Há nos últimos anos no Brasil uma ofensiva devastadora contra valores humanistas e democráticos, uma ode permanente ao ódio, à violência e à intolerância entre pessoas que pensam e vivem distintamente. Temos que construir uma mídia de massa que seja o contraponto na luta por uma sociedade mais sadia e mais humana.
“Deem-me a imprensa e a mídia por 48 horas e eu farei aqui uma revolução” – de Moshé Sné, político israelense, citado por Gershon Knispel, na Caros Amigos.
Por Jadson Oliveira (*)
De Salvador-Bahia – Diante do avanço das forças de direita e da ultradireita no Brasil (e também na América Latina), tendo como principal cabeça de ponte a mídia hegemônica – subsidiada pelo Congresso Nacional e por setores da Justiça, Ministério Público e Polícia Federal -, se fortalece a cada dia entre os companheiros da blogosfera progressista a percepção da prioridade da luta pela democratização dos meios de comunicação, em especial das concessões de rádio e TV.
Tal percepção ganhou nos últimos meses tons dramáticos ante a frenética temporada de caça deflagrada contra o ex-presidente Lula, que aparece como o objetivo seguinte à efetivação do golpe contra a presidenta Dilma. A justificativa metida goela adentro duma população desinformada é a suposta luta contra a corrupção, a mesma fraude imposta pela imprensa para defenestrar Getúlio em 1954 e Jango em 1964.
Há uma ofensiva devastadora contra valores humanistas e democráticos, uma ode permanente ao ódio, à violência e à intolerância entre pessoas que pensam e vivem distintamente, o que aduba o terreno para posições fascistas e golpistas e abre caminho para os retrocessos sociais.
Notam-se vozes representativas se somando ao clamor contra o cerco midiático do pensamento único. Cerco que chegou a ser tratado por Dilma, antes do seu afastamento, de forma equivocada, ao se referir à “batalha da comunicação” – não há batalha, há um massacre diário, uma ofensiva demolidora contra as forças populares, democráticas, nacionais e de esquerda.
Vozes representativas como, por exemplo, as do jornalista Mino Carta e do sociólogo Emir Sader, que já sugeriram ao então governo de Dilma encarar os monopólios da mídia dominante como inimigo (sugestão que, diante da fraqueza do governo e de sua falta de conscientização a respeito, caiu no vazio).
A cada dia, enquanto as forças golpistas avançaram até o afastamento provisório da presidenta e agora buscam segurar o cambaleante governo do interino Temer, ressoam novas vozes de jornalistas, blogueiros, acadêmicos, juristas e políticos contra os antidemocráticos e anticonstitucionais monopólios da comunicação, tendo à frente a Globo, o baluarte mais visível do golpe.
Trata-se duma luta que já vem sendo travada há muito pela militância do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e mais recentemente pelos companheiros do Centro de Estudos da
Mídia Alternativa Barão de Itararé.
No início do ano, no lançamento em São Paulo do Fórum 21, uma nova e promissora frente política e cultural em defesa da democracia, o jornalista e professor Laurindo Lalo Leal Filho foi claro (ele e o professor Venício Lima são velhos batalhadores sobre o tema):
“Cada vez mais, a sociedade brasileira necessita se organizar diante da poderosa organização que já existe há muito tempo e que é coordenada pela grande mídia nacional, contra os interesses nacionais e os interesses da maioria da população”.
Continua Lalo Leal: “Um órgão como o Fórum 21, com a estrutura que está se criando aqui, tem que ser muito imbricado pelo Brasil, porque é a única condição, o único caminho que temos para enfrentar esse partido monstruoso: o Partido da Mídia Brasileira, que é contra os interesses nacionais”.
O próprio Lula – no que pese não ter feito nada quando teve espaço político e institucional para fazê-lo e esbanjar habilidade para dizer um discurso para cada tipo de plateia -, reconheceu em entrevista aos blogueiros progressistas (ou “sujos”, como os viu o líder tucano José Serra) em janeiro último: “A imprensa tem lado”. E prometeu processar todo caluniador e difamador midiático, como de fato vem fazendo.
Do alto de seu rico cabedal de arauto da luta contra a pobreza e de maior líder popular do país, o ex-presidente acrescentou: “Graças a Deus a gente tem uma imprensa alternativa, que dá esperança de que a gente possa fazer um enfrentamento.”
De meros reagentes a agentes de nossa própria agenda
Agora, daqui da invisibilidade da planície, me atrevo a lançar meu grito: É PRECISO DAR UM PASSO À FRENTE (o “graças a Deus” do Lula reflete muito pouco, não nos iludamos).
Sem esse “passo à frente” nunca teremos condições mínimas para chegarmos a uma reforma democrática da mídia, uma reforma ao menos razoável. Nem a esta, nem a tantas outras de que carece, historicamente, o povo brasileiro – lembremos das “reformas de base” do defenestrado Jango.
E qual seria esse “passo à frente”? Simples: a luta pela construção duma mídia contra-hegemônica, uma expressão que sequer entrou no linguajar cotidiano da militância democrática no Brasil, embora já trivial em muitos países latino-americanos. Claro, primeiro seria necessário começar a luta, conseguir a participação dos companheiros da blogosfera, adquirir consciência e ir avançando…
Lula referiu-se a “uma imprensa alternativa” para fazer “um enfrentamento”. Não sei até que ponto sua declaração merece alguma credibilidade para ser tomada como, por exemplo, uma proposta, pois o que temos é pouquíssimo, apesar do esforço heroico dos “guerrilheiros” da blogosfera e redes sociais.
Mas, vamos lá, é disso que se trata: é preciso construir uma forte e poderosa mídia alternativa que sirva de contraponto aos poderosos monopólios: uma rede de emissoras de rádio e TV, plataformas digitais e, se for o caso, até de jornais de papel (um tipo de mídia hoje em franca decadência); meios comunitários, populares, que podem ser também privados, estatais e/ou públicos.
Pensar grande, a médio e a longo prazo, assim: daqui a 10 ou 20 anos poderemos estar em condições de informar e formar consciências cidadãs abertas a valores apegados à solidariedade, à fraternidade e a utopias de um mundo mais saudável e mais humano. Ou seja: consciências devotadas à luta contra as injustiças sociais.
Óbvio que outros fatores da atividade social estão também em jogo, a exemplo da educação, da cultura, das modernas ferramentas da informação, da compreensão sobre as mudanças no mundo do trabalho. Mas é fundamental para se construir um mundo melhor uma mídia plural, criteriosa do ponto de vista jornalístico, comprometida com os interesses democráticos, nacionais e populares.
Não só uma mídia capaz de reagir às diatribes da chamada grande imprensa, mas capaz de ditar e manter a sua própria agenda.
Aviso aos navegantes: não se trata aqui apenas de fazer e ganhar campanhas eleitorais – fator importante no jogo político institucional -, mas de lutar por uma sociedade mais sadia e mais humana, rumo a uma democracia participativa e a algum tipo de socialismo.
(*) Jadson Oliveira é jornalista baiano. Trabalhou nos jornais Tribuna da Bahia, Jornal da Bahia, Diário de Notícias, Estado de S.Paulo e Movimento. Depois de aposentado virou blogueiro, já tendo colaborado com este Fazendo Media. Desde 2007 tem viajado pelo Brasil, América do Sul e Caribe.
Parabéns pelo belo artigo, e que bom termos de volta como blogueiro. Vida longa ao fazendomedia.org e , principalmente, com você ocupando o espaço merecido.
Parabéns Jadson. Seu Evidentemente estava fazendo falta.Sobre a mídia, é isso aí mesmo. Para mim, o grande erro do governo popular foi não ter feito, logo no primeiro dia que assumiu, regulamentação dos maios de comunicação, tirando das mãos das “7”irmãs o domínio dos meios de comunicação e promovendo uma reforma política radical. Sem resolver estes dois problemas, adeus povão.