Arquivo da tag: Jesus de Nazaré

Como atender aos sofrimentos de Deus

XXXIV Domingo Comum

Festa de Cristo Rei e Servidor – Mt 25, 31 – 46. 

Como responder aos sofrimentos de Deus

Neste último domingo do ano litúrgico, que a Igreja Católica continua chamando de Festa de Cristo Rei, o evangelho deste ano é Mateus 25, 31 a 46, a parábola do julgamento final. De fato, a Reforma Litúrgica de 1969 transferiu essa festa do final de outubro para o último domingo do ano litúrgico. Assim, deu a essa celebração o sentido de apontar a esperança que temos no reino de Deus que virá.  É verdade que, até hoje, grupos católicos tradicionalistas cantam e propagam o antigo hino ao Cristo Rei que tem como refrão:

Jesus Rei Deus verdadeiro

O teu Reino venha a nós

Obedeça o mundo inteiro

Ao poder de tua voz

Todo o orbe homenagens Lhe renda

Aos seus pés traga o mundo cristão

De almas livres a livre oferenda

Corações para o seu coração!

Nesses versos, o reino do Cristo é identificado com o poder da hierarquia da Igreja-Cristandade, isso que o hino chama “o mundo cristão”, que convivia muito bem com o domínio do homem sobre a mulher, o racismo estrutural, o extermínio dos povos indígenas, a escravidão das populações negras e tantas outras injustiças sociais. Infelizmente, mesmo se o mundo de hoje é decididamente mais laical e independente de religião, ainda existe em muitos setores cristãos, das mais diferentes Igrejas, o desejo de restaurar essa religião civil que tem muito de costumes religiosos e pouco do evangelho de Jesus. É nesse espírito que compreendemos a preocupação de Dom Helder Camara, quando, há mais de 55 anos, escrevia: “Jesus me compreende quando digo que não gosto da festa de hoje, nem acho que ele queria ser chamado de rei”  (53ª circular – 22/ 10/ 1964)[1].

 

A respeito da parábola lida no evangelho de hoje, dois exegetas belgas sustentam que essa parábola, do modo como está escrita, foi construída pela comunidade de Mateus. Afirmam: “Jesus nunca chamaria a si mesmo de rei nem se atribuiria o papel de juiz, que ele sempre pensou ser reservado ao Pai[2]. No entanto, é possível que o núcleo da parábola venha de Jesus e esse núcleo é a identificação de Jesus com as pessoas empobrecidas e excluídas do mundo.

Toda a espiritualidade rabínica insistia na imitação de Deus. O livro do Talmud ensina que devemos imitar Deus. E ensina que nós imitamos a Deus, quando vestimos os nus, assim como Deus vestiu Adão e Eva, quando os nossos primeiros antepassados se viram nus no paraíso. O Talmud ensina que eevemos visitar as pessoas doentes, como Deus visitou Abraão, depois que ele foi circuncidado. Do mesmo modo, assim como Deus confortou e abençoou Isaac, depois que esse perdeu o pai, temos nós também de confortar os enlutados. E devemos enterrar as pessoas falecidas, assim como Deus enterrou Moisés no monte Nebo (b. Sotah, 14ª)[3].

Nessa parábola sobre o julgamento final, Jesus assume esse modo de falar de Deus e nos revela duas coisas novas: 1º – Se queremos encontrar e nos unir a esse Deus da Bíblia, a quem Jesus chama de Paizinho, o jeito é reproduzir o seu modo de ser, no caminho da misericórdia e da solidariedade.

2º – Os sofrimentos do povo explorado e empobrecido são os sofrimentos do próprio Deus. Para Jesus, não há outro caminho de espiritualidade a não ser descobrir nos sofrimentos das pessoas empobrecidas os sofrimentos do próprio Deus.

Diante disso, então, é preciso sempre rever a nossa vida e o nosso jeito de ser, para ver o quanto estamos sensíveis e atentos a isso: o encontro com Deus não está, em primeiro lugar, no templo e no culto e sim na solidariedade amorosa com as pessoas e comunidades empobrecidas.

Na história, muitas vezes, cristãos e cristãs compreenderam essa palavra de Jesus no varejo da vida, isso é, como se ele tivesse mandado dar esmolas na porta de casa, escolher um dia da semana e visitar alguém doente no hospital e assim por diante: um Cristianismo dos atos soltos de caridade individual. Mas, essa não foi a compreensão de Jesus e da Bíblia, já que, na antiga cultura judaica, como em toda cultura originária, a dimensão comunitária sempre é a primeira e as ações individuais se situam dentro da ação coletiva.

Na Bíblia, a promessa do reino de Deus surgiu no tempo do cativeiro e se desenvolveu como forma de restituir ao povo hebreu, como povo privado da sua liberdade e da sua cidadania a esperança de recuperar a sua liberdade coletiva e a justiça libertadora, como manifestação do amor divino. Os salmos de súplica dos pobres sempre juntam o pedido de socorro individual (tem piedade de mim) com a salvação comunitária. O eu acaba sempre sendo o eu coletivo do povo de Deus. Os salmos comumente chamados de “salmos do reino” mostram que a manifestação de que Deus reina não é nenhum ato religioso. Não há nenhuma coroação. Eles descrevem que o reinado divino se expressa em novo equilíbrio e comunhão com a natureza que é aliada da humanidade. O reinado divino traz justiça libertadora e inversão das situações sociais, de modo que “Deus faz justiça às pessoas oprimidas e liberta quem é cativo. Dá pão a quem tem fome e levanta o desvalido. Reconduz migrantes à sua terra e as pessoas honradas, orienta sempre” (Sl 145).

Jesus revelou Deus no rosto das pessoas mais pobres. O evangelho mostra que Jesus assumiu e viveu isso. O reino de Deus se manifesta quando todas as pessoas são consideradas como cidadãos e cidadãs de pleno direito. A carta de cidadania do reino de Deus garante o direito das categorias mais  vulneráveis da humanidade e também o cuidado com todas as criaturas vivas e com a mãe-Terra.

No Brasil, por causa do 20 de novembro, dia do martírio de Zumbi dos Palmares, cada vez mais, os movimentos sociais têm transformado novembro em um mês da consciência negra. É importante que a luta contra o racismo e a defesa de um Brasil multi-étnico e pluricultural seja expressão de fé e do nosso testemunho do reinado divino. O evangelho de hoje pede que nos identifiquemos com o Cristo, pobre, nu, doente e prisioneiro nas estruturas perversas da sociedade em que vivemos.

[1] –  CAMARA, Dom Helder. Circulares Conciliares, Volume I – Tomo II, Recife, Ed. CEPE, 2009, p. 205.

[2] – Cf. MAERTENS, Thierry e FRISQUE, Jean, Guia da Assembleia Cristã 3, Vozes, 1970, p.47.

[3] – Cf. VERMES, Geza, O autêntico evangelho de Jesus. Ed. Record, 2006, p. 181

A coroa de ouro e a coroa de espinhos

Nestes dias, os jornais dedicam páginas inteiras a mostrar em detalhes a coração do rei Charles III da Inglaterra. Os meios de comunicação competem na cobertura da cerimônia. Nobres e representantes de governos disputam os lugares de honra na nave da velha abadia.

Neste sábado, pela televisão, o mundo inteiro verá a carruagem dourada, puxada por oito cavalos, que, em pleno centro de Londres, conduzirá o rei e a rainha, de volta da cerimônia na Abadia de Westminster para o palácio.

É provável que este encontro da nobreza que se considera de sangue azul e de representantes da elite política e econômica sirva de pretexto para muita gente que adora monarquias  sonhar com um mundo de contos de fada, desde que sejam eles e elas os príncipes e princesas e não os servos da gleba que aplaudem a passagem da carruagem dos nobres.

Nos países do Sul, ao verem a coroa real e o brilho da carruagem dourada, indígenas e negros podem imaginar que aquele ouro ali concentrado custou o sangue de seus ancestrais escravizados nas minas da América Latina ou África. É o mesmo ouro que provoca doenças e mortes nas comunidades originárias e agora tenta exterminar de vez o povo Yanomami e a Amazônia, ferida por tantos garimpos e sítios de mineração.

No próprio Reino Unido, alguém poderá se perguntar sobre a legitimidade de usar o dinheiro público dos impostos de uma população, cuja maioria nem é religiosa, com essa cerimônia de luxo que oficializa um chefe de Estado em uma Igreja cristã, transformada em religião civil.

É possível se perguntar a que ponto chegou o Cristianismo e como  a fé cristã, a mesma do evangelho de Jesus, trocou a coroa de espinhos da cruz de Jesus e dos povos crucificados pela legitimação de uma monarquia, que, como todas as outras, concentra longa história de conquista e colonização que provocou milhões de vítimas em vários continentes.

A cerimônia ocorre em uma liturgia cristã, do mesmo modo que no passado, a Igreja legitimou o poder de outros impérios sangrentos e coloniais e como, hoje, no Brasil, Igrejas mais novas disputam sobre quem  terá mais poder sobre as bancadas do boi e da bala para estabelecer no país o poder de uma Cristandade neopentecostal.

Essa concepção de Igreja Cristandade é a mesma que faz com que nos meios católicos, a CNBB ainda apareça como se fosse a assembleia de toda a Igreja no Brasil e não apenas uma conferência de bispos. Isso ocorre nas melhores famílias, apesar de que, de acordo com a proposta da Sinodalidade, sobre a qual o papa Francisco tanto insiste, esta (a CNBB) deveria formar, junto com outras instâncias, a Assembleia do Povo de Deus, de comunhão católico-romana em nosso país. Na década de 1990, Dom Luciano Mendes de Almeida convocou por duas ou três vezes uma assembleia dos Organismos do Povo de Deus. Depois dele, isso não teve continuidade.

O Cristo Ressuscitado nos chama a renunciar às seduções de uma Igreja Cristandade, legitimada pela sociedade dominante e injusta e que arma como set cinematográfico, o palco desta coroação real. No lugar disso, ministros e fieis, assumamos a coroa de espinhos do Cristo, vivida, hoje, pelos povos crucificados, aos quais devemos ajudar a descer da cruz e a ressuscitar para um mundo baseado no bem-viver.

(06/05/2023)

“A Esperança dos pobres vence e renova a vida”

Breve nota sobre a 3ª Romaria missionária no Santuário de Santa Fé, celebrativa dos 100 anos do Pe. José Comblin 

Como anunciada amplamente, realizou-se, em Santa Fé (Solânea-PB), entre os  dias 24, 25 e 26 próximo-passados, a 3ª Romaria missionária (reeditada a cada cinco anos), com a participação de pessoas – a grande maioria, participantes das Escolas de Formação Missionária, espalhadas pelo Nordeste (Juazeiro-BA; Esperantina-PI; Santa Fé-PB; Floresta-PE; Barra-BA) e em São Félix do Araguaia -MT, a partir de sexta-feira dia 24 foram chegando as caravanas de romeiros e romeiras, todos envolvidos em uma ambiência de alegria, de esperança e de compromisso dispostos a contribuírem com a Equipe Organizadora nas diferentes tarefas organizativas (recepção, acolhida,  inscrição, infraestrutura, comunicação, distribuição dos grupos, Liturgia, animação, entre outras).

 

No sábado dia 25, os participantes da III Romaria  Missionária foram distribuídos em 8 grupos temáticos, inspirados  nos principais livros escritos pelo Pe. José Comblin:

 

  1. Igreja Povo de deus, animado por João Batista, tendo Magal como secretária;

O Concílio Vaticano II teve como uma de suas principais contribuições recuperar o sentido “Povo de Deus” como referência maior da organização eclesial, em detrimento do exclusivismo da hierarquia como quase única referência dos processos decisórios da Igreja Católica Romana. Em que pese a lentidão de se fazer cumprir o lugar de Povo de Deus como a grande referência nas tomadas de decisão, vale lembrar que, sobretudo desde Medellín (1968), segue sendo considerável a consciência das Leigas e Leigos, em assumirem seu lugar nos processos decisórios da organização eclesial. Neste sentido, sobretudo a partir do Papa Francisco, alguns passos importantes (ainda que insuficientes) vêm sendo dados,tais como o  sínodo da Amazônia, da Assembléia Eclesial e do Sínodo da Sinodalidade em curso.

  1. Missão e Igreja em saída, com a coordenação de Pe. Hermínio Canova, com a secretaria de Anunciada.

Em seu relatório, o grupo destacou aspectos decisivos da Exortação Apostólica a “Alegria do Evangelho”, primeiro documento que o Papa Francisco publicou, em 2013.Nele o Bispo de Roma, alem de ressaltar o dom da alegria como marca de todo discípulo/discípula de Jesus, convoca os cristões a porem em prática o que ele chama de uma “Igreja em saída”, ressaltando a necessidade de testemunhamos o Seguimento de Jesus, a partir da busca constante de servirmos os pobres, lá onde eles se encontram: nas periferias geográficas e existenciais, ao mesmo tempo em que lança duras críticas ao clericalismo.

 

  1. Os Pobres no centro do Evangelho, com a coordenação de Pe. Isaías e na secretaria Milena 

Mediante uma metodologia criativa, cada pessoa do grupo foi convidado a expressar seu entendimento, por meio de um desenho do significado do tema trabalhado pelo grupo. Na leitura e socialização de cada desenho com muita criatividade, se pode destacar a centralidade do povo dos pobres, no Evangelho, seja por meio da denúncia as estruturas injustas que sufocam e marginalização os pobres, seja pelo anúncio e construção de uma base fraterna permitindo que todos tenham vida, e vida plena.

 

  1. A Ação do Espírito Santo com Monica coordenando e Marta na secretaria.

Dos temas trabalhados pelo Pe. José Comblin, foi o da ação do Espírito Santo, aquele que constitui sua melhor contribuição de teólogo, a medida que, seja em sua ação transformadora da sociedade, seja em sua atuação voltada para a Igreja, ao longo da história, o Espírito Santo cuida de rememorar o Projeto de Jesus, ao tempo em que não cessa  de iluminar e animar os discípulos e discípulas a seguirem e a testemunharem os sinais da  presença, entre nós, da presença do Reino de Deus e sua Justiça, para o que nos dá os meios de agirmos, com discernimento, em nosso dia-a-dia nesta perspectiva.

  1. Viver na Esperança, com a animação de Helvídio e a secretaria com Aline

Sempre com base no livro de Comblin, o tema contou com uma exposição inicial da parte de Helvídio seguido pela partilha de outras pessoas. A esperança constitui um tema recorrente na obra de Comblin. Apoiado por estudos bíblicos de profundidade, o Pe. José apresenta a experiência Evangélica com relevante fundamento da vida Cristã. Esperança que não se reduz a um mero esperar, mas constitui o horizonte cristão que anima os discípulos e discípulas de Jesus a seguirem firmes no seu caminho: caminho de libertação de todo tipo de correntes opressivas. Tema igualmente presente em livros tais como: “O Caminho: ensaio sobre o seguimento de Jesus” e em “A Profecia na Igreja”, entre outros.

 

  1. Seguindo o Caminho de Jesus, com Frei Roberto como coordenador e Valnice como secretária

Tal como outros temas, este também é especialmente desenvolvido em “O Caminho: ensaio sobre o seguimento de Jesus”, no qual Pe. José traz à tona instigante reflexão sobre as virtudes teologais (Esperança, Fé e Amor). É marcante a forma como Comblin se porta no desenvolvimento desses três capítulos, iniciando pelo da Esperança. Não é por acaso que este livro tem sido trabalhado coletivamente por diversos grupos. Cabe ainda,  observar a feliz coincidência com um livro escrito por Frei Roberto (“Caminhando com Jesus”), no qual compartilha densas experiências missionárias, vivenciadas no meio dos pobres.

 

  1. Vocação para a Liberdade com coordenação de Ana Claudia e secretaria de Valberto

Os discípulos e discípulas de Jesus, em seu processo de humanização, são chamados a Liberdade, sem a qual a vida humana perde seu sentido. Nosso compromisso com a Liberdade se faz presente, no dia-a-dia, em cada gesto pessoal ou comunitário, em que não abrimos mão de nossa Liberdade, que implica respeito à liberdade dos outros, do Planeta e dos demais seres viventes, em sua vasta diversidade.

Não é por acaso que, no cotidiano de nossas Escolas de Formação Missionária, nos inspiram três princípios: o da convivência, o da oração e o do trabalho.

 

  1. O anúncio do Reino no mundo presente com Glaudemir coordenando e  Paulinho secretariando

Diferentemente do que certa tradição clericalista nos orienta a fazer, o Seguimento de Jesus nos convoca a agir no mundo, e não dele nos distanciar, pois é pela nossa ação missionária que Jesus, por meio do Espírito Santo, nos instiga a construir o Reino de Deus e sua justiça desde o presente, inspirando-nos a semear sementes de uma nova humanidade, através de nossa ação de “fermento na massa”, afinal, como Ele próprio disse: “Não foram vocês que me escolheram, mas fui Eu quem os escolheu e os enviei, para que vocês deem fruto, e este fruto permaneça.” (Jo 15,16).

 

Importa observar a estética adotada para a reunião de cada grupo, seja sob belas tendas, seja em outros espaços adequados, todos marcados por forte simbologia, além de uma fraterna animação.

 

Também por ocasião do almoço, preparado comunitariamente com muito carinho, pudemos experimentar um saudável espírito de comensalidade e partilha, ainda contando com a animação de uma equipe inspirada a apresentar belas músicas, com acompanhamento. Por volta das 14 horas, deu-se a continuidade dos trabalhos constantes da apresentação, por cada Grupo, com seu respectivo Coordenador/coordenadora e seu Relator/Relatora, fazendo um resumo do que foi trabalhado em cada grupo, tendo sido reservados 10 minutos para cada um.

 

Antes, porém, da apresentação de cada grupo, o Coordenador dos trabalhos da tarde, atendendo à solicitação de algumas pessoas, anunciou um momento de breves lançamentos de alguns escritos. Pe.Hermínio Canova, de posse de um exemplar do livro “O Espírito Santo e a Tradição de Jesus”, livro póstumo do Pe. José Comblin, recém publicado pela Editora Paulus, cuidou de fornecer relevantes elementos deste livro, considerado como um testamento espiritual e teológico do Pe. Comblin,texto que corresponde a terceira versão,da qual o Pe Hermínio é co-autor do prefácio. Em seguida, Pe.Hermínio informou aos presentes da organização em curso da XIII semana teológica Pe.José Comblin,sobre a qual outros detalhes podem ser encontrados no site teologianordeste.net

 

Adauto Guedes, organizador do livro “José Comblin, um guia de leitura”, elaborado por Eduardo Hoornaert e Alder Júlio, compartilhou os principais aspectos tratados neste livro, editado, na versão E-book, pela Universidade Estadual da Paraíba.Nele,importa ressaltar densa contribuição de Eduardo Hoornaert,profundo conhecedor da obra do Pe.Comblin Por sua vez, Pe. José Floren, conterrâneo e amigo de Pe. Comblin, apresentou ao público participante  traços básicos de seu trabalho mais recente sobre o Pe. José Comblin.Pe Jose.Floren é um ardoroso colaborador do santuário de Santa Fé, do qual também foi Reitor, tendo reconhecido participação em alguns estudos sobre o Pe.Ibiapina. Foi a partir das reflexões feita nesses Grupos, bem como de cada relato apresentado, que Alder Júlio foi chamado a oferecer uma síntese dos trabalhos. Sua fala destacou diversos aspectos, focando em três palavras-chave:

  • Memória, Compromisso e Esperança,tendo partido desta última. 

Parte considerável dos livros de Comblin trabalha reiteradamente  o tema “Esperança”, como a nos lembrar o horizonte da Tradição de Jesus, a ser constantemente testemunhado pelo seus discípulos e discípulas. Trata-se de manter sempre aceso o horizonte do Reino de Deus, bem como os caminhos compatíveis com este horizonte. Disto tem dado prova, ontem como hoje, proféticas experiências de figuras coletivas e individuais. Em seu livro “A Profecia na Igreja”, Pe José Comblin faz questão de dedicar um capítulo, fazendo memória de dez Bispos latino-americano que ele chama de “Santos Padres da América Latina”. Nesta lista ele inclui figuras como Dom Oscar Romero, Dom Helder Câmara, para mencionar apenas dois exemplos.

 

Em busca de mantermos acesso este horizonte do “esperançar”, somos chamados a assumir, a cada dia, o compromisso de continuar firmes nesta caminhada. Por meio da perseverança, somos interpelados pelo Evangelho a contribuirmos pessoal e comunitariamente com o anúncio da boa nova, especialmente pela força do testemunho. Neste sentido, somos fortemente inspirados pelo espírito do Ressuscitado a exercitar continuamente a memória coletiva e pessoal dos discípulos e discípulas do movimento de Jesus, de ontem (as Comunidades cristãs primitivas, João Crisóstomo, Basílio, Francisco de Assis, Clara de Assis os Valdenses, as Beguinas, Frei António de Montesinos, Frei Bartolomeu de Las Casas,Pe José Antônio Ibiapina), e de hoje (irmã Dorothy, Pe José Comblin e tantos outros).

 

A partir da fala de Alder Júlio, foi aberto um momento de diálogo, com as pessoas presentes fazendo comentários e questionamentos. Um desses questionamentos chamou especial atenção: João Batista, Frei Roberto e Glaudemir,  cada qual à sua maneira, manifestaram preocupação,  entre nós, de certa desarticulação. Em que pese a apresentação, nestes casos,  de algum tipo de justificativa, somos todos chamados a fazer autocrítica de nossa parcela de responsabilidade, na perspectiva de nos mantermos firmes na caminhada.

 

A partir das 17 horas, com a coordenação de Luís Barros e João Batista, teve início a celebração litúrgica, em frente ao auditório.iniciou-se com a animação cultural oferecida pela Comunidade Carinhena dos crioulos forte momento de memória, por meio dos cantos e da ciranda,da resistência Quilombola. Com a relevante participação dos membros da Fraternidade do Discípulo Amado (João Batista, Claudemir, Luiz Barros), após a execução de hinos litúrgicos, diante da fogueira acesa, prenunciando a Ressurreição de Jesus, os participantes foram convidados a saírem em procissão até a Quadra, onde, presidida por Dom Frei Luiz Flávio Cappio, Bispo de Barra- BA, deu-se sequência a Concelebração Eucarística.

 

Vivíamos, na ocasião – festa da Anunciação de Maria, Mãe de Jesus – uma profunda experiência de Fé, bem presente em toda a sequência litúrgica, inclusive por meio dos cantos e de uma rica simbologia cuidadosamente preparada pela Equipe de Liturgia, animada por Luiz Barros.

 

Outro ponto marcante da celebração foi o da homilia feita por Frei Luiz Cappio, que testemunhou um profundo exercício de escuta e de partilha, ao longo da Romaria, acentuando a importância do testemunho perseverante do Evangelho pelos discípulos e discípulas do Seguimento de Jesus. Frei Luiz tratou de ressaltar, com ênfase, nossa missão de cuidar da Mãe Natureza, bem como compartilhar a homilia com outros concelebrantes. Um deles, Pe. Isaias, ao enfatizar a importância do agir, lembrou também o Pe. Ibiapina, para quem importa orar “com as mãos e os pés”, enquanto outro presbítero destacava a relevância do nosso cuidado em relação à emergência climática, com gestos concretos no dia-a-dia.

 

A Celebração Eucarística foi encerrada com a benção de Frei Luiz, que, antes de abençoar, generosamente houve por bem chamar duas pessoas com nula ou baixíssima visão, para se postarem ao seu lado, considerando o empenho de Eliseu e de Alder em se manterem firmes na caminhada com a graça de Deus. Os participantes voltaram ao refeitório para a partilha da ceia. Em seguida, algumas caravanas vindas de mais longe, tiveram que partir enquanto uma parte permaneceu até a manhã do dia seguinte.

 

Voltamos todos alegres e agradecidos ao Deus da Vida, por esses momentos abençoados, cada grupo retornando às suas respectivas comunidades: uns para Mato Grosso (São Félix do Araguaia), outras pessoas para o Piauí, outras pra Bahia (Juazeiro, Barra), outras para Sergipe (Propriá, Poço Redondo…), Alagoas, Pernambuco (Arcoverde, Recife, Petrolina…), Paraíba (Alagoa Grande, Guarabira, Solânea, Bayeux, Mamanguape, João Pessoa…), Rio Grande do Norte, Ceará, também agradecidos pela contribuição de tanta gente que não pôde estar fisicamente presente, além de outras pessoas da caminhada que já fizeram sua Páscoa definitiva. Ficamos mais fortalecidos e mais convictos de que “A Esperança dos pobres vence e renova a Vida”.

 

João Pessoa 31 de Março 2023.

Foto: Padre José Comblin

O Papa: Cristo impele-nos a procurá-lo e amá-lo nos abandonados

Por Raimundo de Lima

Cristo na cruz se fez solidário conosco a fim de que possa cada um de nós dizer: nas minhas quedas, na minha desolação, quando me sinto traído, descartado e abandonado, Tu estás presente, Jesus; quando não aguento mais, Tu estás lá, estás comigo; nos meus «porquês» sem resposta, estás comigo. Foi o que disse o Papa na Missa deste Domingo de Ramos, início da Semana Santa, celebrada na Praça São Pedro com a tradicional e solene procissão de ramos

Cristo, abandonado, impele-nos a procurá-Lo e a amá-Lo nos abandonados. Porque neles, não temos apenas necessitados, mas temo-Lo a Ele, Jesus Abandonado, Aquele que nos salvou descendo até ao fundo da nossa condição humana. Por isso deseja que cuidemos dos irmãos e irmãs que mais se parecem com Ele, com Ele no ato extremo do sofrimento e da solidão: disse o Papa na Missa este Domingo de Ramos (02/04), celebrada na Praça São Pedro com a tradicional e solene procissão de ramos. Um momento comovente numa praça com mais de cinquenta mil fiéis e peregrinos, com os ramos de oliveira provenientes da região italiana da Úmbria.

«Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste?»: é a invocação que a Liturgia nos fez repetir hoje no Salmo Responsorial (Sal 22), sendo também – no Evangelho que ouvimos – a única pronunciada na cruz por Jesus. Representam, pois, observou Francisco, as palavras que nos conduzem ao coração da paixão de Cristo, ao ponto culminante dos sofrimentos que padeceu para nos salvar.

Sofrimentos do corpo e da alma

Muitos foram os sofrimentos de Jesus. Foram sofrimentos do corpo: das bofetadas às pancadas, da flagelação à coroa de espinhos, até à tortura da cruz. Foram sofrimentos da alma: a traição de Judas, as negações de Pedro, as condenações religiosa e civil, a zombaria dos guardas, os insultos ao pé da cruz, a rejeição de tantos, a falência de tudo, o abandono dos discípulos. E, contudo, prosseguiu o Pontífice, no meio de todo este sofrimento, restava a Jesus uma certeza: a proximidade do Pai. Ele tinha dito: «Eu e o Pai somos um», «Eu estou no Pai e o Pai está em Mim». Mas agora acontece o impensável; antes de morrer, clama: «Meu Deus, meu Deus, porque Me abandonaste

“O Papa ressaltou que estamos perante o sofrimento mais dilacerante, o do espírito: na hora mais trágica, Jesus experimenta o abandono por parte de Deus. Antes disto, nunca chamara o Pai pelo nome genérico de Deus.”

Na Bíblia, o verbo «abandonar» é forte; aparece em momentos de dor extrema: em amores fracassados, rejeitados e traídos; em filhos enjeitados e abortados; em situações de repúdio, viuvez e orfandade; em casamentos gorados, em exclusões que privam dos laços sociais, na opressão da injustiça e na solidão da doença: em suma, nas mais drásticas dilacerações dos vínculos. Cristo levou tudo isto para a cruz, ao carregar sobre Si o pecado do mundo. E, no auge, Ele – Filho unigênito e predileto – experimentou a situação mais estranha no seu caso: a distância de Deus.

Fez-Se solidário conosco até ao ponto extremo

Mas – podemos perguntar-nos – porque foi tão longe? A resposta é uma só: por nós. Fez-Se solidário conosco até ao ponto extremo, para estar conosco até ao fim, para que nenhum de nós se possa imaginar sozinho e irrecuperável. Experimentou o abandono para não nos deixar reféns da desolação e permanecer ao nosso lado para sempre, enfatizou o Pontífice.

Irmão, irmã, Ele o fez por mim, por ti, para que, quando eu, tu ou qualquer outro se vir encurralado à parede, perdido num beco sem saída, precipitado no abismo do abandono, sorvido no redemoinho dos «porquês», saibamos que há uma esperança. Não é o fim, porque Jesus esteve ali e agora está contigo: Ele, o Pai e o Espírito sofreram a distância causada pelo abandono para acolher no seu amor todas as nossas distâncias. A fim de que possa cada um de nós dizer: nas minhas quedas, na minha desolação, quando me sinto traído, descartado e abandonado, Tu estás presente, Jesus; nos meus falhanços, estás comigo; quando me sinto transviado e perdido, quando não aguento mais, Tu estás lá, estás comigo; nos meus «porquês» sem resposta, estás comigo.

Hoje, tantos «cristos abandonados»

É assim que o Senhor nos salva, a partir de dentro dos nossos «porquês». De lá, descerra a esperança. Um amor assim, que dá tudo por nós, até ao fim, pode transformar os nossos corações de pedra em corações de carne, capazes de piedade, ternura e compaixão, prosseguiu o Santo Padre.

Há hoje tantos «cristos abandonados». Há povos inteiros explorados e deixados à própria sorte; há pobres que vivem nas encruzilhadas das nossas estradas e cujo olhar não temos a coragem de fixar; migrantes, que já não são rostos, mas números; reclusos rejeitados, pessoas catalogadas como problemas. Mas há também muitos cristos abandonados invisíveis, escondidos, que são descartados de forma «elegante»: crianças nascituras, idosos deixados sozinhos, doentes não visitados, pessoas portadoras de deficiência ignoradas, jovens que sentem dentro um grande vazio sem que ninguém escute verdadeiramente o seu grito de dor.

As pessoas rejeitadas e excluídas são ícones vivos de Cristo

Francisco exortou-nos a lembrar sempre que Jesus abandonado nos pede para termos olhos e coração para os abandonados. Para nós, discípulos do Abandonado, ninguém pode ser marginalizado, ninguém pode ser deixado a si mesmo; porque – recordemo-lo – as pessoas rejeitadas e excluídas são ícones vivos de Cristo, recordam-nos o seu amor louco, o seu abandono que nos salva de toda a solidão e desolação.

Em sua homilia, ressaltando a presença de Cristo nos abandonados de hoje e de sempre, deixando por um momento o texto previamente preparado, Francisco lembrou um morador de rua que havia encontrado abrigo sob a cobertura da colunata da Praça São Pedro (Colunata de Bernini) e que meses atrás veio a falecer, ressaltando que Jesus está com cada um desses irmãos abandonados.

Está com cada um deles, abandonados até à morte. Penso algumas semanas atrás, num morador de rua alemão que morreu na colunata, sozinho, abandonado. É Jesus para cada um de nós. Muitos precisam da nossa proximidade, são muitos os abandonados. Também eu preciso que Jesus me acaricie, esteja próximo a mim e por isso vou encontrá-Lo nos abandonados, nos que estão sós.

Peçamos hoje, concluiu o Santo Padre, esta graça: saber amar Jesus abandonado e saber amar Jesus em cada abandonado. Peçamos a graça de saber ver e reconhecer o Senhor que continua a clamar neles. Não permitamos que a sua voz se perca no silêncio ensurdecedor da indiferença. Não fomos deixados sozinhos por Deus; cuidemos de quem é deixado só. Então, só então, faremos nossos os desejos e os sentimentos d’Aquele que por nós «Se esvaziou a Si mesmo».

Fonte: Vatican News

Ramos da esperança para a humanidade

A Semana Santa começa com o Domingo de Ramos. A celebração deste domingo começa pela bênção e procissão de ramos. Neste rito inicial se proclama o evangelho que conta a entrada de Jesus em Jerusalém.

O costume de fazer a procissão, na qual todos levam ramos nas mãos, vem da Igreja de Jerusalém. Depois da bênção de ramos e da procissão, a celebração deste domingo retoma a antiga tradição romana do domingo da Paixão. Na eucaristia, além do cântico de Isaías sobre o Servo Sofredor e o hino da carta aos filipenses, se lê o relato da paixão de Jesus, conforme um dos evangelhos sinóticos (neste ano A lemos Mateus). É o único domingo do ano, no qual a liturgia tem dois evangelhos. No começo da celebração, se lê o evangelho de ramos: Mateus 21, 1 – 11. É o relato da entrada de Jesus em Jerusalém que proponho meditar hoje. Meditaremos sobre a paixão de Jesus na  sexta-feira santa[1].

No Brasil, a bênção e procissão de ramos sempre foi um rito muito popular, já que a maioria das pessoas gosta de procissões e quer levar o ramo bento para colocar nas portas ou paredes da casa como sinal de bênção. Atualmente, com a revalorização da espiritualidade ecológica, este rito deve tomar cuidado para não significar corte de árvores e seja, ao contrário, ocasião para uma valorização das plantas e dos ramos como sacramentais do amor divino. Nas tradições afro-brasileiras, os cultos de tradição Yorubá valorizam Ossaim, o Orixá das folhas e das matas e há vários ritos nos quais as folhas são fundamentais. No Candomblé se diz: “Cosi Ewé, cosi Orijá” (Sem folha, não há Orixá). É importante que a bênção e a procissão de ramos possa retomar essas tradições populares e dialogar com essas culturas.

Com esse espírito de comunhão com as culturas do nosso povo, meditemos o evangelho de Ramos. Conforme João, durante sua vida de adulto, Jesus teria ido a Jerusalém, ao menos três vezes, para as festas mais importantes do ano. Nos evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas, Jesus só vai uma vez a Jerusalém e é para celebrar a sua Páscoa e dar a sua vida. Assim, esses evangelhos resumiram várias peregrinações de Jesus em Jerusalém em uma só e contam que Jesus entrou na cidade santa, montado em um jumento e com o povo que vinha do interior e também entrava na cidade, aclamando-o como Messias e Libertador.

Conforme esses evangelhos, esse fato teria ocorrido quando ele subiu a Jerusalém para celebrar a Páscoa. No entanto, escrevem que o povo o acompanhava agitando ramos nas mãos e cantava versos do salmo 118 (Bendito o que vem em nome do Senhor. Hosana!). Na época de Jesus, esse gesto e esse salmo faziam parte dos ritos não da Páscoa e sim da  festa das Tendas (Sucot), que até hoje, as comunidades judaicas celebram no outono (em setembro) e recorda a caminhada dos hebreus no deserto na esperança da libertação. É uma festa centrada na esperança messiânica, portanto, na fé de que a libertação não foi só do passado, mas na esperança da libertação definitiva e o mais cedo possível.

Ao menos uma vez, nessa ocasião da entrada em Jerusalém, Jesus assumiu o papel de Messias que vem assumir o seu reinado, ou seja, vem reanimar a esperança de libertação do povo pobre. Jesus aceitou ser visto como Filho de Davi (descendente do rei) e ser aclamado pelo povo pobre como Libertador…

Mateus diz que ele fez isso, inspirado na profecia de Zacarias (Zc9, 9- 12). Por isso, entra na cidade não como rei vitorioso, montado em um cavalo branco e cercado de soldados. Jesus entra em Jerusalém, montado em um jumentinho e cercado por lavradores e gente do campo, a maioria pobre e carente. Muitos desse povo esperavam que ele viesse ocupar o trono de um futuro Israel libertado dos romanos. Por isso gritavam: “Filho de Davi!”.

Não era esse o projeto de Jesus. Por sua atitude e o modo como entrou em Jerusalém, deixou claro: a libertação só virá através dos próprios pobres. Como diz a canção: “Eu acredito que o mundo será melhor, quando o menor que padece acreditar no menor”.

Jesus transforma a procissão litúrgica de ramos em marcha social e política dos pobres explorados da Galileia que entram na cidade cantando hinos de libertação como o salmo 118 e gritando Hosana! Parece que historicamente essa expressão aramaica foi mal entendida. A Igreja a interpretou como expressão de louvor. E colocou nas missas: Santo, santo, santo… Hosana nas alturas!. Mas em aramaico, hosana significa “liberta-nos agora”. Não era tanto aclamação de louvor e sim grito quase desesperado de pedido de socorro.

Diante dessa manifestação social e política de Jesus e do povo da roça, entrando na cidade, as reações da elite da cidade e das autoridades são de receio e rejeição. Medo dos romanos. Medo de serem vistos como aliados dos subversivos do campo. No evangelho de hoje, Mateus diz que “toda a cidade de Jerusalém estremeceu”. O verbo é o mesmo que o evangelho usa para dizer que quando Jesus morreu, a terra tremeu. Lucas diz que os chefes vieram pedir a Jesus que mandasse os discípulos e o povo se calarem. E Jesus responde: Se eles se calarem até as pedras gritarão! Já o povo pobre que o acompanhava conclui que quem está ali é o profeta Jesus de Nazaré da Galileia. Então, Jesus não entra na cidade como rei e sim como profeta. É como profeta da esperança da libertação que ele quer, hoje, ser acolhido na Jerusalém nova que é a nossa vida e nossas comunidades.

Hoje, nossos ramos sejam como a flor que uma pessoa apaixonada oferece à outra e significa o amor que se partilha. Que possamos assumir a tarefa das pequenas libertações mas que às vezes doem tanto. Pode ser o ramo que é libertar uma palavra que até aqui não sentíamos força de dizer. Pode ser o ramo, sinal de amizade que hesitávamos em fazer. Será sempre o ramo da coragem de sermos generosos.

Que esses ramos simbólicos vão nos fazendo acumular  energia para as vigílias pela democracia, os bate-panelas para protestar contra o poder que oprime.  Os ramos  revelam o mais importante: pertencemos a uma rede de solidariedade e de comunhão nessa nova Páscoa que vamos celebrar.

Deixo com vocês um poema do nosso querido patriarca e profeta Dom Pedro Casaldáliga:

“E chegarei de noite, 

com o feliz espanto, 

de ver, por fim, 

que andei, dia após dia, 

sobre a palma da tua mão”.

[1] – Para quem quiser meditar sobre os relatos próprios da paixão de cada evangelho, coloco a seguir a meditação da paixão de Jesus segundo Mateus, lida no Ano A.

2023, 100 anos de Pe. José Comblin (1923-2011): Profeta da Liberdade 

Primeiros passos 

A equipe de Organização da Semana Teológica Pe. José Comblin, agora em sua 13ª edição, já realizou seus primeiros encontros deste ano no Centro de Formação Pe. José Comblin, em Café do Vento, município de Sobrado- PB, nos dias 05/02 e 05/03, com o objetivo de empreender os primeiros passos na organização da XIII STPJC.

Dando sequência aos trabalhos da primeira reunião, os membros da Equipe da Organização, vinculados a vários grupos (Kairós, CPT, Grupo Comblin, Teologia Nordeste, CEBs, Egressos da Escola de Formação Missionária de Mogeiro/Santa Fé, CEBI, Coletivo Feminista, entre outros). Todos bem acolhidos pelo Pe. Herminio Canova, trataram de definir o tema geral e os temas conexos da XIII STPJC, além de compartilharem diversas informações, notícias, relatos de experiências, tendo iniciado com o momento habitual de espiritualidade, refletindo sobre a Transfiguração, com base no Evangelho do II Domingo da Quaresma, sobre a narrativa da Transfiguração. Sempre com o apoio do ofício Divino das Comunidades, após o momento da Recordação, foram partilhadas valiosas experiências individuais e comunitárias, associadas ao tema da transfiguração.

Contando com a presença e a participação de Pe. Hermínio, Edna, Andreza, Tânia, Elenilson, Elinaide, Glória, Maria José (responsável pelo saboroso almoço) e Alder, tratou-se de compartilhar informações diversas, dentre as quais:

  • Os preparativos da próxima Romaria celebrativa do centenário do Pe. José Comblin, a acontecer no Santuário de Santa Fé (Solânea-PB), nos dias 24, 25, e 26 de março;

  • Os passos que estão sendo dados para a realização em Rondonópolis;

  • MT, em julho próximo, do XV intereclesial das CEBs;

  • A publicação pela Editora Paulus do livro Póstumo de Comblin, “O Espírito Santo e a Tradição de Jesus” (terceira versão), a sair nos próximos dias;

  • A programação dos cursos de formação para membros da CPT (Regional nordeste 2).

 

Acerca dos preparativos para a próxima Romaria Missionária, celebrativa do centenário do Pe. José Comblin, importa conhecer parte da programação prevista para o dia 25/03:

Serão oito grupos com um assessor e uma secretária em cada grupo, na qual terá as seguintes temáticas:

1. Igreja – Povo de Deus João Batista(coordena)  Magal (secretaria)

2. A Missão e Igreja em Saída Pe. Hermínio (coordena) Anunciada (secretaria)

3. Os Pobres no centro do Evangelho Pe. Isaías (coordena) Milena (secretaria)

4. A Ação do Espírito Santo Monica (coordena)  Marta (secretaria)

5. Viver na Esperança Helvídio (coordena) Aline(secretaria)

6. Seguindo o Caminho de Jesus Frei Roberto (coordena) Valnice ( secretaria)

7. Vocação para a Liberdade Ana Claudia (coordena) Valberto (secretaria)

8. O anúncio do Reino no mundo presente Glaudemir (coordena) Paulinho (secretaria)

 E para a grande plenária e síntese geral: Alder Júlio.

Passando em seguida, para a discussão da pauta principal – a organização das Jornadas Comunitárias e da Sessão de Encerramento da XIII STPJ – , Pe. Hermínio rememorou temas e passos refletidos, na reunião precedente. Após a roda de conversas entre os participantes da reunião, chegou-se a um consenso sobre o tema central e os temas conexos da XIII STPJC. Ficou acordado como tema central “2023, 100 anos de Pe.José Comblin (1923-2011): Profeta da Liberdade”, a ser refletido quando da sessão de Encerramento, marcada para o dia 23 de setembro próximo, com a participação de um convidado, cujo nome será divulgado oportunamente, após os contatos com o mesmo.

Com relação aos temas conexos, locais, datas e convidados/convidadas, chegou-se ao seguinte entendimentos:

Ficou combinado o tema conexão “A trajetória itinerante do Missionário Pe. José Comblin” tema a ser vivenciado na primeira Jornada Comunitária, a ser realizada na Casa Jardim dos Sonhos, em Várzea Nova, no próximo dia 10 de junho, tema para o qual está sendo contactada uma  pessoa  com larga experiência no assunto, cujo nome divulgaremos, oportunamente.

A segunda Jornada Comunitária está prevista para ser realizada, em Santa Rita no dia 15 de julho próximo, sobre o tema conexo “Pe. José Comblin, um Educador Popular” oportunamente, serão conhecidos o local preciso e a pessoa convidada a ajudar a refletir sobre o tema.

A terceira Jornada Comunitária versará sobre a dimensão profética do Pe. José Comblin, a ser realizada em Bayeux (em local a ser conhecido em breve), para o que também contaremos a participação especial de um amigo de Comblin, a ser brevemente confirmado.

Após a definição dos temas da XIII STPJC, as pessoas participantes foram convidadas pelo Pe. Hermínio, nosso anfitrião, após um brinde, a nos servirmos de um saboroso almoço preparado por Maria José.

 

João Pessoa, 10 de março de 2023

Papa no Angelus: não ceda à dor e ao pessimismo, Deus está perto de nós!

Por Silvonei José

Francisco no Angelus deste domingo: “talvez também nós, neste momento, carregamos em nossos corações algum peso ou algum sofrimento, que parecem nos esmagar. Então é hora de remover a pedra e sair ao encontro de Jesus, que está próximo”.

“Não ceda ao pessimismo que deprime, ao medo que isola, ao desânimo pela recordação de más experiências, ao medo que paralisa”! O Papa Francisco introduzindo a recitação do Angelus comentou a passagem do Evangelho deste V Domingo da Quaresma, a ressurreição de Lázaro, “querido amigo de Jesus”, para sublinhar que Jesus “dá vida mesmo quando parece não haver mais esperança” e “convida-nos a não deixar de acreditar e esperar, a não nos deixarmos esmagar por sentimentos negativos”.

“Acontece, às vezes, sentir-se sem esperança, aconteceu com todos, ou encontrar pessoas que perderam a esperança: amarguradas”, com “um coração ferido”, “por causa de uma perda dolorosa, uma doença, uma decepção, um erro ou uma traição sofrida, por um grave erro cometido”, observou o Pontífice.

“Às vezes ouvimos as pessoas dizerem: ‘Não há mais nada a ser feito!’ e fecha a porta a toda esperança. Estes são momentos em que a vida parece um sepulcro fechado: tudo é escuro, ao redor vemos apenas dor e desespero”. Em vez disso, Jesus “nos diz que isto não é assim, o fim não é este, que nestes momentos não estamos sozinhos, pelo contrário, que precisamente nestes momentos Ele se aproxima mais do que nunca para restaurar nossa vida”. Jesus chora, o Evangelho diz que ele chora diante do sepulcro de Lázaro, e Jesus chora conosco, como chorou por Lázaro: o Evangelho repete duas vezes que ele se comoveu e sublinha que Ele chorou”.

Jesus, continua Francisco, “aproxima-se de nossos sepulcros e nos diz, como então: ‘Tire a pedra'”. “Tire a pedra: a dor, os erros, também os fracassos, não os escondam dentro de vocês, em um quarto escuro e solitário, fechado”. Tire a pedra: tire tudo o que está dentro, jogue-a em mim com confiança, sem medo, porque estou com você, amo você e desejo que viva novamente”.

E, como a Lázaro, acrescenta o Papa, “repete a cada um de nós: vem para fora! Levante-se, retome o caminho, recupere a confiança! Eu levo você pela mão, como quando você era uma criança aprendendo a dar seus primeiros passos”. “Tire as ataduras que o prendem, por favor não ceda ao pessimismo que deprime, não ceda ao medo que isola, não ceda ao desânimo por causa da recordação de más experiências, não ceda ao medo que paralisa. Eu o quero livre e vivo, não o abandonarei e estou com você”. “Não se deixe aprisionar pela dor, não deixe morrer a esperança: volte à vida”. “Eu pego você pela mão e trago você para fora” da escuridão, diz Jesus.

Esta passagem, capítulo 11 do Evangelho de João, nos faz tão bem lê-la, enfatiza o Papa. “É um hino à vida”, diz, “e nós o lemos quando a Páscoa está próxima. Talvez também nós, neste momento, carregamos em nossos corações algum fardo ou algum sofrimento, que parece nos esmagar. Alguma coisa ruim, algum pecado feio, algum erro da juventude”, acrescenta Francisco.

“Então é o momento de remover a pedra e sair ao encontro de Jesus, que está próximo”. “Conseguimos abrir nossos corações e confiar nossas preocupações a Ele? Abrir o sepulcro dos problemas e olhar para além da soleira, em direção à sua luz? Ou será que temos medo disso? E, por sua vez, como pequenos espelhos do amor de Deus, será que conseguimos iluminar os ambientes em que vivemos com palavras e gestos de vida? Damos testemunho da esperança e da alegria de Jesus? Nós pecadores, todos nós?”.

Francisco dirigiu-se novamente aos confessores: “Caros irmãos, não esqueçam que vocês também são pecadores e no confessionário não sejam torturadores, mas perdoem tudo”.

O Papa concluiu: “Maria, Mãe da Esperança, renove em nós a alegria de não nos sentirmos sozinhos e o chamado a levar luz à escuridão que nos circunda”.

Fonte: Vatican News

Papa Francisco. Ângelus

Estimados irmãos e irmãs, bom dia, feliz domingo!

Hoje, segundo domingo do Advento, o Evangelho da Liturgia apresenta-nos a figura de João Batista. O texto diz que «trazia um traje de pelos de camelo», que se «alimentava de gafanhotos e mel silvestre» (Mt 3, 4) e que convidava todos à conversão: «Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos céus» (v. 2). Ele pregou a proximidade do Reino. Em suma, um homem austero e radical, que à primeira vista pode parecer um pouco duro e incutir algum temor. Mas, então perguntemo-nos: por que a Igreja o propõe todos os anos como o principal companheiro de viagem durante este tempo de Advento? O que está por detrás da sua severidade, por detrás da sua aparente dureza? Qual é o segredo de João? Qual é a mensagem que a Igreja nos transmite hoje com João?

Na realidade, o Batista, mais do que um homem duro, é um homem alérgico à duplicidade. Por exemplo, quando fariseus e saduceus, conhecidos pela sua hipocrisia, se aproximam dele, a sua “reação alérgica” é muito forte! De facto, alguns deles, provavelmente vieram ter com ele por curiosidade ou oportunismo, pois João tinha-se tornado muito popular. Aqueles fariseus e saduceus sentiam-se justos e, perante o apelo do Batista, argumentavam dizendo: «Temos por pai a Abraão» (v. 9). Assim, entre duplicidades e presunção, não aproveitaram a ocasião de graça, a oportunidade de começar uma vida nova; estavam fechados na presunção de serem justos. Por isso João diz-lhes: «Produzi frutos dignos de arrependimento!», (v. 8). É um grito de amor, como o de um pai que vê o filho arruinado e lhe diz: “Não deites fora a tua vida!”. Com efeito, prezados irmãos e irmãs, a hipocrisia é o maior perigo, porque pode arruinar também as realidades mais sagradas. A hipocrisia é um grave perigo! É por isso que o Batista – como depois também Jesus – é duro com os hipócritas. Podemos ler, por exemplo, o capítulo 23 de Mateus, onde Jesus fala tão energicamente aos hipócritas da época! E por que fazem isto o Batista e também Jesus? Para os despertar. Mas, aqueles que se sentiam pecadores «iam ter com ele e eram por ele batizados»  (v. 5). É assim: para acolher Deus, não importa a habilidade, mas a humildade. Esta é a maneira de acolher Deus, não a bravura: “somos fortes, somos um grande povo…”, não, a humildade: “sou um pecador”; mas não em abstrato, não, “por isto, isso e auilo”, cada um de nós deve confessar, antes de mais a si mesmo, os próprios pecados, as próprias falhas, as próprias hipocrisias; devemos descer do pedestal e mergulhar na água do arrependimento.

Estimados irmãos e irmãs, João, com as suas “reações alérgicas”, faz-nos refletir. Não somos por vezes também um pouco como aqueles fariseus? Talvez olhemos para os outros de cima para baixo, pensando que somos melhores do que eles, que temos a nossa vida nas mãos, que não precisamos todos os dias de Deus, da Igreja, dos irmãos. Esquecemos que existe apenas um caso em que é lícito olhar para o outro de cima para baixo: quando é necessário ajudá-lo a levantar-se; o único caso, os outros não são lícitos. O Advento é um tempo de graça para tirar as nossas máscaras – cada um de nós as tem – e pôr-se na fila com os humildes; para nos libertarmos da presunção de acreditarmos que somos autossuficientes, para irmos confessar os nossos pecados, os escondidos, e receber o perdão de Deus, para pedirmos desculpa a quantos ofendemos. Começa assim uma nova vida. E o caminho é apenas um, o da humildade: purificar-nos do sentido de superioridade, do formalismo e da hipocrisia, para ver os outros como irmãos e irmãs, pecadores como nós, e ver em Jesus o Salvador que vem por nós – não pelos outros, por nós – como somos, com as nossas pobrezas, misérias e defeitos, sobretudo com a nossa necessidade de sermos levantados, perdoados e salvos.

E lembremo-nos de mais uma coisa: com Jesus há sempre uma oportunidade de recomeçar: nunca é tarde demais, há sempre a possibilidade de recomeçar. Tende coragem, Ele está próximo de nós e este é um tempo de conversão. Cada um pode pensar: “Tenho esta situação aqui dentro, este problema que me faz envergonhar…”. Mas Jesus está ao teu lado, recomeça, há sempre a possibilidade de dar um passo a mais. Ele espera por nós e nunca se cansa de nós. Nunca se cansa! E nós somos tediosos, mas Ele nunca se cansa. Ouçamos o apelo de João Batista para voltarmos a Deus, e não deixemos passar este Advento como os dias do calendário, pois este é um tempo de graça, de graça também para nós, agora, aqui! Que Maria, a humilde serva do Senhor, nos ajude a encontrar a Ele e aos irmãos no caminho da humildade, que é a única que nos fará ir em frente.

Fonte: Vatican News

(04/12/2022)

Nas veredas libertárias do Nazareno: Apontamentos acerca do livro “O Caminho”, de José Comblin

Nas veredas libertárias do Nazareno: Apontamentos acerca do livro de José Comblin. “O Caminho: Ensaio sobre o seguimento de Jesus”. São Paulo: Paulus, 2004.

Como lhe sói acontecer em suas obras, também em “O Caminho”, José Comblin dá sobejas provas de uma atualidade e vigência impactantes. Com efeito, 18 anos após a publicação deste Ensaio, não há como o leitor/a leitora não ficar profundamente mexido/mexida pela acuidade analítica do autor. Não foi por acaso que o grupo Kairós, que se tem empenhado na leitura e reflexão atentas da obra de Comblin, decidiu reler “O Caminho”. Nesta ocasião, ao ser avisado por Elena de que, ao final do livro, eu havia escrito 5 páginas de anotações sobre o livro. Surpreso, tomo a liberdade de compartilhar estes apontamentos a partir daqueles registros.

 

Já em sua introdução, ao brindar-nos com uma síntese panorâmica do ensaio, Comblin trata de situar historicamente o que, durante séculos, os teólogos abordam deste tema. Sem mencionar a figura de Joaquim de Fiore (1135 – 1202), Comblin comenta que a Igreja da Baixa Idade Média punha no amor o núcleo primeiro no Seguimento de Jesus. Com efeito, o que o Monge calabrês Joaquim de Fiore definia como tendo chegado a Idade do Espírito Santo (precedida pela Idade do Pai, caracterizada pela obediência, e pela Idade do Filho, marcada pela misericórdia), cuja principal marca é o amor, assim o Povo de Deus passava a viver sob este signo, o da liberdade, o da criatividade. A Idade Moderna, por sua vez, graças à ação reformadora de Lutero e seus seguidores, bem como a reação da Hierarquia Católica, passava a reger-se pela Fé, entendida como o cumprimento formal dos preceitos, dos princípios, das regras, do magistério eclesiástico, ao qual todos os demais setores da Igreja Católica deviam rígida obediência, distanciando-se assim, do Espírito do Evangelho. Enquanto isso, sublinha Comblin, a Idade Contemporânea é caracterizada pela vigência da Esperança

 

Nos capítulos que seguem, tratamos de esboçar um resumo aproximativo do que propõe o autor. Como já dito, Comblin começa pela Esperança.

A proposta bíblica é fundamentalmente escatológica, o ser humano sempre é caminho . O papel pedagógico dos profetas no Reino de Deus. A mensagem cristão é mensagem e esperança, sobretudo para os pobres: Importa ir à galileia. As 3 opções dos vencidos diante dos opressores: Submissão integradora, fuga ao passado ou resistência na esperança. Enjaulamento no medo das autoridades de falar, de reivindicar. Quem espera o reino trabalha para que ele comece a acontecer na sociedade pq (cf. 21-38)

 

Esperar é poder afirmar a necessidade de mudança radical. O sentido da revolta é destruir as opressões, elas são diferentes da esperança como expressão secularizada do advento do Reino, as revoluções ajudam a mudar. Revolução é preparada por um grupo mais dinâmico, não conta com a participação de todos. Após destruir inimigo, desafio maior é prestar atitude alternativa. Somente os pobres podem mudar, somente eles tem esperança (cf. 40-44)

 

Dirigentes partidários, não raramente, vivem longe do povo. Os cristão são protagonistas do movimento dos pobres Os novos movimentos valorizam a subjetividade, a mística. A esperança abrange a totalidade da vida (cf. 47-49)

 

Quem não age tem saudade. Jesus protagoniza mudança radical sem suprimir mudanças ulteriores. A teologia escolástica suprime de mudança para a cristandade, missão é para conquistas não para mandar. O Reino de Deus não é estrutura instalada definitivamente na história. Importa buscar sempre pois os limites do possível podem ceder. A figura de Francisco sugere que Jesus começa pelo corpo. Por isso era peregrino, caminhando peregrino aprende a aproveitar tudo sem se apegar a nada. Torna-se livre. O peregrino aprende a ser mais a cada dia. Na peregrinação nunca se caminha só, há todo um povo em movimento. A Esperança da vida eterna procede da esperança vivida do dia a dia. Não há esperança sem profeta. Este lembra da vocação da liberdade.Todos os cristãos são chamados a ser profetas. (cf. 50-72)

 

O segundo capítulo do livro versa sobre a fé.

 

Fé é diferente de representação intelectual. A fé primitiva dos primeiros cristãos repousa na simplicidade, foi a hierarquia que não aceitando a divergência de interpretação criou a ortodoxia. A condenação das CEBS e da Teologia da Libertação são um exemplo.O Espírito inquisitorial fez grandes estragos, inclusive na América Latina, recorrendo a imposição do pensamento único, a estratégia dos hierarcas consistia em deformar ao máximo o pensamento dos seus adversários, e imputar lhes autoria dos “erros”. De tão a frente a fé incorporou reis e imperadores. Reduzindo-se o entendimento da fé, forjando uma interpretação supostamente baseada na carta aos romanos, a partir daí, estabeleceu-se separação entre reino e mundo. Diante da posição protestante a Igreja Romana adota o sacramentalismo, o ritualismo, esquecendo o Amor descrito em 1 Cor 13. Nasce daí o enquadramento religiosos da vida clerical, só escaparam os beatos e benzedores, porque eram desprezados por serem analfabetos. A fé como iluminação que transforma a vida. Neste caso a fé é a porta de entrada para a esperança, e sem esperança pode se viver como ser biológico, mas não como ser humano (cf. 79-96)

 

A fé implica mediação, o olhar do outro.A fé provoca mudança, em alguns casos, mudança radical, a exemplo de Paulo e Francisco. Fé implica ação, por longo tempo reduziu-se Cristo a cruz, esquecendo-se ou omitindo-se a vida de Jesus. A fé implica renuncia ao poder: é a lição que extraímos do próprio Jesus (cf.Fp 2). Caminho é o nome que as comunidades cristãs primitivas davam à Jesus. Libertação é protagonismo dos pobres, não vem como dádiva dos poderosos. Seguir o Caminho implica seguir a verdade, ao contrário do que pleteia a lógica do marketing, de “dourar a pílula” para obter lucro. A tendência à institucionalização do Reino contrapõe-se ao movimento profética de afirmação da pobreza (cf.97-115)

 

A ressurreição de Jesus é o início da história, prova de sua efetiva presença por meio dos discípulos e discípulas. Mais do que venera-lo Jesus pede mesmo é que O sigamos. Libertando-nos de todas as dominações. Talvez por isso não se tenha chamado filho de Deus. Olhando a vida de Jesus pode-se sempre entender Deus. O Espírito Santo é a presença de Jesus, nos discípulos e discípulas, também acusados pelo mundo (os Poderosos). Quando todos calam, os discípulos levantam a voz, a exemplo dos que fazem os  mártires. O pretenso monopólio de Roma sobre o Espírito: O Espírito quer a diversidade ele segue as possibilidades históricas. Importa aprender a caminhar no escuro. O Vaticano II preferiu usar linguagem metafórica: invés de se impor um sistema de conceitos sobre quem é Jesus, importa procurar saber o que ele fez e queria, o grande problema reside nos descaminhos trilhados sobretudo pela hierarquia. (cf. 116-136)

 

Aceitação intelectual de todos os dogmas não é garantia de fé, a fé a porta da Esperança contra toda esperança (Rm 4-18). É o fundamento da nossa verdadeira vida, o edifício é o amor, a conversão é amorosa, opção pelo essencial que o convívio com os pobres favorece. O amor sustenta o mundo por estar sendo vivido na realidade dos pobres, confiar na transformação social pelo Estado é confiar na lei. O capitalismo é uma imposição dos poderosos. O amor que vem de Deus pode estar presente nas experiências humanas, inclusive na dimensão erótica e do Ághape. Deus não quer receber coisas, quer que amemos com o amor que Dele procede (cf. 1JO 4). O amor se realiza corporalmente, cabeça, mãos, pés, etc. A excelência de MT 25-35-36 como critério principal. Aquele que fez a pergunta a Jesus sobre qual era o maior mandamento, já sabia que era o Amor, mas só intelectualmente, precisava da prática, isto é da relação Deus-próximo (cf. 138-145)

 

O amor aos pobres é o núcleo do Cristão, ambos desaparecidas do cenário católico desde o século XIV, perseguição aos Espirituais. São Gregório Nazianzeno, o amor aos pobres não é opção é obrigação. São João Crisóstomo dizia que o começo e a raiz da riqueza é sempre uma ofensa à justiça. Importa perceber a força profética do olhar do outro: os pobres nos denunciam, nos anunciam. Formas de exclusão e inclusão dos pobres que deixaram de ser tratados como sujeitos históricos (cf. 146-151)

 

Em geral são minorias que lutam pela libertação. Apoiadas por lideranças proféticas o MST tem essa característica. Importa contar com lideranças autênticas próximas do povo e fiés ao mesmo. A compaixão leva a um compromisso coletivo e não individual, não considera a miséria uma fatalidade, sofrer com os excluídos. A compaixão de Jesus virou indignação contra os chefes.Testemunhos da indignação: Montesinos e Bartolomeu de las Casas. A indignação dos profetas da América Latina não é qualquer indignação. O fazer como critério da verdade vivida por Jesus. Importa combater a uniformização do pensamento único via televisão. Tecnologia a serviço de quem? O Capital converte o trabalho em produtos e o trabalhador em produtos e consumidores. Precedidas pelos neo pentecostais, as Igrejas a exemplo da sociedade transformam seus fiéis em consumidores de bens religiosos voltados para interesses imediatos e individualistas (cf. 158-201)

 

203 É de se lamentar que o que identifica o católico não é a prática do evangelho, mas os sinais exteriores. A verdadeira cultura cristã é a dos pobres. As democracias ocidentais defendem mesmo é a propriedade privada. Estamos numa época de trevas, num túnel que parece não ter fim. Jesus não deixou uma religião pronta, mas uma crítica a religião. O sacrifício já não é o que os homens oferecem a Deus, mas o que Deus oferece aos homens, o verdadeiro culto a Deus é oferecer-se para a prática da justiça. A ideologia do sacrifício requer um templo, os que seguem o movimento de Jesus hoje, atua lá onde estão os pobres e necessitados. Oração é aceitação do dom de Deus, é a missão.Na contemporaneidade observa-se o surgimento de nova religião fundada na emoção e gestos corporais. É um desafio para o Seguimento de Jesus usar a religião para anunciar o Evangelho.

 

Eis um breve resumo do livro de Comblin. Ao elaborá-lo, nosso objetivo é o de incentivar os leitores e leitoras a beberem na própria fonte.

 

João Pessoa, 01 de dezembro de 2022

Foto: Padre José Comblin