Instituições em frangalhos

“Congresso Nacional, se gradear vira zoológico, se murar vira presídio, se cobrir com lona vira circo, se botar lanterna vermelha vira puteiro e se der a descarga não sobra ninguém”.

A frase está na seção deste sábado do humorista José Simão, na Folha de S. Paulo.

Cautelosamente, ele a colocou entre aspas, antecedida de um “E olha a revolta das pessoas”, dois pontos.

Pouco importa se a ouviu ou a criou. Num país sério, ela lhe acarretaria sérios problemas. Aqui, os parlamentares tornaram tão deplorável a imagem do Legislativo que qualquer punição seria descabida.

É o que o colunista Fernando Rodrigues explicou admiravelmente na mesma edição da Folha:

Embora o foco agora seja o Senado, não custa lembrar das estripulias na Câmara. Lá, já está tudo abafado. Usou-se até parecer jurídico pago com dinheiro público na absolvição do deputado que levou a namorada ao exterior.

Essa impunidade generalizada parece ter conexão com o momento pelo qual passa o país. A economia não foi para o buraco. Milhões de brasileiros recebem o Bolsa Família. A sensação de bem-estar produzida leva os cidadãos a pensar mais no próximo crediário nas Casas Bahia e menos em protestar contra a canalhice na política.

Num país miserável, não é surpresa a barriga vir na frente da ética e da moral quando se trata de escolher entre ganhar a vida e preocupar-se com políticos indecentes.

Faltou dizer que os políticos só se avacalharam dessa forma por se terem tornado supérfluos e decorativos.

Na verdade, os três Poderes da República foram esvaziados. No lugar deles, manda e desmanda o poder econômico.

No que realmente importa, o grande capital tem a seu serviço o Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Para que o povo não perceba a nudez do rei, deixa-lhes alguma autonomia para decidirem o secundário e o irrelevante.

Então, não há motivo para espanto quando o Congresso é comparado a zoológico, presídio, circo, puteiro ou latrina.

Pior ainda é a situação da imprensa, antes referida como o quarto poder. Virou mera caixa de ressonância dos interesses burgueses.

Já deixou até de exigir qualificação dos seus profissionais. Qualquer cozinheiro hoje equivale a um jornalista, conforme a frase inesquecível de Gilmar Mendes (nós sempre a teremos em mente quando estivermos escrevendo sobre ele!).

Daí minha tese de que o sistema não tem mais salvação.

Quem busca poder dentro do stablishment para depois tentar voltá-lo contra ele (como, de maneiras diferentes, fizeram Lula e Chávez), ou é cooptado ou acaba enveredando pelo autoritarismo.

É claro que dará muito mais trabalho se nos propusermos a obter consenso na sociedade, fora do sistema e contra o sistema, para a realização das mudanças que se fazem cada dia mais necessárias — e talvez sejam a única tábua de salvação face às ameaças que a ganância capitalista coloca para a própria sobrevivência da humanidade, começando pelas alterações climáticas.

Mas, se o caminho é longo, temos de começar a trilhá-lo o quanto antes, ao invés de desperdiçarmos nosso tempo insistindo em práticas cuja validade expirou no século passado, como o caudilhismo.

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