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Em janeiro a USP voltará a ter um reitor de verdade. Fora, TFP!

Há companheiros que igualam a atual democracia a serviço dos poderosos à ditadura de 1964/85. Geralmente, os que nasceram depois dos anos de chumbo ou eram muito jovens para guardarem uma lembrança mais precisa do arbítrio.

 Um pequeno exemplo da diferença entre os dois períodos históricos acaba de ser dado pelo governador Geraldo Opus Dei Alckmin.

 Em novembro de 2009, o então governador José Serra, prestes a fazer uma campanha presidencial de orientação acentuadamente direitista, escolheu para reitor da Universidade de São Paulo o segundo colocado na lista tríplice que lhe foi submetida: João Grandino Rodas, menina dos olhos da Tradição, Família e Propriedade.

 Rodas tinha o pior currículo possível e imaginável.

 Como diretor da Faculdade de Direito da USP, requisitou em agosto de 2007 a entrada da tropa de choque da PM para a expulsão de manifestantes que haviam ocupado o prédio em função da Jornada em Defesa da Educação.

  Integrando a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos entre 1995 e 2007, indeferiu todos os pedidos de reparação que pôde -127 dos 172 processos nos quais atuou-, quase sempre por questiúnculas burocráticas como a de que o prazo para os requerimentos teria se esgotado. Chegou ao cúmulo de negar a participação da ditadura no assassinato da estilista Zuzu Angel, sendo, contudo, voto vencido.

Depois, como reitor da USP, reviveu os piores tempos da ditadura, ao aquartelar permanentemente a PM no campus universitário, gerando todo tipo de provocações, enfrentamentos e atritos com estudantes, professores e servidores.

Afora as denúncias de corrupção e má gestão que pipocavam desde que era diretor da Faculdade de Direito. Como reitor da USP, foi, p. ex., acusado da compra de imóveis com preços elevados, extinção de cursos e vagas, terceirização da universidade e aumento do filtro social para a entrada de alunos na Universidade.

Culminando com o expurgo de janeiro de 2011, quando Rodas foi responsável pela demissão em massa de 271 funcionários da USP.

Na ocasião, o grande jurista Fábio Konder Comparato e outros quatro professores da USP assim se manifestaram:

Após declarar-se pelo financiamento privado e pela reordenação dos cursos segundo o mercado, o reitor vem instituindo o terror por intermédio de inquéritos administrativos apoiados em um instrumento da ditadura (dec. nº 52.906/ 1972), pelos quais pretende a eliminação de 24 alunos.

Quanto aos servidores, impôs, em 2010, a quebra da isonomia salarial, instituída desde 1991, e, para inibir o direito de greve, suspendeu o pagamento de salários, desrespeitando praxe institucionalizada há muito na USP.

Agora, em 2011, determinou o ‘desligamento’ de 271 servidores, sem prévio aviso e sem consulta a diretores de unidades e superiores dos ‘desligados’. Não houve avaliação de desempenho. Nenhum desses servidores possuía qualquer ocorrência negativa. As demissões atingiram técnicos na maioria com mais de 20 anos de serviços prestados à universidade.

O ato imotivado e, portanto, discriminatório, visou, unicamente, retaliar e aterrorizar o sindicato (Sintusp), principal obstáculo à privatização da USP…

A indignação foi tamanha que Rodas recebeu (e esnobou!) convite para prestar esclarecimentos na Assembléia Legislativa de São Paulo. Fez-se representar por um subalterno escolhido à sua imagem e semelhança: sem ter como justificar as medidas arbitrárias, ele abandonou intempestivamente a sessão, deixando de prestar os esclarecimentos solicitados.

A CONVENIÊNCIA POLÍTICA PESOU MAIS DO QUE A AFINIDADE IDEOLÓGICA

Se estivéssemos numa ditadura, Alckmin poderia tranquilamente optar pelo favorito de Rodas, Wanderley Messias, com o qual certamente tem grande afinidade ideológica. Não precisaria levar em conta o fato de o colégio eleitoral (formado por membros do Conselho Universitário, dos conselhos centrais e das congregações das unidades, dos conselhos deliberativos de museus e institutos especializados) tê-lo relegado ao terceiro lugar, com apenas 462 votos.

Já na nossa (ainda que imperfeita) democracia, um valor mais alto se alevantou, determinando sua decisão: o fato de a permanência do PSDB no Palácio dos Bandeirantes estar seriamente ameaçada. Então, tratou de eliminar um foco de permanente tensão, que poderia lhe ser muito prejudicial na eleição de 2014.

Optou, portanto, pelo candidato que não só venceu amplamente a disputa no colégio eleitoral (obtendo 1.206 votos, enquanto os concorrentes, somados, totalizaram 960), como também foi o preferido numa consulta aberta na universidade, em que 14 mil pessoas indicaram seu predileto.

Vai daí que, no próximo dia 25, a USP voltará a ter um reitor de verdade, após as péssimas e turbulentas gestões de Suely Vilela Sampaio e Rodas.

Com isto, o processo de fascistização da USP -paradoxalmente iniciado por um ex-presidente da UNE- vai ser, enfim, detido. Alvíssaras!

Caberá ao médico Marco Antonio Zago, que se define como um apaziguador, a missão de eliminar todos os resquícios da praça de guerra em que a USP foi transformada ultimamente.

 Começando pela imediata extinção do convênio com a PM, uma vergonha para qualquer instituição de ensino superior em qualquer país do mundo.

Os 5 anos de um blogue de resistência

O blogue Náufrago da Utopia completa cinco anos de existência nesta 5ª feira, 8.

 No post inaugural (vide aqui), com a sinceridade habitual, eu admiti que nunca almejara ser blogueiro, mas fora uma opção alternativa quando minhas maiores metas não deslancharam:

Em novembro/2005, ao lançar meu livro de estréia, ‘Náufrago da Utopia’, acreditava ter desimpedido os caminhos para meu projeto maior: propor um novo ideário para a esquerda, retomando, num contexto mais propício, as propostas neo-anarquistas da geração 68. Mas, passados dois anos e meio, nada marchou como esperava.

O ‘Náufrago’ não concretizou seu potencial, mantendo-se apenas como um cult para algumas dezenas de pessoas e uma referência para alunos e professores de História.

Não encontrei espaço para meu  great come back  à grande imprensa, sonho que jamais abandonei. Só que, como nunca, as tribunas estão hermeticamente fechadas para os articulistas de esquerda, salvo os que construíram sua reputação num passado distante e continuarão sendo suportados enquanto durarem, mas não substituídos.

Vai daí que a nova utopia singra os mares meio sem rumo, incapaz de encontrar seu porto seguro.

Na minha visão daquele momento, um blogue de verdade serviria para ir acumulando forças, à espera de dias melhores. O que eu tinha, O Rebate, era apenas um depósito dos textos que eu redigia semanalmente para o site coletivo homônimo. Decidi fazer as coisas direito, produzindo textos diários, para conquistar um público mais amplo e mantê-lo interessado.

 O projeto acabou me encantando, pois veio ao encontro de outra antiga paixão: os circuitos marginais. Quantos esforços desenvolvemos, na década de 1970, para difundir nossas obras diretamente às pessoas, escapando do controle da indústria cultural!

 As precárias coletâneas que editávamos com tiragem de mil exemplares continuam pegando pó na minha estante, como marcos de uma fase talvez ingênua, mas muito gratificante. O que encarávamos como resistência cultural era, também, uma forma de travarmos o bom combate. Se não produziu resultados mais expressivos, ao menos ajudou-nos a manter a sanidade, durante as terríveis trevas ditatoriais.

 Então, aos poucos, o blogue foi tomando forma.

 De um lado, cumprindo meu dever de sobrevivente de uma guerra trágica, defendi a memória da resistência à ditadura militar e prestei tributo aos companheiros que nela lutaram, aproveitando todas as oportunidades para lembrar seus nomes e seus feitos, honrando seu sacrifício.

Muitas informações sequer registradas em livros estão presentes no blogue, pois, mais que o antigo Repórter Esso, posso me considerar uma  testemunha ocular da História: estava no palco dos acontecimentos e os observei com os olhos do jornalista que viria a me tornar, tanto quanto com o olhar do militante em ação (para ser absolutamente sincero, eles ficaram impressos na minha memória, mas os desafios imediatos exigiam tanto de mim que  só os pude digerir, interpretar e aprofundar depois, no recesso compulsório, qual sejam as intermináveis horas que tinha para preencher nos cárceres militares, passada a fase dramática das torturas).

Também resgatei e trouxe para o blogue o melhor da minha experiência  jornalística, chegando a digitar e atualizar longos textos que escrevera profissionalmente, como o dedicado à época de ouro da MPB, tão extenso que fui obrigado a dividi-lo em cinco posts.

E, se nunca se criaram as condições para lançar meu sonhado livro teórico com mínima possibilidade de atingir um público mais amplo do que as poucas centenas de leitores que habitualmente consomem tais obras (veneno  para as livrarias) no Brasil, fui colocando no blogue, pouco a pouco, tudo que eu tinha para dizer. Talvez sejam irrelevâncias, talvez ainda venham servir para apontar caminhos às novas gerações de revolucionários.

 

Mas, ao alertar para as terríveis ameaças que o capitalismo nos inflige, ao sobreviver muito além de sua  vida útil, tornando-se cada vez mais parasitário e nefasto, creio ter, pelo menos, cumprido o papel de estimular discussões extremamente necessárias. Poucos se dão conta de quão grande é o risco da  espécie humana não subsistir por mais um século, nem da premência com que precisamos agir, para salvarmos a humanidade da extinção. O meu papel eu tenho cumprido.

Finalmente, o Náufrago serviu como tribuna para as muitas lutas que tenho travado, algumas vitoriosas, outras não. Esta é a sua faceta mais conhecida, daí eu considerar dispensável estender-me no assunto.

Basta mencionar que, além dos aproximadamente 250 diferentes textos redigidos ao longo da cruzada pela liberdade de Cesare Battisti, o blogue defendeu o ex-etarra Joseba Gotzon, vítima menor do mesmo espírito revanchista da direita européia; Julian Assange, Bradley Manning e Edward Snowden, que escancararam para o mundo a nudez do rei; a iraniana Sakineh Ashtiani, quase-vítima da intolerância medieval; o cineasta Roman Polanski, quase-vítima do moralismo mais rançoso. o movimento estudantil em geral e os universitários da USP em particular (pois submetidos a controle policial como nos piores tempos da ditadura militar); e outros humilhados e ofendidos no dia a dia brasileiro.

Acredito que o balanço seja positivo. E peço encarecidamente aos companheiros e amigos que ajudem a difundir o acervo nele armazenado, pois não basta plantarmos as sementes, elas precisam ser irrigadas. E a colheita almejada está muito além do alcance dos meus esforços pessoais.

A GRANDE VITÓRIA DOS ‘INDIGNADOS’ BRASILEIROS

A tomada da Bastilha foi um episódio de enorme importância simbólica, por ter exposto dramaticamente a fragilidade de uma monarquia que caía de podre mas os franceses, por hábito, continuavam temendo; daí o 14 de julho haver se tornado o principal feriado da nação.

Seu resultado prático, contudo, foi apenas a libertação dos sete últimos prisioneiros que nela restavam e a obtenção de um arsenal sucateado (de 15 canhões, apenas três funcionavam…).

Da mesma forma, o que nossos  indignados  acabam de conseguir não foi somente a revogação, em poucas capitais, de mais um reajuste de tarifas do transporte coletivo. Na verdade, eles despertaram um gigante adormecido: o povo brasileiro.

A chegada ao poder do partido que se propunha a representar os explorados teve o efeito nocivo de os desmobilizar; passaram a crer que lhes seria dado de mão beijada o que tinham, isto sim, de conquistar com os punhos cerrados.

Quando o PT se vergou ao poder econômico para conseguir governar,  endireitando  e domesticando-se a olhos vistos, o povo ficou órfão e, pior ainda, desiludido e descrente de sua força.

Limitava-se a resmungar contra a corrupção, contra a inflação, contra as maracutaias da Copa, contra o sucateamento da Saúde e da Educação, contra o caos nos transportes, contra a vida mal vivida e a noite mal dormida…

Em São Paulo, a bestialidade de um governo cujos efetivos policiais permanecem  mentalmente ancorados na ditadura militar despertava reações frouxas, quase irrelevantes face à gravidade de episódios como a ocupação militar da USP e a  barbárie no Pinheirinho.

No entanto, a força da opinião pública é bem maior que a dos brutamontes fardados; foi o que se constatou, primeiramente, em 2011, quando uma tentativa de proibição da Marcha da Maconha acabou em recuo, face à péssima repercussão da  blitzkrieg  que a PM desencadeou em plena avenida Paulista.

O fenômeno se repetiu na semana passada: quando são escancarados ao País –e ao mundo– os métodos corriqueiros das nossas  polícias democráticas, a batalha pelos corações e mentes está ganha. Só sádicos e psicopatas conseguem presenciar  aquelas agressões covardes sem se revoltarem.

E, desta vez, o exemplo de luta de São Paulo inspirou iniciativas semelhantes em várias outras cidades, que trouxeram à tona demandas reprimidas há mais de uma década e flagraram uma insatisfação generalizada com os governantes do País.

Foi um divisor de águas: nada será como antes amanhã. A passividade e a prostração terminaram. As cobranças começaram. Novos contingentes revolucionários estão sendo forjados na luta, para um dia oferecerem uma verdadeira solução às carências e aflições do nosso povo.

Desde que sejam pacientes na acumulação de forças e perspicazes na escolha do momento para cada batalha, não tentando acelerar artificialmente os acontecimentos e precavendo-se sempre contra a ação nefasta dos provocadores infiltrados.

Saques e depredações são tudo de que não precisamos neste momento mágico de retomada em larga escala das lutas sociais.

TODO REPÚDIO À CRIMINALIZAÇÃO DO MOVIMENTO ESTUDANTIL!!!

Novamente São Paulo é o palco escolhido para uma FLAGRANTE PROVOCAÇÃO contra o movimento estudantil, que parece ter tudo a ver com a sequência de descalabros e arbitrariedades cometidos pelos sucessivos governo tucanos no Estado.

Estou inteiramente solidário aos bravos estudantes da Universidade de São Paulo, que têm reagido até com timidez e comedimento à escalada autoritária em curso –a qual, em tudo e por tudo, faz lembrar os infames tempos da ditadura militar.

As coisas não teriam chegado a este ponto se a OCUPAÇÃO MILITAR DA USP houvesse sido firmemente repudiada por todas as forças de esquerda. A reação tíbia à INVASÃO BÁRBARA da Cidade Universitária estimulou os nostálgicos do arbítrio a radicalizarem ainda mais seus desmandos, que atingiram o auge no Pinheirinho; e, como subproduto temos agora uma INÍQUA E INACEITÁVEL TENTATIVA DE INTIMIDAÇÃO EXTREMA AOS USPIANOS.

Recomendo  o máximo de sangue-frio neste momento, para não fornecermos munição e pretextos aos PESCADORES EM ÁGUAS TURVAS.

E que todas as forças democráticas de São Paulo e do Brasil unam-se em defesa dos NOSSOS JOVENS IDEALISTAS, QUE NÃO SÃO NEM JAMAIS SERÃO QUADRILHEIROS!!!

Vamos acreditar que o juiz de quem depende abortar esta aberração honrará a toga. Vamos evitar quaisquer radicalismos que possam prejudicar aqueles companheiros a quem tentam injustiçar.

Nada está consumado. A batalha mal começa. Se a travarmos com inteligência e determinação, venceremos. Se perdermos a cabeça, os companheiros que estão na berlinda pagarão por nossos erros. Só idiotas fazem o jogo do inimigo.

Defesa dos direitos humanos é prioridade máxima em SP

Cinco anos se passaram desde que, tentando enfiar goela adentro da comunidade uspiana quatro decretos autoritários, o então governador José Serra deu o pontapé inicial numa escalada de arbitrariedades que foi intensificando-se cada vez mais, até chegarmos às recentes e gravíssimas violações dos direitos humanos em São Paulo.

Então, ao promover um seminário sobre os DH em Sampa, o PSOL almeja algo bem maior do que o aprimoramento do seu programa, visando futuras disputas eleitorais: quer estimular os outros agrupamentos verdadeiramente de esquerda a também priorizarem a luta contra a barbárie e o retrocesso, inscrevendo-a em suas diretrizes e abrindo-se a iniciativas de união das forças progressistas para o enfrentamento do inimigo comum.

Há várias formas de avaliarmos tais episódios: podemos, p. ex., vê-los como consequência dos excessos e provocações dos remanescentes da ditadura militar até hoje enquistados na máquina governamental; como nova demonstração do despreparo de algumas autoridades para o exercício de suas funções numa democracia; e até como balões de ensaio golpistas, para se testar a resistência da sociedade brasileira ao restabelecimento do estado policial.

Todos sabem que eu fui o primeiro a alertar para a última possibilidade. Mas, qualquer que seja o motivo, NÃO PODEMOS, DE MANEIRA NENHUMA, CRUZAR OS BRAÇOS DIANTE DO QUE ESTÁ OCORRENDO! Tanto quanto nos  anos de chumbo, a defesa intransigente dos direitos humanos se tornou um imperativo para os militantes de esquerda em SP.

Daí eu pedir a contribuição de todos os companheiros, no sentido de começarmos a construir a reação organizada do CAMPO DA ESQUERDA ao avanço da DIREITA SELVAGEM na cidade e no estado de São Paulo.

 COMO DETERMOS A ESCALADA DE GRAVES VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS EM SP?

 

O PSOL está abrindo a discussão sobre os problemas candentes da atualidade brasileira, em seminários que servem para a identificação de propostas a serem incorporadas ao programa do partido em relação a questões relacionadas à educação, saúde, meio ambiente, juventude, LGBT, etc.

Neste sentido, vai promover amanhã (4a. feira, 30), a partir das 19 horas, o Seminário de Programa: Direitos Humanos, que terá lugar no Sinsprev (rua Antonio de Godoy, 88, 2o. andar, ao lado do Largo do Paissandu, no centro velho de São Paulo).

Os debatedores já confirmados são o militante histórico da Anistia Internacional Carlos Lungarzo e o jornalista e ex-preso político Celso Lungaretti, que tiveram participação destacada na luta pela liberdade de Cesare Battisti; e Fabiana Leibl, da ONG Conectas Direitos Humanos.

Estão convidados não só os filiados ao PSOL, mas os militantes de DH e todos os interessados em darem uma contribuição positiva para o aclaramento e aprofundamento de assuntos que vão desde a persistência da tortura policial contra presos comuns até hoje e as condições de vida e de trabalho desumanas impostas a grande parte da população, até a escalada autoritária em curso na cidade e no Estado (repressão da Marcha da Maconha, faxina social na Cracolândia, barbárie no Pinheirinho, ocupação militar da USP, etc.).

OUTROS TEXTOS RECENTES (clique p/ abrir):
A “FOLHA” VIRA PORTA-VOZ DO TERNUMA E QUASE NINGUÉM DENUNCIA?!
A “FOLHA” AGORA É A VERSÃO IMPRESSA DO TERNUMA
O NOVO XOU (ME ENGANA QUE EU GOSTO)

Sobre o escracho, o PIG, o macartismo e outros temas

Surpreendeu-me encontrar na minha caixa postal uma mensagem de Francisco Foot Hardman, escritor, ensaísta, crítico literário e professor de Teoria e História Literária da Unicamp.

Ele me recomenda o seu artigo publicado neste domingo (22) em O Estado de S. Paulo, O poder do escracho, por ser afim dos meus escritos sobre o mesmo tema.

Corretíssimo. Tem mesmo tudo a ver comigo, tanto que o recomendo enfaticamente (vide íntegra aqui). Eis uma amostra:

Os espectros dos desaparecidos são o GPS real que guia essas alegres levas do Levante. Boa parte das centenas de jovens e representantes de familiares de desaparecidos da ditadura que se espalharam em manifestações políticas contra o esquecimento e a impunidade de torturadores e outros responsáveis pelas ações do aparato de terrorismo do Estado durante a ditadura militar em cidades como São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, Belém, Fortaleza, não viveu aqueles anos.

Isso é tanto mais notável quanto virou idéia fixa repetir que o Brasil é o país da desmemória. Quantos Harry Shibatas precisarão ser ainda desmascarados? Porque é certo que este médico-legista coqueluche da ‘legalização’ dos extermínios praticados por agentes da Oban e do Deops, não foi caso único no amplo aparato do terror instalado pelos serviços da inteligência do regime militar.

Quantos mais foram cúmplices dos perpetradores, administrando a ciência médica a serviço da ‘otimização’ das dosagens de tortura? Quantos juramentos de Hipócrates rasgados sem nenhuma punição dos conselhos regionais ou nacional de medicina?

O escracho é uma manifestação legítima e eficaz. Comprovou-se isso na Argentina, no Chile e no Uruguai…

…É, na verdade, um livre momento de expressão e desabafo da sociedade civil organizada. A informação precisa e atualizada, a rapidez e leveza de sua estrutura de mobilização, em que a internet joga, como em outros exemplos recentes de democracia direta, um papel decisivo, bem como a imaginação criadora de suas variadas formas, esses são seus ingredientes de sucesso.

DESINFORMAÇÃO E LISTAS NEGRAS

Meu estranhamento se deveu a serem raros os  acolhidos na grande imprensa  que têm coragem de assumir vínculo ou identificação com os  boicotados pela grande imprensa: nós, os que só conseguimos divulgar nossos textos na internet. Quanto muito, repetem nossas teses e argumentações sem citarem a fonte.

 O PIG e a web cada vez mais se tornam dois planetas diferentes e, na maioria dos casos, hostis. O primeiro ignora a segunda. A segunda critica acerbamente (quase sempre com justos motivos) o que faz o primeiro.

Para quem escreve com o objetivo de influir nos acontecimentos e não por deleite ou vaidade, é uma limitação terrível.

 

Duelando em igualdade de condições com os inquisidores no território livre da internet, conseguimos convencer as minorias conscientes de que seria uma ignomínia extraditarmos Cesare Battisti para cumprir a sentença farsesca de um tribunal de cartas marcadas, que funcionou sob uma legislação típica de ditaduras (passados os  anos de chumbo, a escabrosa lei instituída exclusivamente contra os ultraesquerdistas foi revogada, mas não se anularam as condenações dela decorrentes!).

 Um dos principais coadjuvantes da ofensiva italiana, juiz aposentado que escreve na CartaCapital, chegou a desertar do debate que iniciara comigo numa tribuna virtual, com os comentários postados pelos internautas quase todos me apoiando.

 Então, era extremamente frustrante assistirmos, impotentes, à mídia desinformando o cidadão comum, a  maioria silenciosa cuja cabeça ela faz, sem a mínima consideração pelas boas práticas jornalísticas, como a de publicar contestações relevantes do  outro lado. Se nos dessem o mínimo de espaço, pulverizaríamos um por um os Minos Cartas da vida –que, sabiamente, esquivavam-se de polemizar conosco (caso do dito cujo, desafiado “n” vezes pelo Rui Martins, pelo Carlos Lungarzo e por mim).

O Lungarzo e eu chegamos a enviar para mais de mil jornalistas o oferecimento de provas incontestáveis de que Battisti tinha sido defendido no segundo julgamento por advogados que não constituiu, munidos de procurações falsificadas. E, como quem desmascarara a tramóia havia sido a Fred Vargas (principal novelista policial da França, tida como uma nova Agatha Christie ou Patricia Highsmith), incluímos um brinde: ela se dispunha a conceder, complementarmente, uma entrevista exclusiva. Um presentão para qualquer profissional de imprensa. NENHUM(A) se interessou.

Vários meses depois, o correspondente do  Estadão  na França ouviu o mesmíssimo relato da boca da Fred e mandou a notícia de lá. Foi, afinal, publicada.

Será que aqueles mais de mil jornalistas tinham desaprendido o ofício? Ou o bloqueio contra qualquer conteúdo contrário à corrente dominante (pró linchamento) era total nas editorias de Política Nacional, de forma que só poderia ser driblado numa menos  estreitamente vigiada, como a do noticiário internacional?

Agora mesmo, teve grande destaque a acusação do digno ministro Joaquim Barbosa a um atrabiliário medievalista que nunca mereceu integrar o Supremo Tribunal Federal e finalmente pendurou a toga, de manipular um julgamento da Lei da Ficha Limpa.

Aproveitando a deixa, divulguei amplamente um crime adicional –muito pior!– cometido pelo mesmo indivíduo, o de manter o escritor Cesare Battisti sequestrado depois do seu caso já estar decidido, na esperança de induzir seus colegas a uma virada de mesa legal.

Com palavras mais veementes, apenas repeti o que haviam afirmado o grande Dalmo de Abreu Dallari e o ministro mais articulado do Supremo, Marco Aurélio Mello: a prisão de Battisti deveria ter sido relaxada tão logo o Diário Oficial publicou a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tornando-se, a partir daquele instante, ilegal. E a ilegalidade durou mais de cinco meses, ao cabo dos quais o próprio STF reconheceu que nada mais havia a se discutir, só lhe cabendo cumprir a decisão que delegara a Lula.

Por que não responsabilizarmos por tal aberração o linchador que presidia o Supremo (e também o relator Gilmar Mendes)? Por que a grande imprensa deu tanto destaque a uma acusação difícil de se provar e nenhum a uma indiscutível e irrefutável?

Por dois motivos principais:

  • para não dar a mão à palmatória quanto às muitas arbitrariedades cometidas contra Battisti que ela tinha omitido ou minimizado anteriormente; e
  • para não levantar a bola de jornalistas revolucionários (agiria da mesmíssima forma se a acusação proviesse do Ivan Seixas, Laerte Braga, Rui Martins, Alípio Freire, Altamiro Borges, etc.).

OS JOVENS VOLTAM ÀS RUAS

Mas, repito, tal macartismo velado não impede que jornalistas e outros autores que têm espaços fixos na mídia inspirem-se em nosso trabalho e o reconheçam.

Por mais exasperante que seja a situação de confinado à web, eu me consolo com a lembrança dos anos de intimidação e censura: tudo era bem pior.

E, tanto quanto naqueles tempos sombrios, continuam verdadeiros os versos de Sérgio Ricardo: “cada verso é uma semente/ no deserto do meu tempo”.

O deserto continua causticante, mas as sementes já começam a frutificar:

  • os jovens foram às ruas lutar contra o autoritarismo redivivo nos episódios da proibição da Marcha da Maconha, da ocupação fascistóide da USP, da blitzkrieg na Cracolândia e da barbárie no Pinheirinho;
  • fizeram passeatas contra a ganância e a corrupção;
  • protestaram contra a ilegalidade cometida pelos saudosos do arbítrio ao exaltarem os horrores ditatoriais (com a conivência de autoridades que ignoraram olimpicamente seu compromisso com a democracia);
  • e aplicaram a antigos carrascos e serviçais do terrorismo de estado a única punição possível (moral) face à tibieza dos Poderes constituídos, aos quais caberia aplicar-lhes penas compatíveis com a gravidade dos crimes hediondos que cometeram.

Foram manifestações que nos lavaram a alma e revigoraram nosso ânimo!

Nós, os que marchamos contra a corrente da desumanização, continuaremos travando o bom combate na internet e nas ruas, sem nunca desistirmos de invadir as praias do sistema e com a certeza de que nossos textos são as sementes de um futuro igualitário e livre.

São Paulo é o grande foco direitista do País

Redatores do  Estadão  no tempo de Olavo Bilac (mão no queixo). As idéias continuam as mesmas

Segundo o Instituto Verificador de Circulação, O Estado de S. Paulo é o jornal mais vendido na capital paulista, na Grande São Paulo e no Estado como um todo, enquanto a Folha de S. Paulo só o supera no interior paulista, mas mantém a liderança nacional por circular mais nos outros estados.

 

Tais dados são perfeitamente coerentes com a realidade política paulista e paulistana.

 

Estadão  é o veículo de uma direita ideológica que remonta à aristocracia cafeeira. Conservador por excelência, foi peça importante na conspiração para a derrubada do presidente constitucional João Goulart.

 

Isto conflitava um pouco com o papel que o jornal desempenhou na ditadura getulista, quando esteve até sob intervenção. Então, depois de, segundo alegou, ter ajudado  a  salvar o País da ameaça comunista, passou a pregar insistentemente a devolução do poder aos civis, uma vez que a  intervenção cirúrgica  já teria  saneado as instituições.

 

Dondocas do Cansei! em SP:
adesão mínima frustrou planos

Ou seja, as cassações de mandatos, a extinção arbitrária de partidos e entidades, os expurgos e mudanças impostas pela força, as prisões e torturas, tudo isso já teria limpado o terreno para a burguesia poder voltar a exibir sua face civilizada…

 

Ressalvas feitas, a resistência dos jornais do Grupo Estado à censura e ao terrorismo de estado merece respeito. Afora o trivial que todos destacam (as poesias de Camões que o  Estadão  colocava no espaço de trechos ou de notícias inteiras censuradas, bem como as receitas culinárias que tinham a mesma serventia no Jornal da Tarde), houve dois episódios em que seus diretores mostraram, inclusive, coragem pessoal:

  • quando mandaram os seguranças impedirem o DOI-Codi de invadir a redação para prender um jornalista, tendo o Mesquita de plantão dito a frase célebre de que “ele pode ser comunista lá fora, mas aqui dentro é meu funcionário” (depois, abrigou-o no próprio sítio);
  • quando, depois da morte de Vladimir Herzog, decidiram acompanhar os jornalistas da casa arrolados no mesmo inquérito sempre que chamados a depor no DOI-Codi, a fim de garantirem pessoalmente sua integridade física.

Mas, embora repudie os excessos no exercício do poder burguês, o Estadão é o jornal brasileiro mais afinado com a sua essência –ao contrário dos  comerciantes  da Folha de S. Paulo, cuja postura oscila oportunisticamente ao sabor dos ventos políticos, ora cedendo viaturas para o serviço sujo da repressão, ora ajudando os Golberys da vida a recambiarem o País para a civilização…

 

A supremacia do   Estadão  em São Paulo é consistente com o fato de ser um Estado sob governos tucanos desde 1995; e na cidade de São Paulo, com o de ela, desde a redemocratização, haver tido várias gestões direitistas e somente duas, digamos,  desalinhadas  (as de Luíza Erundina e Marta Suplicy).

 

Também faz todo sentido que São Paulo esteja sendo o laboratório de testes das novas fórmulas golpistas, com a franca adoção de respostas policiais para os problemas sociais servindo para aferir a resistência que a fascistização provocará.

SP, 1964: marcha das famílias abastadas
preparou o terreno para o golpe militar.

 

Ainda bem que a operação desastrada na cracolândia e a barbárie no Pinheirinho despertaram uma opinião pública que parecia anestesiada quando da invasão da USP por brucutus e da fixação de uma tropa de ocupação em pleno campus universitário (suprema heresia!).

 

Mas, a cena paulista deve continuar sendo observada com muita atenção pelos verdadeiros democratas. Pois, qualquer atentado às instituições, para quebrar a continuidade de administrações petistas (bem toleradas pelos EUA e pelo grande capital, já que mantiveram seus privilégios, mas não pelas  viúvas da ditadura  e por alguns setores setores extremados da burguesia), começará, necessariamente, por São Paulo.

 

Vale lembrar: foi em São Paulo que o Cansei! tentou organizar uma nova (mas frustrada…) Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade.

 

E é em São Paulo que a truculência policial volta a ser exercida exatamente como nos tempos da ditadura militar, por efetivos que até hoje cultivam descaradamente a nostalgia do arbítrio.

 

Obs.: na história de São Paulo também há capítulos edificantes, como a luta contra o despotismo em 1932, o movimento estudantil de 1968, as diretas-já e o fora Collor!. Mas, parecem ter sido episódios fugazes, meras exceções, enquanto o conservadorismo e o reacionarismo dão a tônica.