Por Ivone Gebara
Palestra proferida no encerramento da X Semana Teológica Pe. José Comblin em 03-10-2020
—
* Freira, filósofa e teóloga brasileira.
Foto na portada: Pe. José Comblin
Fonte: Teologia Nordeste
(03-10-2020)
Por Ivone Gebara
Palestra proferida no encerramento da X Semana Teológica Pe. José Comblin em 03-10-2020
—
* Freira, filósofa e teóloga brasileira.
Foto na portada: Pe. José Comblin
Fonte: Teologia Nordeste
(03-10-2020)
Por Jardene Soares
Por Lucetta Scaraffia
Extrato de uma conferência (“Mulheres e Fé: a imagem feminina da Igreja Católica nos séculos IX e X”), na Fundação Collegio San Carlo, em 6 dezembro de 2013.
– “Hoje, vou falar-lhes de um tema que todos pensam resolver bem facilmente, mediante uma condenação da Igreja por não dar espaço às mulheres. De fato, se olharmos para a Igreja de hoje, temos razão em dizer isto, porque na Igreja de hoje, o Vaticano está todo cheia só de homens. Há mulheres que lá trabalham, mas todas em posição subordinada.
– Nos níveis superiores, nos níveis em que são tomadas as decisões, aí as mulheres não se fazem prsentes.
– As Religiosas, por exemplo, constituem dois terços do universo dos Religiosos, portanto uma maioria robusta. Enquanto isso, as Mulheres Leigas tornam-se cada vez mais uma ajuda essencial a serviço das Paróquias: ensinam no Catecismo, ocupam-se do andamento da Paróquia, na Cáritas, Trata-se de uma ajuda muito forte que as Mulheres dão à Igreja. Ajuda transparente que, por outro lado, quase ninguém vê.
– Então, a Igreja hoje nos parece uma instituição misógina, por negar-se a reconhecer às Mulheres o papel do seu trabalho, ao interno da vida religiosa.
– Por outro lado, consideremos um outro fator, que é o da história da emancipação feminina. Vemos que a emancipação feminina nasceu, enraizou-se e realizou-se apenas nos países de matriz cristã. Vejamos que há uma grande dificuldade de que isto se faça em países não-cristãos (Índia, China, países muçulmanos…), onde há grandes problemas em aceitar a igualdade das Mulheres.
– É evidente que a matriz cristã lançou as sementes dessa igualdade entre mumulheres e homens. Vou falar-lhes sobre as Mulheres nos séculos IX e X, mas lhes digo que o Cristianismo lançou as sementes da igualdade.
– No Evangelho, Jesus fala continuamente com as mulheres. E no tempo de Jesus, era muito complicado falar com as mulheres, especialmente com mulheres marginalizadas. E as tratava com total paridade. À samaritana Ele diz: “Vai e dize ao teu povo…” A Maria É a Madalena que Ele se apresenta, por primeiro, como Ressuscitado. Trata as mulheres como tratava aos homens (com igualdade).
– O Evangelho é um livro emblemático quanto à mudança de tratamento em relação às mulheres, inclusive em relação às mulheres “impuras”. Ele tira das mulheres a marca da impureza física. Não há perigo em que as mulheres estejam “impuras”, de modo a justificar que se mantivessem as mulheres marginalizadas, separadas dos homens. Não são mais tratadas como “impuras”. A impureza é do coração, não do corpo, negando assim “impureza” em relação àquelas mulheres por conta de menstruação ou no período pós-parto, não se justificando por isso uma diferença real em relação aos homens.
– É assim que o Cristianismo se torna, nos primeiros séculos, uma religião de mulheres: são muitas as mulheres que se convertem ao Cristianismo, porque o Cristianismo assegurava paridade (em relação ao homem), na vida espiritual.
– Segundo Peter Brown, um grande historiador das religiões da antiguidade, nos primários séculos, havia um tratamento de paridade, ao ponto de permitir às mulheres e aos analfabetos terem uma carreira religiosa, o que revolucionou a sociedade antiga, pois, por meio da ascese, da prática ascética do jejum e da abstinência sexual, permitiu-se às pessoas, às mulheres que não sabiam ler nem escrever, e a pessoas letradas no monarquismo cristão fundado por Antão, que era um camponês analfabeto. Essas pessoas analfabetas, esses homens e mulheres analfabetos se tornam santos, fazendo uma carreira religiosa, no mesmo nível de letrados como Jerônimo, que traduziu os textos sagrados… Isto implica uma carreira espiritual para as mulheres, o que era uma novidade absoluta. Isto é importante.
– Um outro aspecto é o do matrimônio cristão. Além da aceitação da premissa do consenso entre os dois contratentes – a mulher não podia ser um objeto que passava do pai ao marido -, ele implicava os mesmos direitos e os mesmo deveres aos cônjuges. O dever de fidelidade era também para o homem, coisa que antes não acontecia. (…) Aqui houve também uma revolução, no campo do matrimônio.
– Portanto, naquele momento histórico, o matrimônio cristão constituía um ato absolutamente favorável às mulheres. Não existia divórcio. Era o repúdio. E eram sobretudo as mulheres, as repudiadas. Se o casal não tivesse filhos, a responsabilidade era atribuída quase somente à mulher, considerada estéril, e daí o repúdio. E acabava muito mal.
– Assim, o Cristianismo lançou sementes importantes que deram fruto na história. (…) O Cristianismo deu grandes santas, grandes abadessas, mulheres que construíram a cultura cristã, como os homens, contribuíram, como os homens, para a tradição cristã. Isto se deu durante toda a história do Cristianismo. Pensar em mulheres como Catarina de Siena, que falou num Sínodo, que orientou a papas e a cardeais, fazendo-o em nome de Deus. Era uma mulher analfabeta. Não sabia ler nem escrever. Ditava suas cartas e seus tratados para seus assistentes dominicanos. E era chamada a falar nesses espaços.
– Bem, as mulheres tiveram oportunidades na tradição da Igreja, que não tiveram no mundo laico. No mundo laico, somente as rainhas, algumas rainhas é que tiveram essas possibilidades. No contexto da Igreja, eram essas mulheres que, por motivo espiritual, fizeram carreira. Tudo vai mudar com a Revolução Francesa.
http://www.youtube.com/watch?v=uIqe0tuyuHk
Traduçáo: Alder Júlio Ferreira Calado
Duas entrevistas emblemáticas
Há poucos dias, li uma reflexão fecunda proposta por Ivone Gebara acerca das recentes canonizações.
Encontrei uma entrevista recente da própria Ivone Gebara, concedida a Mônica Teixeira, que considero importante: cf. “link”:
Recomendo, ademais, ver/ouvir a instigante entrevista (em três breves blocos de cerca de 11 minutos, cada) da teóloga feminista catalã, Teresa Forcades, concedida ao Programa “Tierra de Sueños”.
Dentre os temas aí abordados, destaco:
– os determinantes sociais da saúde (onde ela cita, inclusive a conhecida figura de Ivan Illich: “La obsesión por la salud se ha convertido en una patología.”;
– desafios da Igreja Católica Romana;
– o lugar das mulheres na Igreja, em especial o debate sobre a ordenação das mulheres;
– o debate sobre a homoafetividade.
Eis o respectivo “link”:
Que tal conferir?