesus e a casa de Deus em nós

Neste 3º domingo da Quaresma (ano B), o evangelho é João 2, 13 a 25. Todos os quatro evangelhos se referem a esse incidente conflituoso de no templo. Os outros evangelhos o situam na última semana de Jesus, poucos dias antes de morrer. O quarto evangelho que lemos nesse domingo o coloca no início da missão de Jesus. Logo depois de fazer o seu primeiro sinal em Caná da Galileia, ele vai a Jerusalém para a Páscoa e realiza o gesto profético, provocatório e agressivo em relação ao templo.

Conforme os evangelhos, desde que, a partir do batismo no Jordão, Jesus iniciou a sua missão profética, ia a Jerusalém e, portanto, ao templo, ao menos, uma vez por ano. Portanto, estava habituado a ver no átrio do templo o pátio dos vendedores de animais para os sacrifícios e os cambistas. Sempre funcionou assim. Por que, então, de repente, dessa vez, toma um chicote de cordas e expulsa os vendedores do átrio do templo?

De acordo com o evangelho, Jesus expulsa todos os vendedores de animais para os sacrifícios, mas parece que a palavra profética é dita mais explicitamente contra os vendedores de pombas. Por que? Possivelmente, como as pombas eram vendidas aos mais pobres, é a eles que Jesus diz de forma mais contundente: “Tirem isso daqui. Não façam da casa do meu Pai um mercado”.

Ao verem isso, os discípulos interpretam esse incidente de acordo com a tradição religiosa judaica. O evangelho diz que eles se lembram do salmo 69 que diz: O zelo da tua casa me consome. Pensam que Jesus estava movido por esse zelo em relação à casa de Deus. Se fosse assim, o que Jesus pretendia era purificar o templo, então profanado por um mercado que não era do agrado de Deus. Até hoje, muitos padres e pastores entendem assim. Há até Bíblias que intitulam essa cena: “A purificação do templo”.

No entanto, conforme o evangelho, a intenção de Jesus não era purificar o templo.  O evangelho começa dizendo: Estava próxima a Páscoa dos judeus, isso é, do sistema judaico. Para a Bíblia a festa sempre era chamada: “A Páscoa do Senhor”. Mas, conforme o livro do Êxodo, a Páscoa não era feita no templo. Não tinha sacerdotes. Quem matava o cordeiro pascal era cada família e o comiam por família ou com os vizinhos. Diferentemente disso, na época de Jesus, o cordeiro pascal só podia ser imolado no templo, pelos sacerdotes. Em seu livro, “Jerusalém no tempo de Jesus”, Joachim Jeremias calcula que, em cada Páscoa, mais ou menos 18 mil cordeiros eram sacrificados no templo. E os sacerdotes ganhavam muito com esse negócio. Por trás desse sistema religioso, estava a compreensão de que, para se ter a bênção de Deus tinha que se pagar sacrifícios. Aqueles homens que vendiam animais no templo eram empregados dos sacerdotes. Eles eram os donos daquele comércio. Foram eles os atingidos principais por aquele ato de agressão que Jesus realizou.

 

Em muitas religiões e até em certos meios católicos, até hoje, ainda vigora esse sistema. Até hoje, os santuários ganham muito dinheiro com velas cujas ceras vão se queimando, se se processando e com elas fazendo novas velas para as pessoas comprarem e acenderem. Até hoje, os ex-votos são feitos para as pessoas pagarem promessas. Se não cumprirem o que prometem, pensam que Deus castiga. O problema pior das religiões do templo é que usam Deus e condicionam a graça ao poder dos sacerdotes e a seus interesses. Na Igreja Católica, há padres que pregam que, sem sacramentos, não há salvação. Na teologia da prosperidade, sem dar dinheiro ao pastor, não se obtém a graça de Deus.

O evangelho de João, não fala em purificação do templo. Trata-se mais de uma expulsão. O verbo grego usado nesse relato é exebalen,  o mesmo termo usado para o exorcismo. O que Jesus quer é libertar a fé e o templo da cultura religiosa sacrificial. Ao tirar os animais do templo, Ele anuncia que Deus não quer sacrifícios, nem de animais, nem da vida de ninguém. Para Jesus, os sacrifícios não têm sentido. Mesmo as nossas liturgias, ou são vividas como atos de comunhão e gratuidade, ou são arremedos dos antigos sacrifícios e cultos que o nosso mestre condenou.

Conforme o evangelho, todas as vezes que Jesus ia ao templo, nunca foi para o culto. Ia para ensinar. Ele mesmo disse isso ao ser interrogado pelo sacerdote: “Todos os dias estava no templo para ensinar e não me prendestes” (Mt 26, 55). Ou a nossa fé é profética, ou não é a mesma de Jesus. Deus não quer sacrifícios e sim amor e misericórdia. Nunca quis Quaresma de atos de penitência. Quer Campanha da Fraternidade e Amizade Social como caminhos de espiritualidade e de Páscoa.

De acordo com esse evangelho, os discípulos de Jesus interpretaram erradamente o gesto de Jesus pensando que ele queria purificar o templo. No entanto, os sacerdotes e religiosos do templo não se enganaram. Perceberam claramente o sentido do gesto de Jesus e viram que esse gesto ia contra o interesse econômico e social deles Sentiram-se ameaçados por Jesus. O chicote que Jesus levantou para tirar dali os animais atingia a eles e a seus interesses. Por isso, perguntaram: Que sinal você dá para agir dessa forma? Quem lhe deu autoridade para agir assim?( acabar com a religião e o sistema de vender a graça de Deus?)

O papa Francisco tem muitas vezes denunciado o clericalismo na Igreja Católica. A opinião pública fica favorável ao papa e muita gente do povo concorda. Grande parte do clero e da hierarquia, não. Acabar com o clericalismo vai ser prejudicial para os interesses deles que vivem do poder eclesiástico e dessa religião sacerdotal. O papa tenta mudar. No entanto, será possível libertar o Cristianismo do Clericalismo? Como?

Jesus responde: Sim. A fé profética, vivida em comunidade, pode ter elementos religiosos, mas não centrados na instituição e sim na profecia. Por isso, ele responde aos sacerdotes: Podem desfazer (o verbo é este) este santuário (isso é, esse tipo de religião do templo) e eu reconstruirei outro santuário. E o evangelho explica:  ele falava do templo do seu corpo.

 

A Páscoa deve ser para nós a reconstrução em nós e na nossa vida disso que, nesse evangelho, Jesus chamou: a casa do meu Pai. É a mesma expressão que na ceia o fará dizer aos discípulos: Na casa do meu Pai há muitas moradas, no acampamento do meu Pai há muitas tendas. Somos nós as tendas do Espírito no qual Deus vem morar. É essa a nossa tarefa pascal. Deixar que Jesus reconstrua em nós a casa de Deus. É isso o que evangelho diz ao insistir: Ele disse: Podem destruir  esse templo (o verbo grego usado é katalyô: desatar ou mais precisamente invalidar/ anular e em três dias, eu o reerguerei” (v 19). O evangelho comenta que ele se referia ao templo do seu corpo e os discípulos se recordaram disso, depois que Jesus foi reerguido dos mortos (modo de falar como se o corpo fosse uma construção). É essa a nossa fé pascal.

 

Tornar nossa fé profética e martirial

Tornar nossa fé profética e martirial

Neste 2º domingo da Quaresma (ano B), o evangelho de Marcos (9, 2- 10) nos traz a cena que, comumente, se chama “transfiguração” de Jesus. Marcos conta essa cena no contexto do caminho de Jesus para a sua cruz. O texto começa dizendo: “Seis dias depois…”. Seis dias depois do dia no qual Jesus adverte aos discípulos que o seu caminho era de enfrentamento às autoridades de Jerusalém e tinha como resultado a morte na cruz. Os discípulos o reconheciam como consagrado de Deus (Cristo), mas, exatamente por isso o viam como sendo sempre poderoso e vencedor. De modo algum, aceitavam que ele caminhasse para a cruz que representava fracasso e derrota.

A compreensão comum que a cultura judaica popular tinha sobre o Messias era de um líder que Deus enviaria para restaurar a realeza de Israel, purificar o templo e renovar a aliança de Deus com o seu povo. No entanto, conforme os evangelhos, Jesus se negou a ser rei ou chefe. Não queria purificar o templo e sim abolir (Chegou a dizer: Destruam esse templo e eu refarei outro – se referindo ao templo do seu corpo). E quanto a Deus, vivia uma relação com Deus muito diferente de tudo o que os discípulos e discípulas podiam compreender.

Mesmo 30 ou 40 anos depois da paixão de Jesus, a comunidade de Marcos continuava com o mesmo problema. Para muitos cristãos, a fé era reduzida ao religioso. As pessoas queriam uma religião de milagres. Veem Jesus como líder que realizaria sua missão pela vitória contra os adversários e pela vitória do poder religioso. Jesus rejeitava isso como tentação. e disse a todos: “Quem não assumir a Cruz como caminho de vida e de missão no mundo não pode ser meu discípulo”.

Ao dizer isso, não estava pedindo a ninguém para gostar de sofrer. Deus não gosta de nos ver sofrer. O que Jesus dizia era que deveria cumprir sua missão, não como Messias ou filho de Deus e sim como simples homem, servo sofredor, cuja solidariedade ao destino dos mais pobres e explorados o levaria a sofrer o castigo que o império infligia aos servos rebeldes (a cruz).

Hoje ainda existem cristãos que vivem uma espiritualidade que separa a fé do compromisso social. Chegam a pensar que a Campanha da Fraternidade prejudica a Quaresma, ao trazer os problemas sociais e políticos como assuntos que nos desafiam no caminho da conversão.

 

Marcos conta a cena da transfiguração para responder aos problemas da comunidade cristã da época. Até hoje, nas Igrejas, precisamos testemunhar que cremos em um Deus que é Amor e fonte de todo amor e não um Deus todo-poderoso, amigo de seus amigos e cruel para quem não lhe obedece. Do mesmo modo, a própria figura de Jesus também tem de ser revista.

Durante séculos, a maioria dos cristãos na Igreja achou normal usar o nome de Jesus para conquistar povos e colonizar. Hoje temos dificuldade de compreender como padres, bispos e pastores, mesmo pessoas santas, conviveram com a escravidão negra e indígena. Provavelmente, no futuro, as pessoas terão  dificuldade de compreender como nós, cristãos de hoje, aceitamos conviver com as imensas desigualdades sociais, com o racismo estrutural da sociedade, com a violência em todas as suas formas. Até hoje, muita gente acha que isso não tem nada a ver com a fé.

 

Jesus chamou os três amigos mais íntimos para fazer deles testemunhas da transfiguração. A cena é impressionante. Jesus leva a um alto monte Pedro e os dois irmãos, filhos de Zebedeu. Eram os três apóstolos mais claramente identificados com uma Igreja judaica e com a esperança messiânica de tipo popular judaica. Enquanto eles estão no monte com Jesus, conforme Marcos, embaixo da montanha, os outros discípulos discutem com os escribas (professores da Lei) e não podem curar um menino surdo-mudo que um pai, pobre e angustiado veio pedir que curassem (Mc 9, 14 ss).

Aquele Cristo que Pedro, Tiago e João veem envolvido da presença divina e cheio de luz é o Jesus de Nazaré que se revelou a eles como pobre, impotente e candidato a morrer na cruz. Por estarem ainda muito presos à cultura religiosa, Pedro propõe construir três tendas, como era costume na festa litúrgica das Tendas e ficarem ali no monte em uma espécie de êxtase carismático. Não lhes importavam os outros do grupo lá embaixo em conflito com os religiosos e incapazes de curar.

Mas, Jesus os levou para o monte afim de lhes revelar qual era o projeto divino. Que carinho e cuidado com seus amigos mais íntimos. O fato deles verem ao lado de Jesus, as figuras de Moisés e Elias é significativo. Mostra que eles devem ver a experiência de Jesus como a Bíblia conta o que aconteceu a Moisés e a Elias. Ambos tiveram de romper com um tipo de visão de Deus: a idolatria do bezerro de ouro no caso de Moisés (Ver Ex 32 e 33). Elias invocava  o Deus dos exércitos. No mesmo monte da aliança do Êxodo, o Horeb, Deus só se revelou a ele quando o profeta conseguiu ver a presença divina no silêncio de uma brisa da tarde. Elias que antes invocava fogo do céu contra seus adversários, teve de se despir do poder, de qualquer instinto de violência e mudar a própria forma de ver Deus para cumprir a missão social e política a qual o mesmo Deus o enviava  (1 Rs 19).

 

Do mesmo modo, agora, ali no monte da transfiguração, Jesus retoma essas experiências. No contexto do evangelho, os discípulos também eram testemunhas de um fracasso de Jesus na Galileia. Também estavam em conflito com ele, porque não aceitavam que Deus deixasse que o seu Messias fosse ameaçado de morte e não fizesse nada para impedir a sua morte.

Ali, aos três discípulos renitentes e teimosos em permanecer em uma religião ligada a milagres e ao poder, Deus declara: Este é o meu Filho amado. Escutem-no. E pronto. Assim, Deus confirma e revalida a palavra que Jesus tinha dito sobre o caminho da cruz como sendo o único caminho necessário de fé e de missão que ele aceita viver.

O Cristianismo tradicional interpretou isso no sentido sacrificial. Conforme essa visão, Jesus precisava morrer para cumprir um sacrifício oferecido a Deus. Esse modo de viver e compreender a fé não vai além da religião. Apenas, substitui o Judaísmo do templo e da sinagoga pelo Cristianismo das catedrais e do direito canônico. A transfiguração de Jesus propõe outro caminho de fé. Não este da religião sacrificial e cultual.

 

Hoje a nossa fé está desfigurada pela incoerência e separação entre fé e vida. Ser testemunhas da transfiguração é aceitar contemplar a luz divina presente nas relações ecumênicas e no caminho da unidade. É ver a glória de Deus presente na figura do Cristo que enfrenta os professores da Lei e os religiosos do templo, assim como os governadores dos impérios atuais.

Atualmente, um desafio para a fé é não permitir que o nome de Deus seja usado para legitimar a iniquidade. O Estado de Israel não tem direito de usar a Bíblia e o nome de Deus para legitimar o seu racismo e cometer um genocídio contra o povo palestino. As Igrejas cristãs não têm direito de usar o nome de Deus para permitir que pastores e líderes defendam no Congresso pautas como o latifúndio, o armamentismo ou o projeto de um Brasil pentecostal que não respeita a pluralidade cultural e religiosa.

A transfiguração revela que só podemos atingir a intimidade de Deus no cuidado uns dos outros e da mãe Terra e no tratamento das chagas dolorosas que ferem a vida humana hoje. Como o apóstolo Paulo escreveu: “Ele transformará os nossos frágeis corpos mortais para serem semelhantes ao seu corpo glorioso” (Fl 3, 21).

Abrir as portas do coração e do mundo ao projeto divino do Amor e da Justiça.

1º Domingo do Advento – B – Mc 13, 33- 37. 

Abrir as portas do coração e do mundo ao projeto divino

Neste 1º Domingo do Advento começamos o novo ano litúrgico. A partir de agora, nos domingos comuns deste novo ano, leremos sempre o evangelho de Marcos. Neste domingo, o texto escolhido é um pequeno trecho do último discurso de Jesus aos discípulos: Marcos 13, 33- 37. Podemos chamar este texto do evangelho: a parábola do porteiro.

Em nossos dias, frequentemente, nos edifícios e condomínios de nossas cidades, toda a comunicação entre quem mora e quem visita depende dos porteiros. Toda a segurança é colocada sob a responsabilidade dos porteiros. O termo grego epíscopo que, hoje, se traduz por bispo, no tempo do Novo Testamento, significava justamente a pessoa que vigiava e era guardiã da casa.

No evangelho, quase sempre o termo casa designa a Igreja doméstica, ou seja, a pequena comunidade de discípulos e discípulas de Jesus que se reuniam em casas de irmãos ou irmãs. Portanto, a Igreja já estava separada do templo e distinta da  sinagoga judaica.

No evangelho que lemos hoje, Jesus nos diz que todos/as nós devemos ser como porteiros/as e guardiães da casa, ou seja, das nossas comunidades. Em nossos dias, temos também de ser guardiães da nossa casa comum, a mãe-Terra e também da casa que é a cidade e o país no qual vivemos e do qual somos cidadãos e cidadãs.

À comunidade representada pela casa e especialmente ao porteiro ou à porteira da casa, Jesus dá duas recomendações importantes: Ficar acordado/a e vigiar. São suas últimas palavras a todos/as os/ discípulos/as, antes de ir para a última ceia e depois para o jardim de Getsêmani onde se preparará na oração para enfrentar os sofrimentos da tortura e da paixão. Em Getsêmani, ele disse essas duas coisas aos discípulos de sua predileção: Pedro, Tiago e João. Vigiai e orai.

No Budismo, Buda significa justamente a pessoa que se mantém desperta. Geralmente se traduz por iluminado/a, mas é no sentido de despertado/a. No Hinduísmo, os Yoguis são pessoas, que pela meditação,  conseguem se manter sempre despertos, mesmo se em estado de quietude, de repouso físico e meditação. São pessoas permanentemente acordadas.

Na Bíblia, profetas eram considerados sentinelas na noite (Ez 3, 16) que noite e dia tomam conta das muralhas da cidade, para avisar da chegada do inimigo e para manter o Senhor acordado e Romalhe recordar as suas misericórdias (Is 62, 6- 7).  À comunidade cristã de Roma, Paulo escreve: “é hora de despertar do sono, porque, agora, a nossa salvação está mais próxima de nós do que quando abraçamos a fé” (Rm 13, 11).

O evangelho diz que o porteiro não sabe a que horas virá o Senhor, se na primeira parte da noite ou na segunda vigília ou de madrugada. É uma alusão às etapas ou horas da paixão de Jesus, isso é, a ceia e a oração no horto (primeira vigília da noite), interrogatórios e tortura (segunda vigília da noite), condenação à morte e cruz depois que o galo cantou (terceira vigília). Assim também, nas noites de nossa vida, o Senhor pode chegar no momento da ceia, no momento de nossa agonia, ou em momentos de noite ainda mais escura (perseguição e martírio). É preciso estar sempre alerta e com capacidade crítica para discernir os sinais dos tempos, ou seja, sermos capazes de interpretar os acontecimentos atuais do mundo e, através deles, conseguir escutar “o que, hoje, o Espírito diz às Igrejas e ao mundo” (Cf. Ap. 2, 5).

No tempo da comunidade de Marcos, a partir da guerra de Roma contra os judeus, o mundo tinha se transformado em um grande Getsêmani e a palavra de Jesus pede aos discípulos e discípulas que sejam capazes de discernir a realidade e manter vigilância e cuidado.

Hoje, novamente o mundo parece um grande Getsêmani de angústia e dor para tanta gente. Na noite da agonia de Jesus, conforme os evangelhos, os discípulos mostraram-se distantes e desinteressados do que estava acontecendo. Ficaram distantes, porque nunca tinham compreendido que o projeto de Jesus, isso é, a causa do reino de Deus tinha de ser realizado no serviço humilde e na cruz. Para eles, ao contrário, Jesus como Messias traria o reino divino como projeto de poder. Mesmo depois da ressurreição, mesmo depois de terem recebido o Espírito Santo, eles se organizaram em termos de ministérios de poder, o que Jesus tinha dito explicitamente para não fazer e o evangelho de Marcos é muito crítico em relação a isso.

Será que hoje, na nossa Igreja, os atuais porteiros (ministros) não continuam tão por fora do projeto de Jesus, quanto o evangelho de Marcos diz que os primeiros discípulos estavam? E nós mesmos, e eu que estou lhes escrevendo isso? Até que ponto assumimos o projeto de Deus do modo como Jesus o viveu e o propõe?

Como seria bom que, como discípulos e discípulas de Jesus, pudéssemos ajudar o mundo a viver um Advento – tempo novo de expectativa do projeto divino – como tempo de nova organização da aliança da humanidade pela paz e pela justiça eco- social.

Uma das primeiras músicas do Chico Buarque ainda nos anos 1960 se chama Pedro Pedreiro. Vocês conhecem?

Pedro pedreiro penseiro, esperando o trem

Manhã, parece, carece de esperar também

Para o bem de quem tem bem

De quem não tem vintém

Pedro pedreiro fica assim pensando

Assim pensando o tempo passa

E a gente vai ficando pra trás

Esperando, esperando, esperando

Esperando o sol

Esperando o trem

Esperando o aumento

Desde o ano passado

Para o mês que vem

 

E lá pelas tantas da canção que é longa, Chico canta:

Pedro não sabe, mas talvez no fundo

Espere alguma coisa mais linda que o mundo
Maior do que o mar, mas pra que sonhar
Se dá o desespero de esperar demais
Pedro pedreiro quer voltar atrás
Quer ser pedreiro pobre e nada mais

Sem ficar esperando, esperando, esperando
Esperando o sol, esperando o trem
Esperando o aumento para o mês que vem
Esperando um filho pra esperar também
Esperando a festa, esperando a sorte
Esperando a morte
Esperando o dia de esperar ninguém
Esperando enfim nada mais além
Da esperança aflita, bendita, infinita
Do apito de um trem

Pedro pedreiro esperando
Pedro pedreiro esperando
Pedro pedreiro, pedreiro, esperando o trem
Que já vem, que já vem
Que já vem, que já vem
Que já vem, que já vem.
Que já vem, que já vem….

 

Mesmo quando parece que Pedro Pedreiro não quer mais esperar, ele espera porque a nossa vocação é esperar e a nossa esperança não nasce apenas do nosso desejo e sim da confiança na revelação divina que nos manda esperançar e profetizar os sinais dos tempos.

Como atender aos sofrimentos de Deus

XXXIV Domingo Comum

Festa de Cristo Rei e Servidor – Mt 25, 31 – 46. 

Como responder aos sofrimentos de Deus

Neste último domingo do ano litúrgico, que a Igreja Católica continua chamando de Festa de Cristo Rei, o evangelho deste ano é Mateus 25, 31 a 46, a parábola do julgamento final. De fato, a Reforma Litúrgica de 1969 transferiu essa festa do final de outubro para o último domingo do ano litúrgico. Assim, deu a essa celebração o sentido de apontar a esperança que temos no reino de Deus que virá.  É verdade que, até hoje, grupos católicos tradicionalistas cantam e propagam o antigo hino ao Cristo Rei que tem como refrão:

Jesus Rei Deus verdadeiro

O teu Reino venha a nós

Obedeça o mundo inteiro

Ao poder de tua voz

Todo o orbe homenagens Lhe renda

Aos seus pés traga o mundo cristão

De almas livres a livre oferenda

Corações para o seu coração!

Nesses versos, o reino do Cristo é identificado com o poder da hierarquia da Igreja-Cristandade, isso que o hino chama “o mundo cristão”, que convivia muito bem com o domínio do homem sobre a mulher, o racismo estrutural, o extermínio dos povos indígenas, a escravidão das populações negras e tantas outras injustiças sociais. Infelizmente, mesmo se o mundo de hoje é decididamente mais laical e independente de religião, ainda existe em muitos setores cristãos, das mais diferentes Igrejas, o desejo de restaurar essa religião civil que tem muito de costumes religiosos e pouco do evangelho de Jesus. É nesse espírito que compreendemos a preocupação de Dom Helder Camara, quando, há mais de 55 anos, escrevia: “Jesus me compreende quando digo que não gosto da festa de hoje, nem acho que ele queria ser chamado de rei”  (53ª circular – 22/ 10/ 1964)[1].

 

A respeito da parábola lida no evangelho de hoje, dois exegetas belgas sustentam que essa parábola, do modo como está escrita, foi construída pela comunidade de Mateus. Afirmam: “Jesus nunca chamaria a si mesmo de rei nem se atribuiria o papel de juiz, que ele sempre pensou ser reservado ao Pai[2]. No entanto, é possível que o núcleo da parábola venha de Jesus e esse núcleo é a identificação de Jesus com as pessoas empobrecidas e excluídas do mundo.

Toda a espiritualidade rabínica insistia na imitação de Deus. O livro do Talmud ensina que devemos imitar Deus. E ensina que nós imitamos a Deus, quando vestimos os nus, assim como Deus vestiu Adão e Eva, quando os nossos primeiros antepassados se viram nus no paraíso. O Talmud ensina que eevemos visitar as pessoas doentes, como Deus visitou Abraão, depois que ele foi circuncidado. Do mesmo modo, assim como Deus confortou e abençoou Isaac, depois que esse perdeu o pai, temos nós também de confortar os enlutados. E devemos enterrar as pessoas falecidas, assim como Deus enterrou Moisés no monte Nebo (b. Sotah, 14ª)[3].

Nessa parábola sobre o julgamento final, Jesus assume esse modo de falar de Deus e nos revela duas coisas novas: 1º – Se queremos encontrar e nos unir a esse Deus da Bíblia, a quem Jesus chama de Paizinho, o jeito é reproduzir o seu modo de ser, no caminho da misericórdia e da solidariedade.

2º – Os sofrimentos do povo explorado e empobrecido são os sofrimentos do próprio Deus. Para Jesus, não há outro caminho de espiritualidade a não ser descobrir nos sofrimentos das pessoas empobrecidas os sofrimentos do próprio Deus.

Diante disso, então, é preciso sempre rever a nossa vida e o nosso jeito de ser, para ver o quanto estamos sensíveis e atentos a isso: o encontro com Deus não está, em primeiro lugar, no templo e no culto e sim na solidariedade amorosa com as pessoas e comunidades empobrecidas.

Na história, muitas vezes, cristãos e cristãs compreenderam essa palavra de Jesus no varejo da vida, isso é, como se ele tivesse mandado dar esmolas na porta de casa, escolher um dia da semana e visitar alguém doente no hospital e assim por diante: um Cristianismo dos atos soltos de caridade individual. Mas, essa não foi a compreensão de Jesus e da Bíblia, já que, na antiga cultura judaica, como em toda cultura originária, a dimensão comunitária sempre é a primeira e as ações individuais se situam dentro da ação coletiva.

Na Bíblia, a promessa do reino de Deus surgiu no tempo do cativeiro e se desenvolveu como forma de restituir ao povo hebreu, como povo privado da sua liberdade e da sua cidadania a esperança de recuperar a sua liberdade coletiva e a justiça libertadora, como manifestação do amor divino. Os salmos de súplica dos pobres sempre juntam o pedido de socorro individual (tem piedade de mim) com a salvação comunitária. O eu acaba sempre sendo o eu coletivo do povo de Deus. Os salmos comumente chamados de “salmos do reino” mostram que a manifestação de que Deus reina não é nenhum ato religioso. Não há nenhuma coroação. Eles descrevem que o reinado divino se expressa em novo equilíbrio e comunhão com a natureza que é aliada da humanidade. O reinado divino traz justiça libertadora e inversão das situações sociais, de modo que “Deus faz justiça às pessoas oprimidas e liberta quem é cativo. Dá pão a quem tem fome e levanta o desvalido. Reconduz migrantes à sua terra e as pessoas honradas, orienta sempre” (Sl 145).

Jesus revelou Deus no rosto das pessoas mais pobres. O evangelho mostra que Jesus assumiu e viveu isso. O reino de Deus se manifesta quando todas as pessoas são consideradas como cidadãos e cidadãs de pleno direito. A carta de cidadania do reino de Deus garante o direito das categorias mais  vulneráveis da humanidade e também o cuidado com todas as criaturas vivas e com a mãe-Terra.

No Brasil, por causa do 20 de novembro, dia do martírio de Zumbi dos Palmares, cada vez mais, os movimentos sociais têm transformado novembro em um mês da consciência negra. É importante que a luta contra o racismo e a defesa de um Brasil multi-étnico e pluricultural seja expressão de fé e do nosso testemunho do reinado divino. O evangelho de hoje pede que nos identifiquemos com o Cristo, pobre, nu, doente e prisioneiro nas estruturas perversas da sociedade em que vivemos.

[1] –  CAMARA, Dom Helder. Circulares Conciliares, Volume I – Tomo II, Recife, Ed. CEPE, 2009, p. 205.

[2] – Cf. MAERTENS, Thierry e FRISQUE, Jean, Guia da Assembleia Cristã 3, Vozes, 1970, p.47.

[3] – Cf. VERMES, Geza, O autêntico evangelho de Jesus. Ed. Record, 2006, p. 181

50 anos de Teologias da Libertação

O grupo Kairós-Nós Também Somos Igreja, promove encontros de leitura e discussão de obras de Teologia da Libertação.

A exposição estar á a acrgo de Alder Júlio Ferreira Calado, sociólogo e educador popular.

Dia 10 de novembro de 2003

Hora: 19 hs.

Acesse este link para entrar no grupo de discussão: https://chat.whatsapp.com/DBev5rPx9D5FmH47t5NkSV

Solenidade de Todos os Santos

Os Santos e as Santas – autênticos amigos de Deus – aos quais a Igreja nos convida, hoje, a dirigir nossos olhares, são homens e mulheres, que se deixaram atrair pela proposta divina, aceitando percorrer o caminho das Bem-aventuranças.

Ao final do século II, já era grande a veneração dos Santos. No início, os santos mártires, aos quais os Apóstolos foram logo assimilados, eram testemunhas oficiais da fé.

Depois das grandes perseguições do Império Romano, homens e mulheres, que viveram a vida cristã, de modo belo e heroico, começaram a tornar-se, paulatinamente, exemplos de veneração: o primeiro santo, não mártir, foi São Martinho de Tours.

Em fins do ano mil, diante do incontrolado desenvolvimento da veneração dos santos e do “comércio” em torno das suas relíquias, iniciou-se um processo de canonização, até se chegar à comprovação dos milagres.

A Solenidade de Todos os Santos começou no Oriente, no século IV. Depois, difundiu-se em datas diferentes. Em Roma, dia 13 de maio; na Inglaterra e Irlanda, a partir do século VIII, dia 1º de novembro, uma data que também foi adotada em Roma, a partir do século IX.

Esta Solenidade era celebrada no fim do Ano litúrgico, quando a Igreja mantinha seu olhar fixo ao término da vida terrena, pensando naqueles que haviam atravessado as portas do Céu.

O Evangelho deste domingo é o Evangelho das bem-aventuranças

«Vendo aquelas multidões, Jesus subiu à montanha. Sentou-se e seus discípulos aproximaram-se dele. Então, abriu a boca e lhes ensinava.

Os Santos e as Santas – autênticos amigos de Deus – aos quais a Igreja nos convida, hoje, a dirigir nossos olhares, são homens e mulheres, que se deixaram atrair pela proposta divina, aceitando percorrer o caminho das Bem-aventuranças; não porque sejam melhores ou mais intrépidos que nós, mas, simplesmente, porque “sabiam” que todos nós somos filhos de Deus e assim viveram; sentiram-se “pecadores perdoados”… Eis os verdadeiros de Santos! Eles aprenderam a conhecer-se, a canalizar suas forças para Deus, para si e para os outros, sabendo confiar sempre, nas suas fragilidades, na Misericórdia divina.

Hoje, os Santos nos animam a apontar para o alto, a olhar para longe, para a meta e o prêmio que nos aguardam; exortam-nos a não nos resignar diante das dificuldades da vida diária, pois a vida não só tem fim, mas, sobretudo, tem uma finalidade: a comunhão eterna com Deus.

Com esta Solenidade, a Igreja nos propõe os Santos, amigos de Deus e exemplos de uma vida feliz, que nos acompanham e intercedem por nós; eles nos estimulam a viver com maior intensidade esta última etapa do Ano litúrgico, sinal e símbolo do caminho da nossa vida.

Condições evangélicas

Trata-se de percorrer o caminho, ou melhor, as nove condições traçadas por Jesus e indicadas no Evangelho: as Bem-aventuranças!

“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus…”: o ponto forte não é tanto ser “bem-aventurado”, mas o “porquê”. Uma pessoa não é “bem-aventurada” porque é “pobre”, mas porque, como pobre, tem a condição privilegiada de entrar no Reino dos Céus.

A mesma coisa acontece com as outras oito condições: “Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados! Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra! Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados! Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia! Bem-aventurados os puros de coração, porque verão Deus! Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus! Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus! Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem… Alegrai-vos, porque será grande a vossa recompensa nos Céus”.

A explicação de tudo encontra-se naquele “porquê”, pois revela onde os mansos encontrarão confiança, onde os pacíficos encontrarão alegria… Logo, “bem-aventurados”, não deve ser entendido como uma simples emoção, se bem que importante, mas como um auspício para se reerguer, não desanimar, não desistir e seguir em frente… pois Deus está conosco.

A questão, portanto, consiste em ver Deus, estar da sua parte, ser objeto das suas atenções; contemplar Deus, não no paraíso, mas, aqui e agora.

Enfim, eis o caminho que devemos percorrer para participar também da alegria indicada pelo Apocalipse, que todos nós podemos conseguir: “Caríssimos, considerai com que amor nos amou o Pai, para que sejamos chamados filhos de Deus. E nós o somos de fato… desde agora somos filhos de Deus, mas não se manifestou ainda o que havemos de ser” ”(1 Jo 3,1-2). Nós, diz o refrão do Salmo, em resposta à primeira leitura da Carta de João: “Somos a geração que busca a face do Senhor”. Não porque somos melhores que os outros, mas porque Deus quis assim.

Fonte: Vatican News

O que aprender de Thomas Muntzer, 500 anos após seu martírio?

Assista esta live que o grupo Kairós-Nós Também Somos Igreja, realizará como parte das suas atividades formativas permanentes.

A exposição estará a cargo de Alder Julio Ferreira Calado, e será transmitida pelo canal do grupo Kairós no YouTube.

Dia 6 de novembro às 19 hs.

Refletir, conhecer a história, a filosofia e a sociologia, são imprescindíveis para significar a vida!