A lista dos sócios e dirigentes das emissoras comerciais de TV e rádio em todo o Brasil foi divulgada pelo Ministério das Comunicações na internet. A medida tem o objetivo de dar mais transparência à administração das emissoras do País e contar com o apoio da sociedade para fiscalizar se a legislação está sendo cumprida.
De acordo com a lei, detentores de cargos políticos podem ser donos de emissoras, mas não podem participar do quadro de dirigentes da empresa.
O Ministério também divulga na internet dados sobre emissoras de TV e de rádio, dividindo-as entre educativas, comerciais e comunitárias, em todo o Brasil.
Agora é possível acompanhar também o andamento dos processos de outorga de rádios comunitárias via internet. De qualquer localidade do País, é possível verificar a situação dos procedimentos necessários.
Há coisa de dois meses, a Anatel resolveu que para uma empresa ter operação de TV a cabo não precisará mais vencer um processo de licitação. Terá apenas que pedir a outorga e demonstrar capacidade finaceira e técnica para manter a operação no ar que ganhará a concessão e poderá ir em frente. Basicamente, isso ajuda às teles, que há muito tempo procuram uma forma de ter oeprações de TV paga a cabo (algumas já têm por DTH), algo que é o pesadelo dos radiodifusores tradicionais. A esperança das teles era (é ainda) o PL-29, mas como esse anda a passos de tartaruga manca, a Anatel adiantou-se e definiu pela abertura ampla, geral e irrestrita das outorgas.
Durante esses dois meses, os radiodifusores ficaram no mocó, só observando. Agora, porém, eles viram que a coisa tende a ficar mesmo preta – foram pedidas mais de 80 outorgas em três semanas (até 12 de julho), em especial em pequenas cidades do interior ou em locais nos quais há forte presença de “gatonets”, como a Baixada Fluminense. Assim, por enquanto, só pequenos operadores entraram no jogo, mas é óbvio que, quando a situação aclarar, as teles vão botar o time em campo.
Para tentar evitar esse ataque, os radiodifusores apelaram para duas armas tão tradicionais quanto poderosas: matérias em TV e pressão no Congresso. O petardo inicial com a primeira foi da Band (leia aqui), seguindo-se um foguete no Congresso disparado pelo senador Antônio Carlos Junior (DEM-BA), ele mesmo dono de TV em seu estado (leia aqui). Já a Anatel defende sua ação afirmando que o fim dos limites para outorgas beneficiará os consumidor pelo aumento da concorrência (leia aqui).
Está ficando realmente muito feia a coisa. A perda de credibilidade do jornalismo brasileiro – muito por causa dos próprios jornalistas – está começando a passar para o desrespeito puro e simples.
Ontem, não vi o jogo em que o Fluzão assumiu a liderança do Brasileiro. Chegando em casa tarde, liguei a TV para ver como tinha sido a partida. Não deu, mas assisti, em três minutos, duas cenas constrangedoras para a “catchigoria”:
1. Entrevista coletiva do Felipão: “vocês ficam tentando induzir o jogador a falar bobagem de cabeça quente. Não vou mais permitir isso. A partir de amanhã, vou determinar que quem falar com jornalista sem ordem, vai pagar 5 mil, 10 mil para caixinha. Aí acabou”.
2. Entrevista coletiva de Wagner Mancini, treinador do Guarani. Ele é perguntado, de maneira educada, porque Fabinho, bom ponta e ídolo da torcida, não tem ficado nem no banco nos últimos dois jogos: “Já vi que vocês gostam muito do Fabinho…” começou ele, exsudando sarcasmo.
Péssimo, né? Mas tem pior. “Isso aconteceu mesmo ou é invenção de jornalista?”, perguntou o apresentador de um programa de rádio, que a cara-metade ouviu no táxi, hoje de manhã.
Esse desrespeito tem raízes lá atrás. No fim dos anos 90, escrevi aqui, na Coleguinhas (na época um site até bem taludo e não um simples blog), que o constante insulto à inteligência do público perpetrado pelos jornalistas ainda ia proporcionar sérios problemas não apenas aos veículos – com queda de audiência -, mas também aos próprios profissionais.
De lá para cá, os insultos multiplicaram praticamente ao infinito, como se pode observar, literalmente todos os dias, apenas folheando jornais (sem contar rádios, TVs e internet). A ação de pessoas truculentas como Felipão e Mancini (e Leão, mas esse é caso patológico mesmo) é resultado do escárnio diário dos profissionais de jornalismo em relação à capacidade de julgar do distinto público. Em reação, este passa a ficar indiferente à violência (pelo menos a verbal) contra os jornalistas (você lembra que houve significativo apoio ao Dunga quando ele destratou o Alex Escobar de público durante a Copa?). Aí felipões e mancinis se sentem autorizados a atacar quem faz perguntas das quais não gostam e “comunicadores” ficam à vontade para chamar jornalistas de mentirosos em seus programas.
Vai melhorar? Dificilmente. Afinal, para haver reversão desse quadro, em primeiro lugar, é necessário que aqueles que trabalham se dêem ao respeito. Uma atitude em direção da qual não se vê nenhum sinal.
Os “acadêmicos” de plantão nas grandes redações precisam ter um pouco mais de rigor científico. Andaram divulgando por aí, com enorme felicidade, que “96% das informações novas (nunca noticiadas até então) surgem em meios tradicionais (jornais, revistas, TV, rádio)” e que as novas mídias não colaborariam tanto assim para a disseminação das tais “informações novas”.
A tentativa de dizer “Não disse!” é meio infantil. Vamos a outras considerações.
01. Não é novidade que os grandes meios pautam as novas mídias. Estudos sérios, que fogem ao determinismo tecnológico comum em tempos de febre de Internet, já demonstravam isso desde o final da década de 90.
02. Mas o que os grandes meios pautam não é o pensamento das pessoas, e sim a agenda pública. E mesmo assim com limitações que aumentam à medida que o uso social da Internet se complexifica.
03. É preciso ressaltar as limitações culturais: o Pew Research Center (responsável pelo estudo) analisou, por uma semana, o conteúdo produzido por 53 publicações em Baltimore (no Estado de Maryland, ao lado de Washington).
04. Segundo a própria Folha (que publicou a matéria sob a editoria “Dinheiro”, estrategicamente), a pesquisa afirma que 17% das reportagens em todos os meios têm conteúdo novo, enquanto o restante é “essencialmente repetitivo, não trazendo nenhuma informação exclusiva”. E que são, portanto, as reportagens inovadoras “que tendem a determinar a agenda de relatos por parte da maioria dos outros veículos”.
05. Uma outra questão que devemos nos perguntar: as “informações novas” são efetivamente as melhores? É um questionamento básico, fundamental: quem disse que reside na novidade a qualidade?
06. Uma outra tendência que nunca seria destacada por um meio de grande circulação é a de que há “uso de conteúdo alheio sem citação de crédito”. Na própria Folha: “Encontramos vários exemplos de sites com trabalho de outras pessoas sem que fosse citado o autor e, muitas vezes, sugerindo que havia apuração própria do veículo, quando isso não ocorreu.” Como sempre se soube, não são apenas os geeks e blogueiros que possuem esse péssimo hábito de copiar sem citar, não é mesmo?
07. E o pior: “esqueceram” de registrar estudo do mesmo Pew Research Center indicando que, em dezembro de 2008, a Internet ultrapassou os jornais como a principal fonte de notícias (porém ainda perde para a TV). (leia aqui o estudo)
Evidente que, justamente nos cadernos de economia, não cairiam bem publicar tal realidade. E o mais curioso deste estudo é uma das tendências demonstradas: entre os jovens, os índices da TV e da Internet como principal fonte de notícias já estão empatados.
Portanto, cabe sim uma crítica à Internet como uma ferramenta redentora dos males sociais (não o é) ou como fonte inovadora de conhecimento. Mas muito se parecem os jornalistas que ficam propagandeando os jornais e demais mídias tradicionais, de um lado, e outros apologistas do determinismo tecnológico.
Jornalista, 41, com mestrado (2011) e doutorado (2015) em Comunicação e Cultura pela UFRJ. É autor de três livros: o primeiro sobre cidadania, direitos humanos e internet, e os dois demais sobre a história da imigração na imprensa brasileira (todos disponíveis em https://amzn.to/3ce8Y6h). Acesse o currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0384762289295308.