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Comissão da Arquidiocese de Belo Horizonte se solidariza com famílias do Quilombo Campo Grande

O arcebispo metropolitano de Belo Horizonte e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Walmor Oliveira de Azevedo, em comunhão e apoio a dom Pedro Cunha, bispo da Campanha, Sul de Minas, envia comissão para visita e presença solidária no Quilombo Campo Grande, cidade de Campo do Meio, onde ocorre, por determinação judicial, uma ordem de despejo, executada inoportunamente, considerando este tempo de pandemia, com graves riscos de comprometimento da saúde das famílias.

As famílias, há muitos anos, vivem no terreno de uma usina desativada. A Igreja Católica, por sua Diocese da Campanha, responsável pelos trabalhos de evangelização na cidade de Campo do Meio, está junto das famílias, com ajuda espiritual, emergencial e solidária, enquanto se empenha no diálogo para preservar a paz social e a conquista inegociável da dignidade de todos, interpelando autoridades governamentais e judiciais, bem como a opinião pública.

Há, pois, um urgente desafio, que exige entendimentos e decisões que protejam os pobres e vulneráveis. É necessário também um esforço para congregar instituições e segmentos da sociedade na construção de políticas públicas e legislações que, efetivamente, contemplem a complexa e preocupante realidade social das ocupações, para que não seja agredido, ainda mais, o princípio democrático da igualdade e do incondicional respeito à liberdade de toda pessoa humana.

Seja acolhida a recomendação do Papa Francisco: não roubem a esperança dos pobres e vulneráveis!

Fonte: Brasil de Fato

(15-08-2020)

“O Pará não é uma terra sem lei; é uma terra onde a lei impera para poucos”, diz coordenador da CPT

Em entrevista ao Portal da Pontifícia Universidade Católica do Rio de janeiro (PUC-RJ), Ruben Siqueira, da coordenação executiva nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), fala sobre os conflitos por terra no Pará, assim como na região Amazônica. Em 2015, dos 50 assassinatos registrados no Brasil pela CPT, 47 aconteceram na Amazônia Legal – apenas em Rondônia foram 20, e no Pará 19.

Por Cecília Bueno, Portal PUC Rio

Há vinte anos, no município de Eldorado dos Carajás, no Pará, 1.500 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) fizeram uma marcha na BR-115 em protesto contra a morosidade da desapropriação de terras na região. Dezenove deles foram mortos pela Polícia Militar. Dos 115 policiais que participaram da ação, apenas dois foram condenados, 16 anos depois. O Massacre de Eldorado dos Carajás foi mais um dos episódios no campo em que a violência passou impune. No Pará, de 1985 a 2014, dos 438 crimes relacionados a conflitos de terra, somente 22 foram julgados. Para o procurador José Elaeres Marques Teixeira, que atuou na Comissão Nacional de Combate a Violência no Campo (CNCVC) representando o Ministério Público Federal, a impunidade é decorrente de um sistema de Justiça ineficaz, que é consequência de uma cadeia de fatores, entre os quais destaca a falta de recursos materiais e científicos para realização de perícias e o número insuficiente de agentes, o que retarda o andamento dos inquéritos policiais e o julgamento dos processos.

– Além disso, a deficiência da apuração prejudica a identificação das autorias do crime. A garantia da impunidade é o principal motor da violência no campo – completa o procurador federal.

Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), dos 50 assassinatos registrados no Brasil em 2015, 47 foram na Amazônia, sendo 20 em Rondônia, 19 no Pará, 6 no Maranhão, 1 no Amazonas e 1 em Mato Grosso. O procurador aponta como causa mediata dos conflitos a ausência de políticas públicas de atendimento para as populações tradicionais, e critica a ausência de um sistema de segurança específico direcionado para essas comunidades desprotegidas. Elaeres considera deficiente a seleção de beneficiários de terra feita pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que a seu ver proporciona o assentamento de pessoas que não têm perfil de reforma agrária, fomentando a violência no campo.

Professora do Departamento de Direito da PUC-Rio, Mariana Trotta assinala que, para compreender o quadro de violência na Amazônia, é preciso pensar no problema desde sua origem na ditadura militar, com os processos de apropriação privada de terras públicas, até então habitadas por populações tradicionais. Na época, os esquemas de legalizações irregulares de propriedades fomentou a grilagem das terras, cuja estratégia se associou a outras formas de violência presentes na região. A Comissão Permanente de Monitoramento, Estudo e Assessoramento das Questões Ligadas a Grilagem do Tribunal de Justiça do Estado do Pará confirmou que o estado tem hoje, em títulos cartorários, quatro vezes a dimensão territorial do estado. Cerca de 24% das terras do Pará são griladas, segundo o Instituto Ambiental da Amazônia.

Depois do Massacre de Eldorado dos Carajás, foram criadas varas especializadas em cinco regiões do Pará para julgar conflitos de terra e ações de desapropriação. A professora ressalva que tais mecanismos fazem mediação do efeito e não da causa do problema e, por isso, não garantem efetivamente uma mudança estrutural na realidade violenta da região. Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública publicado em 2015, o Pará é o quinto estado mais violento do país. Para reverter esse quadro, Mariana reforça que é preciso atacar o problema em sua raiz e completa que enquanto o Estado não atuar em reformar a estrutura fundiária e garantir a demarcação de terras para os povos tradicionais, nenhuma política será efetiva em acabar com a violência da região. De 2010 a 2015, o orçamento anual do Incra – órgão responsável pela política de desapropriação e assentamento de famílias – caiu 85%. Nos três primeiros anos do primeiro mandato de Dilma, o número de famílias assentadas foi o pior desde 1995, apontam dados da instituição. Diante dessa conjuntura, a professora avalia que o cenário só vai se agravar.

Mariana, que é pesquisadora da relação entre movimentos sociais e o Poder Judiciário, frisa que um dos obstáculos da efetivação da reforma agrária é a parcialidade da Justiça Penal. Ela enfatiza que enquanto não for efetivada uma reforma agrária, é necessário pensar nos instrumentos do sistema de justiça para conter o efeito dessa irregularidade, que é a violência contra os povos que defendem as terras. Segundo ela, há uma tendência do Judiciário em proteger os mandantes de crime e grileiros e negligenciar a questão trabalhista e social dos povos da região.

A interferência direta dos conflitos de terra e a ausência do Estado na Amazônia nas pautas climáticas foram temas da imprensa estrangeira durante a Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (COP 21). O compromisso do Brasil em acabar com o desmatamento ilegal até 2030 foi posto em cheque em uma reportagem do jornal britânico Financial Times diante do assassinato de mais um trabalhador de campo no Pará na época. Winslei Gonçalves Barbosa trabalhava no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Esperança em Anapu, o mesmo no qual a missionária americana Dorothy Stang foi assassinada 11 anos atrás. Elaeres considera a atuação do IBAMA deficiente, e avalia que o modelo de fiscalização descontínuo da extração de madeira fomenta a prática ilegal do desmatamento, distanciando o país do cumprimento das metas do acordo.

Na Amazônia Legal, segundo Boletim do Desmatamento do Imazon de março de 2015, o desmatamento acumulado entre agosto de 2014 e março de 2015 atingiu 1.761 quilômetros quadrados. O Pará é o segundo estado com maior área desmatada, 434 km quadrados, representando 25% das terras, atrás apenas de Mato Grosso, com 36%.

Em entrevista ao Portal PUC-Rio Digital, Ruben Siqueira (foto abaixo), da coordenação executiva nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT) elucida principais assuntos relacionados ao conflito de terras no Pará.

Portal PUC-Rio Digital: Os mandantes do assassinato da missionária Dorothy Stang continuam em liberdade, 11 anos após seu assassinato. Qual o motivo dessa crônica impunidade no campo?

Ruben Siqueira: Há registro de sete assassinatos em Anapu, entre julho e outubro de 2015. Taradão, mandante do caso de Dorothy, é suspeito de estar envolvido em algumas dessas mortes. Isso já revela uma das principais causas da histórica e contemporânea violência no campo: a impunidade. Essa condição relembra o julgamento do fazendeiro Adriano Chafik e de seu capataz Washington Agostinho da Silva, responsáveis pela “Chacina de Felisburgo”, no Vale do Jequitinhonha, em novembro de 2004. Após serem condenados a 115 anos e 97 anos e meio de prisão, respectivamente, conseguiram um habeas corpus e hoje respondem em liberdade. Esses mecanismos da Justiça favorecem a fuga do condenado ou sua própria volta ao crime. Além disso, a ineficiência dos órgãos de segurança pública, a letargia do Judiciário e a defasagem do Código Penal são alguns dos principais entraves no combate da impunidade.

O Estado acaba sendo refém nesse quadro de violência, atrasando e impedindo que a justiça seja feita. Como o agronegócio e a mineração produzem commodities, a macroeconomia depende desses setores e fica refém desses poderosos lobbies e interesses. Vivemos um contexto de maior concentração e aumento de poder de setores econômicos na política. O contrato social está em crise. O Estado não é mais a expressão da sociedade. Basta ver o atual momento da política. Os três poderes estão em crise, porque estão reféns de interesses que não são da maioria. É a falácia da democracia. A capacidade punitiva não diminuiu, ela recai sobre os pobres. Situações de violência com raízes profundas não combatidas aumentam a capacidade punitiva do Estado sobre esses setores fragilizados da sociedade. É preciso aumentar a consciência ética política do país.

Portal: Além da impunidade, quais são as principais causas da violência no campo?

Ruben Siqueira: A irresolução de um antigo problema agrário é o principal fator da causa da violência no campo. Os problemas estruturais da questão são contidos e canalizados pelo Estado. A dinâmica política se aproveita dos problemas da população, não os resolve completamente e abre espaço para a criação de um poder paralelo. E em uma sociedade onde terra é privilégio de classe, quem tem terra detêm todos os outros poderes. O potencial das terras brasileiras sempre fomentou conflitos e esteve nos eixos dos problemas das populações tradicionais. Antes, sem-terra e latifundiários queriam terra para produzir. Hoje, com a supervalorização da terra, com a expansão da agropecuária, de mineradoras, empresas de energia e especulação, o mundo todo está de olho no Brasil. Grandes bancos e conglomerados econômicos estão adquirindo propriedades no Brasil, fazendo investimentos para valorizar seus papeis no mercado de capitais. Nesse cenário, são criados diversos esquemas para facilitar o acesso à terra, os quais são causa dos conflitos do campo.

Portal: Como são esses esquemas?

Ruben Siqueira: O poder paralelo criou diversos mecanismos para facilitar o acesso às terras. Já que só os sem-terra podem se beneficiar com a reforma agrária, programas do governo também são usados como instrumento para a conquista de propriedade. O Terra Legal, criado em 2009 pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) com o discurso que resolveria a questão fundiária e regularizaria toda terra para a exploração sustentável da região, é, na prática, um mecanismo para legalização das grilagens. O Fundo Amazônia, criado pela Coroa Norueguesa e hoje do BNDES, tem projetos do programa de manejo florestal que contrariam os objetivos de desenvolvimento sustentável e acabam sendo prejudiciais às florestas e a seus povos.

Além disso, como forma de desvalorizar a terra, muitos grileiros contratam trabalhadores sem-terra para se instalarem em terrenos já ocupados. Com isso, o preço cai e eles compram a área. Depois, contratam jagunços para expulsar os sem-terra e revalorizar a terra.

Portal: Quem são as principais vítimas dessa violência?

Ruben Siqueira: A violência na Amazônia, no momento atual, atinge mais o público da reforma agrária. Como o processo de regularização fundiária ainda não foi concluído pelo INCRA, eles acabam ficando à mercê de novas violências. A disputa pela posse da terra é motivo de conflitos dentro dos próprios assentamentos. Populações indígenas, quilombolas, extrativistas e pescadores também são atingidos pelos conflitos de terra. Nos últimos dez anos, houve aumento da violência contra os povos tradicionais.

Outro grupo atingido pela violência são os defensores de direitos humanos, líderes comunitários e religiosos, advogados e jornalistas. Três dos nossos companheiros da Pastoral tiveram que sair do lugar onde moravam e trabalham, por recentes ameaças de morte. Na Amazônia, o número de ameaçados de morte aumentou em 57,4%, e a efetivação dessas ameaças aumentou em 95,6%.

Outro dado importante é o crescimento dos crimes por pistolagem. Houve uma época em que o Estado – polícia civil e militar – eram os atores da violência no campo. Hoje, a violência também é privada e realizada por pistoleiros. A atual conjuntura na Amazônia se assemelha aos anos 1970 e 80: junto com o desenvolvimento e expansão de capital no campo, houve o aumento de conflitos.

Portal: Qual a causa do crescimento de crimes por pistolagem?

Ruben Siqueira: Durante a ditadura, o Estado concedia terras públicas a particulares, em nome do desenvolvimento da região. Muitos fazendeiros e pequenos produtores receberam créditos públicos para desenvolverem essas áreas e poucos cumpriram o que prometeram. Com a expansão do agronegócio na Amazônia – soja, algodão, pecuária – e a mineração, essas áreas voltam a ter interesse. Os controladores da terra querem negociar essa terra porque ela foi valorizada. Assim aparecem os mediadores, os grileiros de terra, e, por isso, a pistolagem volta. O mercado de terra inflacionado no Brasil aumenta a violência nas áreas de assentamento. A pistolagem volta com força porque a Polícia Militar não faz mais seu papel. O poder local substitui o Estado, que se ausenta, diminui sua capacidade de intervenção e controle, favorecendo a entrada de um poder paralelo. A situação violenta no campo do Pará não é algo somente rural, estanque da política nacional; é consequência da ausência do Estado. O Pará não é uma terra sem lei, é uma terra onde a lei impera para poucos.

Fonte: CPT
http://www.cptnacional.org.br/index.php/publicacoes/noticias/articulacao-cpt-s-da-amazonia/3130-o-para-nao-e-uma-terra-sem-lei-e-uma-terra-onde-a-lei-impera-para-poucos-diz-coordenador-da-cpt

Palavras de Ir. Tonny sobre conquista da Fazenda Antas, em Sapé, Paraíba

Mensagem da Irmã Tonny, Religiosa Franciscana, hoje vivendo na Holanda, grande lutadora da causa dos pobre, em especial dos camponeses e camponesas, junto a quem trabalhou várias décadas na Paraíba, na CPT e outros espaços eclesiais, e que hoje saúda os Trabalhadores e Trabalhadoras da Comunidade de Antas, município de Sapé – PB, pela sua brava conquista:
“Querido Povo da Fazenda Antas, Elizabeth Teixeira, CPT e…todos que ajudaram para esta vitória poder acontecer. (Eu no meio, também, penso agora, me lembrando do começo desta Luta, aí)…
Parabéns gente com esta vitória no Supremo Tribunal!
Antes de tudo meus pensamentos vão para àquelas/àqueles no meio do povo que iniciaram esta Luta braba e ainda estão PRESENTES ATIVAMENTE nela!
Parabéns de coração para todos e… continuem com amor mútuo, pois é agora que a Caminhada precisa de grande esforço e coragem para se criar, aí, ‘Terra Fertil’ por Vida melhor para a Comunidade toda!
Mas antes de tudo, dançam, brincam, festejam a alegria desta vitória. Eu, de coração, vibro juntos com todos vocês.
Quem sabe, pode se celebrar este momento de maneira mais especial e organizado, no dia 02 de abril, dia que faz 52 anos que João Pedro Teixeira tombou, nesta Luta que ele tinha começado nos anos cinquenta, conversando pacientimente com os companheiros dàquele tempo, exatamente neste lugar!
E… aliais, qual foi a data que Sandoval foi assassinado na Luta por esta Terra?
Acredito que todos os lutadores, que deram sua vida e seu sángue pela libertação das terras para o Povo, estão presentes em tudo que vocês juntos celebram e fazem em cada momento desta Caminhada tão importante.
O fato que a terra aonde começaram os primeiros passos da Luta, agora é livre para o Povo, tem um significado todo especial ao meu ver.
Como é importante que Elizabeth Teixeira, esposa de João Pedro, ainda, ao completar 89 anos, na próxima semana, pode presenciar esta vitória: mais uma gotinha na Reforma Agrária, que ela não para de defender.
Pois, é Caminhando que continua se fazendo A História do Povo de Deus.
É como Maria Romão de Mucatu, num dia de um passo positivo na luta, falou: “A gente luta, luta e sofre; passa por uns vinte sofrimentos, para de repente ter uma pequena vitória, que faz esquecer todo o sofrimento. E é isso que faz a gente continuar nesta Caminhada.”
É com estas palavras e com muito mais pensamentos e sentimentos ainda, que me sinto fazer parte desta História do Povo de Deus à Caminho.
E repito: “PARABÉNS PARA TODOS VOCÊS” !!!
Recebam abraços com tudo de bem de
Tonny.
Mais informações sobre o Memorial das Ligas Camponesas: http://www.ligascamponesas.org.br/?p=75