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Para a “Folha”, ouro de tolo é vitória da sociedade

Em 2009 a “Folha” tentou envolver Dilma num sequestro que não houve, além de usar como ilustração uma ficha falsa que encontrou na web.

Simancol é o que mais falta para o jornal da  ditabranda: mancheteia triunfalmente a obtenção do que queria usar durante a campanha eleitoral e agora não lhe servirá de quase nada.

Foi garimpar, só encontrou ouro de tolo e ainda tenta apresentá-lo como uma “vitória da sociedade”. Me engana que eu gosto.

Finda a eleição presidencial, o Superior Tribunal Militar, como Deus e o mundo sabiam que faria, liberou para a Folha de S. Paulo o processo a que Dilma Rousseff respondeu durante a última ditadura, quando foi presa como dirigente da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares e barbaramente torturada.

A decisão foi tomada nesta 3ª feira (16/11), por 10 votos a 1.

Ou seja, nada mais houve do que o cumprimento integral da determinação do presidente do STM, Carlos Alberto Soares: evitar que desse processo falacioso e arbitrário, sem valor jurídico nenhum, fosse extraída munição propagandística contra a candidata em campanha.

Pois só os bem informados sabem serem totalmente inconfiáveis as conclusões dos Inquéritos Policiais Militares da ditadura, contaminados pela prática generalizada da tortura, bem como as sentenças dos julgamentos de cartas marcadas que eram encenados em auditorias militares, com gritante cerceamento do direito de defesa.

Para a maioria da população, poderia passar por verdade o que nada mais era do que a versão forjada pelos déspotas a respeito dos resistentes que, heroicamente, os combatiam. Daí a inconveniência de tal assunto ser escarafunchado em meio ao tiroteio eleitoral.

Após o pleito, com ou sem a ação da Folha, os documentos seriam mesmo liberados.

Não adiantou o jornal espernear no STM e até no STF: não conseguiu acesso em tempo hábil e ficou impossibilitado de produzir algum factóide eleitoeiro.

Da próxima vez, que vá atrás das informações no momento certo e seguindo suas próprias pistas, ao invés de correr atrás das revelações alheias — no caso, a matéria de capa da revista Época sobre Dilma, que foi de onde a Folha tirou a informação de que o processo da VAR-Palmares estava temporariamente indisponível.

Agora, para justificar a  batalha de Itararé que fingiu estar travando, será obrigada a soltar alguma reportagem baseada no processo de Dilma.

Pela qualidade atual do jornalismo da Folha, canto a bola desde já: vai ser imensamente inferior à da Época.

Mas ninguém se surpreenderá, pois vexame é prato de todo dia na espelunca da alameda Barão de Limeira…

Para quem quiser conhecer os detalhes desta comédia de erros (mais uma!), eis o passo a passo:

E vale a pena ler de novo outro tiro pela culatra da Folha contra Dilma, em abril/2009, quando o jornal saiu com a credibilidade em frangalhos:

Reação à catilinária de Serra na França: “por que não te calas?!”

Até quando, ó Serra, vais abusar da nossa paciência?!

Cinco dias depois da derrota na eleição presidencial, José Serra continua com a cabeça quente: fez declarações destrambelhadas e rancorosas em Biarritz, sul da França, acabando por receber um merecido “por que não te calas?” de um representante da Fundação Zapata, do México.

O tema do encontro eram as relações entre a América Latina e a União Européia, mas Serra passou longe dele. Preferiu ocupar seu tempo com furibundas diátríbes contra o Governo do seu país, lavando roupa suja em casa alheia:

  • acusou o presidente Lula de desindustrializar o País;
  • disse que ele adota um “populismo de direita” na economia e não tem modelo econômico definido;
  • criticou os investimentos do Governo Federal e a alta carga tributária;
  • vituperou o sistema de orçamento participativo, em que o contribuinte decide sobre a destinação de parte dos impostos.

Chegou ao cúmulo de se queixar de que não pôde expor suas idéias como gostaria durante a campanha eleitoral, supostamente porque haveria um estado policial o tolhendo:

“A democracia não é apenas ganhar as eleições, é governar democraticamente”.

O que faltou à nossa democracia? Providenciar uma barragem de guarda-chuvas para protegê-lo das bolinhas de papel?

Continuando a abordar assuntos políticos que nada tinham a ver com a pauta econômica do evento, ele estava soltando os cachorros contra a política externa brasileira, por se “unir a ditaduras como o Irã”, quando foi interrompido com a mesma frase proferida pelo rei espanhol Juan Carlos contra o presidente venezuelano Hugo Chávez:

“Por que não te calas?!”.

Prazer em te reencontrar, companheira Vanda!

Sem falsa modéstia, acertei em praticamente tudo que escrevi sobre a campanha e o resultado do 2º turno da eleição presidencial.

Leitores contrariados com a derrota demotucana, entretanto, correram a me rotular de “petista”, forma bem brasileira de desqualificar argumentações irrespondíveis.

No terreno minado em que se transformou o debate político na internet, não há mais espaço para nuances e sutilezas.

Caímos no maniqueísmo total: reduz-se tudo a uma disputa entre o Bem e o Mal, só diferindo o entendimento sobre quem seja o  mocinho e quem seja o bandido.

Para veteranos de outros carnavais, entretanto, há uma infinidade de tons entre o branco e o negro. Foi assim que aprendemos a pensar a realidade e a direcionar nossas ações.

Não mudarei para satisfazer o primarismo de ninguém. Pois, mais do que êxitos, ganhos e prestígio, o que me importa é a coerência. Sou capaz de suportar a reprovação generalizada, quando intimamente sei que estou certo.

Nem imagino o que aconteceria se me sentisse um  safado — como muitos que abriram mão dos seus ideais devem, lá no fundo, estar cientes de que são, embora finjam acreditar que  evoluíram.

Então, não me incomodei nem um pouco quando alguns me acusaram de ajudar  a direita, ao defender a posição de que cidadãos com convicções revolucionárias deveriam, no 1º turno, votar num dos quatro candidatos assumidamente anticapitalistas, e não na candidatura reformista com chance de liquidar logo a fatura.

E, como tudo confluía para (se houvesse) um 2º turno entre Dilma Rousseff e José Serra, também antecipei que, nesta hipótese, o certo seria apoiarmos a candidatura reformista contra a que, além de ser de centro-direita, englobava suspeitíssimos bolsões neofascistas.

REFORMA OU REVOLUÇÃO

Que eu me lembre, foi no final de 1968, ao redigir meu primeiro documento político mais ou menos autoral, que respondi à celebre questão colocada por Rosa Luxemburgo (reforma ou revolução) alinhando-me com os defensores da segunda, contra os esquerdistas que se conformavam com a primeira.

Para mim, não foi só uma besteirinha alinhavada para um congresso secundarista. Foi uma diretriz para a vida inteira.

Mais tarde, vim também a perceber quão insensata era a postura dos companheiros que faziam oposição meramente destrutiva às por eles chamadas  políticas econômicas burguesas, arriscando-se a atirar o Brasil numa depressão.

Ou seja, num momento de grande fragilidade econômica, sustentavam que seria bom se o caldo entornasse de vez, para as massas aprenderem na carne quão perverso é o capitalismo.

Contra esses eu argumentava que, nas crises econômicas (que eu havia estudado em profundidade para produzir uma série jornalística), a primeira coisa que acontece é o arrefecimento da combatividade dos trabalhadores.

Temerosos de perder o emprego numa época de vacas magras, eles, em sua maioria, abdicam de reivindicações, desertam dos sindicatos e enfiam a cabeça na areia.

Então, eu concluía, seria suicídio contribuírmos para o agravamento de qualquer recessão, além de uma desumanidade em relação aos humildes, que são sempre os que mais sofrem.

Dessa polêmica me veio a certeza de que o “quanto pior, melhor” não deve ter lugar nas lutas políticas e sociais.

Lembrei-me de haver lido, em Isaac Deutscher, que a democracia alemã fora detonada pelo ataque conjunto da direita e da esquerda: os comunistas, qualificando os socialistas de “sociais-fascistas”, ajudaram Hitler a varrê-los do poder.

Acreditavam que, alijados os  intermediários, no confronto aberto com o  verdadeiro inimigo levariam a melhor.

Mas, perderam. E, com sua aposta insensata, pavimentaram o terreno para os horrores da 2ª Guerra Mundial.

Lera sem muita atenção este relato. Mas, minhas próprias opções me levaram a perceber, posteriormente, sua enorme importância. Trata-se de um erro que jamais deveremos repetir.

Assim, no 2º turno, coloquei-me vigorosamente contra o retrocesso, enfatizando os riscos que a democracia brasileira correria na eventualidade de um governo com forte presença do DEM (herdeiro dos  arenosos apoiadores da ditadura), um vice ultradireitista como o ìndio da Costa e uma relação pouco clara com as correntes virtuais neofascistas.

Isto incomodou aquelas tendências de esquerda que colocam o lulismo praticamente no mesmo plano dos inimigos capitalistas.

Fazer o quê?! Toquei minha caravana adiante.

CIVILIZAÇÃO x BARBÁRIE

Na antevéspera da votação, com a certeza da eleição de Dilma, antecipei a postura a ser adotada no day after:

“[Dilma} já conseguiu evitar o retrocesso, parabéns!

“Torçamos para que ela seja igualmente bem sucedida em deslanchar o avanço, com determinação e ousadia”.

Tornei mais clara ainda esta idéia no domingo da vitória:

“Torço para que a Dilma saiba aproveitar seu grande momento, não sendo apenas uma estátua de Davi, mas sim a aguerrida companheira que:

  • como Chaplin, queria chutar o traseiro dos ociosos;
  • como Cristo, trouxe uma espada para combater a injustiça; e
  • como Marx, pretendia proporcionar a cada trabalhador o necessário para a realização plena como ser humano”.

Trocando em miúdos, com seus oito anos de políticas cautelosas, Lula melhorou a vida dos humildes e fez jus à sua gratidão.

Agora, com nossa economia deslanchando como não se via desde os melhores anos do  milagre brasileiro, Dilma pode desarquivar algumas propostas originais do PT que ficaram para trás, à espera de melhor oportunidade.

Tal oportunidade chegou e, se ela a aproveitar, desempenhará um papel de primeira grandeza na História escrita pelos explorados e oprimidos, que é bem diferente da História oficial.

Em sua primeira coletiva à imprensa, houve um momento mágico em que Dilma recolocou os valores humanitários no centro das decisões políticas, descartando o pragmatismo amoral:

“Mesmo considerando usos e costumes de outros países, continua sendo bárbaro o apedrejamento da Sakineh”.

Sim, chega dessa relativização obscena que o Itamaraty vinha adotando em questões, estas sim, sem meio termo possível: ou se está ao lado dos homens, ou ao lado das bestas-feras!

A esquerda tem de voltar a alinhar-se, decidida e incondicionalmente, à civilização, contra a barbárie. Só assim tocará de novo os corações e mentes, atraindo para seu campo os melhores seres humanos — aqueles que são movidos pela esperança num mundo melhor e disposição de contribuir para seu advento.

À Dilma que proferiu tal frase eu dou um voto de confiança: fez-me lembrar a vibrante companheira que conheci nos idos outubro de 1969, durante o Congresso de Teresópolis da VAR-Palmares.

Posso ser um incorrigível sonhador, mas espero sempre o melhor das pessoas.

Então, até prova em contrário, prefiro acreditar que, lá no fundo, sem  dar bandeira porque isso em nada facilitaria sua jornada, Dilma ainda é Vanda — e não um ex-Gabeira qualquer.

E mais Vanda será se a ajudarmos a ser Vanda.

Veja até onde vai o ridículo da “Veja”!

“Eu assisti de camarote
o teu fracasso,
palhaço, palhaço!”

(Benedito Lacerda)

Na edição que entrou em bancas no dia 16/10/2010, a revista Veja dedicou sua matéria de capa a um bizarro exercício de futurologia e lobbismo, ao proclamar que a eleição presidencial seria decidida em Minas Gerais, graças ao “poder de Aécio”.

O ridículo começou pela capa, apresentando Aécio como Super-Homem, e se derramou pelas páginas internas, nas quais se garantia que “Aécio move a montanha” (título da matéria). Eis alguns trechos:

“Ao fazer seu sucessor no governo de Minas Gerais, o senador eleito Aécio Neves demonstrou sua enorme capacidade de transferir votos. Agora, ele quer repetir o feito em favor de José Serra. O resultado desse esforço poderá definir o futuro presidente da República.

“A eleição presidencial de 2010 será decidida em Minas Gerais. Três razões justificam essa afirmação. A primeira é que Minas, o segundo maior colégio eleitoral do país, concentra a parcela mais expressiva dos 10 milhões de eleitores indecisos, cujo voto será crucial num pleito em que a diferença entre os contendores está cada vez mais estreita. (…) O segundo motivo é que se encontra em Minas, em disputa aberta, o espólio de 2,3 milhões de votos que a verde Marina Silva recebeu no primeiro turno. (…) O terceiro motivo responde pelo nome de Aécio Neves.

“Principal força política de Minas Gerais, o senador eleito declarou que vai por a serviço do candidato tucano, José Serra, todo o seu capital político – e ele é gigantesco…

“No dia 31 de outubro, o Brasil emergirá das urnas com uma nova configuração de poder. Qualquer que seja ela, Aécio Neves terá um papel fundamental. Ele (…) jurou fazer seu sucessor no governo de Minas, planejou eleger-se senador e agora se propõe a trabalhar para dar a vitória a Serra em Minas. Se o tucano ganhar as eleições, Aécio colherá os frutos de ter sido peça essencial na vitória. Se perder, emergirá como o rosto renovado da oposição…”

Eu não espero comodamente o desenrolar dos acontecimentos para detonar tais falácias — jornalísticas e políticas.

Então, logo no dia 19 lancei também minha profecia, provando ser um Nostradamus bem melhor que os da Veja:

“…não há factóide, propaganda enganosa e alarmismo que façam os eleitores   pés no chão mudarem seu voto.

“O desejo da Veja, erigido em matéria de capa (!), é o de que a eleição fosse decidida em Minas Gerais, com Aécio Neves como fiel da balança. Dia 31 a revista aprenderá que jornalismo é algo mais do que expressão de desejos”.

Aprendeu mesmo.

Apesar da “enorme capacidade de transferir votos” de Aécio Neves, Dilma surrou impiedosamente Serra em MG — 58,45% x 41,55%, vantagem maior do que a alcançada no País inteiro (56,05% x 43,95%).

Talvez por ser um homem de pouca fé, Aécio não moveu montanha nenhuma. E está sendo disto acusado por vários tucanos, começando pelo coordenador do programa de governo de Serra, Xico Graziano, que colocou este comentário no Twitter, mal acabava de ser conhecido o resultado: “Perdemos feio em Minas Gerais. Por que será?!”

Ao invés de emergir da derrota “como o rosto renovado da oposição”, Aécio, para boa parte do tucanato, sai como o rosto hipócrita da traição.

Quanto à Veja, teve mais uma oportunidade para constatar que, como bem mostrou Walt Disney em seu clássico Fantasia (1940), aprendizes de feiticeiros cometem as piores lambanças.

Crônica da vitória anunciada

Quem acompanha meu trabalho, não precisou esperar até este domingo (31/10) para saber quem venceria a eleição presidencial.

Doze dias antes, em 19 de outubro, eu cantei a bola, no meu artigo O diabo trapaceou Serra: tomou-lhe a alma sem dar nada em troca:

“…Serra não encontrou o mapa da mina.

“…Uma mudança surpreendente do quadro só seria possível se Serra fosse um personagem eletrizante; mas, seu estilo é de quem está sempre explicando o óbvio a estudantes burrinhos.

“O aborto (…) da hipotética virada já começa a se evidenciar nas pesquisas eleitorais.

“Pior que a derrota será a decepção causada por Serra àqueles que ainda acreditavam nele.

“Aceitar o apoio e beneficiar-se da baixaria das correntes virtuais ultradireitistas, fazer promessas demagógicas como a do salário mínimo de R$ 600 e colocar uma questão religiosa no centro da campanha o deixou com a imagem de quem pisa até no pescoço da mão para chegar à Presidência.

“O último a projetar tal imagem acabou morrendo na praia. E, convenhamos, fazia bem mais por merecer o ambicionado troféu.”

No fundo, minha linha de raciocínio foi bem simples.

Serra se chocava contra um governo recordista de aprovação e que passa por fase das mais auspiciosas: a situação financeira dos cidadãos tem melhorado consistentemente e as perspectivas são de que a economia continue crescendo.

De quebra, a empada não tem uma, mas três azeitonas: o pré-sal, a Copa do Mundo e a Olimpíada.

Então, a verdade nua e crua é que Serra já teria sido fulminado no 1º turno, caso Marina Silva não tivesse disparado na reta final, obtendo surpreendentes 19,3% dos votos válidos.

O candidato demotucano ficou com os 32,6% que as pesquisas lhe auguravam. Se dependesse só de sua (inexistente) capacidade de reação, teria ido à lona já em 3 de outubro.

A segunda chance lhe caiu do céu, mas ele tinha 14,5 milhões de votos a menos do que Dilma Rousseff. Sabia que o espólio de Marina Silva e demais candidatos derrotados não seria só seu. PRECISAVA DESESPERADAMENTE DESLANCHAR, nas quatro semanas que tinha pela frente.

Ora, nas duas primeiras semanas a campanha de Dilma não só conseguiu superar os danos psicológicos de não haver correspondido à expectativa de que liquidaria logo a fatura, como recolocou a candidata em trajetória ascendente.

Foi a exata repetição do que aconteceu na disputa entre Lula e Alckmin em 2006.

E, como Serra deixara escapar entre os dedos seu melhor momento, dentre outros motivos por causa do desempenho burocrático nos debates, eu apostei tranquilamente que o desfecho também seria exatamente o mesmo de quatro anos atrás.

Não deu outra.

A diferença em favor de Dilma diminuiu um pouco, para 12 milhões de votos. Mas, Serra ficou bem longe de se constituir em verdadeira ameaça.

Ela teve 47,6 milhões de votos no 1º turno e aumentou o total em 8,1 milhões.

Aos 33,1 milhões de Serra acrescentaram-se 10,6 milhões.

Acertaram as pesquisas: os votos de Marina foram redirecionados um pouco mais para Serra.

Só que bem menos do que o necessário para salvarem o demotucano de uma derrota acachapante e que, caso não ocorra um verdadeiro milagre, o condenou a ter mesmo o destino de Brizola: morrer sem realizar seu maior sonho.

TUCANO NÃO É FÊNIX E GUERREIRA

NÃO DEVE SER ESTÁTUA DE DAVI


Para Serra, o desafio agora é renascer das cinzas. Só que tucano não é fênix e o peso dos erros cometidos nesta campanha — direitização aberrante e chocante, demagogia religiosa, promessas populistas, etc. — se tornou lastro que atrapalhará em muito suas tentativas de alçar novo voo.

Dilma, por sua vez, terá de provar que é algo mais do que uma estátua de esculpida com tamanha perfeição pelo artista Michelangelo da Silva que acabou ocupando o melhor pedestal no panteão do Planalto.

Não esquecendo jamais que, tão importante quanto trazer os 43,7 milhões que votaram em Serra para o campo progressista é dar aos 26,8 milhões de desencantados (abstenções, brancos e nulos) motivos para acreditarem que as mudanças são possíveis.

O lulismo no poder já provou sua competência no gerenciamento do estado em conformidade com os interesses dominantes, mas garantindo uma fatia um pouco maior do bolo para aqueles que produzem todas as fatias.

A dívida social, entretanto, está muito longe de ser zerada, como o foi o débito com o FMI.

Torço para que a Dilma saiba aproveitar seu grande momento, não sendo apenas uma estátua de Davi, mas sim a aguerrida companheira que:

  • como Chaplin, queria chutar o traseiro dos ociosos;
  • como Cristo, trouxe uma espada para combater a injustiça; e
  • como Marx, pretendia proporcionar a cada trabalhador o necessário para a realização plena como ser humano.

Campanha de José Serra envia mensagens que investem na burrice alheia

Acabo de receber a seguinte mensagem no celular: “Oi ADILSON, pro Brasil e ITABORAI seguir mudando, escolha um presidente honesto e experiente. Vote 45 no domingo!”

Esclareço:
1. Meu nome é Gustavo, e não Adilson.
2. Não moro e nunca morei em Itaboraí.

E pergunto:
1. Por que a campanha de José Serra utiliza, a menos de 24 horas das eleições, o slogan utilizado durante todo o período eleitoral por Dilma Rousseff?
2. Como eles conseguiram o número do meu celular? Quem indicou pra eles que eu me chamaria “Adilson” e moraria em “Itaboraí”?
3. Como alguém pode se dizer honesto e investe na burrice do eleitor, incluindo o slogan de Dilma e indicando o número de Serra?
4. Pergunto aos nobres eleitores de José Serra: vocês consideram isto ético e honesto?!

Enviei estas questões ao TSE (e também por twitter), ao TRE-RJ (o telefone não responde, mas tentarei de novo e enviei por twitter), aos meus deputados estadual (Marcelo Freixo) e federal (Chico Alencar), à própria campanha de José Serra, ao Arnaldo, comentarista de arbritragem (seguido da pergunta “Pode isso Arnaldo?”) e, para o caso de todos me ignorarem, a Deus (@OCriador).

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PS: Outra da campanha de Serra: Adesivo de Lula pedindo voto em Serra circula em carreata tucana

Cricri, trololó, lero-lero e conversa mole

Depois do debate eleitoral (promovido por um pool de emissoras de TV) que decidiu — ou pareceu ter decidido — a eleição presidencial de 1989, a Rede Globo deve ter unilateralmente resolvido evitar que isto acontecesse de novo, nem que fosse preciso matar de tédio os telespectadores. Está conseguindo.

O certo é que agora monopoliza a data estratégica da antevéspera do 2º turno, mas não para promover debates, e sim chatíssimas sabatinas dos presidenciáveis, que são inquiridos por eleitores indecisos de todos os Estados.

Então, não se discute política propriamente dita, mas, tão somente, propostas administrativas que vêm ao encontro das aspirações dos eleitores, aferidas nas pesquisas qualitativas (pouco importando que sejam inexequíveis e virem letra morta depois…) e miudezas ridículas.

Às vezes dava a impressão de que, ao invés de um presidente, escolhia-se um síndico.

Bom para quem tem confortável vantagem, como Dilma Rousseff. O formato condiciona a que nada suceda de realmente importante.

Ruim para José Serra, que, conformando-se com a camisa de força que lhe foi imposta, jamais conseguiria virar o jogo.

Abúlico, ele nem tentou provocar um debate de verdade. Ficou dando suas aulas que provocam ataques de bocejos nos eleitores, até o mais amargo fim.

Ou seja, não produziu o milagre com que os seguidores mais irrealistas ainda sonhavam, selando definitivamente sua derrota.

Retrocesso evitado, a prioridade será deslanchar o avanço

Como não há mal que sempre dure, chegará ao fim neste domingo a campanha presidencial mais tediosa e deseducativa desde que o Brasil voltou à civilização, em 1985, depois de 21 anos de trevas.

O ritual democrático desta vez ficou em descompasso com o estado de ânimo do povo brasileiro.

Vivendo seu melhor momento econômico das últimas décadas, com mais empregos, mais ganhos, mais consumo e perspectivas douradas pela frente (pré-sal, Copa do Mundo e Olimpíada), o que nossa gente queria mesmo era manter Lula na Presidência.

Felizmente, ele fechou os ouvidos ao canto das sereias, não consentindo numa mudança das regras do jogo.

A segunda reeleição, com certeza, seria legitimada por um plebiscito e pela previsível avalanche de votos… trazendo consigo, entretanto, o espantalho do chavismo, pretexto pelo qual há muito anseiam as correntes mais nocivas e retrógradas deste país, sempre à cata de uma oportunidade para reeditarem 1964.

Dilma Rousseff foi a aposta de Lula para manter a hegemonia petista sem a única grande liderança nacional que o PT produziu até agora.

Só que, depois de cinco eleições consecutivas em que ele foi ou vitorioso ou o principal adversário do candidato vencedor, Dilma necessariamente pareceria uma coadjuvante fazendo as vezes de protagonista.

Saiu-se até melhor do que o esperado, mas dificilmente chegaria aonde chegou se dependesse apenas de seu (escasso) carisma. Deverá a eleição a Lula, como Dutra deveu a dele a Vargas.

Quanto ao maior antagonista, sua missão era, de antemão, quase impossível. Mas, não há dúvidas de que ele maximizou a piora do, em si, já ruim.

Também pouco carismático – parece sempre um mestre-escola lecionando a alunos de compreensão lenta – José Serra começou tentando eleger-se como o administrador experiente que seria melhor continuador de Lula do que a candidata do próprio Lula. Bola fora.

À medida que se evidenciava sua importência para evitar a derrota anunciada a partir de uma agenda positiva, foi apelando para a negativa: desceu do pedestal e passou a jogar sujo.

Endossou a pregação alarmista do seu vice Índio da Costa, cujos clichês ultradireitistas eram visivelmente copiados de sites goebbelianos como o Ternuma.

Olhou para o outro lado enquanto uma escória virtual – as  viúvas da ditadura e os cuervos por elas criados (os pupilos neofascistas) – movia, em seu benefício, uma sórdida campanha caluniosa contra Dilma. Imputavam-lhe responsabilidades indevidas (participação em episódios da luta armada com os quais nada teve a ver), apresentando como  crimesterrorismo o que foi, na verdade, corajosa resistência à tirania.

Desceu até o fundo do poço ao transformar o aborto em tema de campanha, como se a real convicção dele, de Dilma e dos cidadãos civilizados não fosse basicamente a mesma: o estado deve prioritariamente evitar que as mulheres corram altos riscos abortando em condições precárias, ao invés de se subjugar a dogmas medievais.

Caiu no ridículo ao querer erigir um episódio banal de campanha em ameaça à democracia, esquecendo que bolinhas de papel e rolinhos de fita crepe machucam muito menos do que os cassetetes da tropa de choque da PM, tantas vezes brandidos contra manifestantes pacíficos quando ele era governador de São Paulo.

Last but not least, resvalou também para a demagogia, com propostas como a de elevar o salário mínimo a R$ 600, aumentar em 10% o valor da aposentadoria e pagar 13º para os beneficiários do Bolsa Família.

Com tudo isso, só conseguiu transformar a previsível derrota do campo conservador numa acachapante derrota pessoal, da qual dificilmente se reerguerá.

Dilma, por sua vez, terá um desafio maior ainda a partir de 1º de janeiro: provar que mereceu ser a primeira mulher a chegar à Presidência do Brasil, imprimindo uma marca pessoal ao legado recebido de Lula.

Já conseguiu evitar o retrocesso, parabéns!

Torçamos para que ela seja igualmente bem sucedida em deslanchar o avanço, com determinação e ousadia.

Papa chantageia a democracia brasileira

Reunido com bispos brasileiros na manhã desta quinta-feira (28) em Roma, o patético papa Bento XVI conclamou-os a meterem o nariz em assuntos que não lhes dizem respeito, como se a separação entre a Igreja e o Estado não vigesse há 120 anos em nosso país!

Sem se dar conta de que os valores medievais hoje nada mais são do que cinzas de um passado que envergonha os civilizados, quer o Papa que a Igreja faça proselitismo político (“quando os direitos fundamentais da pessoa ou a salvação das almas o exigirem, os pastores têm o grave dever de emitir um juízo moral, mesmo em matérias políticas”), pressionando partidos e candidatos no sentido de que:

  • seja negado às mulheres o direito de interromper, mesmo no início, uma gravidez indesejada, e aos desenganados o direito de escolherem o momento e a forma como preferem morrer (“Quando os projetos políticos contemplam, aberta ou veladamente, a descriminalização do aborto ou da eutanásia, o ideal democrático é atraiçoado nas suas bases”);
  • seja imposto o ensino religioso em escolas públicas do Estado, obrigando professores a cumprirem o papel de sacerdotes e invadindo a esfera de decisão das famílias (“uno a minha voz à vossa num vivo apelo a favor da educação religiosa, e mais concretamente do ensino confessional e plural da religião, na escola pública do Estado”); e
  • sejam expostos símbolos religiosos em ambientes públicos, em gritante violação dos direitos de religiosos de outras confissões, ateus e agnósticos (“Queria ainda recordar que a presença de símbolos religiosos na vida pública é ao mesmo tempo lembrança da transcendência do homem e garantia do seu respeito”).

Em tempos corriqueiros, este anúncio da  Teologia do Retrocesso de Bento XVI já seria uma descabida incitação ao lobbismo.

Três dias antes do 2º turno de uma eleição presidencial, a interferência  indevida desse papa (cujo horizonte mental é o de um ativista da TFP…) assume gravidade ainda maior.

Pois se trata, pura e simplesmente, de uma CHANTAGEM contra a democracia brasileira.