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Pai de Kassab eleito imortal da Academia Paulista

Vários analistas apontam o atraso econômico e cultural do povo como causa da eleição e reeleição de figuras como Sarney, Collor, Renan e Barbalho. Não é bem assim.

A revista Época de 10 de agosto de 2009 noticiou a eleição de Pedro Salomão José Kassab, pai do prefeito de São Paulo, para a Academia Paulista de Letras.

Detalhe 1: o mais novo imortal paulista nunca publicou um livro. Apenas artigos na grande imprensa.

Detalhe 2: a eleição foi antecedida pela liberação pelo governo estadual de R$ 3,5 milhões para reforma na sede da Academia, que vem caindo aos pedaços há dez anos.

Alguém pode dizer que escolher um membro da Academia Paulista é bem diferente de eleger parlamentares e governantes. Correto. Mas, lembremos que os imortais paulistas estão bem “acima” do padrão cultural e intelectual que se atribui às populações nordestinas e interioranas, em geral.

Muitas vezes, os setores pobres dessas regiões são acusados de carecerem de “espírito republicano” e noções de “ética política”. Seriam desinformados, com baixa escolaridade, a quem faltariam boas doses de cultura e esclarecimento sobre o modo burguês de condução da vida pública.

O fato é que a decisão dos acadêmicos paulistas refere-se a alguém cujo filho é prefeito da maior cidade da América do Sul, apoiado pelo governador do estado mais rico do País.

Na melhor das hipóteses, o povão somente reproduz os padrões de conduta que foi obrigado a respeitar com quem o domina.

“Não é pessoal, são só negócios”

Ignoro se esta frase foi proferida por algum gangster da vida real ou só pelos das telas. Mas, uma coisa é certa: cai como uma luva para os gangstêres da política oficial.
Faço questão de acrescentar o adjetivo oficial, na esperança de que volte a existir uma política revolucionária, antípoda de tudo isso que se vê em Brasília. Sou um eterno otimista.

O certo é que, quando Vargas mandava seus esbirros encarcerarem Prestes, despachando-lhe a companheira para a morte nos cárceres nazistas, eram só negócios.

E foi também seguindo a ética dos negócios (a qual, todos sabem, inexiste) que Prestes subiu depois aos palanques junto com Vargas.

Não foi por motivos pessoais que Collor informou ao distinto público que Lula produzira uma filha fora do casamento e tentara convencer a amante a abortar o rebento indesejado.

Nem Lula tem qualquer motivo pessoal para aparecer agora abraçado a Collor, só lhe interessando receber o favor político de que carece neste instante.

Há, é claro, exceções, como o grande Monteiro Lobato, que tentou um sem-número de vezes conquistar uma cadeira, pra lá de merecida, na Associação Brasileira de Letras.

Quando estava prestes a lograr seu intento, com os votos de que necessitava já garantidos, alguém lhe soprou que iria sentar-se ao lado de Getúlio Vargas, responsável último pelas sucessivas prisões que Lobato sofrera.

É isto mesmo, Getúlio Vargas. A exemplo de Sarney, outras figuras do poder já foram atrás de glórias literárias, fingindo não perceber que elas só lhes são concedidas por causa do poder, não em decorrência dos textos medíocres que parem a fórceps.

Avaliando o que significaria para um homem de caráter ficar em tal companhia, Lobato retirou de imediato sua candidatura. Outros tempos.

Há muito deixei de dar importância para a política oficial e seus símbolos. Quando fiz a opção revolucionária, nos idos de 1967, foi para valer. E aprendi bem o bê-a-bá do marxismo, meu ponto de partida.

Então, estou careca de saber que não são os Vargas, Sarneys, Lulas e Collors que movem a História, mas sim a constelação de forças que faz deles instrumentos.

Há uma função a ser preenchida e alguém a preenche. Se apenas tirarmos de cena tal pessoa, outra imediatamente lhe tomará o lugar. Se eliminarmos a função, aí sim produziremos uma verdadeira mudança.

Em 1945, Vargas foi induzido a abrir mão da ditadura e afastar-se por algum tempo da política. Não se passaram duas décadas sem que o Brasil resvalasse para outra ditadura, pior ainda.

Adhemar de Barros, Maluf, Collor, Calheiros, Palloci e tantos outros já foram degradados para aplacar a indignação popular, depois voltaram à tona como se nada houvesse acontecido. E a política oficial não ficou menos podre durante seu ostracismo.

Apontar o capitalismo como raiz de todos os males saiu de moda. Só que, como eu nunca liguei para modas, continuarei insistindo na necessidade de construirmos uma sociedade nova, ao invés de ficarmos catarticamente esbravejando contra a putrefação da velha.