Preguiça do racismo de José Serra…

MigrantesEm 2006, no jornal local da TV Globo, Chico Pinheiro e Carla Vilhena fizeram excelente entrevista com o então candidato ao governo do Estado de São Paulo, José Serra. Uma ótima entrevista, independente (feita por jornalistas, e não pelo “aquário”), conforme depoimento de Rodrigo Vianna, que também trabalhava na emissora.

No quinto minuto, segundo 24, começam a falar sobre educação. Chico e Carla comentam que São Paulo foi reprovado nas avaliações nacionais e Serra contesta. Até aí tudo bem. Mas vem, então, a seguinte continuação:

“Tem que entender o seguinte. Diferentemente dos estados do sul, que são os que têm melhor situação, São Paulo tem muita migração. Muita gente que continua chegando, e tal. Este é um problema. E houve uma expansão quantitativa muito grande do ensino. Eu acho que agora a gente tem que olhar pra frente e enfatizar a qualidade. O que eu fiz na prefeitura e que vou fazer no estado? Botar duas professoras por sala de aula no primeiro ano do ensino fundamental. Isso é crucial para que as crianças aprendam. Eu não quero nenhuma criança passando de ano sem aprender aquilo que tem que aprender. Isso é essencial, Carla”.

Eu pergunto: o que tem uma coisa a ver com a outra? A culpa, então, é dos migrantes, candidato Serra?

O número de migrantes é seguido do aumento da produtividade. Migrantes, nobre Serra, são todo tipo de gente: os trabalhadores da área de construção civil, estudantes de graduação e pós-graduação, famílias que recebem convites diversos para integrar áreas específicas de conhecimento e, igualmente, algumas pessoas que acabam por ficar desempregadas – o mesmo acontece com os paulistanos, que também são trabalhadores da construção civil, estudantes, desempregados ou qualquer outra coisa. É um tema bastante complexo.

Todos os que estão eventualmente empregados, ou que já estiveram empregados, estão contribuindo para a produtividade do Estado de São Paulo, para a maior participação da população nos impostos, para a redistribuição destes impostos em serviços sociais. Aliás, em muitas áreas, o próprio Governo Federal distribui recursos – veja só – de acordo com a quantidade de pessoas. Incluindo a área de educação. E, por incrível que pareça, o Governo Federal não pergunta antes se a criança é paulistana ou cearense.

Quando o candidato José Serra começa sua explicação vinculando o “problema” da educação com o “problema” dos migrantes, demonstra todo o seu preconceito e demonstra porque o PSDB está morrendo no Nordeste.

É um tipo de racismo (*) tão ultrapassado, algo tão estúpido, que eu tenho preguiça de iniciar qualquer argumentação que conclua o óbvio: os migrantes não são melhores nem piores que ninguém. Ao contrário do que Serra parece supor. E o aumento populacional é acompanhado, anualmente, pelo aumento de recursos para a correta aplicação em serviços sociais básicos, como é a educação e a saúde. Não contente com a sua falta de competência em gerenciar a educação pública em São Paulo, José Serra ainda credita seu fracasso a um “inimigo” externo, os migrantes.

Para entendermos a ameaça que está por vir caso esse senhor seja presidente, Rodrigo Vianna faz um comentário que não me surpreende, pela repetição incessante: “Serra saiu do estúdio da Globo furioso. Talvez por isso, pouco tempo depois, numa outra entrevista que iria ao ar no SP-TV 2 (edição da noite), o jornalista Carlos Tramontina recebeu ordens expressas do Rio de Janeiro, para cortar as perguntas duras. Aliás, recebeu do Rio exatamente as perguntas que deveriam ser feitas. A equipe do jornal ficou muito chateada, lembro bem. Porque até ali todas as entrevistas tinham sido feitas com liberdade – como aquela do Chico e Carla Vilhena.”

Agora, cabe o seguinte registro final da minha parte: se o nobre candidato José Serra tem este tipo de pensamento acerca dos migrantes, o que dirá acerca dos imigrantes de todo tipo que o governo atual generosamente recebe no Brasil, oriundos de conflitos étnicos e regiões de miséria social? Qual seria sua política, enquanto presidente?

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[*] Racismo, nos estudos culturais e para diversas outras disciplinas, é um conceito que não se restringe ao preconceito de cor de pele, se estendendo a preconceitos étnicos e regionais, por exemplo. A ideia de raça foi melhor entendida, dada a diversidade dos usos históricos, como qualquer forma de discriminação e preconceito que propunha qualquer tipo de superioridade/diferença de um determinado povo/cultura em relação a outro povo/cultura. Neste caso, supostamente dos paulistanos em relação a pessoas de outra naturalidade e, até mesmo, de outra nacionalidade, como no caso do preconceito contra bolivianos e peruanos verificado recentemente por meio de relatos da mídia.

[**] Acompanhe o twitter do autor: @gustavobarreto_

7 comentários sobre “Preguiça do racismo de José Serra…”

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  2. Eu assisti esta entrevista. Lembro que passei um e-mail protestando e eles nunca responderam (claro). Sempre percebi a hipocrisia, o preconceito e a falta de controle pessoal em todos os debates para presidente que Serra já enfrentou. Ele sempre tentou ser estratégico e disfarçado. Infelizmente, o preconceito ainda reina nesta sociedade. a prova disto, está no que foi mencionado em relação ao Tiririca acima. Eu tenho certeza que Tiririca não venceria no Ceará. O povo do Nordeste tem ideologia e são pessoas pensantes. Serra perdeu feio no Nordeste. O preconceito é o pensamento de pessoas que não buscaram o verdadeiro conceito dos fatos e naturalmente faz parte de uma sociedade desinformada.

  3. Dizem que a geração de empregos é uma consequencia do crescimento da economia, que no governo FHC foram criadas menos vagas que no governo LULA. Gostaria de saber se o número de empregos criados de 2003 pra cá, leva em conta o crescimento da população. Pra mim parece óbvio, que quanto maior a população, maior será o crescimento dos números. Tanto no crescimento bom como no mau.
    Em 2003 éramos cerca de 170 milhões de pessoas, já em 2010 somos cerca de 190 milhões.

  4. Bom dia!

    Deculpe o que vou dizer, mas o candidato Serra está parcialmente certo.
    Não adianta você querer deixar o ensino público paulista com um nível alto se os imigrantes, seja eles nordestinos ou não, chegam aqui sem o mínimo de conhecimento.
    Se você tem em uma sala de aula crianças que frequêntam escola em São Paulo desde o pré e essa criança chega a quinta série, ela tem um certo conhecimento.
    O que acontece quando, nessa mesma sala de aula, chega uma criança oriunda de outro estado, como os do nordeste? Ela não consegue acompanhar o aprendizado, porque a matéria que é dada aqui na quinta série, no nordeste é dada na sexta, sétima e até na oitava série.
    E o que é feito em relação a isso? Nivela-se o ensino por baixo, no nível dos menos instruídos, para que eles possam terminar o estudo, tudo isso em detrimento dos que têm ensino de maior qualidade.
    E isso é verdade! Basta ir a escolas públicas e analisar a vida dos alunos, o conhecimento adquirido e comparar com o que as crianças de escolas particulares aprendem, pois são essas crianças que estão sendo melhores preparadas para o futuro.
    O problema é mais complicado do que parece.
    Não quero aqui dar posicionamento sobre esse ou aquele candidato, mas temos que fazer algumas análises antes de sair criticando os outros.
    Entendo que o governo do PSDB criou uma forma de aprovação automática que piora ainda mais esse quadro.
    Mas o governo do PT, que se diz tão interessado nos menos favorecidos, preferiu dar dinheiro as pessoas ao invés de promover educação.
    Quantas escolas daria para se construir no nordeste com o dinheiro gasto com as “esmolas” dadas pelo governo federal?
    Isso sim vai resolver a vida dessas pessoas definitivamente.
    Educação não se resolve da noite para o dia. Leva 3 gerações para resolver o problema. Se não fizerem algo agora, essa diferença social que o atual governo diz combater vai aumentar cada vez mais.
    Sou empresário e vejo a dificuldae que existe em conseguir mão de obra qualificada, ainda mais no meu ramo onde trabalho com operadors de máquinas.
    As pessoas que procuram emprego na minha empresa, geralmente, são nordestinos ou filhos de nordestinos.
    É nítida a deficiência educacional.
    Chegam pessoas aqui que não sabem sequer escrever.
    Escrevem “sinplis” quando deveriam escrever “simples”. São coisas básicas.
    Chegam pessoas aqui de 25 a 30 anos que não sabem nem ligar um computador, em pleno ano de 2010.
    É lógico que o governo paulista deve se programar para suprir a crescente demanda por vagas escolares, mas o governo federal não pode simplismente ignorar os estados menos favorecidos, senão estes sempre serão estados geradores de mão de obra desqualificada e que acaba superlotando as escolas paulistas porque precisam sair de seus estados para conseguir empregos melhores.
    Se não houver um investimento em educação no nordeste, não será atrativo para indústrias montarem suas plantas nestes estados e as pessoas continuarão a migrar para São Paulo, onde estão as oportunidades.
    Portanto, não é um problema de racismo, e sim da verdade. Quando se analisa as coisas friamente, chega-se a verdades duras.
    Eu também não gosto desse tipo de comentário, mas a verdade tem que ser dita para que possamos mudar isso.

    O nordeste sempre foi e sempre será uma região pobre e desqualificada porque os governantes, principalmente os de saíram de lá, como o nosso atual presidente, não dão a mínima atenção a essa região.

    Dessa forma nada mudará, os salários continuarão achatados, as empresas terão que cuidar da formação dos seus funcionários, tirando essa responsabilidade das mãos do governo, sobrando mais dinheiro para a corrupção e para compra generalizada de votos.

    Desculpem o desabafo, mas…

  5. Prezado Alex Vieira.

    1. Você mesmo começa o texto se desculpando pelo que diz. Não entendi: essa é a sua posição? A culpa é dos migrantes? O que você tem a dizer sobre o que eu disse, meus argumentos? E a questão dos recursos por pessoa, distribuídos pelo Governo Federal para Estados e municípios?

    2. O governo do PT criou 14 universidades federais e expandiu a rede de escolas profissionalizantes vertiginosamente. O governo FHC, Serra no alto escalão, projeto político do PSDB, não criou nenhuma e congelou salários. Eu vivi a consequência destes anos: entrei na universidade pública em 2002. A UFRJ se encontrava em guerra e a maioria dos professores estavam desejosos de sair dali, por aposentadoria ou aceitando outros empregos.

    Educação superior é importante pois ali se formam professores de biologia, química, física, profissionais de serviço social, pedagogia, enfim, os quadros da educação brasileira. Uma vergonha que o PSDB do sociólogo FHC não consegue esconder: o metalúrgico semi-analfabeto se saiu melhor, avançou no tema, aumentou a importância da educação entre os temas estratégicos.

    3. As “esmolas” são políticas públicas apoiadas por todos os organismos internacionais na área de educação (UNICEF, UNESCO etc). A lógica é simples: o incentivo inicial (as bolsas) são um marco inicial para aquela família, que precisa comprovar, entre outras coisas, matrícula na escola. Se não comprovar presença na escola, perde o incentivo, que é temporário e vinculativo. Há responsabilidades e um projeto de desenvolvimento, de autonomia.

    4. Se você apoia a formação de mão de obra qualificada, imagino que seu voto seja na Dilma. Consulte os dados do ponto 2 (consulte por você mesmo, busque informações) e pense bem… você realmente está votando no melhor projeto ou está votando ideologicamente?

    5. Acho que você deveria conhecer a educação no Nordeste e entender essa complexidade da qual fala. E principalmente avaliar quais as participações federal, estadual e municipal. Essa é a lógica das “competências”, ou seja, cada nível possui competências específicas.

    6. Os migrantes, repito, são muitos: vem tanto os semi-analfabetos quanto os mestres e doutores. E a responsabilidade é do lugar onde eles moram, porque o Brasil é, até onde sei, um país de todos. Do contrário, o candidato Serra deveria começar a pensar em controle de fronteiras no Estado de São Paulo, tal como um país faz para expulsar os “indesejados”. Se esse é o problema, ele poderia fazer isso, que tal? Ou então tomar vergonha na cara e pegar a verba POR PESSOA que vem para educação e saúde e gastar melhor…

    Cordialmente,
    Gustavo

  6. Um outro ponto a ser refletido: Muitos dos estados nordestinos foram ou são governados pelo PSDB. Então eu pergunto: Que tipo de politica educacional os tucanos colocam em prática que não faz com que crianças e adolescentes progridam em seus estados e principalmente no centro financeiro do país? O presidente Lula tem razão: “O Brasil não pode descer “serra” a baixo”.

  7. Há muito tempo os eleitores deixaram de decidir seu voto pelas propostas dos candidatos. Hoje as pessoas votam naquele no qual simpatizam, que é mais “bonitinho” ou mais estudado, que foi deputado disso e daquilo, prefeito ou governador dessa ou daquela cidade… Não que o currículo dos candidatos não seja importante, mas isso não garante uma boa gestão. Aliás, os maiores casos de corrupção no país envolvem políticos e famílias que atuam na política há anos!
    Algumas pessoas não sabem (ou não quer) enxergar a diferença, as evoluções que o Brasil fez nos últimos 8 anos! As pessoas não sabem argumentar quando o assunto é política, ou melhor, sabem argumentar, mas não conseguem se defender de maneira decente e convincente. Quando atacam ou quando se prova algo negativo contra o seu candidato “queridinho”, a única coisa que se faz é contra-atacar o adversário ao invés de tentar provar o contrário.
    Assisto os programas eleitorais e, até agora, o que percebo do candidato José Serra é que ele parece ter uma varinha mágica. Como Marina Silva disse no debate entre os candidatos do primeiro turno, na Rede Globo: “As pessoas devem parar de achar que tudo se resolve num passe de mágica”. Se as coisas fossem féceis como o candidato Serra as faz parecer, o racismo seria sanado logo após a abolição da escravatura. Há problemas no país que são heranças seculares que não se resolvem em 4 ou 8 anos! O que temos que analisar são as evoluções e em que velocidade elas ocorreram durante o mandato desse ou daquele candidato! Temos que analisar o que foi feito e as portas que foram abertas para que mudanças ainda maiores aconteçam! Meu caro Alex Vieira, a população precisa de incentivos, de auto-estima e, num país capitalista, dinheiro é fundamental para se manter, para comer decentemente e não fazer com que pais tirem seus filhos da escola para trabalhar e ajudar no sustento da família. O que você, ignorantemente, chama de “esmola” tem mudado a vida de muita gente! E como nosso colega Gustavo Barreto salientou, o Bolsa Família é um benefício/incentivo condicional.
    As pessoas tem que aprender a analisar as propostas dos condidatos, ter inteligência e discernimento pra saber o que é e o que não é possível a curto, médio e longo prazo. E o mais importante: saber cobrar o que foi prometido em campanha, exigir seus direitos, ir às ruas, reivindicar.
    Vamos deixar nossos preconceitos de lado, deixar de julgar as pessoas por seus diplomas, ou falta deles. Quem julga baseado apenas nesse quesito, se torna muito mais ignorante do que o alvo do julgamento.

    Abraços!

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