Arquivo da tag: Genocídio nunca mais

24M: Argentina volta às ruas no 45º aniversário do golpe civil-militar eclesiástico

Por Fernanda Paixão

Neste 24 de março, completam-se 45 anos da última ditadura civil-militar-eclesiástica da Argentina. Desde a volta da democracia, em 1983, a data é relembrada como o Dia da Memória, Verdade e Justiça, com uma marcha multitudinária, apenas interrompida em 2020 pela pandemia. A convocatória de 2021 convida a população para concentrar-se às 15h na praça Congresso e, em seguida, marchar em direção à Praça de Maio.

O chamado à memória é reforçado no termo “ditadura civil-militar-eclesiástica”, nomeando e relembrando a participação não só dos agentes militares nos anos de chumbo da Argentina, mas também de setores da sociedade civil e da Igreja Católica, esta última um elemento-chave no sequestro de bebês de mulheres grávidas perseguidas pela ditadura – e que fez originar o movimento de avós da Praça de Maio, em busca por suas filhas e netos desaparecidos.

Margaret Atwood, criadora da realidade distópica de “O conto da aia” (The Handmande’s Tale), inspirou-se no real caso de roubo de bebês sistemático durante a ditadura argentina para sua ficção.

A marcha resgata a memória dos 30 mil detidos desaparecidos durante o regime, e incorpora o repúdio ao pagamento da dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI), considerada ilegal, uma vez que o valor bilionário não foi contraído com o consentimento da população nem significou investimento em políticas sociais no país.

Além disso, a manifestação marca a luta contra a megamineração que ameaça o sul do país, pede a vacinação contra a covid-19 para todos, e reforça a exigência de prisão para os militares que feriram os direitos humanos durante o regime militar argentino.

Hoje, o retorno da marcha e a marca dos 45 anos tornam o dia especialmente emblemático.

O local do ato, onde se encontra a Casa Rosada, foi palco das históricas marchas que deram início à ainda persistente luta das mães da Praça de Maio, caracterizadas pelo lenço branco na cabeça, em busca dos familiares desaparecidos pela ditadura.

À época, as mulheres identificavam-se entre si com o lenço ao fazer as rondas na praça, sempre em movimento, uma vez que, sob as normas do regime ditatorial, eram proibidas as reuniões e concentrações em vias públicas.

O lenço é, ainda hoje, símbolo da luta pelos direitos humanos e do grito de “nunca mais”, reforçado a cada 24 de março no país.

Nora Cortiñas é uma referente do movimento de mães da Praça de Maio e, desde então, de todas as causas que cruzam a luta pelos direitos humanos. Ela é mãe de Carlos Gustavo Cortiñas, detido e desaparecido no dia 15 de abril de 1977 na estação de trem Castelar, em Buenos Aires, quando tinha apenas 24 anos.

“O partidarismo político nos separa muito das coisas que devemos denunciar. Em 45 anos, após a cruel ditadura civil-militar e religiosa, nos encontramos com as mesmas consignas, mas agora agregadas. Antes não existia o ‘não à megamineração’. Destruíam o país e não percebíamos”, afirmou em entrevista à ArgMedios.

Norita, como é chamada carinhosamente, completou 91 anos no último dia 22 de março. Assim como outras mães e avós da Praça de Maio, participará do retorno da histórica marcha pela memória, verdade e justiça virtualmente, com a projeção em um telão que será instalado na praça.

“Nós, como mães, participamos não apenas da busca pela Memória, Verdade e Justiça, como também acompanhamos as lutas pelos direitos econômicos, sociais, culturais e de gênero”, afirmou em uma entrevista à rádio, no dia do seu aniversário. Por isso, não hesitaram e convocaram a população à marcha neste 24 de março.

Edição: Rebeca Cavalcante

Fonte: Brasil de Fato

Nunca mais

Hoje na Argentina é o dia por Memória, Verdade e Justiça.

Data em que a sociedade se manifesta pela continuação das investigações que conduzam ao julgamento e punição dos responsáveis pelo genocídio que ceifou mais de 30.000 vidas durante a última ditadura cívico-militar (1976-1983).

São recordadas as vítimas do terrorismo de estado, que foram sequestradas, torturadas e desaparecidas pela ditadura de Videla. A cumplicidade da hierarquia da Igreja Católica Romana foi comprovada.

É imperioso que se investigue até a última cumplicidade civil nesta operação massacre. Saudamos as declarações do Presidente da Argentina, Alberto Fernández, em que manifesta a necessidade de estender cada vez mais as ações visando a inclusão social das pessoas em todo o território nacional.

Os Direitos Humanos continuam a ser a única base real de sustentação de regimes compatíveis com o respeito à dignidade da vida humana.

O preço da vida

A indiferença diante dos assassinatos de pessoas, seguida da impunidade, é um alerta. Mulheres, pessoas negras, pobres, vêm sendo assassinadas constantemente desde há muitos anos.

Quando um povo não reage a estas formas de extermínio, está abaixando a cabeça e abrindo espaço para a execução de um genocídio continuado.

Quando a vida não têm valor, surge a pergunta: o que é que tem algum valor? A pandemia têm posto a nu a natureza perversa do capitalismo. O lado mais brutal do ser humano vêm a tona quando há garantia de impunidade.

Um “presidente” da república estimula a matança e o uso de armas. O judiciário fecha os olhos diante do golpe de estado que destitui ilegalmente a Presidenta da República Dilma Rousseff.

A população entregue a si mesma para sobreviver ou morrer diante da pandemia e diante da morte anunciada. Cabe lembrar que se é assim de fato, se é a hora de cada um por si, estamos admitindo que foi abolida a ordem social.

Foi extinta a sociedade, uma vez que a existência social supõe a existência de limites. Se não há mais limites, se não há punição para o crime, se um Presidente da República como Lula pode ser perseguido, agredido, caluniado, condenado e preso sem provas, estamos sob o império da barbárie.

É preciso saber se estamos, como pessoas e como comunidade, como nação e como povo, dispostos a pagar esse preço. A história ensina que existe a consciência. Existe a noção de bem e de mal.

Nada obriga um policial ou um militar a ser um assassino. São opções. Qual está sendo a nossa opção como nação? Iremos mansamente ao matadouro? Ou seremos capazes de honrar a vida?

Santa Sé apoia esforços da ONU por Tratado sobre proibição de testes nucleares

A Santa Sé está pronta a apoiar todos os esforços da ONU para a entrada em vigor do Tratado de Proibição Total de Testes Nucleares (CTBT), assinado em 1996.

Esta posição é manifestada por monsenhor Frederik Hansen, encarregado dos assuntos da Missão do Observador Permanente da Santa Sé junto às Nações Unidas, em seu discurso na sede em Nova York em 26 de agosto, por ocasião de um encontro virtual pela comemoração e a promoção do Dia Internacional Contra os Testes Nucleares, a ser celebrado 29 de agosto.

“Passaram-se já três quartos de século desde que o primeiro teste de armas nucleares – indevidamente chamado de ‘Trinity’ – foi realizado no deserto do Novo México, nos Estados Unidos”, afirmou monsenhor Hansen.

“Desde então, já foram realizados mais de 2.000 testes, dos quais sete neste século – observou -, causando danos ambientais e afetando a saúde das pessoas que estavam próximas aos locais dos testes ou expostas à direção do vento à radioatividade liberada no atmosfera. É de se esperar que o teste nuclear realizado há três anos tenha sido o último”.

Por isso, é fundamental que a Comissão Preparatória do Tratado para a Proibição Total dos Testes Nucleares trabalhe em conjunto com os oito Estados cujas ratificações são necessárias para a entrada em vigor do Tratado – explicou -, e que esses Estados se convençam que a segurança nacional e internacional será fortalecida somente com a entrada em vigor do Tratado.

Novos testes nucleares, de fato, não farão outra coisa senão diminuir a segurança global e, portanto, a paz e a estabilidade de todos os membros da ONU e dos povos que eles representam, enfatizou. O Tratado, portanto, é um passo fundamental para a criação de um mundo sem armas nucleares.

Recordando as vítimas do 75º aniversário da bomba atômica, monsenhor Hansen exortou à retomada do espírito com o qual as Nações Unidas foram fundadas e a chegar todos juntos “não apenas à obrigação permanente e vinculante de nunca mais realizar testes com armas nucleares, mas à meta de um mundo sem armas nucleares: um objetivo ainda mais urgente no contexto de uma pandemia global”, que destacou ulteriormente o absurdo de utilizar recursos preciosos para a manutenção de armas de destruição quando no planeta muitas pessoas estão lutando para sobreviver.

Citando as palavras do Papa, pronunciadas durante sua visita a Hiroshima em novembro passado, monsenhor Hansen reiterou que “o uso da energia atômica para fins bélicos é hoje mais do que nunca um crime não só contra a dignidade do ser humano, mas contra qualquer futuro possível para o nosso lar comum” e que “o uso da energia atômica para fins bélicos é imoral, assim como é imoral a posse de armas nucleares”.

Vatican News Service – AP

Fonte: Vatican News

Notas de repúdio, além de inúteis, denotam mais covardia do que indignação

Por Leandro Fortes*
Pululam, nas redes sociais, lacrimosas notas de repúdio de radicais defensores da democracia contra o comício campestre feito por Jair Bolsonaro para o gado verde e amarelo postado no Setor Militar Urbano de Brasília, em frente ao Quartel General do Exército – aqui apelidado, por nós candangos e brasilienses, de “Forte Apache”.
Primeiro, o ato, em si.
Diante de um demente intoxicado pela própria insanidade, uma pequena multidão de fanáticos de extrema-direita ostentava faixas pedindo um novo Ato Institucional número 5, medida extrema tomada pela ditadura militar, em 1968, portanto, há 52 anos. O AI-5 fechou o Congresso Nacional, suspendeu o instituto do habeas corpus, suprimiu as liberdades individuais e serviu para prender opositores, torturar e matar presos políticos.
Não eram pessoas, portanto, que bradavam pelo fim da democracia, em frente ao Forte Apache. Eram fascistas, uma categoria de não humanos que, assim como o coronavírus, se dissemina como uma doença social quando o Estado de Direito está com a imunidade baixa. O fato de essa turba ser aliada ao vírus não é uma coincidência. Trata-se de afinidade epidemiológica.
Bolsonaro, enfiado numa camisa vermelha desbotada e dois números abaixo de seu manequim, intercalou as estultices de sempre com crises de tosse e perdas súbitas de equilíbrio. É um homem doente, desde sempre. Resta saber se há outras patologias que não as mentais, amplamente diagnosticadas.
O gado pró-AI-5 não requer muita observação. Trata-se de gente frustrada e infeliz, como são os fascistas, manadas exaustas de tanto carregar a própria mediocridade e que, agora, enxerga em Bolsonaro o messias de uma esperada era de estupidez. Pensam que, vingando-se do conhecimento, da ciência e da racionalidade que sempre os oprimiram, há de vir um admirável mundo novo onde cada indigente moral terá sua cota de felicidade, enfim.
Sim, são burros o bastante para acreditar nisso.
Volto às notas de repúdio.
Além de inúteis, denotam mais covardia do que indignação.
*Jornalistas pela Democracia
Fonte: Brasil 247
(20-04-2020)

De que lado você está?

A humanidade não têm tendência. Ou você é humano/a ou não é. Muita gente faz de conta, tenta fazer crer que se preocupa com quem sofre, com as pessoas excluídas, com quem passa fome. Mas você não pode fingir que é humano/a. Ou é ou não é.
Aprendi com a minha história de vida que a humanidade não se divide em esquerda ou direita, crentes ou ateus, etc. Há toda uma indústria que tenta nos convencer do contrário. A direita seria quem se ocupa do poder e do dinheiro, da dominação e da exploração, e a esquerda seria quem se ocupa da justiça social e dos direitos, das condições de vida dos menos favorecidos.
O que eu aprendi com a minha experiência de vida é que esquerda e direita são dois lados da mesma moeda. Dois lados do poder. Pessoas que procuram o poder tendem a se desincumbir do ser humano. O poder nos torna cegos/as. Percebi isto na universidade, no movimento estudantil, nos grupos espirituais e/ou religiosos.
Meu foco está em um lugar anterior, um lugar em que o que conta é a pessoa. Creio que isto permaneceu em mim desde o começo. Ainda hoje tenho uma prevenção, uma espécie de detector, um sinal de alarme, quando vejo pessoas que se mostram como demasiadamente identificadas com uma crença ou ideologia, com uma instituição. Aí têm.
Depois do golpe de estado de 1976 na Argentina, tratei de compreender o que é que tinha acontecido. Comecei a pesquisar e a estudar. Li relatórios da Conadep (Comissão Nacional sobre Desaparecimento de Pessoas), do CIDH-OEA, da OPS-OMS. Percebi que o que tinha acontecido fora uma guerra de um estado terrorista contra a população civil desarmada.
A imprensa repetia a versão dos golpistas de que tinha se tratado de uma operação de limpeza para salvar a Argentina do comunismo. Não fora um confronto de esquerda versus direita. Fora uma operação de extermínio orientada a quebrar psicologicamente a população.
Finda a ditadura certos setores e personagens tentaram se apropriar de uma vitória que na verdade se deveu mais à ação das Madres de Plaza de Mayo do que a qualquer outro setor ou movimento. Tentaram roubar a história e a memória. Os genocidas e seus apoiadores foram julgados e condenados por tribunais comuns, num fato inédito no mundo.
Essa história não pode se repetir nunca mais. Nunca mais campos de concentração na Argentina. Nunca mais tortura, sequestro, desaparição de pessoas. Esta reflexão tenta resgatar um eixo, um foco, que para mim deve presidir não esta ou aquela atividade interna ou externa, mas o dia a dia.
A defesa dos direitos humanos não pode ser uma ação esporádica ou eventual. Há de ser um agir contínuo e integrado. Uma convergência independente de qualquer ideologia ou doutrina, no cuidado e na promoção da vida humana em todas suas dimensões. Um exercício pessoal e comunitário em que o valor da vida esteja sempre presidindo, orientando e motivando, mobilizando, abrindo espaços, animando a criatividade, expandindo horizontes.