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Palavras ao receber da Câmara Municipal do Recife o título de Cidadão honorário da cidade

Minhas palavras ao receber da Câmara Municipal de Recife o título de Cidadão honorário da cidade:

Recife, 26 de setembro de 2023

 

Queridas irmãs, queridos irmãos,

 

Talvez alguém possa dizer que esse tipo de cerimônia é mera  formalidade social. De fato, é ato simbólico e como tal é importante. É, antes de tudo, sinal de amizade e carinho por parte dessa Câmara Municipal que, a partir da proposta da querida amiga e vereadora Liana Cirne, me oferece esse título de cidadão honorário do Recife. Fico comovido com esse gesto de Liana e de todos vocês e só posso agradecer. Presente de amizade é gratuito. Nem precisamos ter certeza de merecê-lo. Trata-se apenas de receber, curtir e agradecer. Essa é minha primeira reação: agradecer comovido. E renovar o meu compromisso de exercer essa cidadania que me é oferecida no trabalho e na luta, para que todas as pessoas que moram nessa cidade possam ser reconhecidas como cidadãs de pleno direito.

 

Aí vem um segundo sentido simbólico. Cidadania é essencialmente termo coletivo. Não tem sentido ser cidadão sozinho. Os planetas de um só homem só existem no Pequeno Príncipe do St Exupery e para serem criticados como não reais. Nenhum ser humano é uma ilha. Cidadania só pode ser vivida na relação e naquilo que, na encíclica Fratelli Tutti, o papa Francisco chama de “amizade social”.

Comumente, as câmaras municipais dão títulos como esse a empresários poderosos que investem na cidade, a autoridades sociais e políticas ou religiosas, que influenciam na organização da sociedade. Eu sou apenas um monge, filho de família de operários de fábrica de Camaragibe e que está chegando quase aos 80 anos com apenas uma conquista: boa rede de amizade e a teimosia de propor um mutirão da profecia e da esperança. E o único título de honra do qual não abro mão é o de irmão e companheiro, que assessora movimentos populares como o MST, acompanha comunidades indígenas e negras, assim como pastorais sociais e comunidades eclesiais de base.

 

Nesse mesmo auditório, há mais de 55 anos no dia 11 de setembro de 1967, nosso querido profeta e saudoso mestre Dom Helder Camara recebia dessa Câmara esse mesmo título. Naquela ocasião, ele pronunciava um discurso, no qual se propunha a fazer balanço e prestação de contas do seu trabalho na arquidiocese de Olinda e Recife, em seus então três anos e meio de pastoreio. (O discurso que pronunciou naquela ocasião está escrito na 291ª circular e publicado no tomo I do Volume IV das Circulares – Circulares pós-conciliares).

Nesse discurso, feito aqui na Câmara, Dom Helder dizia que tinha consciência de que muitos o criticavam por parecer mais líder social do que religioso. E explicava que era a própria espiritualidade e o seguimento de Jesus que o faziam assumir as causas sociais e a consagrar a vida à transformação do mundo.

 

Hoje, 56 anos depois, invoco a herança que eu e vocês aqui do Recife recebemos de Dom Helder como pastor e me coloco como alguém que busca sempre recordar às Igrejas cristãs, às diversas religiões  e à sociedade que a fé e a espiritualidade só podem ser vividas de forma profunda no compromisso social e político a serviço das comunidades mais empobrecidas e excluídas dos seus direitos de cidadania.

Que esse nosso encontro na casa de José Mariano e sob o seu patrocínio, possa fortalecer o papel que a Câmara Municipal pode exercer na promoção da cidadania, dos direitos dos cidadãos e cidadãs,  na parceria do poder publico com cidadãs e cidadãos comprometidos com as causas que atualizam a luta de José Mariano contra a escravidão e pela integração social de todos e todas na plena cidadania da nossa cidade.

Exatamente por isso, ao receber esse título tão importante que, hoje, vocês me dão, peço que simbolicamente sejam inscritos nesse título, como cidadãos honorários, como eu, os nomes dos irmãos e irmãs da imensa multidão, a qual são negados todos os direitos, como o da cidadania. E entre esses, crucificados do mundo, há os companheiros e companheiras, militantes do povo organizado, com os quais, desde minha juventude, em nome de Jesus, consagro minha vida e minha esperança: os irmãos e irmãs do MST, aqui representados pelo grupo que veio me presentear com sua participação e ao qual me junto na luta pela Reforma Agrária e pela justiça no campo.

Recebo esse título, porque confio que vocês aceitem que eu o partilhe, simbolicamente, com nossos irmãos e irmãs indígenas que vivem nessa cidade e que estão aqui representados pela Cacica Kyalonan e o Pajé Juruna do povo Karaxu Wanassu. Essa comunidade originária está reunida na ocupação heróica em Monjope, que se situa em Igarassu, fora do município do Recife, mas acolhe irmãos e irmãs indígenas que viviam pelas ruas da nossa cidade, sem nenhum reconhecimento de seus direitos humanos e comunitários.

Também partilho esse título, especialmente com as comunidades negras com suas culturas e suas expressões religiosas. Como cristão, agradeço a Deus os 115 anos de vida da Umbanda em nossas terras e reverencio em nome de todos os irmãos e irmãs da Umbanda, do Candomblé e da Jurema Sagrada os irmãos e irmãs que vieram aqui para essa cerimônia.

E em nossas cidades se começam a reconhecer os direitos da natureza, os direitos da Mãe-Terra e os direitos dos rios e das matas. Desde 2018, o município de Bonito, aqui em Pernambuco, é o primeiro do país a reconhecer o Direito da Natureza, direito do rio Bonito,  de suas cachoeiras e serras. Imaginem se essa Câmara puder levar à frente essa discussão no Recife com relação aos rios Capibaribe, Beberibe e Tejipió…

Será também que a cidadania pode tomar a fisionomia humana da nossa cidade que tem imensa multidão de filhos e filhas ainda nas ruas e nas calçadas de dezenas de prédios e edifícios abandonados e muitos deles em direção à ruína? Que alegria termos aqui nossa irmã Karina, representando a Pastoral do povo da rua.

 

Só podemos agradecer à prefeitura do Recife a criação do RECENTRO com o seu programa de revitalização do centro de nossa cidade. Ficamos contentes em saber desse programa e o acolhemos com confiança. Esperamos que, mesmo se as soluções que tocam as estruturas nunca são imediatas, quem tem fome não pode guardar o estômago para amanhã. Recife precisa do nosso cuidado hoje e agora. Sem dúvida, as pessoas responsáveis pelo programa RECENTRO e a prefeitura sabem que o centro da nossa cidade nunca será verdadeiramente revitalizado apenas a partir de projetos de grandes redes hoteleiras e investimentos privados de corporações que são as mesmas que provocaram o seu esvaziamento.

A cidade de Havana em Cuba tornou o seu centro histórico restaurado exemplo de revitalização para o mundo todo porque devolveu o centro a moradores e moradoras comuns e até pobres. E no convívio das famílias e da vizinhança a cidade ressuscita. Que os retratos fantasmas que o cineasta nosso conterrâneo Kleber Mendonça Filho está levando em seu filme para o Óscar desse ano possa deixar de ser verdade e ele não precise fazer um segundo filme: retratos do Recife Zumbi. (Pior que os fantasmas que só assustam, os zumbis matam e mutilam as pessoas e a vida).

Se a cidadania é comunitária, demo-nos as mãos e unamos nossos corações para sermos, em nossa cidade, promotores de cidadania, ao mesmo tempo recifense e planetária.

Somos cidadãos do Recife, se garantimos que a nossa cidade continua merecedora dos lindos poemas de gigantes como Manuel Bandeira, Antônio Maria, Ascênsio Ferreira, Carlos Pena Filho e outros importantes. Hoje, temos os poemas da querida Cida Pedrosa e muitos poetas e poetisas de periferia que precisamos valorizar.

E como poesia é arte de dar beleza à vida, faço aqui menção de dois recifenses ilustres:  a nossa querida irmã e amiga Dona Leda Alves, que como secretária de cultura da cidade, fez tanto pela nossa cidade. E, claro, nosso grande Paulo Freire.

Comumente, o recifense Paulo Freire é reconhecido pelo mundo inteiro como educador e pensador da vida. É menos conhecido como poeta. Eu me identifico muito com um poema que ele fez, em 1969, quando estava no exílio no Chile. Quero concluir essa minha fala com esse poema que Paulo Freire dedicou à nossa cidade do Recife e que parece celebração litúrgica na qual envolvo vocês todos e todas comigo:

 

Recife Sempre,  

poema de Paulo Freire

Cidade bonita, cidade discreta

Difícil cidade, cidade mulher.

Nunca te dás de uma vez.

Só aos pouquinhos te entregas

Hoje um olhar, amanhã um sorriso.

Cidade manhosa, cidade mulher.

Podias chamar-te Maria, Maria da Graça

Maria da Penha, Maria Betânia, Maria Dolores.

 

De Santiago te escrevo, Recife,

Para falar de ti a ti,

Para dizer-te que te quero

Profundamente, que te quero.

Cinco anos faz que te deixei –

Manhã cedo – tinha medo de olhar-te,

Tinha medo de ferir-te

Tinha medo de magoar-te.

Manhã cedo – palavras não dizia.

Como dizer palavra se partia?

 

Tinha medo de ouvir-me,

Tinha medo de olhar-me,

Tinha medo de ferir-me,

Manhã cedo – as ruas atravessando

O aeroporto se aproximando,

O momento exato chegando,

Mil lembranças de ti me tomando

No meu silêncio necessário.

 

De Santiago te escrevo,

Para falar de ti a ti,

Para dizer-te de minha saudade, Recife,

Saudade mansa – paciente saudade,

Saudade bem-comportada.

 

Recife, sempre Recife,

de ruas de nomes tão doces,

Rua da União, que Manuel Bandeira tinha “medo que

se passasse a chamar rua Fulano de tal”

e que hoje eu temo que venha a se chamar

Rua Coronel Fulano de Tal.

 

Rua das ceroulas, Rua da Aurora

Rua da amizade, Rua dos Sete Pecados.

Recife sempre.

Teus homens do povo, queimados do sol

gritando nas ruas, ritmadamente:

Chora menino pra comprar pitomba! (…)

 

Doce de banana e goiaba!

Faz tanto tempo!

 

Para nós, meninos da mesma rua,

aquele homem que andava apressado

quase correndo – gritando, gritando:

Doce e banana e goiaba!

Aquele homem era um brinquedo também.

Doce de banana e goiaba!

Em cada esquina, um de nós dizia:

Quero banana, doce de banana!

Sorrindo já com a resposta que viria.

Sem parar, sem olhar para trás,

sem olhar para o lado,

apressado, quase correndo,

o homem-brinquedo assim respondia:

“Só tenho goiaba

– Grito banana porque é meu hábito”.

Doce de banana e goiaba!

Doce de banana e goiaba!

Continuava gritando,

andando apressado, sem olhar para trás,

sem olhar para o lado, o nosso homem-brinquedo.

 

Foi preciso que o tempo passasse,

que muitas chuvas chovessem,

que muito sol se pusesse,

que muitas marés subissem e baixassem,

que muitos meninos nascessem,

que muitos homens morressem,

que muitas madrugadas viessem,

que muitas árvores florescessem,

que muitas Marias amassem,

que muito campo secasse,

que muita dor existisse,

que muitos olhos tristonhos eu visse,

para que entendesse

que aquele homem-brinquedo

era o irmão esmagado

era o irmão explorado

era o irmão ofendido

o irmão oprimido

proibido de ser.

 

Recife, onde tive fome

Onde tive dor

Sem saber por que

Onde hoje ainda

Milhares de Paulos

Sem saber por que

Têm a mesma fome

Têm a mesma dor,

Raiva de ti não posso ter.

 

No ventre ainda, ajudando a mãe

a pedir esmolas, a receber migalhas.

Pior ainda: a receber descaso de olhares frios.

Recife, raiva de ti não posso ter.

 

Recife, cidade minha,

Já homem feito, teus cárceres experimentei.

Neles, fui objeto, Fui coisa, Fui estranheza.

Quarta feira. 4 horas da tarde.

O portão de ferro se abria.

Hoje é dia de visita. Sem fila.

 

Recife, cidade minha,

Em ti vivi infância triste

Adolescência amarga em ti vivi.

Não me entendem, se não te entendem

Minha gulodice de amor

Minhas esperanças de lutar

Minha confiança nos homens

Tudo isto se forjou em ti

Na infância triste, na adolescência amarga

O que penso, o que digo

O que escrevo, o que faço

Tudo está marcado por ti.

 

Sou ainda o menino

que teve fome, que teve dor

Sem saber porque,

só uma diferença existe

entre o menino de ontem

e o menino de hoje, que ainda sou:

Sei agora por que tive fome

Agora eu sei por que tive dor.

 

Recife, cidade minha.

Se alguém me ama, que a ti me ame

Se alguém me quer, que a ti te queira.

Se alguém me busca, que em ti me encontre

Nas tuas noites, nos teus dias

Nas tuas ruas, nos teus rios

No teu mar, no teu sol

Na tua gente, no teu calor

Nos teus morros, nos teus córregos

Na tua inquietação, no teu silêncio

Na amorosidade de quem lutou e de quem luta.

De quem se expôs e de quem se expõe

De quem morreu e de quem pode morrer

Buscando apenas, cada vez mais,

Que menos meninos tenham fome e tenham dor

Sem saber por que.

Por isto disse: Não me entendem se não te entendem.

O que penso,  que digo,

O que escrevo, o que faço,

tudo está marcado por ti.

Recife, cidade minha,

Te quero muito, te quero muito.  (Santiago, fevereiro de 1969).

O Papa: “Marselha acolhe, é uma mensagem para a Europa”

Por Matteo Bruni

Francisco em diálogo com jornalistas no voo de regresso da França: “As migrações bem conduzidas são um tesouro”. As palavras sobre a eutanásia: “Cuidado com as colonizações ideológicas que arruínam a vida humana”. Ucrânia: “Não devemos brincar com o martírio desse povo”

Boa noite Santidade, boa noite a todos. Obrigado por reservar esse tempo no voo de volta. Foi uma viagem particular, em que pode sentir também, como dizia sua Eminência, todo o afeto dos franceses que foram rezar com o senhor. Mas creio que ainda existem algumas perguntas ou questões que os jornalistas queriam fazer-lhe. Ou o senhor queria nos dizer algumas palavras.

Papa Francisco

Boa noite e muito obrigado pelo seu trabalho. Antes que me esqueça, quero dizer duas coisas. Hoje acredito que seja o último voo do Roberto Bellino porque ele está se aposentando (aplausos). Obrigado obrigado obrigado. A segunda coisa é que hoje é aniversário do Rino, o inefável Rino (aplausos). Existe a claque. Agora, por favor, façam as perguntas.

Raphaelle Schapira (France Televisions)

Santo Padre, boa noite. O senhor começou seu pontificado em Lampedusa, denunciando a indiferença. Dez anos depois, continua pedindo à Europa que demonstre solidariedade. E vem repetindo a mesma mensagem há dez anos. Isso significa que o senhor falhou?

Papa Francisco

Eu diria que não. Eu diria que o progresso tem sido lento. Hoje, há consciência do problema da migração. Há consciência. E também existe a consciência de que o problema chegou a um ponto… como uma batata quente que você não sabe como segurá-la. Angela Merkel disse uma vez que o problema é resolvido indo à África e resolvendo-o na África, elevando o nível dos povos africanos. Mas há casos que são difíceis. Casos muito difíceis. Em que migrantes são enviados como “pingue-pongue”. E sabe-se que muitas vezes eles acabam em “campos de concentração”, acabam em situações piores do que estavam antes. Eu acompanhei a vida de um rapaz, Mahmoud, que estava tentando sair porque precisava, e no final ele se enforcou; ele não suportou essa tortura. Eu já lhes disse para lerem esse livro: Irmãzinho, ou “Hermanito“. As pessoas que retornam são primeiro vendidas. Depois, tiram-lhes dinheiro. Em seguida, obrigam-nas a ligar para a família para enviar mais dinheiro. Mas são pessoas pobres. É uma vida terrível. Ouvi uma pessoa que testemunhou, quando à noite, ao embarcar, viu um navio tão simples, sem segurança, e não quis embarcar. E… “pum pum” (barulho como de tiros). Fim da história. É o reino do terror! Eles sofrem não apenas porque precisam sair, mas porque lá é o reino do terror. Eles são escravos. E não podemos, sem ver a realidade, enviá-los de volta como uma bola de “pingue-pongue”. Não. É por isso que continuo dizendo que, em princípio, os migrantes devem ser bem-vindos, acompanhados, promovidos e integrados. Se você não puder integrá-los em seu país, então acompanhe-os e integre-os em seu próprio país, mas não os deixe nas mãos dessas pessoas cruéis do tráfico de pessoas. O problema com os migrantes é o seguinte: nós os enviamos de volta e eles caem nas mãos desses infelizes que fazem tanta maldade. Eles os vendem, eles os exploram. As pessoas tentam sair. Há alguns grupos que se dedicam a resgatar pessoas com barcos no mar. Convidei um deles para participar od Sínodo, que é o líder da “Mediterranea Saving Humans”. Eles nos contam histórias terríveis. Em minha primeira viagem, como a senhora disse, foi a Lampedusa. As coisas melhoraram. Realmente melhoraram. Há mais conscientização. Naquela época, nós não sabíamos. E também não nos diziam a verdade. Lembro que havia uma recepcionista na Casa Santa Marta, que era etíope, filha de etíopes. E ela estava acompanhando minha viagem pela TV. E durante a minha viagem havia um etíope, um pobre etíope, me explicando a tortura e outras realidades. E o tradutor – ela me disse – dizia mentiras, ele amenizava a situação. É difícil ter confiança. São inúmeros dramas. Naquele dia em que eu estava em Lampedusa me disseram: olhe para aquela mulher, era uma médica. Ela foi para o meio dos cadáveres, olhando os rostos das pessoas, porque estava procurando a filha, que ainda não tinha encontrado. Esses dramas… é bom que os tomemos em nossas mãos. Isso nos tornará mais humanos e, portanto, também mais divinos. É um chamado. Eu gostaria que fosse como um grito. Vamos estar mais atentos. Devemos fazer alguma coisa. A consciência mudou. Realmente mudou. Hoje há mais consciência. Não porque eu tenha me manifestado, mas porque as pessoas perceberam o problema, e muitos estão falando sobre isso. E essa foi minha primeira viagem. Quero dizer mais uma coisa pessoal, eu nem sabia onde ficava Lampedusa, nem isso. Mas ouvi as histórias. Li algo e, em oração, senti que precisava ir até lá. Como se o Senhor estivesse me enviando para lá, em minha primeira viagem.

Clemónt-Melki (AFP)

Boa tarde, Santo Padre. Esta manhã, o senhor encontrou Emmanuel Macron depois de ter expresso o seu desacordo em relação à eutanásia. O governo francês está se preparando para aprovar uma controversa lei sobre o fim da vida. Poderia gentilmente nos dizer o que disse ao presidente francês em relação a isso? E se pensa fazê-lo mudar de ideiaObrigado!

Papa Francisco

Hoje não falamos sobre esse tema, mas falamos sobre isso na outra visita, quando nos encontramos, eu falei claramente. Quando ele veio ao Vaticano. Eu dei o meu parecer claro: com a vida não se brinca, nem no início nem no fim, não se brinca! E não o meu parecer, é custodiar a vida, sabe, porque depois acabará com aquela política de “não dor”, de uma eutanásia humanística. Sobre isso quero repetir, um livro – leiam-no – é de 1903, é um romance. Se chama “O senhor do mundo”, The Lord of the World ou The Lord of the Earth (tem dois títulos), escrito por Robert Benson, o autor, é um escritor futurista [romance de ficção científica distópico escrito por Robert Hugh Benson em 1907 que se centra no reino do Anticristo e no Fim do Mundo – ndr ]. Ele mostra como as coisas serão no final. E são tiradas todas as diferenças, todas, e também são tiradas as dores, tudo, e a eutanásia é uma dessas coisas, a morte doce, a seleção antes do nascimento,  como esse homem havia visto os conflitos atuais. Hoje, estejamos atentos com as colonizações ideológicas, que arruínam a vida humana, porque vão contra a vida humana. Hoje se cancela a vida dos avós, por exemplo, quando a riqueza humana vai no diálogo dos netos com os avós, se cancela, são velhos, não servem. Com a vida não se brinca. Desta vez não falei com o presidente, mas da outra vez sim, quando veio, eu dei o meu parecer, com a vida não se brinca, seja a lei de não deixar que cresça a criança no ventre da mãe, a lei da eutanásia, nas doenças, na velhice. Não digo que é uma coisa de fé, é uma coisa humana, humana, há a má compaixão. A ciência chegou a fazer com que cada doença dolorosa seja menos dolorosa, e a acompanha com tantos remédios. Mas com a vida não se brinca!

MARTÍNEZ BROCAL OGÁYAR Javier – ABC

Santo Padre, obrigado por responde às perguntas, por este tempo que nos dedica nesta viagem muito intensa, densa de conteúdos. Até o último momento o senhor falou da Ucrânia e o cardeal Zuppi acaba de voltar de Pequim. Houve progressos nesta missão? Pelo menos na questão humanitária do regresso das crianças? Depois, uma pergunta um pouco dura: como vive o fato, inclusive pessoalmente, de que esta missão não consegue obter nenhum resultado concreto até agora? O senhor, em uma audiência, falou de frustração. Sente frustração? Obrigado

Papa Francisco

Isto é verdade, um pouco de frustração se sente, porque a Secretaria de Estado está fazendo de tudo para ajudar nisto, também a “missão Zuppi” foi lá, há algo com as crianças que está indo bem, mas me vem em mente que esta guerra vai além do problema russo -ucraniano, mas é para vender armas, o comércio de armas. Dizia um economista alguns meses atrás que hoje os investimentos que dão mais lucro são as fábricas de armas, certamente fábricas de morte! O povo ucraniano é um povo mártir, tem uma história muito martirizada, uma história que faz sofrer, e não é a primeira vez: no tempo de Stalin, sofreu muito, muito, muito, é um povo mártir. Mas nós não devemos brincar com o martírio deste povo, devemos ajudá-los a resolver as coisas no modo mais real possível. Nas guerras, o real é possível, não para fazer ilusões: que amanhã os dois líderes em guerra vão comer juntos, mas até o possível, onde chegaremos para fazer o possível. Agora vi que algum país se retrai, que não dá armas, e começa um processo onde o mártir será o povo ucraniano certamente. E isso é algo ruim!
Você mudou de tema, e por isso gostaria de voltar ao primeiro argumento, à viagem. Marselha é uma civilização de tantas culturas, muitas culturas, é um porto de migrantes. No passado eram migrantes rumo a Cayenne, de lá saiam os condenados à prisão. O arcebispo [de Marselha, ndr] me presentou Manon Lescaut para me lembrar daquela história. Mas Marselha é uma cultura do encontro! Ontem, no encontro com os representantes de várias confissões – convivem islâmicos, judeus, cristãos -, mas existe a convivência, é uma cultura da ajuda. Marselha é um mosaico criativo, é esta cultura da criatividade. Um porto que é uma mensagem à Europa: Marselha acolhe. Acolhe e faz uma síntese sem negar a identidade dos povos. Devemos repensar este problema para outros lugares: a capacidade de acolher. Voltando aos migrantes, são cinco as pequenas cidades que sofrem a presença de muitos migrantes, mas em alguns delas quase não há população, penso num caso concreto que conheço onde moram menos de 20 idosos e nada mais. Por favor, que esses povos façam o esforço para integrar. Precisamos de mão de obra, a Europa necessita. As migrações bem conduzidas são uma riqueza, são uma riqueza. Pensemos nesta política migratória para que seja mais fecunda e nos ajude muito.

Agora tem a janta e também a festa para Rino [Anastasio coordenador da Alitalia-ITA Airways das viagens papais, ndr] e a despedida de Roberto. Vamos parar por aqui. Muito obrigado pelo trabalho de vocês e por suas perguntas.

Confira a coletiva.
Fonte: Vatican News

Papa recebe o prêmio Zilda Arns

Por Thulio Fonseca

Francisco recebeu uma homenagem da Comissão do Idoso da Câmara dos Deputados (CIDOSO), o Prêmio Zilda Arns, em reconhecimento pelo seu notável trabalho em defesa dos anciãos. Os membros da comissão também entregaram ao Papa uma carta destacando a importância da ratificação da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos.

O encontro do Papa Francisco com a Comissão do Idoso da Câmara dos Deputados (CIDOSO) ocorreu antes da audiência geral desta quarta-feira (20). Durante aproximadamente 30 minutos, o Santo Padre recebeu um grupo de Deputados Federais que fazem parte dessa comissão e vieram ao Vaticano para entregar ao Papa o Prêmio Zilda Arns.

Os membros do parlamento brasileiro, que representam a comissão voltada para os idosos, foram recebidos na antesala da Sala Paulo VI, e puderam apresentar ao Papa os trabalhos que realizam e discutir assuntos relacionados à necessidade de mais respeito pelas pessoas mais simples, o combate às desigualdades e o cuidado com os idosos. O presidente da comissão, o deputado federal Aliel Machado Bark, afirmou que o Pontífice mostrou muito entusiasmo com a visita e refletiu com eles sobre a vida e os desafios do mundo em que vivemos.

Além do presidente Aliel, foram recebidos pelo Santo Padre os demais membros: José Dias de Castro Neto, Reimont Luiz Otoni Santa Bárbara, José Haroldo Figueiredo Campo, Leandre dal Ponte, Flávia Carreiro Albuquerque Morais e Simone Aparecida Curraladas dos Santos.

Prêmio Zilda Arns

O Santo Padre foi homenageado pela CIDOSO com o Prêmio Zilda Arns. A indicação do Papa partiu do presidente da comissão, e a votação para validar a escolha ocorreu no dia 22 de agosto deste ano. A escolha de homenagear Francisco evidencia o trabalho de enorme relevância mundial em defesa dos idosos que o Pontífice realiza.

O prêmio Zilda Arns é uma forma de reconhecimento às pessoas e instituições que contribuíram ou têm contribuído ativamente na defesa dos direitos das pessoas idosas. O prêmio consiste em um diploma de menção honrosa, concedido anualmente a até cinco homenageados. Seu nome homenageia a Dra. Zilda Arns Neumann, médica pediatra que atuou em causas humanitárias e sanitárias, uma das fundadoras da Pastoral da Criança e da Pastoral da Pessoa Idosa. Conselheira no Conselho Nacional de Saúde, Zilda Arns também trabalhou no Ministério da Saúde.

No final do encontro, eles puderam entregar a homenagem ao Santo Padre e também oferecer-lhe presentes que trouxeram do Brasil. O Papa Francisco presenteou os membros da comissão com um rosário, uma medalha pontifícia e o livro sobre a Statio Orbis de 27 de março de 2020, editado pelo LEV.

Foto: O Papa em recebe em audiência os membros da Comissão do Idoso da Câmara dos Deputados

Fonte: Vatican News

O Papa: o ecumenismo pastoral é o caminho natural para a plena unidade

Por Mariangela Jaguraba

Francisco recebeu em audiência Baselios Marthoma Mathews III, Catholicos da Igreja Ortodoxa Siro-Malankar, pela primeira vez no Vaticano desde a sua eleição em 2021. Em seu discurso, o Pontífice enalteceu o trabalho do “ecumenismo pastoral” traduzido em acordos e decisões comuns. Recordou que um delegado da Igreja Ortodoxa Siro-Malankar participará da próxima Assembleia do Sínodo dos Bispos.

O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta segunda-feira (11/09), no Vaticano, Sua Santidade Baselios Marthoma Mathews III, Catholicos do Oriente e Metropolita da Igreja Ortodoxa Siro-Malankar, e sua comitiva.

Francisco agradeceu a Deus “pelos laços criados nas últimas décadas”. “A aproximação de nossas Igrejas, após séculos de separação, começou com o Concílio Vaticano II, ao qual a Igreja Ortodoxa Siro-Malankar enviou alguns observadores. Naquele mesmo período, São Paulo VI se encontrou com o Catholicos Baselios Augen I, em Bombaim, em 1964. Agora, sua vinda aqui ocorre no quadragésimo aniversário da primeira visita a Roma de um Catholicos de sua querida Igreja, realizada, em 1983, por Sua Santidade Baselios Marthoma Mathews I, a quem três anos depois São João Paulo II visitou na Catedral de Mar Elias, em Kottayam”, disse ainda o Papa. “Este ano também marca o 10º aniversário do abraço fraterno com seu predecessor imediato, Sua Santidade Baselios Marthoma Paulose II, de abençoada memória, que tive a alegria de receber no início do meu pontificado, em setembro de 2013”, sublinhou Francisco.

Caminhar juntos

A seguir, o Santo Padre saudou “fraternalmente os bispos, o clero e os fiéis da Igreja Ortodoxa Siro-Malankar, cujas origens remontam à pregação do Apóstolo Tomé”. Francisco deseja que as duas Igrejas celebrem juntas o aniversário de 1700 anos do primeiro Concílio Ecumênico, o de Nicéia.

“Agora, as divisões que ocorreram ao longo da história entre nós, cristãos, são lacerações dolorosas infligidas ao Corpo de Cristo, que é a Igreja. Ainda sentimos as consequências. Mas, se juntos colocarmos a mão nessas feridas, se juntos, como o Apóstolo, proclamarmos que Jesus é nosso Senhor e nosso Deus, se com um coração humilde nos confiarmos à sua graça, poderemos apressar o tão esperado dia em que, com sua ajuda, celebraremos o mistério pascal no mesmo altar. E que chegue logo!”

Enquanto isso, querido irmão, caminhemos juntos na oração que nos purifica, na caridade que nos une, no diálogo que nos aproxima“, disse ainda o Papa. “Penso de modo especial na criação da Comissão Mista Internacional para o diálogo entre nossas Igrejas, que levou a um acordo cristológico histórico, publicado no Pentecostes de 1990”, sublinhou o Papa. Segundo Francisco, “trata-se de uma Declaração Conjunta, que afirma que o conteúdo de nossa fé no mistério do Verbo Encarnado é o mesmo, embora tenham surgido diferenças de terminologia e ênfase na formulação ao longo da história. De forma admirável, o documento declara que «essas diferenças são tais que podem coexistir na mesma comunhão e, portanto, não nos dividem nem devem nos dividir, especialmente quando anunciamos Cristo aos nossos irmãos e irmãs em todo o mundo em termos que podem ser facilmente compreendidos». Anunciar Cristo une, não divide; o anúncio comum de nosso Senhor evangeliza o próprio caminho ecumênico”.

Ecumenismo pastoral

Segundo o Papa, “a partir da Declaração Conjunta, a Comissão reuniu-se quase todos os anos em Kerala e deu frutos, promovendo a colaboração pastoral para o bem espiritual do Povo de Deus”. Francisco recordou “com gratidão os acordos de 2010 sobre o uso comum de locais de culto e cemitérios, bem como sobre a possibilidade de os fiéis receberem a unção dos enfermos, em determinadas circunstâncias, numa ou noutra Igreja. Este é um bom acordo”.

“Louvo a Deus pelo trabalho desta Comissão, focado sobretudo na vida pastoral, porque o ecumenismo pastoral é o caminho natural para a plena unidade. Como tive oportunidade de dizer à Comissão Mista Internacional para o Diálogo Teológico entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas Orientais, da qual a sua Igreja também é membro desde o início, desde 2003, «o ecumenismo tem sempre um caráter pastoral».”

De fato, é avançando fraternalmente no anúncio do Evangelho e no cuidado concreto dos fiéis que nos reconhecemos como um único rebanho de Cristo a caminho. Nesse sentido, espero que os acordos pastorais entre nossas Igrejas, que compartilham a mesma herança apostólica, possam se estender e aumentar, especialmente em contextos em que os fiéis se encontram em situação de minoria ou diáspora. Alegro-me também pela sua participação ativa nas visitas de estudo para jovens sacerdotes e monges, organizadas anualmente pelo Dicastério para a Promoção da Unidade dos Cristãos, visitas que contribuem para uma melhor compreensão entre os pastores. E isso é muito importante.

Sinodalidade e ecumenismo

“Em nosso caminho para a unidade plena, outro caminho importante é o da sinodalidade”, disse o Papa, manifestando satisfação com o fato de que um delegado fraterno da Igreja Ortodoxa Siro-Malankar participará da próxima sessão da Assembleia do Sínodo dos Bispos. “Estou convencido de que podemos aprender muito com a experiência sinodal secular de sua Igreja. De certa forma, o movimento ecumênico está contribuindo para o processo sinodal em andamento da Igreja Católica, e espero que o processo sinodal possa, por sua vez, contribuir ao movimento ecumênico. Sinodalidade e ecumenismo são, de fato, dois caminhos que seguem juntos, partilhando o mesmo objetivo, o da comunhão, que significa um melhor testemunho dos cristãos «para que o mundo creia». E não nos esqueçamos – e digo isso aos católicos – que o protagonista do Sínodo é o Espírito Santo, não nós”, sublinhou o Papa.

“Que a contemplação comum do Senhor crucificado e ressuscitado favoreça a cura completa das nossas feridas passadas, para que diante dos nossos olhos, além de toda distância e incompreensão, Ele se destaque, “nosso Senhor e nosso Deus”, Senhor e Deus, que nos chama a reconhecê-lo e adorá-lo em torno de um único altar eucarístico. Que isso aconteça logo”, concluiu Francisco.

Fonte: Vatican News

Grito dos Excluídos e Excluídas/ 2023: Promover a vida e a libertação 

Em todo o Brasil, especialmente nas principais cidades, têm lugar, no próximo dia 07/09, a 29ª edição do Grito dos excluídos e excluídas, expressão prática que tem sua origem nas Semanas Sociais organizadas pela CNBB, entre 1993 e 1994.

Desde 1995, o Grito dos excluídos e excluídas vem acontecendo, protagonizado, no início pela CNBB, bem como por outras Igrejas cristãs componentes do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic) e, em seguida, também por diversas organizações de base de nossa sociedades civil (Associações, Sindicatos de Trabalhadores, Movimentos Populares…).

O tema desta 29ª Edição do Grito dos excluídos e excluídas é “A Vida em Primeiro Lugar” com sub-tema questionando: “Você tem fome e sede de quê?” inspirados e inspiradas pelo tema e subtema, o Grito costuma ser organizado e preparado, ao longo de meses, por diversas equipes de militantes e coordenadores eclesiais e da sociedade civil, munidos de materiais de reflexão crítica sobre os grandes desafios da atualidade, bem como da formação de equipes setoriais encarregadas de preparar blocos temáticos, faixas e cartazes, equipes de animação, de divulgação, de programação do Ato, de custeio, etc.

Em João Pessoa, por exemplo, o Grito dos excluídos e excluídas, em todas as suas edições, tem acontecido, graças ao compromisso de militantes eclesiais e de outras organizações populares e movimentos sociais, cujos representantes começam os preparativos, alguns meses antes do dia. Nas primeiras edições do Grito, ora na Cúria, ora no Mosteiro de São Bento, com o relevante suporte pastoral de Bispos como Dom José Maria Pires e Dom Marcelo Pinto Carvalheira, e graças a contribuição das Pastorais Sociais, o Grito dos excluídos e excluídas, seja no dia 07 de Setembro ou em alguns dias antes, se fazia com um grande número de participantes, a marcharem pelas ruas do centro da Cidade, com carro de som e muita animação, dando o seu recado, apresentando suas denúncias e suas aspirações. Nessas ocasiões é sempre lembrada a figura de Ricardo Brindeiro, a animar todo o trajeto, com suas músicas tocadas ao violão e suas palavras de ordem.

Na metade da década de 2000, eis que, com a mudança de Bispo, o novo Arcebispo, Dom Aldo Pagotto, em oposição à CNBB, tentou em vão proibir a realização do Grito dos excluídos e excluídas no âmbito de João Pessoa, mesmo assim contra a vontade do Bispo, o Grito nunca deixou de acontecer. Com efeito, alguns meses antes de 07 de Setembro, em uma sala cedida pelo SINTRICOM, realizavam-se aí SEMANALMENTE, as reuniões preparatórias do Grito, graças à contribuição de jovens da Consulta Popular, das Pastorais Sociais e de outros Movimentos Populares. Nessas reuniões preparatórias, vale lembrar a participação efetiva de pessoas tais como Gleison, Marquinho, Elias Candido, Ricardo Brindeiro, entre outras.

Nos últimos anos, com tristeza, constatamos um certo recuo da Igreja Católica local, em apoiar firmemente a construção do grito dos excluídos e excluídas. Mesmo assim, como aconteceu no ano passado, os movimentos populares vêm tomando a frente e realizando o Grito. É o que deve acontecer, mais uma vez, amanhã, 7 de setembro. Ainda na segunda-feira próximo-passada, foi realizada mais uma reunião preparatória do Grito, da qual participaram cerca de 40 representantes de vários movimentos populares e sindicais.

A programação do Grito dos Excluídos e Excluídas, em João Pessoa,  prevê concentração em frente ao Liceu Paraibano, a partir das 8h00 da manhã do dia 07 de Setembro. Mais uma vez, os participantes do 29º Grito dos Excluídos e Excluídas manifestarão, pelas ruas do centro da cidade, seu protesto contra as profundas desigualdades sociais, a enorme concentração de renda, de terra, e de riquezas em mãos de tão poucos, à custa da penúria de imensas maiorias, no tocante à alimentação, habitação, saúde, educação e tantas outras políticas públicas em falta ou insuficientes para garantirem os direitos elementares à enormes parcelas da população.

Graças à credibilidade política do então candidato Luiz Inácio Lula da Silva, o povo brasileiro evitou a continuidade e o aprofundamento de um governo neofascista. Reconhecendo os limites e alguns deslizes do governo Lula, não podemos ignorar avanços razoáveis, em oito meses de governo.

Reconhecendo o empenho e a disposição do atual Governo, em construir políticas públicas destinadas a combater a fome, o alto “déficit” de moradias, a enorme violência praticada contra os jovens, os pretos, as mulheres periféricas, a dívida social secularmente acumulada pela classe dominante brasileira não podemos recuar na luta por um novo Brasil, com soberania popular, com justa distribuição da renda, da terra, das riquezas nacionais que se acham injustamente concentradas nas mãos de menos de 1% de nossa população.

Em todo o Brasil, vamos, sim, expressar nossos clamores por uma sociedade em harmonia com a mãe-natureza, economicamente justa, politicamente participativa nas decisões e culturalmente respeitosa da diversidade.

João Pessoa, 06 de setembro de 2023.

Quem é Jesus para nós

Neste XXI domingo comum do ano (A), o evangelho de Mateus 16, 13 – 20 nos faz retomar hoje a mesma pergunta que Jesus fez aos discípulos: E vocês, quem dizem que eu sou? 

É normal que a mesma pessoa possa ser vista a partir de ângulos diversos a depender de quem a vê e da experiência que tem com ela ou ele. Durante séculos, nos habituamos a ver Jesus a partir de imagens europeias. Apresentaram sempre um Jesus branco e identificado com títulos e funções de poder na sociedade ocidental. Foram astutos em trocar a mística do reinado divino no mundo (reino de Deus) pela espiritualidade do Cristo Rei, cujo poder é exercido através da Igreja e de seus legítimos representantes.

De fato, com exceção de duas ou três referências em obras de escritores do final do século I, o pouco que sabemos sobre Jesus nos vem do testemunho dos evangelhos. E estes já o veem a partir do olhar de comunidades cristãs que, mesmo baseadas em testemunhos mais antigos,  escreveram seus relatos a partir de 40 ou 50 anos depois da sua morte.

Estudos contemporâneos comparam relatos e fazem pesquisas arqueológicas sobre as sociedades do Oriente Médio no primeiro século. Em seus escritos, John Crossan mostra Jesus como “camponês judeu do Mediterrâneo”. Reza Aslan descreve o Jesus histórico como zelota. Ligando história e adesão da fé, José Antonio Pagola publicou vários livros para nos ajudar a redescobrir a humanidade de Jesus em seu mundo cultural, suas opções e sua proposta. Apesar de tudo isso, Jesus continua desconhecido, não somente para o mundo, mas sobretudo para as próprias Igrejas. Muitos preferem olhar Jesus como mito do que levar a sério sua humanidade e segui-lo como mestre de vida.

Há mais de 50 anos, as comunidades latino-americanas veem Jesus como o Cristo Libertador e recebem dele força e inspiração para a resistência em um mundo desigual e para testemunhar o projeto divino como justiça, paz, libertação para todos e comunhão com a Terra e toda a natureza. Para as pessoas comprometidas com a transformação do mundo, o que mais atrai na pessoa de Jesus libertador é que Ele assume esta função a partir da inserção no mundo como pobre, testemunhando o amor de Deus pelos pequeninos e vulneráveis do mundo e se identificando com eles nos diversos tipos de cruz em que até hoje a sociedade dominante os crucifica.

O desafio para as Igrejas e religiões estabelecidas é que Jesus se identifica e se une não apenas às vítimas da exploração social, política e econômica. O que mais escandaliza os religiosos é que Jesus convive e “come com as prostitutas e com as pessoas consideradas de má vida”.

Ainda hoje, mesmo eclesiásticos abertos ao social têm dificuldade de alargar esta abertura às relações de gênero, à luta contra o colonialismo não só econômico e social, mas também cultural e religioso. Até hoje estranham que, na festa de Natal, um grupo de humor cáustico e agressivo apresente a figura de um Jesus gay ou que, no desfile de Carnaval, uma escola de samba tome como enredo o Jesus da Gente. Não percebem que a luta maior do Jesus histórico foi justamente contra o poder religioso quando este pretende aprisionar Deus em sua gaiola sagrada.

Estudos mais atentos à História nos lembram que até a abertura do Canal de Suez, em 1864, a região da atual Palestina era considerada como pertencente à África. Portanto, Jesus nasceu, viveu e morreu como africano.

Neste domingo, 23 de agosto, anualmente a ONU celebra o Dia internacional da lembrança do tráfico de escravos e de sua abolição. E cada vez mais analistas sociais revelam que a sociedade brasileira se caracteriza por um racismo estrutural que ainda em nossos dias se expressa pela violência contra os pobres, especialmente as comunidades indígenas e os grupos remanescentes de Quilombos. E esta sociedade fez isso sempre relacionando o nome de Jesus com esta iniquidade.

Para nós, Jesus se revela nas vítimas e excluídos do mundo. A figura do nosso irmão e mestre Pedro Casaldáliga que nestes dias fez a sua Páscoa nos convida a retomar a palavra de Jesus que disse: “Tudo o que fizerdes a um desses pequeninos foi a mim que fizestes” (Mt 25, 31ss).

O Papa: cuidado com disseminação de falsidades e ódio através das redes sociais

O Papa Francisco encontrou-se na manhã deste sábado, no Vaticano, com membros da Rede Internacional de Legisladores Católicos, uma rede cujo objetivo é a formação de uma nova geração de líderes católicos capazes de promover a doutrina social da Igreja na esfera pública. Francisco advertiu sobre os riscos da tecnocracia dominante de hoje, que tende a “coisificar” as pessoas e os recursos naturais

O Papa Francisco recebeu no Vaticano, na manhã deste sábado, 26 de agosto, os participantes do XIV Encontro anual da “Rede Internacional de Legisladores Católicos”, que se realiza em Frascati, nas proximidades de Roma.

Em seu discurso, o Santo Padre aprofundou o tema escolhido para o encontro deste ano: “Luta das grandes potências, Captura Corporativa e Tecnocracia: resposta cristã às tendências desumanizantes”, um tema que aborda os aspectos vitais da nossa existência.

A este respeito, o Papa referiu-se à Encíclica ‘Laudato Si’, dizendo que o “paradigma tecnocrata dominante” suscita profundas questões “sobre o lugar e a ação que, hoje, o ser humano ocupa no mundo”.

Promover a doutrina social da Igreja

Certamente, disse Francisco, um dos aspectos mais preocupantes deste paradigma, devido aos seus impactos negativos sobre a ecologia humana e a natureza, é a tentação sutil do espírito humano, que conduz as pessoas, sobretudo os jovens, a fazer um uso distorcido da liberdade. Notamos isso quando homens e mulheres são encorajados mais a exercer um controle e não tanto uma proteção responsável dos “objetos” materiais ou econômicos, dos recursos naturais da nossa Casa comum ou uns dos outros. Este modo de “coisificar” acaba tendo um impacto negativo sobre os sujeitos mais pobres e frágeis da sociedade”.

“Ao procurar responder a esta questão e aos muitos desafios associados, promovendo uma doutrina social católica, disse Francisco aos participantes no Encontro, gostaria de salientar que a própria estrutura da sua organização pode lhes oferecer um quadro de referência: vocês são uma rede internacional, cujo intuito é reunir em uma comunidade a nova geração de líderes cristãos corajosos”. A este respeito, o Papa ponderou:

O objetivo de cada Rede é estabelecer uma conexão entre as pessoas, conscientizando-as de pertencer a algo bem mais superior a elas. Eis o propósito de muitas plataformas mediáticas, que fazem tanto bem através dos meios de comunicação. Mas, é preciso também fazer atenção, porque, infelizmente, nos canais de comunicação podem-se encontrar práticas desumanizantes, de natureza tecnocrática”.

Apelo radical à escuta e ao respeito recíprocos

Entre tais práticas, Francisco destacou a divulgação deliberada de notícias falsas, incitação ao ódio e divisão, redução das relações humanas com algoritmos, para não mencionar a promoção de falsos sentimentos de pertença, especialmente entre os jovens, que os pode levar até ao isolamento e à solidão.

O uso distorcido dos encontros virtuais, afirmou o Papa, pode ser superado com uma cultura de encontros autênticos, que implica um apelo radical à escuta e ao respeito recíprocos, até para quem tem opiniões divergentes.

Neste sentido, afirmou, a “Rede Internacional de Legisladores Católicos” pode dar exemplo, porque tenta reunir pessoas do mundo inteiro, de forma sincera e genuína. E explicou:

Criar uma rede, porém, não significa apenas unir pessoas, mas dar-lhes a possibilidade de cooperar para atingir a meta de um objetivo comum. Os primeiros discípulos de Jesus foram chamados a uma ação conjunta ao lançar as redes para uma pesca abundante. Poderíamos definir a criação de redes como ferramentas para ser utilizadas, de forma partilhada, para a realização de um objetivo comum”.

Missão comum de proclamar com alegria o Evangelho

Ambos os aspectos “conexão e objetivo comum” são as características do trabalho da “Rede Internacional de Legisladores Católicos”, que também refletem a vida da Igreja, Povo de Deus, chamado a viver em comunhão e missão. Estes dois aspectos, sustentados pela força do Espírito Santo, unem as pessoas na comunhão fraterna interna e, ao mesmo tempo, as impelem à missão comum de proclamar com alegria o Evangelho. E o Papa concluiu:

Uma rede verdadeiramente cristã já é uma resposta às tendências desumanizantes, porque não tende apenas às verdades que libertam a existência do homem, mas as tornam modelos no contexto de suas atividades. Por este motivo, manter uma rede internacional, genuinamente católica, significa indicar, com credibilidade, uma alternativa à tirania tecnocrática, que induz os nossos irmãos e irmãs a se apropriar dos recursos, tanto da natureza como da existência humana, que, no entanto, diminui a sua capacidade de tomar decisões e viver livremente”.

O Santo Padre se despediu dos participantes no Encontro da “Rede Internacional de Legisladores Católicos”, invocando o Espírito Santo que inspire e oriente os esforços de todos para formar uma nova geração de líderes católicos treinados e fiéis, que se dedique à promoção do ensinamento social e ético da Igreja e do crescimento do Reino de Deus.

Fonte: Vatican News

(26-08-2023)