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Fim do JB: morte anunciada de um velho centenário

“O Jornal do Brasil, coerente com sua tradição de pioneirismo e modernidade, se coloca mais uma vez à frente de seu tempo. A partir de 1º de setembro de 2010 o JB passa a ser o primeiro jornal 100% digital”
(JB, 14/07/2010, pA9)

Anunciada oficialmente no dia 13 de julho, a morte do Jornal do Brasil tardou, mas não falhou. Em processo de falência há mais de dez anos, o JB, que já foi o maior periódico do Brasil, nas décadas de 60 e 70, será publicado a partir deste dia (1/9) apenas na internet.

Os indícios de que este senhor de 119 anos padeceria em breve endividado, enfraquecido e assassinado pela sua desastrosa administração já eram evidentes desde a mudança de sua sede da Avenida Brasil para a Rio Branco, em 2002, e reforçados ainda mais com a chegada do jornal às bancas, em 2006, no formato berlinder, substituindo o centenário stardard.

Alegando que o JB seguia sua tradição de pioneirismo e revolução estética, tal qual acontecera em sua famosa reforma de 1956, idealizada por Amílcar de Castro, o tamanho do periódico diminuía seguindo uma tendência européia, como fizera pouco antes o inglês The Guardian. Assim como seu tamanho, foram sendo reduzidas com o tempo, suas páginas, credibilidade e relevância no mercado nacional. O Rio de Janeiro ficava sem uma mídia impressa de peso, a qual fosse capaz de fazer frente a O Globo, fortalecido ainda mais no final da década de 80.

Em 2006, no entanto, a crença em uma reviravolta mágica e improvável ainda existia para os otimistas, que iam forjando uma imagem glamourosa de um fantasma decadente e mascarado. Ainda sim, nada foi dito, comentado ou protestado. Adiava-se cada vez mais a morte iminente. O velho moribundo mal tinha forças para caminhar sozinho, mas seus responsáveis maquiavam-no e forçavam-no a percorrer uma estrada cruel e tortuosa, cujo fim estava mais próximo do que se imaginava.

JB Digital: sinônimo de inovação?

No dia 14 de julho de 2010, a bomba. Confirmou-se o que todos sabiam há tempos. Em um anúncio de página dupla, o JB comunicou a seus leitores e funcionários que a partir do dia 1º de setembro passaria a ter uma versão apenas online. O novo projeto JB Digital, hospedado em “atraentes plataformas multimídias” com “diagramação moderna e amigável à exposição em laptops, desktops ou iPhones”, teria seu conteúdo fechado disponível apenas para assinantes ao custo mensal de R$ 9,90.

Os problemas administrativos e financeiros, agravados pela falta de anunciantes, além da dívida bilionária herdada na década de 70 com a construção do elefante branco da Avenida Brasil, jamais foram mencionados nesta “migração” do papel para o online. A “transferência” é abordada como uma medida visionária, que preserva o meio ambiente, além de dar um passo para o futuro.

“Não está distante o momento em que um país com jornais de grande circulação em papel será sinônimo de subdesenvolvimento, desrespeito ao meio ambiente e anacronismo digital. O que é um jornal na selva tecnológica? Qual o papel do jornal num ambiente de rádios digitais, leitores eletrônicos, fones inteligentes, monitores em elevadores ou aeroportos, TVs on-demand e sites dos mais variados em tempo real ou analíticos de toda ordem?”
(JB, 23/8/2010, p23)

Feita sem qualquer planejamento, a migração preza tecnologia e modernidade disponíveis apenas para a menos populosa fatia da sociedade carioca e brasileira. Tendo o cobiçado iPad como carro-chefe da campanha, o JB Digital foi pensado para ser consumido por ricos, oferecendo um conteúdo fechado e “diferenciado”, cujo slogan arrojado promete ao leitor “qualidade, interatividade, respeito à ecologia, alinhamento com o futuro e inovação”.

No novo JB, o leitor encontrará os mais ilustres colunistas que serviam de muleta para o idoso de 119 anos, em seus últimos dias de vida, além do conteúdo que recheava o moribundo jornal, o qual em seu último dia de circulação apresentou apenas 24 páginas. No site em que o projeto será hospedado – o JBonline, criado em 1995, no qual a maioria das notícias não são de autoria própria – se terá apenas uma “amostra” do conteúdo exclusivo, pago, do JB Digital.

Dessa forma, o plano seria de preservar seu leitor antigo e fiel, parte dos cerca de 20 mil assinantes do impresso nos últimos momentos da longa jornada, e conquistar o público jovem, aquele acostumado a baixar músicas, filmes e informação gratuitos e de excelente qualidade na web.

O Rio sob um ponto de vista

Os anúncios repentinos do fim do JB chocaram a imprensa, seus leitores e funcionários. Todos agiram como se a notícia fosse uma grande surpresa, uma grande perda. “E agora? O Rio terá apenas um grande jornal?”, indagaram os hipócritas.

É evidente que há muito o Rio tem apenas um grande jornal. Há muito a classe média fluminense parou de ler as coloridas páginas do JB e passou a ter em mãos apenas o periódico principal da família Marinho. Entretanto, durante todos estes anos, nenhuma palha foi movida para que este velho JB, que traz nas rugas do nome marcos profundos da história do Brasil e do mundo, fosse salvo das mãos assassinas de seus donos despreparados.

Os defeitos e problemas deste fantasma saudosista são explícitos e facilmente criticáveis. O fato é que ele ainda continuará vagando sem rumo por aqui até que o deixem morrer em paz, em memória de seu passado grandioso, ou se esforcem para recuperá-lo das cinzas com dignidade, estado ao qual foi reduzido fatalmente no trágico fim de sua vida longa e sentenciada.

A mídia, a ‘esquerda’ e a esquerda

A entrevista concedida pelo candidato do PSOL à presidência da república Plínio Arruda ao ‘jornalista’ José Roberto Burnier, exibida anteontem no Jornal da Globo, é sintómática no que diz respeito ao tratamento dispensado pela mídia às campanhas eleitorais de esquerda. Quando não usa do artifício da invisibilidade, como o faz por exemplo com o PSTU e seus candidatos, parte para uma estratégia que mistura agressão e confusão. Utiliza-se de métodos retóricos para confundir a escolha do eleitor e tentar desestabilizar seus entrevistados. É uma demonstração inequívoca da óbvia função política da mídia burguesa que, apesar de seu descaramento, ainda encontra no seio da sociedade um confortável berço para seu ‘mito da imparcialidade’.

No entanto, mostra por outro lado, a flagrante preocupação dos poderosos da mídia com a possibilidade de ascenção de um paradigma político voltado menos para o capital e mais para o social. E isso já demonstra uma vitória do povo contra a tirania disfarçada – mas nem tanto – dos setores poderosos do Brasil. A tentativa de destruir publicamente figuras de forte reivindicação popular sem demonstrar tão explicitamente os enormes tentáculos do poder midiático são uma prova de que é possível sim enxergar o Brasil governado por interesses verdadeiramente populares, com vontade e participação política em prol do desenvolvimento social e em detrimento dos mercados.

Roberto Burnier, compromissado com a manutenção do status quo imperante no Brasil, mostra a incoerência, a leviandade e a podridão que significa fazer ‘jornalismo’ para a casa em que trabalha. Faz uma série de intromissões e colocações sem importância, como a respeito da necessidade da ‘ficha no hospital público’, numa tentativa de penetrar e colocar em contradição as respostas de seu entrevistado. Obviamente falha diante do bem consolidado discurso do candidato Plínio, que é absolutamente consciente da intenção de seu entrevistador, mas que não pode dispensar, dados os objetivos de sua campanha, a oportunidade de figurar na rede de televisão com maior penetração no país. O faz de maneira incontestável, passa incólume às tentativas do entrevistador de derrubá-lo, e – muito importante dizer – tendo sempre como característica a boa educação e o respeito, que passou longe de ser recíproca nas duas oportunidades em que esteve na Rede Globo.

O referido ‘jornalista’ faz ainda uma colocação digna de nota: diz não entender qual é o sentido de desapropriar terras produtivas que excedem os mil hectares, como propõe o candidato. É claro que não entende, dada sua pretensa ignorância político-social da realidade do país a que se dirige. É contundente ao defender os fazendeiros latifundiários e se opor aos interesses do campesinato. Renega o trabalho do camponês como motor primeiro de sua produção, perguntando ao entrevistado se não seriam os responsáveis pela produção do campo os escravocratas do latifúndio que a financiam, corroborando o discurso fascista e feudal de que o pobre é responsável por sua pobreza. Esta é a lógica do capital que o candidato Plínio pretende, segundo sua campanha, derrotar. Quem possui os meios de produção explora os que não os possuem, é simples assim. Mas o jornalista não compreende tal colocação. Não pode compreender, entregue que está às prescrições de seus patrões, que por sua vez agem como servos dos interesses da concentração de terra e do agronegócio.

Por último toca no ponto da reestatização da Vale, fazendo um hábil uso do controle que possui dos cinco minutos de entrevista – um tempo risível se comparado ao que têm os ‘grandes’ candidatos, e que reafirma o caráter não democrático do pleito presidencial. Deixa pouquíssimo tempo para o candidato explicar uma coisa bastante óbvia mas não trivial, e cria de novo uma oportunidade de vislumbrar os interesses tacitamente implícitos no programa ‘jornalístico’. Numa pergunta dissimulada – como se não fosse a Rede Globo em grande parte responsável pelo sucateamento da estatal Vale do Rio Doce, num premeditado processo de privatização concretizada pelo governo FHC, neoliberal por excelência – Burnier diz que a companhia é agora muito mais produtiva e geradora de empregos. Não fala, no entanto, do contexto da política econômica do governo no período da privatização, de seu compromisso com o capital extrangeiro e com o FMI, com os interesses dos banqueiros e dos latifundiários, fatores que contribuíram em grande parte para a derrocada da empresa estatal. Também não dá tempo ao candidato de explicar este raciocínio tão básico e óbvio, mas que não pode ser dito em trinta segundos.

Ao que parece, a mídia novamente não conseguirá colocar o candidato de sua predileção na presidência da república. Mas perder para o PT é aceitável e em grande medida desejável para os setores ricos do país. A oposição que ainda existe na direita ao governo é muito mais fruto de um preconceito histórico da burguesia – que não pode suportar ver em seu comando um ex-operário e ex-pobre iletrado – do que propriamente por suas diretrizes de governo, vide os 420% de lucro dos banqueiros. Perder para um partido verdadeiramente de esquerda, no entanto, é um risco que a Rede Globo, representante maior das ‘natas’ da sociedade, não vai se atrever a correr. Afinal de contas, a emissora já tem grande experiência: é melhor prevenir do que remediar.

A entrevista pode ser vista abaixo:

Madureira, do “PPSDB”

Recebi de um amigo meu a dica desse vídeo, talvez um dos mais engraçados da carreira do humorista neocon Marcelo Madureira, em inspirada noite galhofeira na bancada do inefável Instituto Milleniun, a gentil confraria neo integralista bancada pela velha mídia. Num misto de primarismo e fúria gaguejante, Madureira (mas com discurso do Leblon), primeiro, faz um mea culpa por ter militado no antigo Partido Comunista Brasileiro (PCB), que classifica como “pior partido político” do Brasil.

Depois, prega o impeachment de Lula, afirma que os atuais líderes políticos do governo eram aqueles que não estudavam na faculdade (“conheço todos eles!”), se credencia como social-democrata e se diz simpatizante do “PPSDB”, num saboroso ato falho com potencial de se tornar, além de uma piada, uma nova sigla depois de 2010.

Compartilhem comigo desse constrangimento, sob mediação de William Waak:

Por Leandro Fortes

Os privilégios do bispo Edir Macedo

Apesar do discurso oficial pela democratização da mídia, o governo Lula derrubou, na prática, o limite de propriedade de concessões de radiodifusão que vigora desde os anos 60. Com anuência do governo, o bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, é acionista de três emissoras de TV no Estado de São Paulo: duas como pessoa física e uma por meio de pessoa jurídica. Copyright Folha de S.Paulo, 24/12/2007; título original “Governo ignora limite para concessões de canais de TV”. Por Elvira Lobato (FSP).

Apesar do discurso oficial pela democratização da mídia, o governo Lula derrubou, na prática, o limite de propriedade de concessões de radiodifusão que vigora desde os anos 60. Com anuência do governo, o bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, é acionista de três emissoras de TV no Estado de São Paulo: duas como pessoa física e uma por meio de pessoa jurídica.

O limite estabelecido no decreto-lei 236 (de 1967), que está em vigor, é de duas TVs por Estado. Foi extrapolado em junho de 2005, quando a Rádio e Televisão Record S.A – concessionária da cidade de São Paulo – comprou, de bispos da Iurd, 30% da TV Record de Franca.

Macedo já possuía duas concessões de televisão em São Paulo, como pessoa física. Ele tem 90% da concessionária da capital (os outros 10% estão em nome de sua mulher, Ester Bezerra) e 63% da TV Record de Rio Preto.

O Ministério das Comunicações declarou à Folha que aprovou a transferência das ações da emissora de Franca por entender que o limite se aplica apenas a pessoas físicas.

A interpretação é contestada por especialistas ouvidos pela Folha. Na opinião do ex-ministro das Comunicações Juarez Quadros do Nascimento e de três advogados consultados, a transferência foi ilegal.

Para o consultor jurídico da TV Cultura de São Paulo, Fernando Fortes, a TV Record de Franca estaria passível de perder a concessão.

A avaliação dele é de que, se prevalecer a interpretação do ministério, o limite de propriedade de radiodifusão cai por terra.

As empresas do setor, tradicionalmente, burlam o limite, registrando as concessões em nome de diferentes membros da famílias, mas a artimanha é considerada legal, porque, individualmente, os acionistas ficam dentro do limite.

Pessoa jurídica

O caso de Macedo pode abrir caminho para que um mesmo acionista controle número ilimitado de emissoras, por intermédio de pessoas jurídicas.

Até 2002, pessoas jurídicas não podiam ser acionistas de concessionárias de rádio e televisão. Apenas pessoas físicas – brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos – eram admitidas.

Há cinco anos, o artigo 222 da Constituição foi alterado para permitir a participação estrangeira de até 30% nas empresas de mídia.

A emenda – regulamentada pela lei 10.610, em dezembro de 2002 – também permitiu a participação de pessoas físicas em até 100% do capital de emissoras de radiodifusão.

Ações das emissoras da Rede Record foram transferidas para a Rádio e Televisão Record S.A, de propriedade de Edir Macedo e da mulher.

O presidente Lula autorizou a transferência indireta do controle da TV Record de Franca em junho de 2005, pelo despacho nº 52.

O ex-ministro das Comunicações Juarez Quadros do Nascimento, que estava no cargo quando a lei 10.610 foi aprovada, diz que o limite de propriedade tem de incluir as participações de pessoas físicas e jurídicas. Para ele, o limite de propriedade de concessões é importante para evitar o monopólio de grandes grupos.

Fortes diz que, por maior que seja a cadeia societária, é preciso identificar a pessoa física existente por trás da pessoa jurídica para o limite de concessões. “”Não existe respaldo legal para excluir as pessoas jurídicas desse cálculo. Elas não podem ser usadas como subterfúgio”, afirmou.

Para ele, as ações preferenciais (sem direito) também contam no cálculo. A participação indireta de Edir Macedo na TV Record de Franca é com ações preferenciais.

“O texto é claro: não poderão ter concessão entidades das quais faça parte acionista ou cotista que integre o capital de outras empresas executantes do serviço de radiodifusão além dos limites fixados”, declarou.

Ministério diz que lei trata só de pessoa física

O Ministério das Comunicações afirmou que o Código Brasileiro de Telecomunicações de 1962 e o decreto-lei 236 de 1967 só disciplinam as participações acionárias diretas de pessoas físicas em empresas de radiodifusão e que as participações indiretas, por meio de pessoas jurídicas, não são disciplinadas em lei.

Com isso, o ministério entende que os limites de propriedade de televisão -no máximo duas emissoras por acionista, no mesmo Estado, e máximo de dez em todo o país- não se aplicam às ações adquiridas por empresas, como no caso da compra de 30% da TV Record de Franca, no interior do Estado, pela Rádio e Televisão Record S.A, do bispo Edir Macedo.

A informação oficial é que a transferência das ações da TV Record de Franca foi analisada pela Secretaria de Serviços de Comunicação Eletrônica e pela consultoria jurídica do Ministério das Comunicações e, ainda, pela chefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, com assessoramento da Advocacia Geral da União.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo o ministério, autorizou a transferência em 20 de junho de 2005, pelo despacho 52, publicado no Diário Oficial da União.

Para o Ministério das Comunicações, não há risco de a concessão da TV Record de Franca ser cassada, uma vez que ele entende que não foram infringidos os limites de propriedade de emissoras estabelecidos pelo decreto-lei 236.

Universal e Record

Procurada pela Folha, a Igreja Universal do Reino de Deus não quis se manifestar sobre o assunto das concessões de TV e recomendou ao jornal que procurasse o Ministério das Comunicações. A Rede Record foi informada do teor da reportagem, mas também optou por não dar entrevista.

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