Acadêmica barrada em Madri lança livro sobre migração internacional

Há quatro anos, eu e um companheiro de mestrado fomos arbitrariamente detidos em Barajas (aeroporto de Madri) e impedidos de seguir viagem para Lisboa, onde participaríamos de um congresso da Associação Portuguesa de Ciência Política. Foram 50 horas de detenção injustificada e maus-tratos.
De lá para cá, pouca coisa mudou. Só no primeiro trimestre daquele ano de 2008, a polícia espanhola barrou 18 mil pessoas (entre elas, mil brasileiros). Além de engajar-se no processo de aprovação da Diretiva de Retorno (um novo acordo para dificultar a permanência de estrangeiros na União Européia), o país anunciou a idéia de pagar para os imigrantes desempregados retornarem a seus países. Atualmente, o governo espanhol já paga a passagem de quem quer voltar para casa.
Parece que os governantes europeus se esquecem de todos os imigrantes que enviaram aos países daqueles que hoje rejeitam. E que muito da identidade européia se deve à contribuição dos estrangeiros. Recentemente, o debate foi resgatado por conta da adoção de políticas de reciprocidade, que acarretaram a negação de cidadãos espanhóis por autoridades brasileiras.
Foi observando e analisando este fenômeno que terminei por escrever um livro acerca dos fluxos migratórios, com foco especial nas políticas de imigração da União Européia. O livro, intitulado “Barrados: um ensaio sobre os brasileiros inadmitidos na Europa e o conto da aldeia global”, também traz um par de depoimentos meus sobre tão peculiar etnografia. O nome que escolhi para a obra demonstra meu descontentamento em relação às assimétricas relações travadas entre o Norte global e os povos do Sul.
Segue a apresentação da obra pelo professor Fréderic Vandenbergue
(IESP/UERJ):
“Ao invés de realizar uma apresentação de 20 minutos em Portugal, Patrícia Rangel foi detida no aeroporto de Barajas, Espanha, por mais de 48 horas. Para a polícia, era somente uma operação de rotina – afinal de contas, um terço dos brasileiros que residem no exterior são imigrantes ilegais; para a grande mídia, mais uma matéria inusitada; mas para Patrícia, essa detenção na fronteira europeia foi uma experiência traumática e transformadora. Graças a sua sensibilidade, ela foi capaz de entender seu caso como universal. Tendo sentido na pele o que significa ser detida arbitrariamente, em seu retorno ao Brasil, realizou um percurso teórico (via Foucault, Bauman, Negri e outros) para reconceitualizar o que havia acontecido com ela e transformar sua própria experiência em um estudo de caso etnográfico da injustiça que tantos imigrantes de países em desenvolvimento sofrem ao visitar a “Fortaleza Europa”. Barajas não é Auschwitz nem Guantánamo, mas no extremo todos podem ser considerados variações do campo que separa o “Nós” dos “Outros”. Ao mesmo tempo em que esse livro pode ser lido como uma investigação sociológica sobre a “terra de ninguém” que separa a barbárie da civilização, ele também é um relato do quanto custaram a Patrícia seus 15 minutos de fama.”
“Barrados” foi idealizado pela Ars Ventura (http://www.arsventura.com.br/), editado pela Abaré (Brasília) e está disponível para download gratuito no site http://www.barrados.org a partir do dia 01 de abril de 2012. O livro em versão papel pode ser comprado no Sebinho Livraria e Bistrô (SCLN 406, Bl. C, Lj. 44 – Asa Norte Brasília – DF) ou junto à editora (http://www.editorialabare.com.br).
Espero que gostem da leitura!
Sobre a autora: Patrícia Rangel é doutora em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB), mestre pelo antigo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ) e bacharel em Relações Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).

Um comentário sobre “Acadêmica barrada em Madri lança livro sobre migração internacional”

  1. Bonito gesto. Importante que aqueles que podem dêem seu testemunho. Penso que a entrada pelo território espanhol hoje seja a mais violenta para qualquer brasileiro que queira ir à Europa. Você entra bem na França, na Alemanha, em Portugal, etc., então vamos evitar os espanhóis e vamos gastar o nosso dinheiro – que os espanhóis precisam mais que os outros países europeus – em outro lugar. A lei da reciprocidade deve ser tão dura para eles como é para nós

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