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Positivamente

Ter um lugar aonde estar. Um lugar aonde ir. Saber-se esse lugar que vai e vem e não sai do lugar. Volta a si uma e outra vez.

Puxam pra fora ou para baixo. Não vou pra lá, não. Fico em mim, não importa onde esteja ou o que esteja a fazer.

Trato de não me menosprezar. Deixar de lado expressões pejorativas a meu respeito. Não são minhas. É a ação perversa da qual venho me livrando. Afirmo a minha positividade. As minhas qualidades. O amor me anima.

Nenhuma das coisas terríveis que imaginei, aconteceu. Posso, então, seguir confiando. Confiar em mim e em quem me ama. Me apoio no que quero e me movimenta. Vou na direção da luz. Prazer, bem-estar, alegria, paz.

Novidades não sei se tenho a partilhar. Talvez mais reafirmações de propósitos que cada dia me vejo obrigado a renovar.

Simplesmente

Frequência S

Sintonia S

Prazer

Reino de Deus

Beleza

Justiça

O simples.

Junção

Apertura

Abrir espaço em mim, em nós

Um lugar no mundo

Pinceladas desta manhã

Junto e me junto ao partilhar o que vou aprendendo

Sentido de partilha

Sentimento de mim

Sentir o mundo e me sentir

Saber que posso

Podemos

Posso

Juntos e juntas podemos mais!

Para retomar nossa vocação profética

Neste 2º Domingo do Advento, o evangelho lido nas comunidades, Mateus 3, 1 – 12 nos traz a figura de João Batista como quem primeiro anuncia e testemunha a vinda do reino de Deus, ou dos céus, como diz Mateus.

Para Mateus, quem começou o evangelho foi João Batista, profeta de Israel. João revela que a mensagem do reino é comum aos dois testamentos. Não há solução de continuidade. O fio condutor é o profetismo, a capacidade de ver os sinais do reino e fazer a vontade do Pai para que o reino e sua justiça sejam sempre a prioridade. Em Mateus, Jesus representa a verdadeira realização do Judaísmo: a plenitude da lei e dos profetas.

As palavras de João pedindo conversão e justiça (e não apenas ritos), são atuais. Ele pede arrependimento, conversão. Esse apelo: “Arrependei-vos, o reino dos céus está chegando” (Mt 3, 2). O original grego diz: “Mudem de mente(metanoiete), porque o reino divino acabou de chegar (em grego: eggiken). Alguns textos traduzem como “está perto ou próximo”. Só se for geograficamente porque em termos de tempo, conforme esse evangelho, já chegou. E só Mateus diz isso. Já chegou!

Afirmar que o reino já chegou, mesmo quando vivemos na realidade social e política, uma situação oposta ao projeto divino, é uma profecia corajosa. É subversiva em relação a todos os impérios e aos nossos costumes e convenções costumeiras. Naquele tempo, afirmar que o reino de Deus já chegou era negar o poder do império. E o evangelho afirma isso no tempo em que o Império Romano era mais poderoso e atuante.

Hoje, o que significa afirmar que o reino de Deus já chegou? Como podemos afirmar que esse reino chegou, se o mundo parece caminhar na direção contrária ao reino? Qualquer pessoa pode ver que, que tanto na Igreja Católica, como em Igrejas evangélicas e pentecostais, muitos ministros e grupos cristãos se fecham em uma forma de religião narcisista e auto-referencial, descomprometida com a profecia do reino como transformação do mundo.

Ao contrário disso, o reinado divino pede antes de tudo conversão, isso é, “voltar atrás” e regressar a uma relação de aliança de fidelidade e compromisso com Deus. Mais tarde, o próprio Jesus vai dizer: “Não é quem me diz: Senhor, Senhor, que entra no reino, mas quem, de fato, realiza a vontade do Pai”(7, 21). De qualquer modo, João acolhe a todos e não se considera ele mesmo como realização das profecias. Ele vê as profecias realizadas na pessoa do Cristo, que vem após ele.. Esse “virá após mim”(v. 11) significa que o Cristo o seguirá como discípulo.  Jesus se insere na história como discípulo de um profeta e é acolhido pelo povo como profeta. Também nós, se somos verdadeiramente cristãos,  temos de ser discípulos do profeta Jesus e viver o profetismo que nos é pedido.

Para revitalizar o profetismo, Joao Batista se coloca no deserto entre o rio Jordão e a terra prometida. É o lugar da antiga conquista da terra e do Êxodo. Foi pelo rio Jordão que, segundo a Bíblia, os hebreus entraram na terra prometida (Js 3, 14- 17). Então, o Jordão tem uma dimensão simbólica na história de Israel. Era como se, ao ser mergulhado/a naquele rio, (batizada), as pessoas e comunidades passassem de um império do mal (de Roma) ao reinado divino. A palavra usada para significar “banho” (miqweh) tem duplo sentido: banho e esperança. Daí que o batismo de João podia ter um sentido de anúncio do Reino futuro.

Hoje, podemos atualizar isso dizendo: Só se vive um cristianismo profético retomando uma espiritualidade sócio-político libertadora. Só assumindo as causas da libertação, podemos ser profetas como João Batista e como Jesus e, assim viver o Advento como tempo de retomada da expectativa do reino.

Assumir as causas da libertação, nós assumimos junto com todos os movimentos sociais e partidos de esquerda que lutam pela transformação do país e do mundo. No entanto, talvez alguém de vocês me perguntem se não há algum diferencial nessa profecia do reino que é a nossa, ou seja, a profecia propriamente cristã.

Não parece que Jesus tenha se preocupado com isso. Ele quis, ele  mesmo se inserir no caminho da esperança e do movimento profético. No entanto, sem dúvida, há algo de próprio e de novo neste anúncio de João Batista sobre o batismo (mergulho) nessa vida nova. A vida nova que propomos para o mundo tem de começar por nós mesmos que devemos nela mergulhar (ser batizados).

Profetas como Isaías, Jeremias e Oséias apresentam a aliança do Senhor como um casamento de Deus com o seu povo. Agora, João diz que o povo rompeu com este casamento e Jesus é o Casamenteiro que vem reatar este casamento de Deus com o povo. No evangelho, João afirma que não precisará desatar as sandálias de Jesus porque Jesus representa Deus, o Esposo da humanidade. Por isso, João Batista fala do gesto de desatar as sandálias dizendo que não é digno de desatar as sandálias do Messias. É uma imagem que remete à cultura patriarcal da sociedade israelita antiga, mas comparar a  aliança com Deus com a intimidade do casamento pode ser atual. Temos de redescobrir como viver uma fé profética, que se expressa no compromisso social e político transformador e, ao mesmo tempo, se renova na relação carinhosa e afetuosa da relação de intimidade com Deus.

(03/12/2023)

Formação missionária ante os atuais desafios: o lugar da memória histórica

Diante da multiplicidade e da complexidade de desafios sócio-eclesiais – a crueldade de uma guerra, a letalidade de uma pandemia, a crise de emergência climática, o colapso da economia, os desmandos da necropolítica, as profundas contradições do cristianismo atual, inclusive da Igreja Católica, o desvario do fundamentalismo religioso, a profunda crise ética de nossos tempos, entre outros -, enquanto discípulos e discípulas, enquanto missionários e missionárias fiéis aos valores do Reino de Deus e Sua Justiça, somos instados a reavaliar criticamente e a aprimorar o trabalho de formação, como um instrumento (ao lado do processo organizativo e de mobilização) de enfrentamento exitoso de tais desafios.

No exercício contínuo do processo formativo, somos chamados a ter presentes diversos elementos (análise de conjuntura, planejamento, trabalho temático a altura dos nossos desafios, protagonismo de docentes e discentes, metodologia compatível com o horizonte da formação,  avaliação contínua, entre outros). Nas linhas que seguem, limitamo-nos a examinar o lugar específico da memória histórica, no processo de formação missionária, precedida de uma breve rememoração do sentido de Missão.

 

Chamados e enviados

 

A despeito de honrosas exceções entre pessoas e grupos envolvidos, no âmbito da Igreja Católica, vem sendo frequente a observação de um crescente hiato entre Discipulado e Missão. Com efeito, não obstante sólida fundamentação bíblica – veterotestamentária e neotestamentária -, constata-se uma tendência a uma dissociação entre Discipulado e Missão. Por vezes, até parece um bizarro “esquecimento” de nossas raízes cristãs: “sai de tua terra e vai aonde te mostrarei” (Gn 12,1); “Olha, ponho-te neste dia sobre as nações, e sobre os reinos, para arrancares, e para derrubares, e para destruíres, e para arruinares; e também para edificares e para plantares” (Jr 1:10”); “Não foram vocês que me escolheram; pelo contrário, fui eu que os escolhi para que vão e deem fruto e que esse fruto não se perca.” (Jo 15, 16). Parece um esquecimento de nossas raízes nômades, de discípulos e discípulas desinstalados e desinstaladores, missionários itinerantes ou, como costuma dizer o Papa Francisco, “uma Igreja em saída”. Vã tentativa de centrar no templo nosso Discipulado, desconectado da Missão, em especial de missionárias e missionários enviados aos empobrecidos, aos oprimidos, aos marginalizados.

Eis um desafio de monta que somos chamados a enfrentar, buscando inspirarmos constantemente em tantos membros eclesiais, por exemplo, dos anos 70 e 80, comprometidos com a causa libertadora dos oprimidos.

Nesta perspectiva, é que nos sentimos provocados pelo Espírito do Ressuscitado, a nos converter continuamente em membros de uma “Igreja em saída” para tanto, somo instados a trabalhar, de modo crítico e autocrítico, nosso processo formativo, sempre conectado ao nosso processo organizativo e celebrativo.

 

O lugar da memória histórica em nosso processo formativo na e para a Missão

Insistimos em que, como acima dito, na perspectiva do Seguimento de Jesus, nosso compromisso missionário pressuponho um contínuo processo organizativo, formativo e celebrativo. No que toca, especificamente, a dimensão formativa, convém destacar, pelo menos três componentes intimamente conectados: o da memória histórica (passado), o da ortopraxia (presente), e o da esperança (em perspectiva).

Especialmente no que diz respeito a memória histórica, importa por em relevo o sentido com que trabalhamos esta dimensão. Não se trata de uma revisitação saudosista ao passado, por mais interessante que isto também possa ser. Trata-se, sim, de um exercício de constante busca às nossas raízes, como um exercício empenhativo e reparador das experiências históricas características do povo dos pobres: movimentos populares, “minorias abraâmicas” (Dom Helder Câmara), grupos e pessoas em situação de exploração, opressão, marginalização.

 

A relevância pedagógica das biografias

 

A memória histórica, seja em sua versão coletiva, seja em sua dimensão individual, proporciona uma série de elementos, de critérios, por meio dos quais temos a oportunidade de, a medida que vamos rememorando, fatos, situações e acontecimentos do passado, vamos, ao mesmo tempo, tomando consciência de passos decisivos para o êxito dos enfrentamentos, bem como os passos equivocados que implicaram reveses, tanto no âmbito macro-social, como no campo eclesial.

 

O exercício da memória histórica pode ter uma semelhança com o exercício da mística, seja da mística revolucionária (numa linguagem laica), seja no que concerne ao processo de conversão (numa linguagem mais própria dos seguidores e seguidoras do movimento de Jesus). Revisitar acontecimentos, fatos e situações do passado, por exemplo, em sua dimensão coletiva, supõe, fazer uma análise crítica do que foi vivenciado, seja enquanto conquistas, ganhos, seja enquanto reveses. Trata-se de um exercício de crítica e autocrítica, no sentido de que nos permite analisar os processos realizados, seja quanto aos objetivos, seja quanto aos protagonistas, seja quanto à metodologia utilizada, seja quanto à avaliação, etc.

 

A memória histórica, do ponto de vista macro-social, nos permite examinar, de modo criterioso, as causas, as circunstâncias, as atitudes coletivas e individuais, os ganhos, os reveses. Permite, também, que passemos em revista, grandes acontecimentos históricos, transformações sociais de grandes alcances, processos revolucionários, modo de atuação, comportamento dos protagonistas, objetivos alcançados ou fracassados, enfim, diferentes aspectos desse mesmo processo.

 

No âmbito estritamente eclesial, o exercício da memória histórica nos permite reexaminar criticamente os vários períodos da história (da Igreja – Católica, Ortodoxa, Reformada), de que modo os seus protagonistas atuaram em sua busca de segmento do movimento de Jesus, ou, ao contrário, seu distanciamento, das origens do próprio cristianismo, convertendo em projeto de poder, do qual o clero foi o único beneficiado.

 

A memória histórica, pode ainda, ser exercitada do ponto de vista pessoal. Neste sentido, convém destacar a relevância de se estudar a história de vida de grandes figuras da história, bem como do âmbito eclesial. O estudo de biografias de figuras de referência constitui uma ferramenta relevante, num processo de formação missionária. Com efeito, os formandos e formandas, os formadores e formadoras sempre encontram elementos de exemplaridade em figuras, seja no plano macro-social, seja no plano eclesial. Trata-se de proporcionar aos educandos e educandas a ocasião de travar conhecimento da trajetória de vida de figuras consideradas emblemáticas. Neste sentido, no processo formativo missionário, convém reservar um tempo precioso para o exame na trajetória de vida de muitas pessoas que atuaram, seja no âmbito macro-social, seja no âmbito eclesial, como exemplos vivos dos quais podem ser extraídos muitos elementos intuitivos, válidos para o enfrentamento para os desafios atuais.

 

A formação missionária, no âmbito da Memória Histórica 

 

No Movimento de Jesus, o horizonte perseguido é sempre o Reino de Deus e sua justiça, sempre tendo a humanidade como seu grande horizonte. a Tradição de Jesus transcende fronteiras eclesiais, espaços Cristãos e de outras religiões. Conforme o lema Episcopal de Dom Pedro Casaldáliga, trata-se de “Humanizar a Humanidade”.

 

Neste sentido, é que o Horizonte Missionário, bebendo na fonte da Trajetória de Jesus de Nazaré, destina-se a todo o gênero humano. É assim que a formação missionária se alimenta da Memória Subversiva, empenhativa e de compromisso com a causa libertadora dos oprimidos. Bebe na fonte do gesto que Jesus testemunhou, por ocasião da Última Ceia, ao levantar-se em direção ao seus discípulos, para lavar-lhes os pés, ao mesmo tempo em que ordenou aos seus discípulos e discípulas que fizessem o mesmo entre si.

 

A missão é sempre alimentada pela memória subversiva de Jesus que enfrentou abertamente os poderosos do seu tempo, as forças políticas e religiosas: Doutores da Lei, Escribas, Fariseus, além dos representantes políticos do Império Romano, pelos quais Jesus seria condenado, torturado e assassinado.

 

Ao longo de séculos, ainda que constituindo pequenas minorias – “minorias Abraâmicas” -, sempre houve testemunhas proféticas a enfrentarem os “donos do poder”, em todos os períodos históricos, também hoje.

 

Eis porque, seja no plano coletivo, seja no plano pessoal, a formação missionária não deve prescindir do exercício da Memória Histórica. Resulta fundamental, por consequência,  a rememoração contínua de lutas sociais, protagonizadas por diferentes movimentos sociais, das quais importa acentuar conquistas, avanços reveses, protagonistas, estratégias e lições a serem recolhidas. A título de exemplo, vale destacar experiências de lutas, desde a Antiguidade (ver, por exemplo, a luta dos escravos liderados por Spartacus) contra o Império Romano; vale ainda destacar diversos movimentos palperísticos na Idade Média; a modernidade e a contemporaneidade, igualmente, despontam como cenários de lutas relevantes (Revolução Francesa, a Comuna de Paris, a Revolução Russa, Revolução Chinesa, Revolução Cubana e várias outras). Aos formandos e formandas no campo da Missão importa examinar estes acontecimentos como forma de identificar neles a presença do Espírito do Ressuscitado, atentando sempre para as lições a serem recolhidas.

 

Assim como no plano coletivo, cumpre também acentuar a importância do exercício da Memória, no que diz respeito às experiências de pessoas cuja trajetória e cujo testemunho de vida são reconhecidos como referência e inspiração para as gerações de hoje e de amanhã. Aqui lidamos mais diretamente com histórias de vida ou biografias.

 

Para tanto, vale a pena destacar, a título de exemplo, a biografia de algumas figuras emblemáticas.

 

A memória histórica no processo de formação missionária pode, por conseguinte, ser exercitada por meio de biografias e de relatos de experiência coletiva. Deste ponto de vista, convém, a título de ilustração de alguns casos, incentivar a leitura ou o acompanhamento de textos de reconhecida relevância, quanto à perspectiva de luta, de organização, de testemunhos de movimentos populares, de organizações de base de nossas sociedades, cujo teor pode contribuir enormemente no processo formativo de missionários e missionárias, também em nossos dias. Neste sentido, poderíamos iniciar esta série de indicações bibliográficas e de filmes que apontam para as fontes mais consistentes de inspiração missionária.

 

Em relação, por exemplo, à própria figura de Jesus de Nazaré, indicamos, entre outros, os seguintes textos:

 

  • PAGOLA, José Antônio. Jesus, aproximação histórica. Petrópolis: Editora Vozes, 2010.

  • COMBLIN, José. Jesus de Nazaré. Petrópolis: Editora Vozes, 1975.

  • BENEDITO, Ferraro. O processo de Jesus. Petrópolis: Editora Vozes.

  • ECHEGARAY, Juan. A prática de Jesus. Petrópolis: Editora Vozes, 1984.

  • CASTILLO, José Maria. Jesus: a humanização de Deus. Petrópolis: Ed. Vozes, 2015.

  • HOORNAERT, Eduardo. Origens do cristianismo. São Paulo: Paulus.

  • HOORNAERT, Eduardo. Memória do povo cristão. Petrópolis: Ed. Vozes, 1986.

 

No plano da evolução do cristianismo, principalmente a partir do século IV, convém destacar algumas contribuições relevantes. De autoria de José Comblin:

 

  •  COMBLIN, José. Vocação para a liberdade. São Paulo: Ed. Paulus, 1998;

  • COMBLIN, José. O caminho. São Paulo: Ed. Paulus, 2007;

  • COMBLIN, José. A profecia na Igreja. São Paulo: Ed. Paulus, 2008;

  • COMBLIN, José. O Espírito Santo e a Tradução de Jesus. Ed. Nhanduti, São Bernardo do Campo, 2012.

 

No tocante a relatos históricos voltados para uma interpretação de movimentos populares de libertação, ao longo da história, convém ressaltar algumas contribuições:

  • Arthur Tavares Brito (Peregrino) – tese de doutorado “À SOMBRA DO JUAZEIRO: as transformações da experiências religiosa popular no Juazeiro do Padre Cícero (1986-2016)” (UNICAP 2020) http://tede2.unicap.br:8080/bitstream/tede/1316/5/Ok_jose_artur_tavares_brito.pdf

  • O filme “Spartacus”, interpretando a saga das lutas de libertação contra o Império Romano;

  • Bloch, Ernst. “Thomas Müntzer, o teólogo da revolução”, narrando a atuação revolucionária de Thomas Müntzer, uma liderança relevante dos camponeses em resistências aos príncipes da nobreza alemã; (Ed. Tempo brasileiro, 1973)

  • Livros e documentários sobre a Comuna de Paris;

  • Textos e documentários em torno da figura libertária de Louise Michel, uma das mulheres protagonistas da Comuna de Paris;

  • GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina; Ed. L&PM, 2010, edição original 1971.

  • FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes. Ed. Biblioteca Azul, 2008.

  • GORENDER, Jacob. O escravismo colonial. Ed. Expressão Popular, 2016.

  • FREITAS, Décio. Palmares: a Guerra dos Escravos. Ed. Mercado Aberto, 1984.

  • ____________. O escravismo brasileiro. Ed. Mercado aberto, 1991.

  • LUGON, Clovis. A República Comunista Cristã dos Guaranis. Ed. Paz e Terra, 1976.

  • MOURA, Clovis. Sociologia do negro brasileiro. Ed. Perspectiva, 2019.

  • CHIAVENATO, Júlio. Lutas do povo brasileiro. Ed. Moderna, 2008

  • _______________. O golpe de 1964 e a ditadura militar. Ed. Moderna, 2014.

  • RIBEIRO, Darcy.O povo brasileiro. Ed. Companhia das letras, 1995.

  • SILVA JÚNIOR, Edson Teixeira. Carlos, a face oculta de Marighella. Ed. Expressão Popular, 2009.

  • CALLADO, Antônio. Tempo de Arraes. Ed. Paz terra, 1964.

  • ______________. Os Industriais da Seca e os Galileus de Pernambuco. Ed. Civilização Brasileira, 1960.

  • SOUZA, João francisco de. Uma Pedagogia da Revolução. Ed. Cortez, 1978.

  • FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança.

  • SANTIAGO, M. Eliete & BATISTA NETO, José.

  • Memórias do povo. João Pedro Teixeira e as Ligas Camponesas na Paraíba. Deixemos o Povo Falar. Editora Ideia, 2006. PDF: http://www.ligascamponesas.org.br/wp-content/uploads/MEMORIAS%20DO%20POVO%20-%20Joao%20Pedro%20Teixeira%20e%20as%20Ligas%20Camponesas%20na%20PB.pdf

  • GORENDER, Jacob. Combate nas Trevas. São Paulo: Ática, 1987.

  • _________, Jacob. O Escravismo Colonial. São Paulo: Expressão Popular, 2016.

  • GABEIRA, Fernando. O que é isto, companheiro?. São Paulo: Companhia das Letras, 1979.

  • MIELE, Neide; GODOY, Rosa Maria; BANDEIRA, Lourdes. Eu marcharei na tua luta: a vida de Elizabeth Teixeira. João Pessoa, Editora Universitária, 1997.

  • Documentário sobre “Terras para Rose”. ver em: https://www.youtube.com/watch?v=1ZlqjK4K1-0 ;

  • Filmes diversos sobre a ditadura militar, no Brasil (“Capitão Lamarca”, “O dia que durou 21 anos”, “Marighella”, “Batismo de Sangue”, entre outros)

  • MUGGLER, Mônica. José Comblin, uma vida guiada pelo Espírito. São Bernardo do Campo: Nhanduti, 2012;

  • HOORNAERT, Eduardo. Helder Câmara, uma vida que se fez Dom. São Paulo: Ed. Paulus, 2022;

  • Vale a pena consultar o blog de Eduardo Hoornaert: http://eduardohoornaert.blogspot.com/

  • _____________, “Os anjos de Canudos” (ed. Vozes)

  • LARRAÑAGA, Inácio Larrañaga.O irmão de Assis. São Paulo: Ed. Paulinas, 1998;

  • MURPHY, Roseane. Mártir da Amazônia a Vida da Irmã Dorothy Stang. São Paulo: Paulus, 2008.

  • OLIVEIRA, Frei Roberto Eufrásio de. Experiências missionárias no Nordeste. João Pessoa, Ed. Ideia, 2003;

  • _____________, Caminhando com Jesus nos Sertões Nordestinos.;

  • SILVA, Romero Venâncio da. A crítica da religião em MARX: 1840-1846. Tese de doutorado 2010 https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/tede/5681?mode=full&locale=pt_BR ;

  • GUEDES NETO, Adauto. Por um novo jeito de ser Igreja : a trajetória do padre José Comblin na América Latina em tempos de ditaduras (1964-1985);

  • SANTOS, Elenilson Santos. AS SANDÁLIAS DO PROFETA: Narrativas acerca do padre José Comblin e sua contribuição para a Igreja dos Pobres na Paraíba, uma perspectiva das Ciências Empíricas das Religiões. 2021;

  • COMBLIN, José. O Espírito no mundo. Petrópolis: Vozes, 1978;

  • LYRA, José Hailton Bezerra. Espiritualidade a Liberdade Profética do Espirito. João Pessoa: Ed. Ideia, 2000;

  • SALES, Ivandro da Costa. Os desafios da Gestão Democrática da sociedade (Em diálogo com Gramsci). Pernambuco, UFPE, 2003.

  • MONTENEGRO, Antônio. Travessias, padres europeus no Nordeste do Brasil (1950-1990), Recife: CEPE, 2019;

  • GEBARA, Ivone. Teologia Ecofeminista. São Paulo: Editora Olho d’Água, 1997.

  • FORCADES, Teresa. A Teologia Feminista na História. Lisboa, Editora Presente.

  • FRAGOSO, Antônio Batista; GONÇALVES, Luiz Gonzaga; FRAGOSO, João; CALADO, Alder. Igreja de Crateús, uma Experiência Popular e Libertadora. 1964-1998. São Paulo, editora Loyola, 2005;

  • FRAGOSO, Antônio Batista. Evangelho e Revolução Social. Lisboa, 1974.

  • JOSAPHAT, Frei Carlos. Evangelho e Revolução Social. São Paulo: Duas Cidades, 1962.

  • SPONG, John Shelby. Um novo cristianismo para o mundo; a fé além dos dogmas. Campinas: Verus Editora, 2006.

  • HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

  • Última entrevista concedida por Dom Fragoso a Luiz Gonzaga Gonçalves, João Fragoso e Alder Calado; https://kairosnostambemsomosigreja.wordpress.com/2011/01/15/profeta-dos-pobres-dom-fragoso-nos-fala-livro-em-pdf/

  • NETTO, José Paulo. Karl Marx — uma biografia. São Paulo: Boitempo, 2020.

  • COUTINHO, Carlos Nelson. Gramsci. Um Estudo Sobre Seu Pensamento Político. editora Civilização Brasileira, 1981);

  • ARAÚJO, Luiz Carlos. A Heresia Primordial. Recife, 2002;

  • SOARES, Sebastião Armando Gameleira. Espiritualidade em tempos de crise.

  • LOWY, Michael Löwy. O que é cristianismo da libertação? Religião política na América Latina. Editora Fundação Perseu Abramo e Expressão Popular, 2016;

  • Marcelo de Barros, “Teologia da Terra” (Ed. Vozes, 1988);

  • Alberto Acosta “O bem Viver: uma Oportunidade Para Imaginar Outros Mundos” (Ed. Autonomia Literária, 2016);

  • Frei Betto “Batismo de Sangue Guerrilha e Morte de Carlos Marighella” (Ed. Rocco, 1982);

  • Leonardo Boff “Igreja: Carisma e Poder” (Ed. Vozes, 1982);

  • Gregório Bezerra. “Memórias” (Ed. Boitempo, 1979);

  • Paulo Suess “Evangelizar – a Partir dos Projetos Históricos dos Outros” (Ed. Paulus, 1995);

  • Henrique Dussel, 1492. Petrópolis, Vozes.

  • Carlos Augusto Júnior: Fundação Dom José Maria Pires: uma experiência de Educação Popular- Serra Redonda-PB, Ano de Obtenção: 2014.

  • Zé Brasil descobre a sociedade.

  • Resende, Maria Valéria. A vida rompendo muros: Carisma e Instituição; As pequenas comunidades religiosas femininas inseridas no meio popular do NE; ; 1999; 0 f; Dissertação (Mestrado em Programa de Pós Graduação Em Sociologia) – Universidade Federal da Paraíba.

  • BENJAMIN, Walter. o capitalismo como religião. São Paulo: Boitempo, 2013.

  • José Adilson Filho e Bruno Gaudêncio (orgs.). Sob o signo da fé; memória, poder e protagonismo de padres da Paraíba e em Pernambuco. Rio de Janeiro: Telha, 2021.

  • Pereira, Luiz Barros. ORAÇÃO DO OFÍCIO DIVINO DAS COMUNIDADES NA FRATERNIDADE DO  DISCÍPULO AMADO NO TEMPO DA PÁSCOA. TCC. UNICAP, 2014.

  • MESTERS, Carlos. “Esperança de um povo que luta; o Apocalipse de São João: uma chave de leitura.” São Paulo: Paulus.

  • Mesters, Carlos. “Flor sem defesa”

  • ________. “Seis dias nos porões da humanidade”. Petrópolis: Vozes, 1980.

  • Magalhães Sales, João Batista. Uma mensagem de esperança.

  • Padre Aldo Giazzon, 27 anos de Brasil: Bahia e Alagoas.

  • Alves, José. Organização das lutas populares em Cajazeiras nos anos 80.

  • Ataualpa A. P. Filho. Tragam a túnica nova: depoimentos de irmãos acolhidos pela Pastoral de Rua e Oficina,  obras do Padre Quinha. Petrópolis: ed. do autor, 2021.

  • Movimento das Comunidades Populares. Livro sobre a vida do padre João Geisen, militante do MCP.

  • AGENDA LATINOAMERICANA/2022: organização popular e transformação social.

  • Huberman, Leo. História da riqueza do homem. Zahar: 1981.

  • Ofício Divino das Comunidades (livro elaborado pela competente equipe formada por Ir. Agostinha Vieira de Melo, Pe. Reginaldo Veloso, Ir. Marcelo de Barros, Ir. João Batista Magalhães, entre outras pessoas)

  • VELOSO, Reginaldo. Ofício da Mãe do Senhor. São Paulo: PAULUS Editora, 2001.

  • Cartilha das Comunidades (livro de cantos elaborado pelas comunidades do Agreste Pernambucano, Santuário das comunidades, Caruaru-PE)

  • VAN DER POEL, Maria Salete.Vidas aprisionadas: relatos de uma prática educativa. Rio Grande do Sul: Oikos, 2020.

  • POEL, Maria Salete van der. Alfabetização de adultos: sistema Paulo Freire; estudo de caso num presídio. Petrópolis: Vozes, 1981.

  • CONE, James . O DEUS DOS OPRIMIDOS. São Paulo: Paulinas, 1985.

  • Lelyveld, Joseph Mahatma Gandhi : e sua luta com a Índia. tradução Donaldson M. Garschagen. — 1ª- ed. — são Paulo : companhia das Letras, 2012.

  • BROCHADO, Cláudia, Deplagne, Luciana. Vozes de mulheres da idade média. João Pessoa: Editora da UFPB, 2020. Disponível em:http://www.editora.ufpb.br/sistema/press5/index.php/UFPB/catalog/book/464

  • BARRETO, Adalberto de Paula. Terapia Comunitária passo a passo. Fortaleza: LCR, 5a. Edição. Capítulo 8: Nossas raízes culturais.

  • Rolando Lazarte “Terapia comunitária integrativa: uma construção coletiva do conhecimento” (Editora UFPB, 2013)

  • A Terapia Comunitária Integrativa e a pesquisa ação/intervenção. Maria de Oliveira Ferreira Filha, Rolando Lazarte e Maria Djair Dias (orgs). Editora Universitária da UFPB, João Pessoa, Paraíba, 2019. Em: http://revistaconsciencia.com/editora-universitaria-da-ufpb-publica-livro-sobre-a-terapia-comunitaria-integrativa/

  • BERGMAN. Michel. Nasce um povo. Petrópolis: Vozes, 1977.

  • Constantine, André. Ashton, Dafne. O dia em que o morro não descer.

  • OLIVEIRA, Marcelo Bezerra. A teoria do conhecimento em Paulo Freire – pressupostos gnosiológicos da Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Edição do Autor, 2020.

  • Ailza de Freitas Oliveira Bruno Oliveira de Botelho Fernando A. Abath L. C. Cananéa Islany Costa Alencar José Francisco de Melo Neto Marcilane da Silva Santos Pedro José Santos Carneiro Cruz Renan Soares de Araújo. COLEÇÃO SABERES EM EDUCAÇÃO POPULAR EDUCAÇÃO POPULAR: AUTORAS E AUTORES DA PARAÍBA Volume 1. João Pessoa: Editora CCTA/UFPB, 2020

  • CALADO, Alder J.F. Movimentos e lutas sociais no Nordeste. Caruaru: Vanguarda, 1982.

  • ______ . Repensando os 500 anos. João Pessoa: Editora Ideia, 1994.

  • _______ . Brasil, anos 80. Caruaru: Edições FAFICA, 2006. Ver blog: http://textosdealdercalado.blogspot.com/

Grupo Kairós convida: estudo e partilha da vivência do evangelho

O grupo Kairós-Nós Também Somos Igreja é um coletivo de homens e mulheres voltados e voltadas para a vivência do evangelho de Jesus de Nazaré.

Trata-se de um grupo de caráter formativo, que teve início em reuniões na casa do Padre José Comblin, cuja obra e exemplo de vida nos orientam.

É parte importante da razão de ser do grupo, o estudo da obra de José Comblin, bem como de outros teólogos e teólogas da Libertação.

Estes estudos vêm evidenciando a importância da busca pessoal e coletiva direcionada ao Reino de Deus, independentemente de pertencimento ou não a instituições religiosas.

Todas as pessoas participantes desenvolvem formas de atuação social e comunitária, em espaços educacionais, trabalhos de base, promoção da construção de vínculos solidários nas comunidades, entre outros.

Potenciar a autoconfiança das pessoas, a confiança nas demais pessoas e no futuro, como maneira de quebrar o que se têm chamado de “síndrome da miséria/precariedade psíquica,” muito frequente em populações submetidas a estresse constante, distintas formas de violência, desenraizamento, desesperança, etc.

Mais do que um espaço de debates, é um lugar de acolhimento. Migrantes somos todos/as. Podemos fazer da fragilidade uma fortaleza. Junte-se a nós!

Caso deseje participar das nossas reuniões on line, basta nos enviar um e-mail, para que possamos lhe enviar o link no dia da reunião semanal, que é às 5as-feiras, das 09:00hs às 10:00hs.

E-mail: kkairos0@gmail.com

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Aspectos da obra de José Comblin

Não poderia escrever sobre alguns aspectos da obra de José Comblin de uma maneira teórica ou conceitual. Não que menospreze este tipo de reflexão, ao contrário. Ela é muito preciosa e necessária, mas tem o seu lugar. Aqui prefiro, no entanto, apresentar alguns fragmentos do seu pensamento, colhidos em algumas das suas obras, de maneira a reter, para mim mesmo e para os leitores e leitoras, alguns traços dos que se me figuram mais originais, da obra deste ser tão singular, que deixou marcas indeléveis na minha existência.
Estas marcas ou traços, poderiam ser resumidos assim: A mensagem de Jesus é simples. O amor é o centro da vida. A vida é uma peregrinação. Todos e todas podem ser profetas, desde que se disponham a ser palavra de Deus. A indistinção na obra de Comblin entre o sagrado e o cotidiano, é para mim talvez a tônica mais forte. Quebra a cisão entre o espiritual ou o religioso e a vida do dia a dia. A vida como tal, é obra de Deus, e se assim a vivermos, ela será e é, uma vida consagrada.
Não importa se a pessoa seja ordenada ou não, ou mesmo se pertença a esta ou àquela religião. Importa se vive a serviço do amor, que é Deus mesmo. E isto implica em viver mergulhados/as na cotidianidade da vida. Rompe com a casta sacerdotal como monopolizadora do sagrado. Quebra com a privatização ou o exclusivismo do cristianismo como a única religião verdadeira. Restaura a sacralidade da vida da pessoa, como uma re-condução do ser para si mesmo, como uma ruptura do intelectualismo de uma casta ou estamento especializados, para harmonizar a vida na sua unidade de intuição, amor e razão ou consciência, e ação.
Obviamente, o que aqui destaco da obra de José Comblin, são aspectos que resultam significativos desde os meus próprios valores e desde a minha própria trajetória existencial e visão de mundo. Outras pessoas, certamente, verão outras coisas. Algo que também creio que deva ficar bem claro, é que tenho a nítida impressão que Comblin diz muito mais do que nós somos capazes de ler. A sua palavra excede em muito o que está escrito. A certeza que podemos ter, é que é um ser inspirado, e que essa inspiração nos oferece uma referência segura para que cada um, cada uma de nós, possa se encontrar consigo mesmo. Esse encontro conosco mesmos é o caminho de Jesus, o encontro da Jerusalém interior. Longe de encontrarmos nos escritos de Comblin receitas ou verdades definitivas, o que neles podemos encontrar, sim, são alusões a uma verdade da qual fazemos parte, que nos contém, nos ilumina e nos guia.
Agora gostaria de me referir a dois trechos de autoria de Comblin que me chamaram a atenção, e que tem o denominador comum de oferecerem subsídios para que a pessoa se oriente em direção às suas próprias metas, caminhado com esperança, e se conduzindo em direção à realização do seu próprio projeto de vida. São eles um parágrafo de A força da palavra, e outros de O caminho. Ensaio sobre o seguimento de Jesus. “O que é um ser humano no sentido completo da palavra? Não é somente um ser dotado de órgãos e de faculdades: inteligência, vontade, sensibilidade, etc. A soma dessas faculdades não faz um ser humano vivo e ativo. O que faz um ser humano é um projeto de vida, uma obra imaginada por si e prosseguida pacientemente com constância, inteligência e até teimosia. O que faz um ser humano é uma ilusão, uma utopia que persegue durante a vida toda, uma história de fracassos e êxitos na caminhada para os fins que ele/a mesmo/a definiu…” (p.37).
Resgato aqui a palavra projeto, a noção de projeto. Existir é ir em direção a uma meta. Passemos agora ao segundo dos livros mencionados de Comblin. O autor explora o tema da esperança do peregrino, da vida como peregrinação: “Há uma esperança para o dia de hoje, outras para a semana, para o mês, para o ano, para um período da vida, para a vida inteira e para além desta vida –ou seja, para a vida eterna” (p. 68) Outra vez a noção de direção, de esforço orientado a um fim. Qual é esse fim? O fim da vida é ser mais, não ter mais.
A “imagem da peregrinação ajuda a entender o sentido da vida. Pois, para a maioria, a peregrinação não é feita caminhando nas estradas materiais. A caminhada é interior: a pessoa vai buscar no próprio coração o seu verdadeiro ser. Por meio das experiências da vida vai se aproximando pouco a pouco da sua verdade, de uma realização mais completa de si. Pode-se realizar também a mudança, o amadurecimento de si mesmo/a na vida ordinária. A imagem da peregrinação ilumina essa busca até o próprio coração. A esperança parece mais abstrata, mas realiza a mesma transformação: como o peregrino, o discípulo vai abandonando o seu passado, reconhecendo no presente a porta que abre para o futuro, torna-se aberto à etapa seguinte da vida. No final, ele consegue conhecer-se melhor naquilo que era o objeto da sua esperança ao iniciar a caminhada. A nova Jerusalém se encontrará finalmente dentro do coração”. (pp. 68-69)
Salienta Comblin que a caminhada nunca é solitária.
Foto: Pe. José Comblin
 
 
 
 

Anunciar aos aprisionados a libertação

O anúncio que serve de título ao presente artigo faz parte do discurso programático de Jesus, pronunciado, segundo a tradição de Lucas, na sinagoga de Nazaré (cf. Lc 4,18). Faz parte de uma enumeração de benefícios tirada de Is 61,1-2. Na profecia de Isaías, o anúncio de libertação feito aos cativos refere-se ao povo de Israel cativo na Babilônia.

Jesus dirige-se a um povo que voltou da Babilônia quatro séculos antes, mas ainda não está realmente livre. Continua numa situação semelhante à vivida no cativeiro de Israel. Embora não sendo mais cativo do rei estrangeiro, continua cativo de todas as estruturas sociais e religiosas em que as próprias autoridades mantêm o seu povo.

Na mente de Jesus, o problema não é tanto a presença das legiões romanas ou a dominação política exercida por Roma. O problema é a escravidão do ser dos israelitas à corrupção da religião da qual são autores as autoridades, os sacerdotes, os anciãos, os fariseus e os doutores da lei. A redenção de Israel começa pela subversão dessa falsa ordem, mantida pelas elites e imposta aos pobres.

O anúncio de Jesus não se refere diretamente aos encarcerados do seu tempo. Por sinal, naquele tempo, em Israel, a prisão não era castigo previsto pelas leis. Os castigos legais eram a morte (muito mais frequente do que se pode pensar — basta ler os códigos que estão na Bíblia), a flagelação, a escravidão e as multas. Outros povos contemporâneos mencionam também a mutilação, a tortura e outros castigos corporais.

No tempo de Jesus o encarceramento é a condição de quem está à espera do castigo. Não é castigo em si. Os apóstolos foram encarcerados várias vezes, e o próprio Jesus foi preso a fim de ser condenado à morte.

Será que, por isso, não há relação nenhuma entre o povo de Israel escravizado pelas suas elites e os presos que estão nas nossas prisões? Partindo daí, não haveria nenhum anúncio para os presos que foram condenados e hoje se encontram nos cárceres?

A seguir veremos que as relações são várias.

 

1. Os encarcerados por abuso de poder

Há uma primeira categoria de presos, cuja situação parece bem clara: são homens ou mulheres que estão na cadeia sem ter infringido nenhuma lei ou sem ter sido condenados. Estão aí porque foram presos por engano, confundidos com outros, ou porque estavam perto de outros que cometeram um delito, ou foram denunciados sem provas, ou simplesmente foram esquecidos. São pessoas muito pobres, que não podem pagar um advogado, e não têm acesso às instâncias do poder judiciário. Estão na prisão porque não sabem provar que são inocentes. É o caso da pessoa que é considerada culpada até que possa mostrar que é inocente. Ora, ninguém no mundo é capaz de provar que nunca cometeu um delito. Acontece que, quando se trata de pessoas de boa condição, bem vestidas e instruídas, as autoridades não insistem e não exigem que forneçam as provas de sua inocência.

Para as pessoas que estão na prisão injustamente, vale o anúncio de Jesus. Os verdadeiros discípulos vão empenhar-se para que os que foram injustamente encarcerados sejam libertos. O evangelho é anúncio de libertação, pelo menos no sentido de que a causa deles será defendida.

 

2. O perdão

O perdão dos pecados, das culpas, das dívidas — no sentido mais amplo — é básico no cristianismo. Jesus anuncia o perdão. Não somente anuncia que Deus perdoa e suprime todas as penas, mas pede que os seus discípulos façam a mesma coisa: subordina o perdão de Deus ao perdão aos irmãos. Este perdão é de modo particular o núcleo central do evangelho segundo Mateus. Jesus anuncia, proclama, provoca, exige: não tem poder para fazer com que as pessoas sigam as suas instruções. No entanto, para quem quer seguir o caminho de Jesus, o perdão é indispensável. Os evangelhos não permitem que se faça uma distinção entre os pecados pessoais ou sociais, entre a culpa e as penas devidas legalmente pelas culpas, entre perdão dado por indivíduos ou pelas autoridades em nome da sociedade. O pedido de perdão é universal e cobre a totalidade o mal cometido.

A questão é: como esse perdão vai poder entrar nas sociedades concretas que conhecemos? Como vai ser aceito por indivíduos impregnados pelo desejo de vingança, ou pelo medo dos criminosos? Esse é outro problema. Jesus estava bem consciente da sua pretensão exorbitante. No seu tempo, a vingança era até exigência da lei, sendo atribuída a uma revelação do próprio Deus: quem se vingava, obedecia a Deus. E o medo não era menor do que é hoje em dia. Daí a crueldade dos castigos diretamente infligidos aos delinquentes.

A pena de prisão é considerada uma forma mais leve de castigo do que a pena de morte. Nas civilizações antigas, a pena de morte era muito mais habitual e muito mais frequente, mesmo em casos de delitos hoje em dia considerados leves, tais como o roubo e o adultério.

Atribui-se frequentemente ao cristianismo a evolução da pena de morte para castigos mais leves como as penas de prisão. Pode ser. Porém, está claro que o encarceramento, sobretudo quando dura anos, constitui um castigo tremendo. Atinge o ser humano no que tem de mais valioso: a liberdade, na sua forma mais radical — que é a liberdade de poder ir e vir.

É legítimo e moral condenar uma pessoa a anos de prisão? Há razões que possam justificar tal prejuízo infligido a uma pessoa? No caso da pena de morte ou de mutilação, não há possibilidade de perdão. Há, sim, possibilidade de perdão no caso de penas de prisão.

Lembremos que, na América Latina, os governos militares decretaram anistias gerais que favoreceram membros das forças armadas ou das polícias que mataram, torturaram, roubaram e mutilaram cidadãos. Milhares de delinquentes foram assim dispensados das penas de prisão, previstas nos códigos penais.

Isso aconteceu no Brasil, na Argentina, no Uruguai, no Chile e em outros países. A anistia foi julgada benéfica para a paz pública e para a ordem social.

Portanto, a dispensa das penas de prisão não foi considerada um perigo para a cidadania. A nação não se sentiu em perigo embora milhares de delinquentes tenham ficado soltos, livres de qualquer castigo.

Notemos que esses delinquentes, assim dispensados, não estavam arrependidos. Foram perdoados sem conversão, sem penitência. O caso mais famoso — e, talvez, mais incompreensível — foi o dos generais argentinos condenados por tribunais do seu país e anistiados pelo presidente Menem, sem que tenham dado o mínimo sinal de arrependimento. Pelo contrário, nada tinham perdido da sua arrogância.

Por sinal, em quase todas as nações os chefes de Estado têm poder para conceder anistia aos presos escolhidos por eles. É outro sinal de que a ideia de perdão não é nem absurda, nem perigosa, nem louca. A questão é: por que não poderíamos estender muito mais a anistia, isto é, o perdão?

Uma primeira situação seria a dos presos que estão arrependidos do mal que fizeram, e estão com sérias disposições de mudança. O caso não é utópico. São milhares e milhares os presos que querem recomeçar. Por que não perdoar?

Sempre se cita um caso que se tomou famoso na Itália nos anos 80. Milhares de terroristas das Brigadas Vermelhas (mais de cinco mil) foram parar nas cadeias na Itália. A grande maioria entrou num processo de autocrítica e acabou reconhecendo que tinha cometido grande erro — levando-os a cometer verdadeiros crimes. Arrependeram-se. Houve todo um processo de conversações entre as autoridades e as entidades religiosas. Foram feitos muitos processos de revisão de penas. A própria opinião pública italiana acabou convencendo-se de que uma ampla redução de penas era a melhor solução para os arrependidos.

Podemos presumir que, em muitos casos, se produz uma evolução semelhante a essa. Muitos arrepender-se-iam do que fizeram se soubessem que há caminhos de redenção e de perdão, e não se chocassem contra um sistema judiciário implacável.

O perdão parte da convicção de que o pecador é a primeira vítima do seu pecado. Fazendo o mal, corrompe-se a si próprio. O perdão tende a ajudá-lo a se arrepender, isto é, a se libertar do pecado que o aprisionava. É verdade que, em certos casos, como no dos terroristas italianos, uma temporada na prisão ajudou a fazer a autocrítica e a revisar o modo de agir. No entanto, essa temporada não pode ser interminável, sem perspectiva de perdão.

O caso dos que estão decididos a recomeçar é diferente. Além disso, para os pequenos delinquentes, o encarceramento custa mais à coletividade do que o mal que fizeram. Seria mais econômico para a comunidade indenizar as vítimas.

A situação é mais grave quando o ambiente da cadeia torna os presos mais corrompidos, mais perigosos e mais enraizados nos delitos do que antes. Muitos afirmam que esse é o caso de muitas prisões brasileiras, por várias razões — que especialistas no assunto pode­rão enumerar e comentar.

 

3. O perdão pela revisão das leis penais

A maior parte dos presos está na cadeia por motivos de drogas. Se não existisse a legislação que reprime o comércio e o consumo das drogas, milhares e milhares estariam fora dos cárceres, onde estão se degradando.

Décadas de experiência de repressão das drogas mostram que é impossível suprimir, ou mesmo reduzir, o consumo das drogas pela repressão policial. Quer nos parecer que, na atualidade, quem luta para manter as leis repressivas são as máfias de traficantes.

Quem está nas prisões são os pequenos vendedores, entregues pelos próprios traficantes, para dar satisfação aos policiais. Graças à penalização das drogas é às leis repressivas, o narcotráfico é hoje o maior negócio do mundo, superando o petróleo. As máfias de narcotraficantes detêm um poder econômico superior ao das maiores companhias do mundo, o que lhes permite controlar os poderes políticos e manter na sujeição cidades inteiras. Nenhum poder político, exército ou polícia do mundo é capaz de enfrentar com êxito as máfias de narcotraficantes. Por sua vez, essas máfias podem corromper todos os poderes, em primeiro lugar o poder da polícia ou do exército. Se os Estados Unidos fracassaram rotundamente, qual é o país que terá êxito?

Por outro lado, o álcool e o fumo fazem enormes estragos à saúde da população, provocando muitas doenças e vultosos gastos sociais. No entanto, ninguém está na cadeia por vender cigarros ou cachaça. Prejudicam profundamente a população, mas gozam de cobertura de fortes grupos econômicos. Forças econômicas e tradições culturais tornam impossível a proibição do álcool e do fumo.

No entanto, há um paradoxo. Não faz sentido tirar a liberdade de milhares de pessoas que, afinal de contas, prejudicaram muito menos os seus concidadãos. No Brasil — embora haja tentativas de aplicar nova legislação, mais rigorosa — até o momento, o motorista que mata acidentalmente por estar embriagado não vai para a prisão. Mas o revendedor que é pego com algumas gramas de droga, este é preso.

Em semelhante caso, o perdão seria apenas aplicar a certas categorias o que já se tolera em outras categorias semelhantes. Seria tolerar o equivalente daquilo que, desde sempre, se tolera. O dinheiro que se gasta na repressão poderia ser mais bem investido na educação ou na reeducação dos cidadãos. Não é realmente um caso de perdão, e sim de equidade.

 

4. A substituição por penas mais leves

Já houve muitas experiências de substituição da prisão por penas mais leves, que não tiram o condenado de seu ambiente. Anos de cadeia, muitas vezes, tornam o condenado irrecuperável para a convivência civil. Existem formas alternativas de, mediante vigilância, corrigir por meio da prestação de serviços comunitários. Trata-se de encontrar atividades que possam reeducar o delinquente de modo adaptado à sua condição.

Em muitos casos se aplica a liberdade condicional. Muitos delegados sabem também levar em conta as circunstâncias e deixar livre a pessoa que não é realmente perigosa para a sociedade.

Em países como o Brasil, que não têm condições para fazer com que as penitenciárias tenham tratamento humano, o remédio é pior do que a doença. As penitenciárias corrompem os presos de tal modo que a recuperação se torna muito mais difícil. Com essas condições o encarceramento não garante a segurança dos cidadãos. É preferível aceitar certos riscos do que preparar riscos maiores.

 

5. A privatização da segurança e da justiça

O que nos ameaça, na onda da privatização da vida pública, é a privatização das funções reservadas à polícia. Há muitas polícias particulares encarregadas da segurança dos bancos, das indústrias, das residências ou dos bairros residenciais. Há também os que se especializam na segurança pessoal.

Uma vez que se instala uma polícia particular, a serviço dos privilegiados, corre-se o risco de que apareça uma justiça clandestina, um poder judiciário clandestino que decreta penas e castigos, notadamente a pena de morte. Na prática já se sabe que, nas cidades, certos grupos decidem quem deve morrer e quem pode viver. Contratam pistoleiros profissionais para aplicar as penas decretadas.

Por sinal, essa privatização da justiça nas cidades é a continuação de uma velha tradição do mundo rural. Ali, desde sempre, fazendeiros e senhores de engenho decidem sobre a vida e a morte, decretam penas de morte e as aplicam graças à contribuição de pistoleiros profissionais que andam soltos à procura de serviço.

Se houver privatização completa da justiça e da segurança, todas as tentativas de humanização serão nulas. A justiça privada não precisa de prisões. Realiza o que dizia um delegado há algum tempo: “Não quero que me tragam aqui delinquentes. Os delinquentes serão simplesmente executados ninguém saberá quem foi que decretou sua morte”.

Pior do que a prisão é a eliminação pura e simples dos indesejáveis. Na privatização, a evolução atual tende a um retrocesso.

É verdade que, na atualidade, as polícias existentes não conseguem reprimir a delinquência e garantir a segurança. Todavia, a solução não está na privatização, mas na organização popular feita nos bairros, para garantir e manter uma polícia pública verdadeira, controlada pela população. É a população organizada que cuida da segurança. Da mesma maneira, os juízes podem ser eleitos pela população local em lugar de ser designados por políticos que servem os interesses dos grandes. A única maneira de se chegar a humanizar a polícia e a justiça consiste em entregá-las à população local. Somente assim a população será capaz de vencer a sua angústia e de controlar as forças que levam à delinquência. Realizar a privatização da polícia e da justiça seria o pior caminho.

 

6. Legalismo e tolerância

No Brasil as leis raramente foram aplicadas com rigor. Sempre houve ampla tolerância. As infrações são toleradas ou escondidas. As sanções judiciárias não são aplicadas e a maior parte dos delinquentes encontram-se soltos. Evita-se, dessa maneira, o legalismo, que torna as sociedades neuróticas. É bom que as autoridades saibam levar em conta as situações humanas reais antes de aplicar as leis, sobretudo as leis penais.

Desafortunadamente a tolerância e a flexibilidade jogam quase sempre para favorecer os privilegiados. Quem consegue evitar a prisão são sempre os privilegiados. Quem goza de impunidade são sempre os responsáveis pelos maiores crimes e delitos. A tolerância não se deve somente, nem principalmente, a uma sensibilidade moral mais atenciosa às pessoas, e sim à corrupção das relações sociais.

A solução não está num legalismo estrito, mas na extensão da flexibilidade até os limites que a sociedade possa suportar. A garantia da impunidade dos grandes desestimula o povo inteiro. Alguns exemplos são necessários. Porém, muitos pequenos delinquentes são suscetíveis de recuperação e se recuperariam se a temporada passada na cadeia não os tivesse pervertido.

 

7. A aspiração à liberdade

Em lugar nenhum a aspiração à liberdade é vivida com tanta intensidade quanto nas prisões. É verdade que alguns acham melhores as condições de vida dentro das prisões do que fora delas: “Aqui pelo menos temos comida e lugar para dormir. É melhor aqui do que na rua”. No entanto, a maioria acha melhor a rua, mesmo com a insegurança que esta traz. A liberdade tem mais valor do que a segurança. A reação dos presos confirma que o apelo à liberdade está enraizado no mais profundo do ser humano.

Por outro lado é também verdade que o ser humano pode preservar um nível mais profundo de liberdade mesmo no cativeiro das prisões. Embora não contando com a liberdade de movimento, mesmo assim é possível salvar a liberdade de pensamento e de expressão. Obras literárias e científicas de grande valor foram escritas no cativeiro. Religiões ou ideologias foram divulgadas e espalhadas dentro do cativeiro. Certos presos podem adquirir mais personalidade e convicções mais firmes no cativeiro. Todavia, são casos excepcionais. De modo geral, o cativeiro destrói.

A partir de certo nível de concentração da população carcerária, as autoridades públicas não logram mais controlar o ambiente. Não conseguem impedir o tráfico de drogas, de armas ou explosivos. Não conseguem sequer controlar a corrupção em que incorrem os próprios encarregados da disciplina. A prisão, então, torna-se um fator de desintegração da sociedade em geral. Contamina os povos e destrói a aspiração à liberdade. Inocula os vícios de tal modo que a população desanima de poder um dia libertar-se, entregando-se às máfias. É o que está acontecendo hoje em dia em favelas e bairros marginais das grandes cidades.

Atualmente certas áreas das grandes cidades vivem em permanente estado de cativeiro. Narcotraficantes ou traficantes de armas, de mulheres e de crianças dominam de tal modo o bairro que ninguém se atreve a desobedecer-lhes. O exército pode se instalar durante alguns meses nesses bairros, mas não permanece e acaba entregando de novo o território aos criminosos. Inverte-se a relação carcerária. Doravante não são os cidadãos que mantêm os delinquentes sob vigilância nas prisões. São os criminosos e delinquentes que mantêm a população e os cidadãos sob vigilância nos seus bairros. Os delinquentes transformam as cidades em prisões controladas por eles.

Tais situações ainda não são consideradas alarmantes, uma vez que afetam mais os pobres, enquanto os ricos se defendem com as suas polícias particulares nos seus santuários. Este é o sinal mais visível da irresponsabilidade das classes dirigentes: entregaram as cidades dos pobres aos delinquentes, comprando-lhes, dessa maneira, a sua própria segurança.

O grito pela liberdade levanta-se dos bairros e das favelas transformadas em prisões. Pior, são prisões das quais não se pode fugir: para onde ir se os donos estão em todas as partes?

Jesus anuncia a libertação aos aprisionados. Não quer dizer com isso que a libertação virá por milagre sem a colaboração dos próprios cativos. Estes precisam primeiro manter e alimentar a esperança da liberdade, e, depois, aproveitar todas as brechas que a história abre para conquistar essa liberdade. Deus ajudará!

Fonte: Vida Pastoral

(Janeiro-Fevereiro de 1997, pp. 7-11)

Associação de missionários/as do campo expressa solidariedade ao MST

A Associação dos Missionários e Missionárias do Campo, entidade católica difundida em quase todos os Estados do Nordeste e de São Paulo, com perfil do profetismo cristão, em nome de Jesus, Filho do verdadeiro Deus, crucificado e ressuscitado pelos seus, vem de público manifestar o que segue:

  1. Frente à crescente tentativa de esvaziamento e de desmonte dos movimentos populares no Brasil, perpetrado pelos atuais dirigentes de extrema direita fascista e idólatra, sente-se no dever de declarar a mais estrita solidariedade aos assentados e assentadas na Normandia e ao Centro de Formação Paulo Freire, nas proximidades de Caruaru, na iminência de despejo de seu espaço legal que já passa dos vinte anos.
  2. O Centro de Formação Paulo Freire oferece cursos e congressos da mais alta qualidade a jovens e adultos de qualquer nível e classe que se disponham a uma busca intelectual e pragmática de um apoio e razão de sua resistência ao mesmismo que o atual sistema impõe aos mais incautos. Por essa razão e não por outra o dito Centro se vê às voltas com as forças reacionárias mais truculentas do Brasil atual. Como uma pedra no sapato ou um cisco no olho.
  3. O Assentamento Normandia tem sido referência de produtividade e de promoção de uma sociedade promissora, igualitária e solidária, vencendo os vícios arraigados do individualismo e do financismo que conduzem os atuais projetos oficiais, manipuladores do nome de Deus e da inconsciência das massas em proveito próprio e perverso.
  4. Constituída por membros da classe popular em sua maioria, nossa Associação de caráter eminentemente cristão e na adesão total às orientações da nossa Igreja não pode deixar passar o momento que vivemos sem exprimir seu mais veemente protesto e sua apreensão quanto ao que se tenciona obter com a neutralização e o desmonte do Assentamento e do Centro de Formação. Queremos estar juntos na resistência a um plano destrutivo projetado sem o menor respeito aos atores e atrizes históricos do Assentamento e o Centro de Formação. Tudo se decide no papel e no arbítrio de quem detém o poder.
  5. Fica aqui asseverada às irmãs e aos irmãos e companheiros do assentamento Normandia e do Centro de Formação Paulo Freire nossa disposição de reforçar a resistência pacífica, sem nos deixar envenenar pelo ódio cada vez mais difundido, aberta ao diálogo com quem dele se faz capaz nesse momento. Concluímos com as palavras evangélicas: Levantem a cabeça, pois está próxima a vossa libertação (Lc 21,28)

Sítio Catita, Sede da Associação dos Missionários e Missionárias do Campo,

20 de setembro de 2019.

 

Um jeito de celebrar Puebla (III CELAM, MÉXICO, 1979): anotações sobre a realização da I Jornada Comunitária, abrindo a IX Semana Teológica  Pe. José Comblin

Realizou-se, anteontem, dia 11 de agosto, a I Jornada Comunitária, animada pelo Grupo Kairós, um dos grupos organizadores das Semanas Teológicas Pe. José Comblin, agora em sua nona edição, que tem como tema “Nas trilhas de Puebla, com Jesus, Francisco e José”.

Como em outras precedentes, a IX Semana Teológica Pe. José Comblin (STPJC), desdobra-se para além de uma semana: estende-se por meses. Neste ano, de agosto a outrubro. Compõe-se, primeiramente, das Jornadas Comunitárias (no campo e nas periferias urbanas), culminando com a Sessão de Encerramento, prevista para o dia 05 de outubro vindouro, conforme vem sendo divulgado, nesses últimos dias, inclusive por meio do”site” teologianordeste.net, contendo também o “folder” da IX STPJC.

As notas que seguem, focam apenas a realização, neste último domingo, da I Jornada Comunitária, realizada no bairro Castelo Branco, mais precisamente na Capela Ecumência da UFPB, em João Pessoa – PB. Cada Jornada Comunitária é coordenada por um dos grupos organizadores do mesmo evento. No caso da I JC, coube ao Grupo Kairós organizar e animar, de forma mais direta, com a participação de membros de outros grupos, tais como o CEBI, o MTC, a Fraternidade  Esperança… Cuidamos, em seguida, de fornecer os traços principais desta I Jornada Comunitária.

Prevista para iniciar-se às 08:30, bem mais cedo já se achavam por lá alguns membros do Kairós e de outros grupos, para os preparativos do local (cenário, materiais de apoio, serviço de som, roteiro da celebração, etc.). A Capela Ecumênica da UFPB é rodeada de bosques preciosos da Mata Atlântica,  oferecendo uma paisagem rica em biodiversidade. As pessoas iam chegando e cumprimentando-se, nesse clima, animado por músicas bem selecionadas, inclusive com tomadas de fotos feitas por Andrea. Por volta das 09 horas, foi dado início à celebração.

Tocaram a Aparecida (Cida) expressar pelo Grupo as palavras de acolhimento e a coordenação dos trabalhos. Em suas palavras iniciais, deu as boas-vindas a todas, a todos, e após entregar a(o)_s participantes as folhas do roteiro da celebração. Em seguida, cuidou de relembrar o sentido da IX STPJC deste ano, em que estamos celebrando os 40 anos da Conferência Episcopal Latino- Americana, realizada em Puebla ( México), em 1979.

Dando continuidade,  foi lida a introdução do que está contido no folder acerca do legado de Pe. Comblin, sua contribuição inclusive, como assessor, de bispos participantes da III CELAM, em Puebla, bem como as profundas afinidades suas com as atitudes proféticas do Papa Francisco, como se estivessem em permanente diálogo implícito.

Tivemos, em continuidade, o início da celebração da Palavra, com o convite a entoarmos o cântico “ É missão de todos nós”, do qual fazem parte estrofes emblemáticas tais como:

“ O Deus que me criou, me quis e consagrou

Para anunciar o Seu amor”

           É missão de todos nós:

Deus chama e quer ouvir a sua voz

Eu sou como chuva em terra seca

P’ra saciar, fazer brotar

Eu vivo para amar e pra servir

Eu sou, sou profeta da verdade

Canto a justiça, o amor e a liberdade.”

 Em seguida, as pessoas participantes foram convidadas a entoar o canto de aclamação ao Evangelho, tendo sido escolhido o cântico:

“Toda Palavra de vida é Palavra de Deus

Toda ação de liberdade é a divindade agindo entre nós”.

Consultados sobre quem gostaria de fazer a leitura do Evangelho a Irmã Maria Besen da Fraternidade Esperança, prontificou-se a fazer a leitura o que, pela tocante afinidade com a temática de Puebla, foi escolhida a passagem de Lucas,  (leitura da do Domingo anterior), à qual se seguiram densas reflexões compartilhadas, dentre as quais Elias Cândido do Nascimento (membro do Kairós e do MTC) sublinhou a profunda atualidade da leitura, tomando em consideração a extrema ganância dos poderosos de hoje de acumular riquezas desmedidas, contribuindo diretamente para o aumento das gritantes desiguadades sociais, ambiente parecido com o contexto sócio-histórico da III Conferência realizada em Puebla, há quarenta anos. E assim, várias outras pessoas também expressaram suas reflexões inspiradas pelo Espírito do Ressuscitado.

Concluíindo esse momento, foi recitado o Salmo, de forma dialogada, por todos.

O momento seguinte consistiu numa leitura mais extensa de trechos-chave do Documento Final de Puebla. Este texto era um dos três propostos para a reflexão nas Jornadas Comunitárias. Os outros dois são: um texto escrito pelo Pe. José Combiln, fazendo uma avaliação da III Conferência Episcopal Latino-Americana, em Puebla, enquanto o terceiro texto corresponde a trechos da Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”, do Papa Francisco, sublinhando a relevância e urgência de nos abrirmos, como Igreja, a uma “Igreja em saída”.

Conforme a escolha do Grupo, cuidamos de focar no Texto n. 1, o que traz passagens relevantes do Documento Final de Puebla. Com a contribuição espontânea das pessoas participantes, foi iniciada a leitura, começando pelo que o Documento chama de “feições dos pobres de nosso continente, ou seja a descrição dos rostos de nossa gente mais sofrida e merecedora de nossa ação pastoral prioritária. Com efeito, o trecho que se situa entre os números 31 e 39 do mesmo Documento se apresenta emblemático. Aí se fala, por exemplo, das feições de nossas crianças: antes mesmo de nascerem, já se vêem alvo de injustiça, pela penúria de suas mães e da família. Após o nascimento, seguem seu cotidiano “severino” – de abandono, de violência sofrida, de ausência de políticas públicas a seu favor, etc. Rostos de indígenas marginalizados, explorados pela ganância do sistema capitalista e seus representantes, de olhos grandes para seus territórios, seus bens, suas riquezas, agredindo a Mãe-Terra para a exploração de minérios destinados à exportação. Feições de comunidades quilombolas ou de povos afroamericanos mergulhados nas mais graves mazelas do mesmo sistema: desemprego, sub-emprego, baixíssimos índices de qualidade de vida. Feições de camponeses, vítimas contumazes da fúria dos grandes proprietários e latifundiários, acobertados pela cumplicidade do Estado. Feições de operários submetidos às mais cruéis agruras das leis trabalhistas vigentes nos diversos países do continente. Feições de pessoas idosas, desrespeitadas em sua dignidade e em seus direitos.

Eis um trecho que despertou uma sucessão de comentários pelos presentes.  Rolando expressou seu sentimento de indignação, sublinhando a contundência daquele Documento que lhe soava tão atual e tão próximo das atrocidades de hoje. Maria Oliveira Ferreira, por seu turno, também manifestou sua indignação, diante de realidade tão cruel, mas também tão atual, e até de certa forma agravada, no atual contexto. Lúcia, igualmente, contribuiu, compartilhando seu sentimento de revolta contra tal situação, que infelizmente perdura. Glória, em várias ocasiões, lembrava que tais crueldades por vezes se faziam até  em nome do Cristianismo, como acontece no presente. Nos números seguintes dos trechos selecionados, a leitura prosseguiu. Consoante à temática geral da III CELAM – “A Evangelização no presente e no futuro da América Latina” , mereceram destaque  as profundas e crescentes desigualdades sociais e respectivos fatores, incidindo seja no plano econômico, seja na esfera política, seja no terreno cultural. Também, foi realçada a participação dos leigos e das leigas como agentes mais diretos do processo de transformação, inclusive na esfera política. No correr da leitura, aqui ali, percebia-se certo hiato ou incongruência nas falas dos próprios bispos signatários do texto, o que chamou a  atenção dos presentes. Em intervenções de outros participantes – mulheres e homens -, buscou-se interpretar tais discrepâncias, a partir da compreensão de que, como toda Igreja, também a nossa é fortemente plural. Mesmo reunidos na mesma Igreja, e animados pela mesma fé, há, contudo, diferentes posicionamentos, refletindo o lugar social de tais membros, o que nos ajuda a entender a Igreja como um grande guarda-chuva a abrigar diferentes (às vezes, até antagônicos) posicionamentos de classe, de visões de mundo, de sociedade, o que se reflete com frequência nos docuemetnos oficiais da Igreja, em especial em documentos assinados por participantes de sínodos, de conferências episcopais e foros semelhantes.

Ao final de cada texto proposto a cada Jornada Comunitária, constavam duas perguntas, destinadas a ajudar o debate em pequenos grupos. Foram lidas, com a contribuição de algumas pessoas, na discussão.

Antes do convite à Oração do Pai Nosso,  algumas pessoas houveram por bem compartilhar mais informações e convites. Um desses convites foi feito pela Irmã  Sílvia, da Fraternidade Esperança, no sentido de informar e convidar os presentes para a celebração, na segunda-feira, dia 12, na Comunidade Laranjeira, no Bairro José Américo, onde viveu Dom Fragoso o período final de seu percurso existencial entre nós. Aí está sendo organizada a celebração que dá início aos festejos e comemoração do centenário de Dom Fragoso.

Conforme o roteiro da celebração, a coordenadora dos trabalhos convida a todos e todas à oração do Pai Nosso, sugerindo a versão conhecida e cantada do “Pai Nosso dos Mártires”.

Foi solicitada e acolhida a sugestão de convidarmos a Elias e a Marinete, para nos darem a bênção final, o que foi aceito pelo venerando casal. Após a bênção, e por sugestão de Elias, entoamos juntos, acompanhados da interpretação de Clara Nunes, o belíssimo “Canto das Três Raças”:

“Ninguém ouviu

Um soluçar de dor

No canto do Brasil

Um lamento triste

Sempre ecoou

Desde que o índio guerreiro

Foi pro cativeiro

E de lá cantou

Negro entoou

Um canto de revolta pelos ares

No Quilombo dos Palmares

Onde se refugiou

Fora a luta dos Inconfidentes

Pela quebra das correntes

Nada adiantou

E de guerra em paz

De paz em guerra

Todo o povo dessa terra

Quando pode cantar

Canta de dor

E ecoa noite e dia

É ensurdecedor

Ai, mas que agonia

O canto do trabalhador

Esse canto que devia

Ser um canto de alegria

Soa apenas

Como um soluçar de dor”.

Nossa I Jornada Comunitária foi encerrada festivamente, com muita partilha, alegria e animação. O casal Elia –Marinete nos trouxe um saboroso bolo, enquanto outras pessoas nos brindaram com mais doces, salgadinhos e bebida, sempre em conversas animadas, a escutarmos notícias e experiências do dia-a-dia, inclusive no campo dos estudos, a exemplo das partilhadas por Júlia e outras pessoas. Saímos todos, todas, mais renovados e encorajados a seguirmos em saída, a continuar nossa missão no meio do povo dos pobres, mantendo viva nossa esperança e nossa confiança no Deus da Vida e da Liberdade.

João Pessoa/ Olinda, 13 de agosto de 2019

Foto: Pe. José Comblin