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Na Europa, Lula aponta os desafios do mundo: desigualdade, clima e era digital

Lula diz que sua viagem ao continente busca mostrar, aos próprios brasileiros, que o mundo gosta do Brasil e que o país é fundamental na construção de uma nova geopolítica

Em uma fala que deixou emocionados todos os presentes, neste sábado (20), na Espanha, última etapa de sua viagem pela Europa, Lula convocou a esquerda mundial a se unir em busca de soluções para os três grandes desafios que enxerga para a humanidade: o fim da desigualdade, a preservação ambiental e a manutenção de relações trabalhistas justas em um mundo cada vez mais digitalizado. E ressaltou que, nesse debate, o Brasil certamente é um ator chave.

“Essa viagem que fiz pela Bélgica, Alemanha, França e Espanha é uma tentativa de provar, para o próprio povo brasileiro, que o mundo gosta do Brasil. Sou muito grato ao presidente Pedro Sánchez, que me recebeu, ao Macrón e ao Olaf Scholz, que me receberam, ao Parlamento Europeu, que me tratou com a maior dignidade. Porque não é o Lula que é importante, é o Brasil que é necessário ao mundo neste instante para discutir uma nova geopolítica”, disse, lembrando que o país já mostrou ser possível vencer a fome e preservar o meio ambiente, duas conquistas que estão sendo destruídas hoje por Jair Bolsonaro.

“O faminto está fragilizado, temos de estender a mão”

Lula falou em Madri, durante o evento Construindo o futuro: desafios e alianças populares, convocado pelo partido espanhol Podemos e que reuniu sindicatos, legendas e lideranças progressistas europeias. “Precisamos colocar a desigualdade no centro da nossa pauta”, defendeu. “Nós, que tomamos café, que almoçamos todo dia, que jantamos, temos a obrigação ética e moral de estendermos a mão para que essa gente tenha o direito de comer”, completou, lembrando que o planeta abriga 800 milhões de seres humanos que hoje não têm acesso à comida suficiente para viver com dignidade.

Para Lula, o combate à desigualdade deve ser encampado pela esquerda do mundo, uma vez que uma extrema-direita age de forma cada vez mais agressiva contra os mais pobres. “Trump ganhou as eleições nos Estados Unidos com uma frase simples: ‘América para os americanos’, ou seja, chega de latino, de africano, de muçulmano. A pobreza incomoda. Tanto que até entre famílias os mais pobres não são convidados para aniversários. Mas como é possível, num mundo que produz mais comida que consome, haver 800 milhões de pessoas sem ter o que comer? Essa tem que ser nossa bandeira. Porque o faminto não faz a revolução, o faminto está fragilizado. Nós é que temos de estender a mão para eles”, disse, antes de ser muito aplaudido (assista à integra do discurso no fim desta matéria).

 

“A Amazônia é brasileira, e sua riqueza deve ser compartilhada”

Segundo Lula, a desigualdade está fortemente relacionada com o outro grande problema da humanidade, que é a questão ambiental. “Meio ambiente não é só a questão da Amazônia. Precisamos discutir a questão das favelas, da coleta de água e esgoto, a despoluição dos rios e das praias. Muitas vezes, a gente só fica falando da Amazônia e não vê o cara ali morando numa palafita, fazendo as necessidades biológicas dele e os caranguejos comendo, e ele vai comer o caranguejo depois. Isso já foi escrito em 1946 por Josué de Castro, que em Geografia da fome descreveu exatamente o que ainda ocorre no século 21”, ressaltou.

O ex-presidente brasileiro, porém, não minimizou a importância da preservação das florestas, sobretudo da Amazônia, que, de pé, pode ser fonte de inúmeras descobertas científicas que beneficiem a população brasileira e mundial. “Na questão da Amazônia, a gente tem que deixar claro que a Amazônia é um território brasileiro, portanto o Brasil é soberano. Agora, a riqueza da biodiversidade tem que ser compartilhada com o mundo. Temos que compartilhar com o mundo a pesquisa. Não queremos transformar a Amazônia num santuário. O que queremos é explorar cientificamente a riqueza da biodiversidade para, dela, a gente ver se tira alguma coisa para dar ao povo brasileiro e ao povo do mundo”, defendeu.

E lembrou: “A questão ambiental não é mais um problema de ambientalistas, de um Partido Verde, de uma classe média sofisticada, intelectualizada. Não. É uma questão do povo do planeta Terra, nós só temos ele. Precisamos colocar a questão ambiental na ordem do dia. Não é possível mais pensar em desenvolvimento, em emprego, sem considerar a questão ambiental”.

 

“Convenceram as pessoas de que elas são pequenos empreendedores”

Como terceiro ponto que merece a atenção das forças progressistas de todo o mundo, Lula destacou o emprego na era digital.  “Noventa por cento da indústria de dados é dominada hoje pelos Estados Unidos e pela China. A indústria de dados, alguns dizem, será o que petróleo foi no século passado. Vocês jovens terão de discutir como será o mundo digital, o emprego na era digital. Cada coisinha que você está fazendo no seu celular está sendo guardado e isso vai valer dinheiro. E o povo do Brasil, da Espanha, o povo do mundo que não é chinês nem americano, precisa começar a pensar nisso”, alertou.

Para Lula, o avanço desse mercado digitalizado representa um desafio imenso aos sindicatos. “Se não pensarem nessa questão, os sindicatos vão perder o trem da história e as pessoas começarão a se perguntar para que serve um sindicato. Porque essas pessoas (empregadas no mundo digital) são trabalhadoras. E veja que as empresas, num primeiro momento, venceram a batalha porque conseguiram convencer as pessoas de que elas são ‘pequenos empreendedores’. Você está trabalhando em casa usando a sua água, a sua conta de luz, a sua mesa, gastando parte do seu dinheiro e trabalhando o dobro do que você trabalhava achando que você é pequeno ou pequena empreendedora”, analisou.

“Os Estados pobres precisam unir universidades, que é quem tem inteligência, a juventude, que é quem pode pensar no futuro, os empresários e os sindicatos para a gente pensar sobre isso. É urgente. Obviamente que o mundo não vai acabar por conta disso, mas a gente vai ficar refém de indústria que a gente não conhece, de empresário que a gente não conhece”, completou.

 

“Jovens, não desistam da política”

Por fim, Lula disse que a esquerda, que defende os interesses da classe trabalhadora e dos excluídos, precisa compreender por que o mundo assiste atualmente o avanço da extrema direita. “Temos de analisar o discurso deles e entender por que essa gente voltou a convencer uma parcela da sociedade. Por que a população deu a eleição ao Trump e não aos democratas, que tinham o símbolo de uma mulher concorrendo à Presidência? Qual foi a mentira que eles contaram? Qual foi a mentira que contaram aqui na Espanha e fez surgir o Vox, mais à direita que a direita? Qual é o problema que faz a França ter dois candidatos de extrema-direita? Como pode ter surgido o Bolsonaro no Brasil?”, indagou.

“Temos de analisar isso. Não deve ter sido erro apenas dele, deve ter sido erro nosso também. O que nós deixamos de fazer? É preciso que a gente comece a pensar nisso, para termos certeza de que vale a pena lutar. E a juventude, pelo amor de Deus, saibam que uma das coisas que está fazendo a extrema-direita crescer é a negação da política. Então, queria pedir: não desanimem”, concluiu.

Assista à íntegra da fala de Lula:

Fonte: PT

(20-11-2021)

Espíritas de esquerda rompem com maioria conservadora e preparam iniciativa de educação popular

Por Murilo Pajolla

No começo de 2016, o clima de polarização política que levou ao golpe contra a presidenta Dilma Rousseff contaminava, também, as casas espíritas. A apologia à ofensiva conservadora era a regra nos encontros religiosos e discursos públicos feitos por lideranças ligadas à doutrina. 

Sentindo-se isolados, espíritas baianos criaram um pequeno coletivo para reunir adeptos com perfil progressista. Desde então, centenas de membros de todo o Brasil se somaram ao Espíritas à Esquerda.

Neste ano, o grupo pretende passar do discurso à ação, promovendo iniciativas de educação popular inspiradas nas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) ligadas à Igreja Católica, espaços que foram cruciais na resistência durante a ditadura militar.

“O Livro dos Espíritos, bem como o anúncio do reino feito por Jesus, são necessariamente transformadores, revolucionários”, afirma um dos fundadores do movimento, Sergio Maurício Pinto, ao citar a obra fundamental à doutrina espírita escrita no século XIX pelo francês Allan Kardec.

“Eles ensinam o tempo todo que o nosso dever é lutar por uma sociedade de justiça social, de igualdade de direitos. Então todo discurso conservador, reacionário, discriminatório, preconceituoso, como nós temos visto dentro desse movimento espírita hegemônico, na verdade, é uma farsa, uma mentira”.

Maurício relembra o silenciamento sobre as questões políticas dentro das casas espíritas. Quando acontecia, as falas eram contrárias às perspectivas progressistas, criando constrangimento para fiéis que não se identificavam com o conservadorismo predominante.

“Havia uma interdição de qualquer discurso progressista, de qualquer discurso que tivesse um viés de esquerda, no sentido de uma luta por justiça social, por novas políticas públicas que pudessem amparar a sociedade. Isso fez que surgissem diversos coletivos. O Espíritas à Esquerda é um dos pioneiros, mas existem outros”, afirma.

Consolidação

Com o processo eleitoral de 2018, a onda reacionária ganhou contornos fascistas, escancarando ainda mais o “racha” no ambiente espírita. Segundo Maurício, os coletivos espíritas de esquerda ganharam ainda mais força, e um encontro nacional do Espíritas à Esquerda em 2019 marcou o início da trajetória ascendente.

“Temos hoje cerca de 500 membros regulares dentro da nossa organização. O nosso alcance hoje na internet é de aproximadamente 20 mil seguidores, somando as nossas redes sociais. E agora temos um site”, conta Maurício, membro da coordenação da entidade.

Atualmente a organização está presente em 17 estados brasileiros e em Portugal. Remando contra a maré, o grupo divulga artigos e reflexões articulando os preceitos espíritas aos principais debates políticos contemporâneos, como o racismo, a desigualdade social, a questão de gênero, a os direitos da comunidade LGBTQI+.

Trabalho de base

Os Espíritas à Esquerda estão buscando uma nova forma de organização social dos adeptos da doutrina. No horizonte próximo, estão os chamados Núcleos Espíritas Populares (NEPs), cuja atuação se dará nas periferias das cidades. As inspirações são o educador e filósofo Paulo Freire e as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs).

“Refletimos que a única forma de mudar a nossa sociedade é por meio da educação popular, por meio do trabalho de base, aquele trabalho que leva a consciência, que produz libertação. Trabalho que auxilia as pessoas que vivem em condições opressivas a se auto libertarem”.

Segundo Maurício, o objetivo é mudar a forma como os espíritas se relacionam com o conjunto da população e, com isso, inspirar iniciativas semelhantes no restante do país. Ainda neste ano, a meta é inaugurar o primeiro CEB em Natal (RN).

“É possível, sim, que o discurso da fé, num novo mundo, seja um discurso libertador. É preciso que o nosso discurso religioso seja um discurso ideologicamente engajado, que diga às pessoas: ‘sim, é possível transformar a sua realidade’”.

Edição: Marina Duarte de Souza

Fonte: Brasil de Fato

 

 

Bolsonarismo, crise política e base social: dossiê expõe desafios da esquerda no país

Uma crise política, socioeconômica e sanitária sem precedentes, a chegada da extrema direita ao poder e a brutal retirada de direitos sociais. É nesse desafiador contexto que a esquerda brasileira tem enfrentado o governo Jair Bolsonaro e angariado esforços para resistir, se reinventar e engrossar as fileiras por outro projeto de sociedade.

Com o capitão reformado no Palácio do Planalto apoiado pelas classes dominantes e pelas Forças Armadas, o projeto neoliberal instaurado no país após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016, se aprofundou. Em 2020, o surgimento do novo coronavírus e a ausência de enfrentamento à pandemia por parte de um governo federal negacionista trouxeram para o Brasil a marca de mais de 430 mil vítimas fatais da doença respiratória e o título de ameaça mundial.

A esquerda, por sua vez, continuou se articulando e tendo como prioridade retomar a condução do país em direção a outro rumo. Mas, quais são os próximos passos a serem tomados em uma conjuntura tão emblemática? Quais são os desafios colocados para as forças políticas progressistas, considerando as eleições de 2022 e a “política de morte” em curso?

Essa é a temática abordada pelo Dossiê 40 do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, lançado no último dia 13 de maio. O documento Os desafios da Esquerda no Brasil apresenta diferentes reflexões a partir do ponto de vista de representantes de partidos e organizações da classe trabalhadora, do campo e da cidade.

Entre os entrevistados estão, Jandyra Uehara, da Executiva Nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT); Juliano Medeiros, presidente nacional do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL); Kelli Mafort, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); Gleisi Hoffmann, deputada federal e presidenta do Partido dos Trabalhadores (PT); e Valério Arcary, professor do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) e membro da direção nacional do PSOL.

Balanços e perspectivas

O dossiê está dividido em cinco partes e tem como ponto de partida uma análise crítica da esquerda brasileira nas últimas décadas. A exemplo da política de renda do programa Bolsa Família, responsável por tirar 36 milhões de pessoas da extrema pobreza, e do programa habitacional Minha Casa Minha Vida, que construiu mais de 4 milhões de casas populares, o documento reconhece a importância das políticas de bem-estar social adotadas pelos governos Lula e Dilma, mas faz ponderações.

“A esquerda conseguiu chegar ao governo com Lula mas isso não significa que conquistou o poder. Essa talvez seja uma das chaves que explique a derrota da esquerda nos últimos anos. É inegável que tivemos conquistas importantes nos governos petistas, mas isso não foi acompanhado de um processo de politização que elevasse o nível de consciência das massas”, afirma Luiz Albuquerque, organizador do dossiê.

O também coordenador do departamento de Comunicação e Publicação do Tricontinental explica que após a crise econômica de 2008, a burguesia e o empresariado puseram fim à política de conciliação de classes para manter a lucratividade de seus negócios, em detrimento dos direitos das populações mais vulneráveis.

Sem um processo de politização da grande maioria de trabalhadores que pudesse forjar a consciência de classe dos setores médios e populares, não houve o fortalecimento de uma base social sólida para a defesa de um projeto progressista ou, ainda, que fosse capaz de deter o golpe contra a ex-presidenta Dilma ou a vitória de Bolsonaro, com mais de 57 milhões de votos, dois anos depois.

Entre os desafios urgentes, Albuquerque cita que o consenso da esquerda é o afastamento de Bolsonaro da presidência, a defesa da vacinação em massa e a volta do auxílio emergencial de R$ 600.

A retomada de uma base social e de um conteúdo programático combativo são demandas a médio e longo prazo essenciais para nortear a atuação do campo da esquerda como um todo – seja nas ruas ou nos parlamentos.

“Precisamos retomar o trabalho de base, no sentido de acumular forças e sair da situação defensiva, avançar em pautas de fôlego, mais estruturais. O trabalho de base é indispensável para a luta popular e deve estar vinculado a uma determinada estratégia, a tomada do poder. Com isso, então, é preciso organizar o povo em torno de um programa, fazer a disputa ideológica para reconstruirmos força social, derrotar o bolsonarismo e colocarmos na ordem do dia as reformas estruturais”, defende Albuquerque.

Élida Elena, vice-presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE) e integrante do Levante Popular da Juventude, também está entre as entrevistadas do Dossiê e, ao Brasil de Fato, ressalta a importância do diálogo da esquerda com a população diante dos retrocessos.

“Para que possamos superar esse cenário, precisamos reforçar a mobilização social, a construção de força social da esquerda para que possamos ter outra alternativa e derrotar Bolsonaro e o bolsonarismo. Temos apostado como passo para esse caminho em campanhas de solidariedade nos diversos estados do Brasil como forma de ampliar nossa resistência e reconectar os vínculos da esquerda com o povo brasileiro”, declara.

As fissuras da direita e a importância da figura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a proximidade das eleições presidenciais de 2022 são outros pontos abordados pelos entrevistados. Vale destacar ainda que todas as imagens que compõem o documento fazem parte do projeto Design Ativista, um coletivo que surgiu durante as eleições de 2018 com o objetivo de fomentar a criação e distribuição livre de arte e informação, combatendo as notícias falsas e apoiando a democracia.

“Juntos, venceremos!”

O Dossiê deixa claro que a unidade entre os setores progressistas é central para a construção de um outro futuro. Uma necessidade histórica e um desafio permanente, aponta Albuquerque. Indispensável para “conter o avanço do neofascismo e retomar o Estado”.

“Um grande debate em aberto é como se constituiria essa unidade e quais seriam as táticas necessárias para construí-la. Se se daria em uma frente de esquerda compostas pelas forças progressistas, em torno de um programa mínimo em comum, ou em uma frente ampla que incluiria todos os espectros políticos contrários ao bolsonarismo, incluindo parte da direita liberal, por exemplo? Ou uma combinação de ambas as táticas? Esse debate ainda está aberto”, continua o jornalista.

Elida Elena, da UNE, também endossa a necessidade da unidade entre as plurais esquerdas brasileiras para derrotar o bolsonarismo e destaca a importância da juventude como agente político desse processo.

“Cada organização, sozinha, isoladamente, não vai conseguir cumprir essa tarefa. Nós, da juventude, temos um papel importante. Desde a campanha eleitoral temos sido um elo forte, de resistência, ao projeto bolsonarista. Desde o “Ele Não”, ao Tsunami da Educação e lutas antirracistas e antifascistas do ano passado. Temos muita disposição de luta”, comemora a militante.

Mesmo em meio a uma conjuntura acirrada, Albuquerque, o organizador do dossiê, avalia que ainda que seja necessária a adoção de uma postura defensiva por parte da esquerda, o governo Bolsonaro vem sofrendo um desgaste lento, porém gradual, desde o início do ano. Algo que fomenta a organização popular.

“Há uma percepção de que a militância, a base social da esquerda, se sente mais fortalecida para lutar hoje do que em tempos passados. Esse é um elemento muito importante, é um dos fatores que pode ajudar a alterar a correlação de forças na sociedade”, finaliza.

Leia o Dossiê nº40 completo aqui.

Edição: Vinícius Segalla

Fonte: Brasil de Fato

Porque a corrupção é sistêmica ao estado mental capitalista e captura também as esquerdas

por Evandro Vieira Ouriques

A corrupção é sistêmica ao ‘estado mental capitalista’ e também captura as esquerdas. Porque?

Porque o ‘estado mental capitalista’ apregoa como sua grande vantagem que ‘qualquer um’ pode ser ‘rico’ e que ser ‘rico’ é ‘a melhor coisa do mundo’ e o ‘objetivo supremo de um ser humano’.

Mas observem por favor: é ‘qualquer um” que pode ser ‘rico’; não ‘todos’. É assim que ‘todos’ são ensinados (pela pedagogia da opressão, pela concentração da propriedade de mídia, pela publicidade, etc.) a fazer o que puderem para ser este ‘qualquer um’, porque não ser este ‘qualquer um’ seria ser ‘infeliz’, um ‘derrotado’.

Então, grande parte de ‘todos’ faz exatamente isto, procurando -o tempo todo- esconder tal fato. Quando alguém ou um grupo quer derrubar outro alguém ou outro grupo faz vazar informações sobre a ‘corrupção’ do ‘outro’.

Por isso só há uma saída: uma nova visão de política, que seja psicopolítica; ou seja, na qual cada um faça continuamente uma revisão dos estados mentais de maneira a suprimir memórias psíquicas e valores comprometidos com o processo descrito acima.

A começar, por exemplo, pela eliminação dos estados mentais ‘desenvolvimentistas’, uma vez que são fatos concretos:

1. que a maior parte do que se considera ‘belo’ e ‘desejável’ é construído com o sangue e o sofrimento dos ‘perdedores;
2. e, que não existem recursos naturais para produzir os bens e serviços considerados ‘ricos’, ‘desenvolvidos’, ‘desejáveis’ para ‘todos’.

Este é o erro de apoiar o ‘desenvolvimentismo’. Pois é alimentar a ‘corrupção’. E, lembro, que este gravíssimo erro estratégico está sendo cometido também pelas esquerdas na tentativa de instauração do que seria o ‘socialismo’, entendido como a distribuição de tal ‘riqueza’ para todos, uma vez que é impossível fazer isto, como acabei de dizer, pois não existem recursos naturais suficientes para tal.

O que entendemos geralmente como ‘riqueza’ é o que a Europa produziu a partir do século XVI com os recursos saqueados através da colonização. Ou seja, o que é vivenciado como sendo ‘belo’ e ‘bom’, ‘elegante’ e ‘chic’ -e que as esquerdas querem distribuir para todos- é construído na maior parte das vezes com o sangue e o sofrimento dos ‘outros’, destes ‘outros’ mesmos que tantas vezes assim admiram a estética de seu próprio opressor; e a desejam, e fazem de tudo para tê-la, perpetuando assim o mesmo horror.

É por isso que venho dizendo desde o início dos anos 70 que precisamos ir além da ‘esquerda’ e da ‘direita’, do ‘capitalismo’ e do ‘socialismo’, na medida em que a crise ecológica, ou seja a crise da relação entre Cultura e Natureza, evidenciou que o problema é muito mais complexo do que o da acumulação de capital, uma vez que desde então estamos, ou deveríamos estar, conscientes de que o que está em risco não é uma classe, mas a própria espécie humana. O que demanda para sua compreensão uma outra Teoria Social e uma outra estratégia de ação política. A Psicopolítica da Teoria Social e a Gestão da Mente são minha contribuição para isso.

Espero ter sido claro, com amor, e a a alegria da gratidão, e.

Sobre esquerda, direita, liberdade, direitos humanos

Hoje pensava o quão importante é socializar algumas reflexões no momento atual, sobre direita, esquerda, direitos humanos, inclusão social, respeito às diferenças, igualdade. Pode ser muito genérico, mas mesmo assim vale a pena a tentativa.

A direita se sente afetada pelo programa de direitos humanos do governo.

“O direito de propriedade, a liberdade de imprensa,” bradam os canais de televisão, os ruralistas. O direito de propriedade deve ser sempre posto em relação com a utilidade social da mesma, e isto até a direita mais conservadora sabe e aceita.

O direto de propriedade não pode ser uma desculpa para a desumanização, para o abuso do poder financeiro dos grandes proprietários e seus representantes no legislativo.

A agricultura familiar brasileira produz alimentos para as pessoas, trabalha para a reprodução da vida, e deve ser priorizada. Isto não significa que o agronegócio deva desaparecer ou deva ser punido, mas deve ser disciplinado, aqui e em qualquer país do mundo que se pretenda civilizado.

A liberdade de imprensa não significa que apenas as grandes empresas de comunicação (TVs, rádios, jornais, etc) tenham o direito de expressarem suas idéias e interesses.

Também os pequenos, os cidadãos particulares, as pequenas organizações ou quem quer que seja, tem o direito de dizer o que pensa, desde que respeite aos demais, aos que pensam diferente.

Isto não é censura, é respeito. Se eu invado um site de direita com panfletos antifascistas, estou procurando agredir, e isto terá as suas conseqüências.

Se o contrário ocorrer, como ocorre, de fato, também está se procurando um confronto, e isto deve ser enfrentado. Na acredito em paz sem luta, em harmonia sem conflitos. O que não pode nem deve faltar, é o respeito.

Quando em nome da minha liberdade e do meu direito atropelo alguém, estou pedindo para ser agredido, me parece. Tolerância é a base do convívio, e isto nem sempre é fácil.

O mais fácil é reagir, mas isto leva a atitudes impensadas. Os que tivemos a experiência de sobreviver ao terror de estado, seja onde for, no Brasil, na Argentina, no Uruguay ou no Chile, aprendemos o quanto é valiosa a atitude de respeito às diferenças, por mais que isto nos custe, na prática.

Não sei se tiraste alguma conclusão disto, leitor ou leitora, mas é o que queria partilhar contigo nesta manhã. Obrigado pela atenção.

Identidad

Yo no sé quién o qué soy, y sin embargo soy feliz casi siempre así. Ahora estoy en una casa de internet, que en este tiempo y lugar se llama LAN house. La vida me puso del lado izquierdo de los acontecimientos, pero esto no hace de mí un izquierdista, palabra con la cual simpatizo, sin saber bien lo que quiere decir, y sabiendo. No soy cristiano, aunque trato de seguir a Jesús Cristo, que me ha hecho muy bien a lo largo de la vida. Ahora tengo que irme, pues aunque no tenga nada que hacer, pues mi tarea consiste apenas (te parece poco?) en tratar de permanecer en presencia de mí mismo todo el tiempo, María me va a llamar y estoy en la Ruy Carneiro de João Pessoa, Paraíba, y escribo esto para mí mismo, nadie lo va a publicar ni me gustaría que nadie lo leyera. Chau. Yo.