A Terapia Comunitária Integrativa e o sentido da existência

tciO que poderia ser dito sobre a TCI e o sentido da existência? Muitas coisas. Eu não poderia pensar em dizer a vocês algo que vocês não saibam. No entanto, tentaria relembrar com vocês, coisas que a TCI me relembrou. Acho que isto é o caminho da descoberta do sentido da vida. Ninguém descobre sozinho o sentido da sua existência. Ninguém pode dizer para outro qual é o sentido da existência.

Cada um, cada uma, descobre o sentido da sua própria vida, em comunidade. Mas como em comunidade, se nos dias de hoje esta palavra parece ter perdido o seu sentido original? Aqui é onde entra a TCI. A TCI recria um espaço em que a pessoa pode ir re-descobrindo em si mesma, a comunidade da qual tinha-se perdido. Re-encontra a sua comunidade interna, o seu pertencimento, a sua conexão vital com a humanidade, e a comunidade externa, uma rede dentro da qual mais e mais vai voltando a sentir que a vida faz sentido.

Ninguém chega à roda da TCI por não ter o que fazer, por acaso. Vem para a roda porque algo em si mesmo tinha-se quebrado. A auto-estima estava em baixa, uma dor que parecia a maior do mundo, uma sensação de não ter um lugar na terra. Eu não estou falando de coisas que tenha lido ou que alguém tenha me contado. Estou falando de coisas que vivi e vivo, coisas que experimento desde que fui me integrando à roda da TCI a partir de 2004, quando chegou em João Pessoa.

A partir desse primeiro contato, fui percebendo que não há dores que alguém não possa suportar. Todo mundo pode lidar com seu sofrimento, se encontra um espaço humano caloroso e compreensivo, de não julgamento, de não culpabilização, onde o próprio saber não seja desqualificado por alguém que esteja em posição de autoridade. Todos somos doutores da nossa própria vivência. O objetivo da TCI é que cada um, cada uma, se torne o seu próprio terapeuta. Que cada um possa aprofundar de tal maneira no seu próprio interior, que ali encontre o sentido da sua vida.

A TCI fornece um modelo, um molde. E você a partir desse modelo ou molde, vai re-descobindo o ser que você é. A través de perguntas e exercícios muito simples, mas de grande efeito mobilizador, a pessoa vai se libertando das prisões interiores, dos papéis sociais escravizadores, dos preconceitos, das ideias falsas sobre si mesmo e sobre os outros, a vida. Quebra-se a vitimização. A pessoa ganha novo fôlego. Ela descobre que no passado foi capaz de vencer em situações dificílimas. Essa força resiliente está viva dentro de cada um, de cada uma de nós.

Nas rodas da TCI, nas vivências do Cuidando do Cuidador, nos encontros de formadores, vamos reforçando uma atmosfera propícia para o re-encontro do ser consigo mesmo. A minha vida vale a pena. Mas isto não é apenas racional, lógico. É integral. Mente e coração. Não há receitas, ninguém lhe da conselhos, mas no convívio com pessoas de diferentes classes sociais e níveis sócio-econômicos, você começa a se lembrar de quem você é. Mais além dos títulos e diplomas acadêmicos, está o ser, a pessoa humana.

E esta pessoa humana é a criança interior, que foi vencedora ao longo de toda a vida. É aquela parte nossa que não se rende, que não transige, mas não por cabeça dura ou turrona, mas sim, por sábia. Esse saber inato é recuperado na TCI. Recentemente, participei em Montecarlo, Argentina, da primeira formação em TCI naquele país, meu país de origem. Um dos participantes contou a sua história. E cantou uma canção que ele tinha composto. Dizia: busca no teu coração o caminho que te leve à liberdade. Busca no teu coração: escuta de si. Isto aprendemos na TCI.

Isto é o caminho para a vida plena. Isto é o germe de uma nova humanidade, livre de automatismos e dependências. A TCI não dá respostas, mas ao dissolver as falsas ideias que nos aprisionavam, abre um espaço para a liberdade, um espaço para que eu possa ser. Na medida em que eu posso vir a ser quem sou, e desfruto desse prazer sem igual de ser eu mesmo, posso aceitar que os outros também são como são, desisto de querer mudar os demais.

Começo a respeitar. Isto não é tão fácil de praticar como de dizer. Aqui apenas partilho algumas pinceladas desta caminhada liberadora que a TCI estimula em cada um, em cada uma de nós. Acredito que não exista na vida nada que valha tanto a pena, como o de a gente ser quem a gente é. Isto é a Terra Prometida. Isto é o reino de Deus, que não está além da morte, mas aqui, agora, se eu for capaz de viver a pleno esta dádiva da existência.

Existem muitos sistemas de pensamento, crenças, ideologias, religiões. Mas nenhum deles pode libertar ninguém. Mais frequentemente, as doutrinas impõem escravidões. A libertação vem de dentro para fora. E se torna possível a partir do momento em que eu, cada um de nós, descobre por si mesmo, individual e coletivamente, a sua própria essência, a sua própria razão de ser. Atrevo-me a dizer, com Max Weber, que o sentido da vida não está dado, é criado.

Cada pessoa decide por si mesma sobre o sentido da sua vida. Isto é liberdade, isto é responsabilidade. Mas apenas coletivamente podemos criar espaços de libertação. Muitas vezes me surpreendo com a sabedoria contida na TCI. Na sua simplicidade e efetividade, ressoam ditados populares que ouvia da minha mãe durante a minha infância e juventude. Há males que vêm para o bem, ouvia a minha mãe dizer. Como podia ser isto? Eu não entendia. Depois, muito depois, pude vir a compreender (e continuo tentando) que sim, que é verdade.

Eu não vim aqui para sofrer, mas a dor pode me fazer crescer. Posso ver a vida desde outros ângulos. Posso descobrir forças onde antes ignorava. Posso descobrir que a minha vida é parecida demais com a vida de todo mundo. Começo a me sentir parte da humanidade, outra vez. A perder os medos. Volto a confiar, volto a pensar que eu sou capaz. Não importa quantos anos tenha, tenho muitos, mas não é isto o que conta. O que conta é que estou decidido a seguir adiante na minha busca interior, na busca da razão essencial pela qual estou vivo.

Os motivos que me fazem viver são velhos e novos, há motivos que vieram com o meu nascimento, e outros que fui gerando e adotando ao longo da minha caminhada até este aqui e agora. Vou ganhando uma sensação de novidade, à medida que o tempo vai passando. Parece curioso, ou até contraditório, vou envelhecendo, e cada vez estou mais leve. Isto pode parecer um paradoxo para o intelecto, para a mente, mas não para o coração, não para o ser interior.

Aprendo a confiar mais na minha intuição a não temer a morte, mas sim, a morte em vida, que é a desistência, o arriar bandeiras, a desesperança, o ceticismo, a descrença. Aprendo a ganhar espaço dentro de mim mesmo, me permitindo ser, além das restrições e imposições da educação castradora que nos é imposta, que instala aquele inimigo interno, o opressor internalizado de que falava Paulo Freire. E vem vindo a vida, vem vindo uma luz que é material, é concreta. As alegorias de Jesus sobre a vida nova são literais.

Nas sensibilizações e formações em TCI de que tenho participado na Paraíba, na Argentina e no Uruguay, bem como nos cursos de Cuidando do Cuidador, tenho visto uma nova humanidade nascendo. Uma nova humanidade que não aparece nos jornais nem nas TVs. Mas que luta pela vida, pela identidade, pela liberdade, pela independência. Um movimento de re-humanização da vida que honra e e perpetúa os anseios libertários da humanidade de todos os tempos, sem barreiras ideológicas ou de crenças ou classes sociais.

2 comentários sobre “A Terapia Comunitária Integrativa e o sentido da existência”

  1. Amigo Rolando
    Você sabe que gosto do seu modo de escrever. São palavras sábias. Apesar de não conhecer a TCI, admiro muito.
    Você é muito feliz com o que diz: “”vou envelhecendo, e cada vez estou mais leve””. Interessante que vivo este sentimento.
    Um abraço Magdala

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