Venezuela: Via beligerante aborta saída democrática

No momento em que estas linhas estão sendo digitadas, deve estar iniciando, em Bogotá, um encontro com lideranças e chefes de Estado do continente, acerca dos próximos passos a serem dados, com vistas a uma suposta saída do impasse venezuelano.

A Venezuela segue a desafiar o processo democrático, seja por vias endógenas seja por via exóginas. Nos últimos meses e nos últimos dias, agiganta-se o risco de uma conflagração sangrenta, de grandes proporções, de modo a abortar o caminho democrático como única condição de uma saída democrática, de alcance razoável. Não nutro simpatia pelas escolhas em curso do regime venezuelano. Tenho, de minha parte uma posição próxima da manifestada pelo sociólogo François Houtart (cf., por exemplo: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4834924.pdf ).

Independentemente de qual seja a avaliação sobre as escolhas do Governo de fato e legalmente instalado da Venezuela, sucessivas tentativas endógenas e exógenas de superação da atual crise têm resultado frustradas. E, ao que parece, as mais recentes tentativas emitem sinais de nova frustração. E o que nos leva a sinalizar nesta direção? Cuidemos, a seguir (brevissimamente), de pontuar alguns elementos, tomando em consideração uma sucessão de análises de um amplo espectro político-ideológico, indo de analistas venezuelanos a comentaristas europeus; indo de uma interpretação de Causa Operária, passando por boas análises disponibilizadas pela Boitempo, a interpretações de Breno Altmann, de Boaventura de Sousa Santos… (Sobre este último, ver: https://www.youtube.com/watch?v=vZpV_1JdmBI )

Nas linhas que seguem, limitamo-nos a destacar, rapidamente, elementos em forma de questionamentos que considero importante compartilhar.

É sabido que crises humanitárias acontecem, neste instante, em diferentes países, mundo a fora, a merecerem iniciativas internacionais de verdadeira ajuda humanitária. Por que será que o caso Venezuela – que está longe de ser o mais grave – desperta tanto sentimento de solidariedade?

O que os pobres da Venezuela têm de tão importante – a mais do que outros povos – para merecerem tanta atenção e interesse, desde Trump e seus aliados?

No passado – recente e menos recente -, em que resultaram tais ajudas humanitárias (inclusive no Brasil dos inícios dos anos 60, com a participação de organismos tais como a USAAID)?

Em que resultaram, na pratica, ações de intervenção similares, no Iraque, na Líbia, etc.?

Pode-se mesmo dizer que daí rebrotou a Democracia? Qual Democracia?

À parte eventual (e duvidoso!) Interesse humanitário de grandes corporações estadunidenses e respectivos governos aliados, será que o petróleo deve ser considerado seu alvo especial?

Que saída democrática é possível, sem a participação decisiva das diversas forças que constituem o povo venezuelano? É o povo venezuelano ou são as forças exógenas a quem deve caber a decisão, em busca de uma saída democrática?

As potências e os grupos externos, tão interessados em determinar o destino do povo venezuelano, achando-se em semelhante situação, aceitariam a saída que se está a propor, inclusive a da criação de um presidente autoproclamado?

Com relação à propagada “ajuda humanitária”, esta alcança que ordem de valor (20 milhões de dólares), quando comparada ao sequestro de dezenas de bilhões de dólares, feitos pelo Governo Trump, contra o povo venezuelano?

No caso do Governo brasileiro diante de profundos desafios enfrentados, não será, no mínimo, temerária uma adesão incondicional à tese de invasão (ou algo semelhante) do território venezuelano?

Diante da conhecida e reconhecida tradição diplomática do Brasil, no conjunto das nações, não parece evidente seu perfil já provado e aprovado, em vez de um perigoso adesismo às soluções de força?

João Pessoa, 25 de fevereiro de 2019.

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