Tenho somado a minha voz à daquelas pessoas que resistiram e continuam resistindo ao regime instalado a partir do golpe de estado de 2016. A ação das forças contrárias à democracia, aos direitos humanos e à convivência civilizada, exacerbou o menosprezo à vida, dilacerando esse tecido mínimo de que está feito o dia a dia.
Hoje percebo que a mera crítica e a denúncia não bastam. São necessárias, mas não suficientes para refazer o que foi destruído. A reconstrução de um projeto de país includente, um país para todas e todos, demanda um esforço e uma soma de intenções e ações que ultrapassa os dualismos implantados.
No meu ponto de vista, se trata de recuperar um espaço de ação que vêm sendo minado tanto pelo poder quanto pelas tecnologias digitais e pelos meios de desinformação e manipulação. É o espaço da pessoa, o espaço da família, das relações cara a cara, do comunitário, do que somos capazes de fazer por nós mesmos/as.
Voltar o olhar e a atenção para o diálogo, a escuta de nós mesmos/as e dos demais. Ter a noção clara de que a vida é tão efêmera, tão incrivelmente delicada e complexa, que exige de nós toda a ternura, todo o cuidado, toda a amorosidade de que formos capazes.
Quando deixamos vago o espaço do nosso próprio ser, da nossa própria identidade, cedendo ao que nos é imposto, começamos a viver uma vida que não é mais nossa. É uma vida alheia implantada no nosso interior. Então eu vivo e ajo e penso e sinto e falo e faço como me é dito que devo, mas não sou eu.
É preciso estar atentos/as. Para não perder a vida não basta estarmos vivos/as. É preciso fazer nossa a vida que vivemos. A arte têm um papel primordial nesta apropriação, já que nos resgata do utilitarismo e da banalização, nos devolve a noção clara e precisa do valor de cada instante.

Doutor em sociologia (USP). Terapeuta Comunitário. Escritor. Membro do MISC-PB Movimento Integrado de Saúde Comunitária da Paraíba. Autor de “Max Weber: ciência e valores” (São Paulo: Cortez Editora, 2001. Publicado em espanhol pela Editora Homo Sapiens. Buenos Aires, 2005), Mosaico (João Pessoa: Editora da UFPB, 2003), Resurrección, (2009). Vários dos meus livros estão disponíveis on line gratuitamente: https://consciencia.net/mis-libros-on-line-meus-livros/