Impressionante o discurso de Capriles (Eleições Venezuela)


Capriles, com a camisa da seleção de futebol, na Praça Caracas: discurso sem ideias e sem programa de governo (Foto: Leo Ramirez/AFP/Getty Images)

De Caracas (Venezuela) – Impressionou pelo vazio, pela falta de qualquer referência a um programa de governo, o discurso do candidato oposicionista Henrique Capriles Radonski, representante das forças de direita, quando no dia 10 inscreveu a candidatura no Conselho Nacional Eleitoral (CNE, nosso Tribunal Superior Eleitoral/TSE).
Claro que deve ter sido uma estratégia de marketing, porque seu programa não pode conter outra coisa senão as velhas teses do neoliberalismo, onde se sobressaem a reverência ao deus mercado e o apequenamento do papel do Estado, teses profundamente desgastadas em todo o mundo, especialmente depois dos desastres ocorridos nas décadas de 80 e 90 na América Latina (o caso da Argentina foi o mais gritante) e atualmente na Europa, onde ocorrem neste domingo, dia 17, processos eleitorais importantes (o caso da Grécia é o mais gritante).
A impressão ficou mais acentuada no dia seguinte quando o presidente Hugo Chávez inscreveu sua candidatura e fez um discurso prenhe de conteúdo programático, com cinco pontos de ação para seu governo (caso seja reeleito) no período de 2013-2019 (já objeto de matéria deste blog): manter a independência nacional, continuar a construção do socialismo, construir uma Venezuela potência, lutar por um mundo multipolar e pela salvação do planeta Terra.
(Ao contrário da expectativa difundida pela mídia antichavista, diante do tratamento contra o câncer, o presidente apareceu esbanjando vigor: falou durante duas horas e meia, cantou, brincou e deu seu show de palanque costumeiro, levando enorme entusiasmo aos milhares de seguidores).
Capriles, ao contrário, evitou qualquer menção a programa de governo. Ele e seus assessores optaram por frases de efeito, repetidas, de conteúdo supostamente emotivo. Há de se perguntar o quanto isso foi eficaz ou não do ponto de vista eleitoral. O discurso durou 22 minutos. Ou menos, se contarmos 15 pausas que duraram entre sete e 30 segundos cada uma. Um trecho da parte inicial:
“Os tempos de Deus são perfeitos”
“Quero saudar a todos, a todos os que hoje saíram a caminhar (houve uma caminhada de 10 quilômetros até a Praça Caracas, no centro da cidade, onde houve a concentração) pela esperança, pelo futuro, pela Venezuela grande, pela Pátria grande. Que viva a Venezuela! Hoje saíram como um milhão de pessoas, um milhão de pessoas; mais de um milhão de pessoas, mais de um milhão de corações (pausa de sete segundos). Os tempos de Deus são perfeitos; não esqueçamos nunca este dia. Hoje viemos todos firmar um compromisso e nosso compromisso se chama Venezuela. Venezuela!”
Outro trecho já transcrito na cobertura deste blog: “Eu estou com vocês, eu amo este país acima de qualquer coisa… minha vida é a Venezuela, minha vida são vocês, minha vida é o povo… eu quero ser o primeiro servidor público deste país… eu estou a serviço de vocês, não vocês a meu serviço… o outro candidato propõe uma Venezuela dividida… Capriles propõe uma Venezuela unida… o outro candidato propõe uma Venezuela de violência, Capriles propõe uma Venezuela de unidade…”
Mais um: “O outro candidato propõe uma Venezuela de violência, Capriles lhes propõe uma Venezuela de paz, uma Venezuela de tranqüilidade. O outro candidato lhes propõe que se ponham a camiseta de uma cor (a maioria dos militantes e seguidores de Chávez usa o vermelho), eu lhes proponho que ponham a camiseta de La Vinotinto, a Venezuela tricolor (“vinotinto” é cor de vinho, é a cor da camisa da seleção venezuelana nos jogos esportivos, como a de futebol; o esporte mais praticado aqui é o beisebol; a bandeira do país tem três cores: amarela, azul e vermelha).
Continua após uma pausa de 13 segundos: “O outro candidato nos propõe que a sorte da Venezuela depende dele, Capriles lhes propõe que a sorte da Venezuela dependerá do que façamos todos, com Capriles à cabeça mas com o esforço e o compromisso de todos. O outro candidato nos propõe que vejamos o passado, Capriles lhes propõe que subam no ônibus do progresso que vai rumo ao futuro”. Uma frase de efeito utilizada no discurso e que chegou a ser manchete de capa de um jornal da oposição: “Vamos unir a Venezuela, custe o que custar!”
O fecho do discurso: “Venezuela, estou a seu serviço; povo, este “flaquito” (diminutivo de “flaco”, magro, esbelto, os antichavistas adotaram este apelido para seu candidato, certamente dando a entender que o adversário é gordo e feio) está a seu serviço. Que Deus abençoe a Venezuela, que Deus abençoe esta Pátria, que Deus abençoe a todos. Sigamos adiante, que nada nos detenha! Amém!”
Capriles, 39 anos, solteiro, é ex-governador do estado de Miranda, o segundo mais populoso do país (o primeiro é Zulia, os dois são governados pela oposição). É alguém que se pode classificar de jovem, bonito e rico (sua família é milionária). Participou do golpe de Estado fracassado de abril de 2002 para derrubar Chávez: na época foi um dos que invadiram a Embaixada de Cuba. Ocupava na ocasião o cargo de prefeito do município de Chacao (faz parte da área urbana da capital venezuelana, uma das partes onde vive a população mais endinheirada).
As cinco metas do novo plano de governo de Chávez

Chávez discursa no centro de Caracas para milhares de seguidores (Foto: Miraflores)

Os cinco objetivos do chamado Segundo Plano Socialista da Nação, conforme apresentado pelo presidente Hugo Chávez, na segunda-feira, dia 11, em discurso quando da inscrição de sua candidatura para as eleições de 7 de outubro. O plano de governo, caso ele seja reeleito (é considerado amplamente favorito), é para o período de 2013-2019. Segundo declarou, trata-se de um esboço aberto à discussão entre os partidos políticos e os movimentos sociais. “São vocês, o povo venezuelano, que dará força” ao plano, disse ele. Tal plano foi entregue, no ato de inscrição, ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE, equivalente ao nosso Tribunal Superior Eleitoral/TSE).
Seu principal opositor é Henrique Capriles, que se inscreveu no CNE no domingo, dia 10, e fez também uma grande manifestação nas ruas de Caracas (ver postagens anteriores deste blog).
O resumo abaixo foi traduzido de aporrea.org , portal que se apresenta como “comunicação popular para a construção do socialismo do século 21”. As palavras de Chávez estão entre aspas:
1.- Manter a independência nacional: “A Venezuela até uma década atrás era duplamente manietada, dominada. Hoje a Venezuela é politicamente falando um país independente e devemos defender o bem mais precioso que temos conseguido em 13 anos da revolução bolivariana: a independência”.
2.- Aprofundar o socialismo no país: “É projeto original do Libertador Simón Bolívar, dar continuidade à construção do socialismo. Tentemos penetrar na classe média com o discurso, a argumentação e as ideias. No setor C e B também devemos ir com as ideias”.
3.- Converter a Venezuela em potência: “No Socialismo, a Venezuela se posiciona como o país mais feliz da América do Sul. Sob o Capitalismo, teria sido impossível. A propriedade social dos meios de produção a nível da comunidade e do bairro é vital. Com ela converteremos o país numa verdadeira potência no econômico e no social”.
4.- Acabar com a unipolaridade do império: “O quarto objetivo histórico é que a Venezuela siga contribuindo com a construção de um mundo multipolar. O projeto do “majunchismo” (é como os chavistas chamam os opositores, de “majunche”, medíocre) é o capitalismo que nos levaria a um novo caos”.
5.- Contribuir com a salvação do planeta: “Temos que contribuir com a conservação da vida na Terra. É dever do socialismo, do nosso socialismo, contribuir com a salvação do mundo”.
(*) Jadson Oliveira é jornalista baiano e vive viajando pelo Brasil, América Latina e Caribe. Atualmente está em Caracas (Venezuela). Mantém o blog Evidentemente (blogdejadson.blogspot.com).

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