Uma garrafa no mar e uma esperança para o povo?

garrafa gazaPor Sidney Dupeyrat de Santana,
Temos visto, nos últimos anos, o nascimento de um subgênero no cinema do Oriente Médio. Filmes que, mais do que tomar partido ou oferecer soluções políticas para os inúmeros confrontos da região, tentam mostrar o lado humano das guerras e os dramas cotidianos de pessoas que vivem neste lugar tão instável. Desta linhagem surgiram excelentes películas com “Lemon Tree”, “Paradise Now”, “A Noiva Síria” e “A Banda”.
E “Uma Garrafa no Mar de Gaza” segue a tendência. Apesar de ser inferior aos anteriores, é mais uma obra a ser conferida pelo amante de cinema e geopolítica internacional.
O roteiro é simples e em até certo ponto infantil. Uma jovem judia francesa recém-chegada a Jerusalém, Tal (Agathe Bonitzer), resolve jogar no mar uma garrafa de vidro contendo uma carta de apresentação. Não familiarizada com o histórico de animosidade entre israelenses e palestinos, o seu objetivo é entrar em contato com um árabe e conhecer um pouco mais de um conflito que agora faz parte de sua vida.
A garrafa e a carta são encontradas por um palestino de Gaza, Naïm (Mahmud Shalaby), que começa a se corresponder com a francesa. A óbvia animosidade inicial dá lugar a uma identificação mútua. Guardadas as devidas proporções e a abissal diferença de autonomia, infraestrutura e poderio econômico entre Israel e Palestina, ambos os personagens habitam zonas de conflito e convivem com a tensão no dia-a-dia. Se Tal tem medo de pegar o ônibus por causa de possíveis homens-bomba, Naïm é obrigado a sobreviver com a constante ameaça dos bombardeios aéreos israelenses.
A comunicação entre ambos, claro, não é fácil. Mesmo estando tão próximos geograficamente, os personagens vivem em lados opostos de um conflito militar e têm qualquer tipo de interação proibida. Um muro e inúmeros checkpoints separam os dois jovens. Mas a tecnologia supera barreiras físicas e eles conseguem estabelecer e manter contato por email. E assim vão se aproximando e, aos poucos, entendendo que o lado oposto também tem suas razões e suas lamúrias nesse que parece ser um confronto sem fim.
O filme tem duas falhas. Flerta com a pieguice na rápida construção de uma relação amorosa entre os protagonistas e oferece à França o papel de “baluarte da cultura e da liberdade”. Mais do que dar bolsas de estudo aos estudantes palestinos, o papel francês como superpotência global também é o de trabalhar com as lideranças israelenses e palestinas pela realização de um definitivo projeto de paz na região. E o roteiro poderia fazer menção a isso, e não adotar uma postura simplista e colonialista.
“Uma Garrafa no Mar de Gaza” jamais toma partido de um dos dois, apesar de deixar claro que a Palestina é o lado mais fraco da balança. O objetivo do diretor Thierry Binisti é retratar a rotina de sofrimento que um conflito sem perspectivas de término inflige aos dois povos. E isso ele faz bem. A cena final, tão bonita quanto melancólica, é uma fotografia perfeita da situação atual. Podemos ter fé num futuro melhor? A resposta, infelizmente, está longe de ser fácil.
(*) Artigo publicado originalmente na Vírus Planetário.

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