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Os inocentes úteis e os totalitários inúteis

O advogado Jonas Tadeu Nunes afirma que seu cliente Caio Silva de Souza e outros jovens recebiam pelo menos R$ 150 cada para provocarem distúrbios durante as manifestações de protesto. E que os contratantes lhes forneciam, inclusive, as fantasias de black blocs.
Pode ser verdade. Afinal, é fácil e barato de se fazer. E há sempre forças políticas interessadas em fomentar o caos, os famosos pescadores em águas turvas [1].
O certo é que, no fundamental, constata-se nas ruas um imenso desencanto com as consequências do capitalismo (embora a maioria ainda não esteja consciente de que seja ele a causa)  e com os governos que para elas concorrem, inclusive os do PT.
secundário são as peripécias das refregas que causam vítimas de ambos os lados.
Umas são pranteadas e praticamente canonizadas pela grande imprensa e pelos defensores virtuais dos interesses petistas, como o cinegrafista Santiago Ilídio de Andrade. Os responsáveis devem ser punidos, claro, mas nem de longe se justifica tão histérica satanização de jovens que não se davam conta do dano que poderiam causar.
Num país em que tantos matam premeditadamente e com extrema crueldade, é patético que os maiores vilãos acabem sendo uns tolos que mataram sem consciência e por inconsequência (se comprovado que terceiros guiavam suas mãos, estes merecem castigo muito mais rigoroso, pois os mandantes são sempre maiores culpados do que os executantes).
 
Outras vítimas são vergonhosamente escamoteadas pela mídia. O caso mais emblemático e chocante não se deu exatamente no curso dos protestos, mas tem de ser lembrado sempre: Ivo Teles da Silva, 69 anos, foi bestialmente espancado pela PM de Geraldo Alckmin durante o episódio conhecido como a barbárie no Pinheirinho, por ela sequestrado e mantido longe dos parentes que o procuravam desesperadamente. Tudo isto para esconder seu estado deplorável; para que a opinião pública não tomasse conhecimento da barbarização de um idoso. Só foi localizado 10 dias depois, teve alta mas acabou morrendo.
Luminares do Direito brasileiro, dentre eles Celso Antonio Bandeira de Mello, Dalmo de Abreu Dallari e Fabio Konder Comparato, entenderam que havia sido cometido um crime e como tal o denunciaram (juntamente com as muitas outras ilegalidades perpetradas no Pinheirinho) à Comissão de Direitos Humanos da OEA. A indústria cultural ignorou olimpicamente.
O fato é que as lágrimas de crocodilo só jorram profusamente quando um cinegrafista de TV é morto por reais ou supostos black blocs, ou quando um coronel é espancado. A indignação (seletiva) foi bem menor no caso das várias dezenas de profissionais da imprensa feridos durante as manifestações pela PM paulista, alguns dos quais sofreram lesões graves e definitivas.
Ou quando um soldado apertou o gatilho desnecessariamente e colocou em coma um bobinho que portava um estilingue… perdão, um canivete (é quase a mesma coisa). Tivesse Fabrício Proteus Chaves morrido, o volume das lamentações seria o mesmo? Nem a pau, Juvenal!
Mas, repito, o principal continuam sendo os motivos -justíssimos- que levam os jovens às ruas. Como a Copa das maracutaias, cuja realização a Fifa admitiria com apenas oito sedes, mas o governo brasileiro preferiu fazer com 12, a fim de contemplar todo tipo de interesse sórdido. O PT prometia abolir as práticas tradicionais da politicalha, mas a elas aderiu alegremente.
Terem escolhido o Mundial de futebol como o principal alvo dos protestos depois das queixas iniciais contra o aumento das tarifas dos ônibus atesta que os indignados brasileiros têm, sim, tirocínio político. Daí estarem sendo tão execrados pelos que temem a voz das ruas -alguns dos quais, melancolicamente, são os mesmos que há algumas décadas arriscaram a vida para que elas fossem ouvidas. As voltas que o mundo dá.
Pior: alguns que tanto sofreram sob o AI-5 e outros, mais jovens, que pretendem ser herdeiros dos ideais da resistência, estão entre os que hoje surfam na onda de episódios infelizes como o da morte do cinegrafista [2], aproveitando para pregar a igualação dos atos de protesto a terrorismo (com penas mais pesadas do que as infligidas a homicidas!!!), sua transformação em crime inafiançável, a colocação das Forças Armadas nas ruas para reprimir manifestantes e outras aberrações totalitárias.
Sem se darem conta, pois tudo que fazem atende à prioridade obsessiva de perpetuação do PT no poder, estão clamando por um novo AI-5.
Não passarão!

1 Quando este artigo já estava no ar, um acusado que tenta escapar de uma cana braba deu um suspeitíssimo depoimento à polícia, sem a presença do seu advogado (portanto, legalmente inválido), sugerindo que o PSOL, PSTU e FIP seriam os financiadores das ações para exacerbar os ânimos. Digo sugerindo porque ele não apresentou dado concreto nenhum (quem, quando, onde, quanto). Eu acho plausível que integrantes de tais partidos tenham feito doações aos black blocs, e não vejo mal nenhum nisto numa democracia. Mas, permito-me duvidar de que fossem eles que apontavam alvos, forneciam indumentarias e pagavam honorários fixos pela jornada de trabalho. Tal modus operandi é escrachadamente direitista. De resto, as surpreendentes declarações de Caio Silva de Souza certamente vão assegurar-lhe uma boa vontade que as autoridades não teriam com ele se apontasse o dedo para o outro extremo do espectro ideológico.
 
2 Além, é claro, dos reacionários empedernidos que sempre surfam em tais episódios, mas, pelo menos, estão sendo coerentes com suas (medíocres) convicções. Caso do Reinaldo Azevedo, que andou até macaqueando o Emile Zola, ao disparar as mais demagógicas acusações contra a Dilma, o Franklin Martins, o Gilberto Carvalho e o José Eduardo Cardozo. Vai levar um pito do Ternuma por não ter dado um jeito de incluir o Lula no pacote. Como o RA fez a besteira de mexer também com o Jânio de Freitas, que lhe é infinitamente superior como jornalista, não perderei tempo reduzindo-o à sua insignificância. Deixo o necessário corretivo por conta do Jânio, o qual certamente lhe aplicará umas boas palmadas para que deixe de ser petulante…
 
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Ustra continua sendo torturador com registro em carteira

O julgamento do recurso do (ausente) torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra contra a sentença da 23ª Vara Civel de São Paulo que o declarou torturador foi suspenso pelo Tribunal de Justiça a pedido do relator Rui Cascaldi, que disse precisar de tempo para refletir melhor sobre o caso. Em seguida, um dos juízes acrescentou que pretende estudar meticulosamente os sete volumes do processo, antecipando aos interessados que eles não devem  alimentar a expectativa de uma retomada  do julgamento em curto prazo.

Então, a sessão desta 3ª feira (22) se restringiu à sustentação oral do advogado da Família Teles, o veterano jurista Fábio Konder Comparato –que, tal como Dalmo de Abreu Dallari, é uma lenda viva do Direito brasileiro.

Comparato alertou que está em jogo “a dignidade do Estado brasileiro diante da opinião pública nacional e internacional”, daí o imperativo de a Corte dar uma resposta incisiva aos “atos bestiais de tortura” pelos quais o antigo comandante do DOI-Codi/SP foi responsável.

Ele criticou o “chorrilho de questões preliminares” levantadas pela defesa, que não apresentou nenhuma testemunha  e restringiu suas alegações de inocência às declarações do próprio Brilhante Ustra. Este nem sequer negou a ocorrência das torturas e óbitos, apenas alegando, da forma mais inverossímil possível, não haver tomado conhecimento dos maus tratos infligidos a milhares e da morte de mais de 40 cidadãos na unidade sob sua responsabilidade.

Como é do conhecimento público, Brilhante Ustra comandou o DOI-Codi entre setembro/1970 e janeiro/1974, tendo sido apresentadas 502 denúncias de torturas referentes a tal período, durante o qual estiveram no inferno da rua Tutóia cerca de 2 mil cidadãos presos por suspeita de  subversão  ou  terrorismo. E, no total dos seus seis anos de operações, o DOI-Codi paulista prendeu (pelo menos) 2.372 opositores do regime militar e assassinou (no mínimo) 50 deles, inclusive o jornalista Vladimir Herzog.

 São três as questões preliminares com as quais Brilhante Ustra tenta safar-se sem ser realmente inocentado:

  1. Considera-se resguardado pela anistia de 1979, mas FKC esclareceu que tal lei não elimina a responsabilidade civil, “pois se trata do direito de particulares”, que o Estado não pode anular com uma penada;
  2. A inadequação de ação declaratória como intrumento jurídico num caso desses, ao que FKC contrapôs que, desde as leis do Império romano, quem causa dano o deve reparar. “Houve ou não houve tortura? Se houve, o direito subsiste.” Quanto ao fato da Família Teles não querer tomar “o dinheiro do algoz”, isto não invalida a ação declaratória para fins de reparação moral, explicou o jurista; e
  3. A prescrição que, diz FKC, inexiste quando se trata de um “direito subjetivo”.

Finalizando, Comparato comentou que, quando o Conselho de Direitos Humanos da ONU está prestes a se reunir em Genebra para discutir, entre outros assuntos, a impunidade dos torturadores brasileiros, enquanto a Comissão da Verdade acaba de ser instalada, seria patético o Tribunal de Justiça de São Paulo não sentenciar como deve “o mais notório torturador do regime militar”.

NA SENTENÇA, O JUIZ QUALIFICOU O DOI-CODI DE “UMA CASA DE HORRORES”

 

Fábio Konder Comparato: uma lenda viva

A ação declaratória contra o torturador Brilhante Ustra foi movida pelo casal Maria Amélia e César Teles; pelos filhos Janaína e Édson; e por Criméia, irmã de Maria Amélia.

César, Maria Amélia e Criméia foram presos em 1972. Janaína e Édson, então com 5 e 4 anos, chegaram a ser levados de camburão ao DOI-Codi, como uma forma de tortura psicológica contra os pais e tia.

Eis como Édson lembra o ocorrido:

Nas dependências deste então órgão público/estatal pude ver minha mãe e meu pai em tortura. (…) Fui levado a um lugar onde, através de uma janelinha, a voz materna, que meus ouvidos estavam acostumados a escutar, me chamava. Porém, quando eu olhava, não podia reconhecer aquele rosto verde/arroxeado/ensangüentado pelas torturas que o oficial do Exército brasileiro, Carlos Alberto Brilhante Ustra, havia infligido à minha mãe. Era ela, mas eu não a reconhecia.

A sentença do juiz Gustavo Santini Teodoro assinalou que o DOI-Codi era “uma casa dos horrores, razão pela qual o réu não poderia ignorar o que ali se passava”. Segundo o depoimento das testemunhas, o  torturador  Brilhante Ustra comandava as sessões de tortura com espancamento, choques elétricos e tortura psicológica. Os gritos e choros dos presos eram ouvidos até nas celas. Daí a conclusão do magistrado:

Não é crível que os presos ouvissem os gritos dos torturados, mas não o réu. Se não o dolo, por condescendência criminosa, ficou caracterizada pelo menos a culpa, por omissão quanto à grave violação dos direitos humanos fundamentais dos autores.

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Congresso sofre nova ação no STF por omissão em relação ao direito de resposta

Por João Peres, Rede Brasil Atual

Uma nova ação direta de inconstitucionalidade (Adin) por omissão foi apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o Congresso Nacional. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Comunicação e Publicidade (Contcop) quer que o Legislativo seja responsabilizado por não haver regulamentado o direito de resposta.

A medida, prevista no artigo 5º da Constituição, foi revogada pelo próprio STF juntamente com os demais pontos da Lei de Imprensa. A antiga lei, embora fosse uma herança da ditadura, definia parâmetros para o direito de resposta de todos os que se sentissem atingidos por publicações jornalísticas brasileiras. Havia previsão quanto a limite de tempo para resposta por parte do meio de comunicação e a maneira como deveria ser feita a retificação da informação.

A Contcop defende que a Constituição, por si, não vai ao detalhe do assunto, sendo necessário estabelecer uma regulação específica. “Ninguém contesta que o direito fundamental de resposta continua a ser reconhecido em nosso ordenamento jurídico. O que se assinala é que, na prática, deixou de existir um parâmetro legal para que os tribunais possam decidir se, quando e como tal direito fundamental é efetivamente aplicado”, constata a Confederação.

Além do novo pedido de punição, o Congresso é alvo de outra ação de inconstitucionalidade que diz respeito às comunicações. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e a Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão (Fitert) questionam, além da ausência de regulamentação do direito de resposta, a falta de atuação de deputados e senadores no que diz respeito aos demais pontos constitucionais que versam sobre o assunto.

Entre os cinco artigos do capítulo em questão, o que trata dos limites a monopólio e oligopólio está sem regulamentação. Apenas um deles foi alvo de análise do Congresso, que em 2002, a pedido das grandes empresas de comunicação, autorizou que as mesmas pudessem ter até 30% de participação estrangeira nas respectivas estruturas acionárias.

A ação de Fenaj e Fitert é de autoria de Fábio Konder Comparato (foto), professor titular aposentado da Faculdade de Direito da USP, que lembra que há aberta relação entre parlamentares e meios de comunicação. Segundo o artigo 54 da Carta Magna, deputados e senadores não poderiam, em nenhuma hipótese, ser concessionários de serviços públicos, categoria na qual se enquadram rádios e TVs.

“O Congresso vai fazer o possível para continuar lento ou omisso. De qualquer maneira, é uma vitória política do povo. É nesse sentido que a ação tem um conteúdo republicano procedente”, afirmou Comparato em entrevista à Rádio Brasil Atual em outubro deste ano.

“Ditabranda”: a Folha admite que errou… e reincide!

Celso Lungaretti

O diretor de Redação da Folha de S. Paulo, Otavio Frias Filho, deu a mão à palmatória, diante da rejeição unânime dos conceitos do seu jornal por parte dos melhores cidadãos: “O uso da expressão ‘ditabranda’ em editorial de 17 de fevereiro passado foi um erro. O termo tem uma conotação leviana que não se presta à gravidade do assunto. Todas as ditaduras são igualmente abomináveis”.

Esta foi a autocrítica arrancada de um jornal arrogante, que dificilmente concede direito pleno de resposta e de apresentação do outro lado aos atingidos por sua desinformação premeditada ou involuntária. A maior mobilização da coletividade contra as falácias da mídia nos últimos anos não foi em vão. Estabeleceu um novo marco na luta da cidadania por seus direitos.

Depois de abrir mão do mais indefensável, Frias Filho ainda tentou, tergiversando, preservar o fulcro da tese do seu editorialista: “Do ponto de vista histórico, porém, é um fato que a ditadura militar brasileira, com toda a sua truculência, foi menos repressiva que as congêneres argentina, uruguaia e chilena – ou que a ditadura cubana, de esquerda”.

O fato é que, sendo todas as ditaduras igualmente abomináveis, o empenho em estabelecer graduações na intensidade da repressão denuncia consciência culpada e o propósito de atenuar a truculência de uma delas. Para uma empresa cujo colaboracionismo com a ditadura militar já é fato amplamente estabelecido, equivale a uma distorção da verdade histórica em causa própria.

Ditaduras não são mais ou menos repressivas. Para manter o poder que usurparam, recorrem à força bruta, tanta quanta necessária e, às vezes, além da necessária — como foi o caso da nada branda ditadura brasileira ao dizimar os militantes da luta armada a partir de 1971, quando já estavam inapelavelmente derrotados.

Prisioneiros rendidos, torturados, executados e que não tiveram sequer sepultamento cristão, pois os restos mortais foram escondidos como as provas de crimes costumam ser. E alguém ousa, ainda hoje, colocar panos quentes sobre atos tão hediondos! Quem é o cínico, afinal?

Também não havia motivo nenhum para tocar neste assunto doloroso se o objetivo do editorial era apenas o de atacar e denegrir Hugo Chávez, minimizando a vitória que obteve em plebiscito. Foi uma forçação de barra por parte de quem está empenhado em mistificar e confundir as novas gerações.

A Folha e seus pistoleiros, digo articulistas, de aluguel omite tendenciosamente que a resistência aos golpes e ao terrorismo de estado foi bem maior na Argentina, Uruguai e Chile, países com mais tradição de lutas populares, daí a violência e os banhos de sangue a que os tiranos tiveram de recorrer para não serem derrubados.

Se no Brasil o poder foi usurpado facilmente pelos militares, ao contrário do Chile, em que tiveram até de bombardear o Palácio do Governo; se no Brasil o mesmo golpe resultou num totalitarismo contínuo de 21 anos sob o controle das Forças Armadas, ao contrário da Argentina, em que tiranos desalojaram tiranos para fincar nova tirania, ENTÃO UMA REPRESSÃO QUE TIROU A VIDA DE 400 A 500 RESISTENTES E TORTUROU DEZENAS DE MILHARES DE BRASILEIROS FOI, ISTO SIM, EXAGERADA!

A comparação correta seria com a ditadura de Getúlio Vargas, p. ex. Mas, os reacionários e as viúvas da ditadura não a fazem porque lhes seria amplamente desfavorável. Omitem que, pelos padrões brasileiros, foi o período mais escabroso em cinco séculos de História.

Finalmente, a desculpa esfarrapada de Frias Filho para o ataque aos professores Fábio Konder Comparato e Maria Vitória Benevides foi a seguinte:

“A nota publicada juntamente com as mensagens dos professores Comparato e Benevides na edição de 20 de fevereiro reagiu com rispidez a uma imprecação ríspida: que os responsáveis pelo editorial fossem forçados, ‘de joelhos’, a uma autocrítica em praça pública.

“Para se arvorar em tutores do comportamento democrático alheio, falta a esses democratas de fachada mostrar que repudiam, com o mesmo furor inquisitorial, os métodos das ditaduras de esquerda com as quais simpatizam.”

Nada a acrescentar ao que eu afirmei logo no primeiro momento:

“Quanto a Comparato e Benevides, o que faltou (…) foi (…) base para a acusação contra eles assacada: nenhum brasileiro pode ser taxado de cínico e mentiroso por defender os direitos humanos em seu próprio país e não se manifestar a respeito do que acontece em outros países, a menos que participe ou tenha participado de entidades cuja missão seja exercer a vigilância em âmbito internacional.

“Então, ao misturar alhos com bugalhos, a Folha (…) cometeu os crimes de difamação e calúnia. É disto que teria de se retratar.”

Não o fez nem o fará, a menos que sob vara dos tribunais.

Mas, a mobilização dos humilhados e ofendidos — nós — já a obrigou a entregar os anéis para tentar salvar os dedos.

Da próxima vez será pior — garantimos.

O alerta está dado.

“Ditabranda”: a “Folha” admite que ignora os leitores

Celso Lungaretti

Uma das obsessões da Folha de S. Paulo, quando tratava de restringir cada vez mais o componente opinativo nos textos de sua redação, foi impor a complementação das notícias com estatísticas e mais estatísticas, como se a multiplicação de tabelas conferisse cientificidade e rigor ao jornalismo, em detrimento da emoção do repórter que presencia os acontecimentos e das conclusões que eles lhe inspiram.

Os dados estatísticos, ademais, deveriam ser apresentados com destaque nas notícias, o que as tornou extremamente tediosas, robotizadas. Brasileiro não quer saber se o jogador do Corinthians acerta 58,97% dos passes ou 26,49% dos chutes. Prefere uma descrição envolvente do gol de placa que ele marcou ou do passe milimétrico que deu ao artilheiro do time.

Avaliações de média de desempenho fazem parte da mentalidade dos anglo-saxões, que passam a semana discutindo o percentual de erros e acertos dos jogadores de beisebol. Nós outros nos fascinamos com os grandes lampejos dos craques, com os momentos (cada vez mais raros) de arte e beleza, nos esportes e na vida.

A Folha nos quis fazer ainda mais colonizados do que já somos. E, de quebra, impor uma camisa-de-força aos jornalistas, de forma a que seu espírito crítico, sua ânsia por justiça, não pudessem mais extravasar para os textos.

Bem, já que a Folha gosta tanto de estatísticas, eis algumas interessantes, que me dei ao trabalho de levantar.

A utilização em editorial do termo “ditabranda” para qualificar o nefando regime militar de 1964/85 e os insultos proferidos em nota da redação contra os ilustres professores que criticaram tal neologismo foi o assunto mais enfocado nas mensagens recebidas nas duas últimas semanas pelo Painel do Leitor.

Na semana de 15 a 21 de fevereiro, 13% das mensagens de leitores da Folha, conforme levantamento publicado pelo próprio jornal, se referiram ao Caso Ditabranda. Coerentemente, das 60 notas publicadas no Painel do Leitor, 13 (21,6%) foram relativas à principal preocupação dos missivistas.

Já na semana de 22 a 28 de fevereiro, a proporção de mensagens sobre a “ditabranda” até cresceu, para 20%. O que diminuiu foi o interesse da Folha em destacar uma discussão que se tornava cada vez mais indigesta para ela.

Portanto, dentre as 69 notas que saíram no Painel do Leitor, míseras quatro (5,8%) abordavam o assunto que, para o público do jornal, era o mais importante do período, à frente até do “Governo Lula” e da “crise econômica”, sobre os quais apenas 6,4% e 5,3% dos leitores, respectivamente, sentiram-se compelidos a escrever à Folha.

Eu insisto no que já cobrei da Folha em carta enviada no dia 25/02 a seis membros do seu Conselho Editorial, inclusive o diretor de redação otávio Frias Filho, e por nenhum deles respondido, com o que acrescentaram a falta de civilidade à consciência de estarem em posição indefensável:

“Se a Folha agora quer ter rabo preso com a extrema-direita, que, pelo menos, o assuma francamente. Caso contrário, que reconheça, também francamente, ter incidido em excessos que não definem sua verdadeira posição.

“O que não pode é, simplesmente, encerrar de forma unilateral um debate que desnecessariamente provocou e agora se voltou contra si, deixando de dar satisfações e esclarecimentos aos leitores que sentiram-se atingidos por seus textos”.

Reitero: a Folha continua devendo “aos brasileiros um editorial esclarecendo exatamente qual é a sua posição sobre a ditadura dos generais, pois um assunto de tamanha gravidade não pode ser tratado de forma tão apressada e superficial como o foi no editorial de 17/02 e nas notas da redação de 19/02 e 20/02”.

Reitero: a Folha continua devendo “desculpas aos professores Fábio Konder Comparato e Maria Vitória Benevides, pois é simplesmente ridícula a presunção de que, antes de se pronunciarem sobre a ditadura que vitimou seu país, eles seriam obrigados a um posicionamento público sobre os regimes políticos de outras nações”.

A moção de solidariedade aos professores Fábio Konder Comparato e Maria Vitória Benevides já tem mais de 5,6 mil signatários.

O Movimento dos Sem-Mídia promoverá ato de protesto diante da Folha na manhã do próximo sábado (7).

Cada vez mais pessoas tomam conhecimento do sórdido colaboracionismo da Folha com a ditadura, à qual chegava emprestar viaturas para a captura e transporte de resistentes, além de facilitar a detenção dos profissionais da casa e publicar noticiário sintonizado com os interesses da repressão.

Quanto mais a Folha, qual avestruz, enfiar a cabeça na areia para fugir às verdades desagradáveis, mais a onda crescerá.

Foi assim, perdendo a credibilidade, que a Veja começou a decair. Não parou mais de despencar ladeira abaixo.

Mensagem enviada a membros do Conselho Editorial da “Folha de S. Paulo”

Prezado senhor,

dentre suas muitas atividades, é ao membro do Conselho Editorial da Folha de S. Paulo que me dirijo.

E o faço na condição de cidadão brasileiro indignado com o falseamento da verdade histórica no editorial Limites a Chávez, de 17/02/2009, quando o regime despótico de 1964/85 recebeu a designação mistificadora de “ditabranda”, um escárnio para todos que padecemos sob o pior totalitarismo que este país já conheceu, responsável pela tortura de dezenas de milhares de cidadãos, pelo assassinato de centenas de resistentes (desde os que não suportaram as sevícias até os capturados com vida e friamente executados), por estupros e por ocultação de cadáveres, além de um sem-número de violações dos direitos constituicionais dos brasileiros.

Falo também como vítima direta dessa ditadura, já que fui sequestrado, torturado, lesionado para sempre e coagido a participar de uma farsa televisiva altamente lesiva à minha imagem.

E, ainda, como leitor da Folha a quem é sistematicamente escamoteado o direito de resposta e de apresentação do “outro lado”, seja com a concessão de espaços ínfimos no Painel do Leitor para repor a verdade dos fatos em episódios nos quais as versões deformadas ou falaciosas tiveram grande destaque editorial, seja com a total desconsideração por minhas mensagens.

É o que acaba de acontecer, pois a Folha ignorou olimpicamente minha mensagem de crítica ao lançamento do neologismo “ditabranda”, meu protesto ao ombudsman (que nada respondeu) e minha mensagem de crítica ao ataque descabido da redação a dois ilustres defensores dos direitos humanos.

Venho reiterar que a Folha deve aos brasileiros um editorial esclarecendo exatamente qual é a sua posição sobre a ditadura dos generais, pois um assunto de tamanha gravidade não pode ser tratado de forma tão apressada e superficial como o foi no editorial de 17/02 e nas notas da redação de 19/02 e 20/02.

E também que deve desculpas aos professores Fábio Konder Comparato e Maria Vitória Benevides, pois é simplesmente ridícula a presunção de que, antes de se pronunciarem sobre a ditadura que vitimou seu país, eles seriam obrigados a um posicionamento público sobre os regimes políticos de outras nações.

A Folha não incidiu apenas no erro da falta de cordialidade, como pretende o ombudsman, mas fez acusações insustentáveis contra dois cidadãos respeitados e ofendeu a inteligência dos seus leitores, ao misturar tão grosseiramente alhos com bugalhos, na linha do besteirol característico de sites fascistas como o Ternuma.

Se a Folha agora quer ter rabo preso com a extrema-direita, que, pelo menos, o assuma francamente. Caso contrário, que reconheça, também francamente, ter incidido em excessos que não definem sua verdadeira posição.

O que não pode é, simplesmente, encerrar de forma unilateral um debate que desnecessariamente provocou e agora se voltou contra si, deixando de dar satisfações e esclarecimentos aos leitores que sentiram-se atingidos por seus textos.

Sem mais,

CELSO LUNGARETTI
EM 25/02/2009