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Como no filme, o renascido das trevas a elas retorna…

Um bom amigo me perguntou se eu não estaria sendo precipitado, ao concluir que o impulso dado à candidatura demotucana pela surpreendente sobrevida já está exaurido. Colocou em dúvida a confiabilidade do instituto Vox Populi.

Respondi que, independentemente da pesquisa e de quem a fez, era isto que eu intuia desde o debate Folha/Rede TV.

José Serra — a quem caberia aplicarmos o título do livro/filme de Clive Barker, Renascido das Trevas — teria de aproveitar o que porventura ainda restasse do seu momento favorável, levando Dilma Rousseff às cordas naquele debate.

Uma pesquisa por ninguém questionada, a do DataFolha, já revelava que a sangria de votos de Dilma havia sido estancada e a situação estabilizara-se novamente, num patamar ainda seguro para a candidata oficial.

Serra teria de produzir algum impacto na noite de domingo, para voltar a crescer a partir da 2ª feira. Negou fogo.

Então, deduzi, a tendência era de que a altíssima aprovação do governo atual e a popularidade do presidente Lula voltassem a fazer a diferença, já que nenhum candidato sobrepujava nitidamente o outro — como, aliás, vinha se constatando desde o início da campanha.

Então, das quatro semanas entre um turno e outro, na primeira Serra tentou e não conseguiu decolar; na segunda houve imobilismo; a terceira tende a ser de Dilma; e a possibilidade de que o quadro sofra uma grande reversão na quarta é das mais remotas.

Com o que isto se parece? Com a eleição de 2006, claro! Pois:

  • tudo levava a crer que Lula liquidaria a fatura no 1º turno;
  • a tendenciosidade da mídia, produzindo na enésima hora um factóide providencial, salvou Geraldo Alckmin;
  • este, entretanto, não conseguiu embalar na 1ª semana;
  • Lula segurou a onda, voltando a crescer nas duas semanas seguintes;
  • chegou à 4ª com a vitória consolidada, de tal forma que o resultado das urnas (ele colocou uma vantagem de 21%, mais de 20 milhões de votos, em cima de Alckmin) foi apenas a confirmação do que todos esperavam.

Analista político que se preza tem de acreditar nas suas avaliações e intuições. Eu não fico em cima do muro, teclo-as e divulgo.

Uma notícia desta 4ª feira (20) da Folha de S. Paulo, Campanha de Serra vê perda de fôlego e traça mudanças, vem ao encontro da minha sensibilidade, como se constata nestes trechos:

O comando da campanha de José Serra (PSDB) avalia que houve uma perda de fôlego nos últimos dias e estuda como manter a candidatura em ascensão.

Um reflexo disso foi o abandono do tema do aborto e de questões religiosas pelo tucano…

“O tema (…) já começa a ser visto com potencial negativo pelo PSDB, especialmente depois que a mulher de Serra, Monica, acabou incluída involuntariamente no noticiário…

“Ontem, o partido demonstrou publicamente uma contrariedade em grau ainda não manifestado em relação a uma pesquisa do Vox Populi que apontou crescimento da vantagem de Dilma Rousseff (PT) sobre o tucano…

“A pesquisa deu início a um procedimento raro na campanha de Serra. O presidente do PSDB e coordenador da campanha, Sérgio Guerra, decidiu conceder entrevista coletiva com o objetivo de desqualificar o instituto e os números da pesquisa…

“Guerra fez um pronunciamento de nove minutos recheado de duros ataques ao instituto. Apesar das críticas, ele não anunciou nenhuma medida judicial em relação à pesquisa ou ao instituto.

“Um tucano também afirmou ontem que a expectativa do partido é que a próxima pesquisa Ibope, que deve ser divulgada hoje, também aponte um crescimento de Dilma, interrompendo a trajetória ascendente de Serra”. [os grifos são todos meus]

Nas entrelinhas, o que se percebe é o desespero de quem vê a derrota chegando.

Caso a expectativa  em relação ao Ibope se confirme, como eu acredito que se vá confirmar, a candidatura de Serra voltará a fazer água.

E, desta vez, não haverá nenhuma Marina Silva para atirar-lhe uma bóia…

O diabo trapaceou Serra: tomou-lhe a alma sem dar nada em troca

Após o insosso debate entre os presidenciáveis que a Rede TV e a Folha de S. Paulo promoveram no último domingo, fiquei com a impressão de que 2006 se repetiria: um grande esforço de última hora da mídia golpista evitando que a candidatura oficial decidisse a parada logo no 1º turno, mas não sendo suficiente para reverter o resultado anunciado.

Como Alckmin daquela vez, Serra não encontrou o mapa da mina. Marina Silva e o PIG lhe proporcionaram uma sobrevida, mas aproveitá-la para decolar são outros quinhentos.

Com carisma zero, não consegue fazer seus castelos nas nuvens valerem mais do que uma realidade palpável: as condições de vida dos pobres e dos muito pobres melhoraram sob o governo atual.

Então, independentemente de posturas ideológicas, o que deixa Serra num beco sem saída são a aprovação e popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A percepção do eleitor despolitizado é de que o Brasil evoluiu, daí ele encarar a tempestade de som e fúria dos demotucanos como tentativas de encontrarem pêlo num ovo que está dando certo. Portanto, significando nada.

Trata-se de uma sinuca de bico: não há factóide, propaganda enganosa e alarmismo que façam os eleitores  pés no chão mudarem seu voto.

O desejo da Veja, erigido em matéria de capa (!), é o de que a eleição fosse decidida em Minas Gerais, com Aécio Neves como fiel da balança. Dia 31 a revista aprenderá que jornalismo é algo mais do que expressão de desejos.

Uma mudança surpreendente do quadro só seria possível se Serra fosse um personagem eletrizante; mas, seu estilo é de quem está sempre explicando o óbvio a estudantes burrinhos. Não empolga ninguém.

Ora parece um mestre-escola alongando-se em repetições desnecessárias para martelar as lições na cabeça dos alunos, ora um guarda-livros a detalhar uma contabilidade que ele considera interessante e os demais, nem um pouco. Enfim, um chato de galochas, como se dizia antigamente.

O aborto (a palavra aqui cai muito bem…) da hipotética virada já começa a se evidenciar nas pesquisas eleitorais: a última do Data Folha mostrara um quadro estático e a nova do Vox Populi flagra subida de Dilma.

Pior que a derrota será a decepção causada por Serra àqueles que ainda acreditavam nele.

Aceitar o apoio e beneficiar-se da baixaria das correntes virtuais ultradireitistas, fazer promessas demagógicas como a do salário mínimo de R$ 600 e colocar uma questão religiosa no centro da campanha o deixou com a imagem de quem pisa até no pescoço da mão para chegar à Presidência.

O último a projetar tal imagem acabou morrendo na praia. E, convenhamos, fazia bem mais por merecer o ambicionado troféu.

É mais fácil superar Serra do que o desencanto

O espírito que faltou no 1º turno

Dilma Rousseff foi a grande vencedora do 1º turno da eleição presidencial 2010, com mais de 47 milhões de votos.

Isto é o que a imprensa teria de noticiar, caso não houvesse a perspectiva de liquidação da fatura já neste domingo.

Por conta do clima de  já ganhou!, a vitória acabou tendo sabor de derrota. E vai ser assim que os adversários a apresentarão.

No entanto, a vantagem de Dilma sobre José Serra superou 14 milhões de votos. Em termos eleitorais, um colosso. Nada indica que será revertida.

São dois candidatos sem carisma, mas Dilma se beneficia da lenda e popularidade de Lula.

Já Serra, coitado, nasceu sem os dons da simpatia e da fala agradável. Parece sempre um mestre-escola ensinando uma matéria tediosa.

Por mais que disfarce, percebe-se que considera os ouvintes um bando de retardados, aos quais crê ser necessário explicar tudo tintim por tintim. Comunicação pior, impossível.

Mostrou toda sua impotência no final da campanha: incapaz de evitar a vitória imediata de Dilma, limitou-se a rezar para que Marina Silva fizesse o que ele jamais conseguiria fazer.

A candidata do PV, aliás, estava certíssima ao afirmar que ela era a única capaz de enfrentar Dilma de igual para igual no 2º turno.

Mas, em política como no futebol, convém nunca subestimar-se um azarão. Ainda mais quando a imprensa faz o papel de  juiz ladrão, fabricando factóide em cima de factóide para prejudicar a candidata oficial.

Então, Lula, Dilma e o PT deveriam dar uma boa olhada nos resultados do domingo. Principalmente nas abstenções, nulos e brancos: foram nada menos que 34 milhões de votos jogados no ralo!

Ou seja, maior do que o universo de eleitores de Serra foi o conjunto dos que não deram importância ao pleito.

Então, além de irem à caça dos votos dados a Marina (o que certamente farão), os petistas deveriam oferecer alguma motivação a esse imenso contingente entregue à negatividade.

Por exemplo, o compromisso de seguir estas diretrizes:

“É preciso que o Estado se torne a expressão da sociedade, o que só será possível quando se criarem condições de livre intervenção dos trabalhadores nas decisões dos seus rumos.

“Por isso, o PT pretende chegar ao governo e à direção do Estado para realizar uma política democrática, do ponto de vista dos trabalhadores, tanto no plano econômico quanto no plano social.

“O PT buscará conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde não haja explorados nem exploradores”.

Isto, claro, se ainda conseguirem localizar o manifesto de fundação do PT, que deve estar acumulando pó em algum canto do arquivo morto.

Por que o PV, senadora?

Perguntar não ofende, dizem. Se a pessoa questionada for Marina Silva, firme e coerente, devemos tomar cuidados ainda maiores.

Mas, por que a senadora se desfiliou do PT e pensa apenas no PV como alternativa para sua militância? Por que não cogitou o PSOL, o PSTU, o PCB?

Claro que essas organizações acumulam uma dívida enorme em relação à luta ambiental. Mas, no caso do PV, não é dívida. É calote, mesmo.

O PV tem uma ficha sem maiores registros em favor da causa ambiental.  Por outro lado, vive de braços dados com partidos da direita nacional. Apoiou o governo FHC, apóia Kassab em São Paulo e Alfredo Sirkis foi secretário do meio-ambiente de César Maia. Sua única prefeitura de capital é produto de uma coligação com o DEM, em Natal. Um de suas lideranças é Zequinha Sarney, que talvez não tenha culpa de ter nascido na família, mas tampouco acumula realizações e conquistas na seara ambiental.

Como sabemos, nem tucanos nem o antigo PFL se notabilizam por preocupações ambientais. Com essas companhias o PV mostra que é ecológico somente na grife.

Que o PT abandonou todas as suas bandeiras históricas, sabemos todos. Mas, ao deixar o PT pelo PV, Marina Silva só estaria escolhendo um caminho muito próprio de deserção.