Resposta ao editorial de “O Estado de S. Paulo”

Cesare Battisti

Causa tristeza e decepção ver O Estado de S. Paulo posicionar-se como força auxiliar do revanchismo italiano, tomando partido contra o governo brasileiro e uma das mais nobres tradições deste país: a acolhida hospitaleira a perseguidos políticos de todos os países e orientações politico-ideológicas.

Ignorando por completo as consistentes justificativas do ministro da Justiça Tarso Genro para conceder refúgio humanitário a Cesare Battisti, o editorial “Decisão desastrada” (16/01) insistiu em desconsiderar o clima de histeria vingativa dominante na Itália no período subsequente ao assassinato de Aldo Moro — semelhante, p. ex., ao macartismo estadunidense.

Critica Tarso Genro por arvorar-se em “juiz da Justiça italiana”, mas qualquer cidadão com o mínimo conhecimento jurídico ficaria igualmente estarrecido ao constatar que Battisti acabou condenado à prisão perpétua mediante enquadramento numa lei que inexistia quando ocorreram os crimes de que o acusam e lhe foi aplicada com efeito retroativo.

E falta com a verdade ao afirmar que Battisti foi “condenado à prisão perpétua por ter assassinado quatro pessoas em sua atividade terrorista”. Disto o acusou um delator premiado, sem que nada mais o corroborasse. Só que duas dessas mortes aconteceram no mesmo dia, em cidades tão distantes entre si (Udine e Milão) que era fisicamente impossível Battisti ser o autor de ambas. Aí uma das acusações foi alterada de “assassino” para “mentor intelectual do crime” — o que não impediu os tendenciosos de continuarem trombeteando que Battisti matou quatro pessoas.

A choradeira e as ameaças italianas têm espaço descomunal no editorial, que, entretanto, em nenhum momento lamenta as agressões às instituições brasileiras, começando pela nota em que a chancelaria italiana exortou o presidente Luiz Inácio da Silva a revogar a decisão do ministro Tarso Genro, cometendo três pecados capitais: contestar uma decisão soberana do governo brasileiro; atingir a autoridade do ministro, quando o correto seria apelar primeiramente a ele; e atropelar o protocolo, já que a interlocutora da chancelaria italiana é sua congênere brasileira, enquanto o interlocutor de Lula é o presidente Silvio Berlusconi.

Esperamos que, para compensar, o Corrieri della Sera faça um editorial intitulado “Pressão Desastrada”. Este seria mais veraz, pois a arrogância com que a Itália tentou impor sua vontade ao governo brasileiro teve o efeito de um bumerangue.

Celso Lungaretti

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