Saudade das pedras de Teixeira

Um lampejo ilumina o meu pensar
E encontro no meio dos achados
Minha infância lá no Sítio Machados
No terreiro debaixo do luar
Afinada, uma orquestra a coaxar
Ali perto, no tanque do oitão
Era tempo de chuvas no Sertão
Que o meu pai o chamava de divino
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão
Ainda ouço soar no vão do tempo
Zé Mosquito e orquestra ensaiando
Era o sopro da arte eternizando
Partituras... milhares num momento
Lembro bem de Ambrósio com talento
A tirar do seu sax uma canção
Ao meu lado a menina com emoção
Solfejava baixinho no meu tino
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão

Do passado tem vezes que sou presa
E me pego absorto, revivendo
Como se bem ali tivesse vendo
Minha vida passando com clareza
A lembrança sentada numa mesa
Com Djalma e Solon ao violão
Mais a voz de Mimosa na canção
Dando provas de seu gogó divino
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão

No horizonte o ocaso enrubescido
Vendo o sol sonolento se esconder
Na Igreja um anjo a bendizer
Uma ave-maria enternecido
A moçada guiada por Cupido
Para a praça acorria em profusão
E no clube de Eli e João Mamão
A vitrola a tocar Gesùbambino
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão

Nas paragens vernáculas de Teixeira
Donde vê-se a montanha potentosa
A minh'alma se queda, assim, saudosa
Quando o meu coração abre a porteira
As lembranças vestidas de poeira
Se sacodem na noite de São João
A quadrilha marcada no salão
Pelo nobre Ananias de Seu Nino
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão

Uma pedra no meio do caminho
Onde um galo acordava o novo dia
Explodiram naquela manhã fria
O progresso a teria como espinho
Ao rumar por ali para Brejinho
Vão da noite, umbral da escuridão
Vejo alguém tateando pelo chão
Cada seixo daquele desatino
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão

Quando avisto essas plásticas paisagens
Com os seus elementos naturais
Penso às vezes que as pedras são bem mais
Do que seres sem vida, sem linhagens
Na verdade, elas usam de linguagens
Que só louco ou poeta entenderão
Ah, que falta de estar com Domingão
A falar do escudo cristalino!
A saudade parou no meu destino
E o futuro ficou na ilusão

Martim Assueros, abril/2024
(no mote de Adeildo Nunes)

Um comentário sobre “Saudade das pedras de Teixeira”

  1. Não deixo de me admirar e de agradecer pela sua capacidade expressiva. As imagens e o ato evocativo, fielmente traduzem e transmitem o sentir poético. a junção de passado e presente donde nasce a plenitude do viver.

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