Lula, o filho do Brasil

Mais um filme que constava em minha lista de receios. Só que dessa vez, não teve jeito, foi só decepção.

Vou tentar ser calma na explicação, porque quando tenho muito o que dizer extrapolo a língua toda e quase fico sem sentido.

A maior reclamação que posso fazer é a total falta de harmonia entre as cenas. Cada seqüência parece ter tido um objetivo próprio, não dialogando com a próxima. Muitas vezes, se mostrando ineficientes para o propósito desejado ou ainda passando por desnecessárias. Senti bem essa falta de maleabilidade porque por incrível que pareça, já que o filme é exatamente igual ao trailer só que esticado, ainda assim consegue ser muito longo.

Essa colcha de retalhos, que tenta nos atrair para a emoção constantemente, não consegue envolver o espectador e segue no caminho inverso, devido a problemas de roteiro, diálogos e timing.

Certos efeitos como frases ditas que mais tarde são repetidas (cair no mundo), previsões do futuro nem um pouco sutis (teima, meu filho, até conseguir) e ainda a falta de sutileza e tato para dizer coisas simples (ainda vou usar esse uniforme) são alguns exemplos das falhas de roteiro.

Outro problema é a unilateralidade dos fatos. A seqüência de sua mulher grávida dando entrada no hospital onde parece que a demora para ser atendida é gerada por puro pouco caso e total falta de profissionalismo é um exemplo. Ou seja, não há abertura para outras interpretações, como os médicos estando simplesmente ocupados. Em todos os momentos tem que haver uma comprovação do bom caráter de Lula, como se tudo que nos fosse mostrado garantisse seu merecimento de estar onde chegou.

lulaMuitas cenas, principalmente enquanto jovem e adolescente, são construídas apenas para mostrar como o personagem é bom ou simplesmente para reforçar que teve que passar por dificuldades. No primeiro caso: recebendo suas ótimas notas na escola, o empreendorismo exemplificado desde jovem pela capacidade de vender laranjas, sua vontade de trabalhar, a constante superação de obstáculos, deixando sua mãe muito orgulhosa, e no segundo o pai bêbado, a inundação de sua casa – cena essa que não tem nenhum tipo de continuidade- etc. Tudo isso é demonstrado de maneira óbvia, pouco criativa, sem nenhuma sensibilidade de nos mostrar algo além dos fatos. São cenas com um fim, um objetivo claro e por isso, cenas vazias.

Na lista de diálogos ridículos está a anunciação do médico sobre a morte de sua mulher e filho (Você vai ter que ser forte… Você vai ter que ser mais forte ainda….). Aquilo que tenta fazer para gerar envolvimento gera risos, porque não pode ser levado a sério!

Quando Lula fica mais velho, sendo encarnado pelo recente ator Rui Ricardo Diaz, o personagem ganha mais complexidade, mais densidade. Além do que, Rui foi uma agradável surpresa, dando credibilidade às palavras que dizia e representando magnificamente, trazendo em diversos momentos os trejeitos e a voz do atual presidente. A atuação de Glória Pires (Lindú) também está ótima, quase que disputando o título de protagonista do filme.

Mesmo tendo vários irmãos, a relação de Lindú é quase sempre marcada por algo que parece uma preferência por Lula, ou melhor, quase não a vemos com os outros filhos, principalmente na vida adulta.

Um aspecto que ficou confuso pra mim foi a atitude geral política de Lula, que por mais que eu soubesse que nunca foi comunista, me pareceu ser exageradamente retratado como diplomático e comprometedor. Não havia nada de radical e revolucionário nesse Lula do filme. Como se este tivesse sempre sido aquele que conhecemos hoje na presidência. Vemos alguns de seus discursos, mas estes nunca são muito esclarecedores. Digo essas coisas, mas baseando-me apenas em rumores e impressões, não sou conhecedora doas propostas políticas antigas de Lula.

De qualquer forma, a vida adulta do protagonista é a mais interessante, pois consegue realizar uma conexão mais forte com o espectador.

O momento “anos 60 e 70” é bem diagnosticado através das canções, da febre novelesca e da pincelada que o diretor dá nos horrores da ditadura. Não se estendendo, mas conseguindo passar um pouco do medo e da violência presentes.

Uma reclamação um pouco injusta é a maneira gritante de indicar alguns de seus patrocinadores (To vendo que todo mundo aqui é Brahmeiro hein!). Algumas pessoas podem até não perceber, mas pior que isso só mesmo a Xuxa brincando com crianças na frente do posto Shell, bebendo coca cola e pintando com tintas Suvinil na abertura de “Super Xuxa contra o Baixo Astral”.

Resumindo, “Lula, o filho do Brasil” não consegue estabelecer um ritmo por se mostrar constantemente um filme com uma finalidade. A não fluidez entre seqüências pode ser metaforizada por uma criança escrevendo sua vida num diário. “Hoje fui na casa da vovó. Hoje fui à escola”. Só que no caso de Luiz Inácio seria “Hoje perdi o dedo na fábrica. Hoje perdi mulher e filho”.

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