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Nunca mais

Quando um país é governado por um criminoso de lesa humanidade é evidente que foram ultrapassados os limites da política. O filme Democracia em vertigem reaviva a memória.
Reconstrói de maneira documental o conjunto de peças que se movimentaram para destituir a Presidenta da República Dilma Rousseff e dar lugar ao atual regime.
O atual presidente do Brasil, ao emitir o seu voto em favor da destituição ilegal da Presidenta da República, o fez em homenagem ao torturador dela. Nada aconteceu.
Será que a vida não vale nada? Será que os Direitos Humanos aqui não vigoram? O filme nos lembra que este país nunca deixou para atrás o seu passado escravagista.
Este documentário irá ter na história brasileira, talvez, o destino do filme argentino La hora de los hornos, que mostra o bombardeio das pessoas na Plaza de Mayo durante o golpe contra Perón em 1955.
A história se repete. Que a vida das pessoas nada valha para a oligarquia não é novidade. Mas que as próprias pessoas não dêem valor à sua própria existência, é algo que de maneira alguma pode deixar de chamar a atenção.
Ao se deixar impune o crime cometido contra Dilma Rousseff ontem e hoje, deixou-se uma porta escancarada para que se repita o que nunca mais deve ocorrer em país algum. A omissão é cumplicidade.

Dois Papas: dois modelos de homem, dois modelos de Igreja

O que digo é opinião estritamente pessoal. Tive o privilégio de conhecer a ambos os Papas pessoalmente e com os quais entretive e entretenho relações de certa proximidade e até amizade.
O Papa Ratzinger: finíssimo e rigoroso
Com o Prof. Joseph Ratzinger tenho uma dívida de gratidão por ter apreciado minha tese doutoral sobre “A Igreja como Sacramento Fundamental no Mundo secularizado”, volumosa, mais de 500 páginas impressas. Ajudou-me financeiramente com uma soma considerável de marcos e encontrou um editora para sua publicação, pois ninguém queria assumir o risco de lançar um livro desta proporção. A acolhida na comunidade teológica internacional foi grande, considerada uma obra fundamental, especialmente pelo renomado especialista em Igreja Jean Yves Congar, dominicano francês.
O Prof. Ratzinger é uma pessoa finíssima no trato, extremamente inteligente e nunca o vi alçando a voz; mas é muito tímido e reservado.
Ao saber de sua eleição a Papa, logo pensei: “É um Papa que vai sofrer muito, pois talvez jamais tenha abraçado pessoas, mesmo uma mulher e se exposto às multidões”.
Nossa amizade se fortaleceu porque durante cinco anos, a partir de 1974, toda semana de Pentecostes (por volta de maio) cerca de 25 teólogos e teólogas progressistas, renomados do mundo inteiro, nos encontrávamos em Nimega na Holanda ou em outra cidade europeia. Durante uma semana discutíamos ecumenicamente, acompanhados por um pequeno grupo de cientistas, inclusive de Paulo Freire, sobre temas relevantes do mundo e da Igreja. Editávamos uma revista Concilium que se publicava em 7 línguas que ainda continua a ser publicada (no Brasil pela Editora Vozes). Ai colaboraram as melhores cabeças mundiais, nas várias áreas do conhecimento que vai da sexualidade, da Teologia da Libertação, à moderna cosmologia.
O Prof.Ratzinger sentava-se quase sempre ao meu lado. Depois do almoço enquanto quase todos tiravam uma sesta eu e ele passeávamos pelo jardim, discutindo temas de teologia, nossos preferidos, Santo Agostinho e São Boaventura dos quais li praticamente toda obra.
Cada um com seu papel sem perder a relação
Feito Cardeal e Presidente da Congregação para a Doutrina da Fé, teve a ingrata missão de me interrogar sobre o livro Igreja: carisma e poder em 1984. Ele cumpria institucionalmente sua função de interrogador e eu de defensor de minhas opiniões. Foi um diálogo firme, mas sempre elegante da parte dele, mesmo quando, após o interrogatório, tivemos um encontro já mais duro com ele e os Cardeais brasileiros Dom Paulo Evaristo Arns e Dom Aloysio Lorscheider que me acompanharam em Roma e testemunharam a meu favor. Éramos três contra um. Devo reconhecer que ele se sentia constrangido.
Depois de um ano, recebi a solução do processo doutrinário com a deposição da cátedra de teologia, de minhas funções na Editora Vozes e a imposição de um “silêncio obsequioso” que me impedia de falar, de ensinar, de dar entrevistas e de publicar qualquer coisa. A decisão final após o interrogatório foi feita por 13 cardeais (13 para desempatar). Soube mais tarde, através de um emissário de seu secretário particular que ele, Card. Ratzinger, votou a meu favor mas foi voto vencido. Cabe dizer que sempre que jornalistas perguntavam a ele sobre mim, respondia, com certo humor, que sou “ein frommer Theologe”( um teólogo piedoso) que um dia vai aprofundar seu verdadeiro caminho teológico.
O filme não retrata a figura fina e elegante que o caracteriza. Em certa cena, levanta a voz e quase grita, o que, me parece, totalmente inverosível e contra seu caráter.
Apesar de estarmos agora em situações diferentes, ele Papa e eu um um teólogo promovido a leigo, nunca perdemos a amizade. Por seus 90 anos, ao ser organizada uma Festschrift (um livro de homenagem), na qual muitos notáveis escreveram, a pedido dele solicitaram-me que escrevesse meu testemunho a seu respeito, o que fiz, prazerosamente. A amizade é mais forte que qualquer doutrina sempre humana.
O Papa Francisco: terno, fraterno e inovador
Com referência ao Jorge Mario Bergoglio, agora Papa Francisco, diria o seguinte: Conhecemo-nos em 1972 no Colégio Máximo de San Miguel em Buenos Aires, cada um discorrendo sobre a singularidade do caminho espiritual de Santo Inácio de Loyola (ele) e o caminho espiritual de São Francisco (eu). Ai discutimos a vertente da teologia da libertação de tipo argentino (do povo silenciado e da cultura oprimida) e a nossa brasileira e peruana (sobre a injustiça social e a opressão histórica sobre os pobres e afrodescendentes). Deste encontro há uma foto que ele, desde Roma, teve a gentileza de me mandar, onde aparecemos, todo um grupo de teólogos e teólogas, a maioria não mais entre nós, alguns perseguidos e torturados pela repressão bárbara dos militares argentinos ou chilenos. Depois nos perdemos de vista.
(Ele é o terceiro da esquerda para a direita e eu o segundo da esquerda)
O Papa Francisco: teólogo da libertação integral
Soube pelo seu professor de teologia, recentemente falecido, Juan Carlos Scannone, o representante maior da teologia da libertação argentina. que Bergoglio entrou para a Ordem Jesuítica como vocação adulta (era químico antes, como aparece no filme). Entusiasmou-se logo com a teologia da libertação e aí mesmo fez um voto que cumpriu sempre, mesmo como cardeal de Buenos Aires: toda semana passar uma tarde ou mesmo um dia numa favela (villa miseria), sempre sozinho, entrando nas casas e conversando com todo mundo.
Foi Superior Maior da Província dos Jesuitas da região de Buenos Aires. Era muito rigoroso. Aqui teve que enfrentar uma situação gravíssima que carregou no coração até os dias de hoje: dois jesuitas, o padre Jalish e o padre Yorio (que conheci pessoalmente em Quilmes) viviam numa favela, apoiando os pobres e marginalizados. Quem trabalhava com o povo, como no Brasil de 1964 (e talvez também hoje sob o novo governo) seriam considerados marxistas e subversivos. Eram vigiados pelos órgãos de segurança dos militares. Bergoglio soube que seriam sequestrados com as torturas que se seguiam. Tentou salvá-los até apelando ao voto de obediência, típico de sua Ordem, no sentido de abandonaram a favela para não serem vítimas da repressão.
Eles argumentaram de forma evangélica: “um pastor não abandona seu rebanho, seu povo; participa de seu destino; vale mais obedecer ao Deus dos pobres do que obedecer a um superior religioso”.
Efetivamente foram sequestrados e duramente torturados. Jalish se reconciliou com Bergoglio e vive na Alemanha, enquanto Yorio se sentiu abandonado e distanciou-se dele (morreu no Uruguai, anos atrás). Pude sentir sua amargura pessoal, ao mesmo tempo que procurava entender o impasse que uma autoridade religiosa, com responsabilidade, enfrenta em situações-limite. Mesmo assim, Bergoglio escondeu a muitos no Seminário Maior de San Miguel ou os levou até a fronteira de outro país para fugirem da morte certa.
O Papa Francisco: o cuidado da Casa Comum
Ao ser eleito Papa, voltamos a nos comunicar. Sabendo que havia me ocupado intensivamente com o tema da ecologia integral, envolvendo a Casa Comum, a Mãe Terra, solicitou-me subsídios, coisa que fiz com assiduidade. Mas logo me advertiu:”não mande os textos para o Vaticano, pois, não me serão entregues (o famoso sottosedere da Cúria: sentar em cima e esquecer) mas envie-os diretamente ao embaixador argentino junto à Santa Sé, especialmente aquele que todos os dias, bem cedo, toma o chimarrão (el mate), comigo”. Assim fiz sempre, mesmo com textos sobre o Sínodo Panamazônico de 2019. Respondeu várias vezes agradecendo.
Ao escolher o nome de Francisco sob inspiração de seu amigo brasileiro, o Card. Dom Cláudio Hummes que lhe sussurrou logo fazer uma opção clara pelos pobres, ele se transformou. O rigor jesuítico se uniu com a ternura franciscana. Com os problemas internos da Cúria, a pedofilia, a corrupção financeira dentro do Banco do Vaticano é extremamente rigoroso. Contrariamente, com o povo é visivelmente terno e fraterno.
Nenhum Papa anterior castigou tão duramente o sistema que perdeu a sensibilidade, a solidariedade com os milhões de pobres e famintos, a capacidade de chorar e que são adoradores do ídolo do dinheiro. Depredam a natureza e são anti-vida e anti-Mãe Terra. Não precisamos declarar a que sistema se refere. Sua opção pelos pobres é altisonante. Tornou-se por suas posturas corajosas face à emergência ecológica da Terra, ao aquecimento global e à desumanização das relações humanas, um líder religioso e político. Sua voz é ouvida e respeitada pelo mundo afora.
Dois modelos de homem e dois modelos de Igreja
O propósito do filme é mostrar dois modelos de personagens religiosas e dois modelos de Igreja.
Primeiramente mostra como ambos, Ratzinger e Bergoglio. são humanos, profundamente humanos. Nesse sentido: ambos possuem seu lado luminoso e também seu lado sombrio. O Papa Bento XVI sua leniência com os pedófilos. Não devemos esquecer que escreveu a todos os bispos, sob sigilo pontifício que jamais deve ser quebrado, de não entregar os padres e os bispos pedófilos aos tribunais civis. Isso desmoralizaria a instituição Igreja. Deviam, sim, confessar-se do pecado e ser transferidos para outro lugar. O Papa não se deu conta suficientemente de que não tinha a ver apenas com um pecado perdoável pela confissão. Tratava-se de um crime contra inocentes que a justiça comum deve investigar e punir. Não se pensou nas vítimas, apenas na salvaguarda da imagem da instituição-Igreja.
O Papa Bento XVI colocou-se na esteira do João Paulo II que era moral e doutrinariamente conservador. Procurou relativizar o arggiornamento do Concílio Vaticano II (1962-1965). Via a Igreja como uma fortaleza sitiada por todos os lados por inimigos, vale dizer, pelos erros e desvios da modernidade. A solução que se propunha era a de voltar à grande disciplina anterior, vinda do Concílio de Trento (século XVI) e do Concílio Vaticano I (1870). A centralidade era a ortodoxia e a sã doutrina, como se fossem as prédicas que salvassem e não as práticas. Nesta linha o Card. Joseph Ratzinger foi rigoroso: mais de 110 teólogos ou teólogas foram condenados, depostos de suas cátedras, silenciados (no Brasil Yvone Gebara e eu pessoalmente) ou de alguma forma punidos. Um deles, excelente teólogo, foi condenado sem recebernenhuma explicação. Ficou tão deprimido que pensou em suicidar-se. Só se curou quando foi à América Central A trabalhar com as comunidades eclesiais de base.Viveu-se um inverno eclesial severo.Toda uma geração de padres foi formada nesse estilo doutrinário e com os olhos voltados ao passado, usando os símbolos do poder clerical.  Igualmente, toda uma plêiade de bispos foram sagrados, mais autoridades eclesiásticas ortodoxas que pastores no meio de seu povo.
Outro modelo de personalidade religiosa é o Papa Francisco. Ele vem do fim do mundo, de fora da velha e quase agônica cristandade europeia. Ele trouxe uma primavera para a Igreja e para o mundo secularizado.
Primeiramente inovou os hábitos. Ao negar-se de vestir a “mozzeta” o pequeno manto branco, cheio de brocados que os papas carregam aos ombros, símbolo do absoluto poder dos imperadores romanos pagãos, diz o filme claramente : “acabou-se o carnaval”. Não aceita a cruz dourada, continua com sua cruz de ferro; rejeita o sapato vermelho (Prada) e continua com o seu velho sapato preto. Não se anuncia como Papa da Igreja, mas como bispo de Roma e somente a partir daí, Papa da Igreja universal. Animará a Igreja não com o direito canônico, mas com o amor e com a colegialidade (consultando a comunidade dos bispos). Em sua primeira fala pública diz “como gostaria uma Igreja pobre para os pobres”. Não mora no palácio papal, o que seria uma ofensa ao poverello de Assis, mas numa casa de hóspedes. Come na fila como os outros e comenta, com humor:”assim é mais difícil que me envenenem”.
Dispensa um carro especial e um corpo de proteção pessoal. Mistura-se no meio do povo, dá as mãos a quem as estende e beija as crianças. É pai e avô querido das multidões.
Seu modelo de Igreja é o de “um hospital de campanha” que atende a todos, sem perguntar de onde vem e qual é sua situação moral. É uma “Igreja em saída” para as periferias humanas e existenciais. Respeita os dogmas e doutrinas mas diz claramente que prefere colocar-se vivamente diante do Jesus histórico, opta pelo encontro direto com as pessoas e a pastoral da ternura. Insiste que Jesus veio para nos ensinar a viver o amor incondicional, a solidariedade e o perdão. Central para ele é a misericórdia infinita de Deus. Vai mais longe ao dizer :”Deus não conhece uma condenação eterna pois perderia para o mal. E Deus não pode perder. Sua misericórdia não conhece limites”. Por isso chama a todos, uma vez purificados de suas maldades, para a casa que o Pai e Mãe de bondade preparou para todos desde toda a eternidade. Morrer é sentir-se chamado por Deus e vai-se alegre para o Grande Encontro.
Eis outro tipo de pontificado, outro modelo de ser humano que reconhece que perdeu a paciência quando uma mulher o puxou e apertou longa e duramente sua mão. Irritado, bateu-lhe a mão por duas ou tres vezes. Mas no dia seguinte pediu publicamente perdão.
Dois Papas: diferentes e complementares.
O Papa Francisco abriu sua inteira humanidade, dando-se o direito à alegria de viver, de torcer pelo seu time de estimação o San Lorenzo, de apreciar a música dos beatles até conquistar o Papa Bento XVI a dançar um tango, impensável a um severo acadêmico alemão. Aqui aparece não o Papa mas o homem Bergoglio que desentranha humanidade recolhida do homem Ratzinger. Ambos são diferentes mas se integram na dança de um tango de pessoas anciãs.
O filme é uma bela metáfora da condição humana, de dois modos diferentes de realizar a humanidade, que não se opõem mas se compõem e se completam, uma com a ternura e a outra com o rigor. Vale ver o filme, pois nos faz pensar e nos oferece lições de mútua escuta, de verdades ditas sem rebuços e de uma amizade que vai crescendo na medida em que a relação se descontrai  de encontro a encontro. O perdão que um dá ao outro e o abraço final, longo e carinhoso, engrandece o humano e o espiritual presentes em cada  um de nós.
(02-01-2019)

Zé Celso, Laerte, Tata Amaral, Nicolelis: cultura, ciência e democracia

“A ciência só existe quando vem do homem. A felicidade de milhões não pode ser subjugada pela ganância de uma minoria”, afirma neurocientista. “Quero o meu voto de volta”

“O mundo hoje sabe que é golpe”, disse o cientista Miguel Nicolelis, que ajudo a repercutir internacionalmente o processo de impeachment no Brasil. No ato Grito pela Democracia, realizado neste sábado (21) em São Paulo, ele lembrou de quando foi estudante secundarista e participou de passeatas contra a ditadura. “Fui embora do Brasil para perseguir a minha utopia, ser cientista. Mas a ciência só existe quando vem do homem. A felicidade de milhões não pode ser subjugada pela ganância de uma minoria”, afirmou Nicolelis, atacando o “mafioso, medieval, medíocre” governo interino e pedindo a volta de Dilma Rousseff.

“Este Brasil não pertence aos homens brancos, milionários e alguns deles criminosos, que ocuparam o poder neste momento”, acrescentou o cientista. “Eu quero o meu voto de volta. Eu quero no Palácio do Planalto a brasileira que foi eleita por 54 milhões de brasileiros. Eu só aceito a verdadeira presidente do Brasil sentada na cadeira da Presidência da República.” Para Nicolelis, o golpe atacou “o coração e a alma” dos brasileiros: a cultura. “Todos somos artistas, somos poetas.”

A cartunista Laerte Coutinho identificou diferença entre o golpe atual e o de 1964. “Por que fechar o Congresso? Foi o Congresso que deu o golpe”, afirmou. Para ele, os partidos tradicionais estão em crise e as pessoas são convocadas a participar politicamente de uma forma difusa. Neste momento, acrescentou, é preciso se preocupar não apenas em derrotar o golpe, “mas construir o depois do golpe”, para restabelecer a normalidade democrática e retomar as demandas sociais. “Estamos no meio. Fora Temer”, disse Laerte.

Com uma mensagem em vídeo, a cineasta Tata Amaral, que está em Cannes, destacou o protesto feito por equipe e elenco do filme Aquarius. “Foi lindo, muito aplaudido”, afirmou, ressaltando a “sensação incrível” de deixar o país com Dilma Rousseff na presidência e voltar com Michel Temer no poder. “A gente apenas começou na conquista de direitos. A gente não pode e não vai voltar atrás”, disse Tata. “Sou contra o governo golpista de Temer. Não estamos à venda. Esse projeto não foi eleito.”

Ela também fez referência à extinção do Ministério da Cultura, que após pressões do meio artístico deverá ser mantido por Temer. Segundo Tata, é um órgão para estabelecer políticas e garantir inclusão e democratização, e isso se evidencia pela quantidade de autores produzindo. “Isso é uma política pública, não acontece à toa”, afirmou, manifestando também contra o fim da Controladoria-Geral da União e as ameaças ao SUS.

Com uma jaqueta vermelha e um enorme cachecol branco, o diretor teatral José Celso Martinez Corrêa comentou artigo do diretor do Sesc São Paulo, Danilo Santos de Miranda, para quem a cultura está em coma. “Não é a cultura, é o Estado que está em coma. A República foi enterrada com esse golpe”, disse Zé Celso, aludindo ao “espetáculo ridículo” de 17 de abril, quando a Câmara aprovou a admissibilidade do processo de impeachment. “Todos aqueles corruptos se abrigaram nesse golpe”, afirmou o diretor, referindo-se a José Serra (que lembrou ter sido presidente da União Nacional dos Estudantes) como “entreguista”.

Ao mesmo tempo, Zé Celso que o fechamento do Ministério da Cultura, agora revogado, sinaliza algo positivo, uma “revolução cultural da juventude”. “Porque cultura é uma coisa transversal. A cultura é simplesmente a coisa mais importante da vida. É a infraestrutura da vida.” Para o diretor do Oficina, “resistência” é uma palavra superada. “Você tem de re-existir”, afirmou.

Muitos participantes do “Grito” fizeram referência à mídia tradicional e às ameaças à comunicação pública. O professor Laurindo Leal Filho, por exemplo, destacou a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), que ajudou a “aumentar o patamar civilizatório da sociedade brasileira”. “A Globo é inimiga do povo, da democracia”, acrescentou.

“Não acreditem no que sai na mídia”, disse o jornalista e publicitário Chico Malfitani, um dos fundadores da torcida organizada Gaviões da Fiel, do Corinthians. “A mesma mídia que criminaliza a Gaviões e as torcidas organizadas é a mesma que criminaliza as esquerdas”, afirmou, destacando o apoio dado a movimentos como à greve dos professores estaduais e à ocupação das escolas em São Paulo. Ele lembrou ainda que há 18 integrantes da Gaviões presos há mais de um mês”, jogados na delegacia e esquecidos”, por protestar contra o desvio de recursos da merenda escolar. Há uma audiência prevista para esta segunda-feira (23).

Fonte: Rede Brasil Atual
http://www.redebrasilatual.com.br/politica/2016/05/ze-celso-laerte-tata-amaral-nicolelis-cultura-ciencia-e-democracia-9687.html

Tener una madre

Acá, en Luján de Cuyo, entre los jovatos que quedamos, es un deporte consentido simular que conocimos al menor de los Juri, al niño y adolescente que sería Leonardo Favio. Hemos ido armando una historia, una leyenda, que repetimos cada vez más convencidos, sin desmentirnos.

No tiene importancia casi, salvo porque el propio Leonardo le dio siempre mucha importancia a su propia niñez.

Yo sí me acuerdo de su grupo, los chicos de la Colonia Hogar – en ese tiempo El Patronato de Menores-. Chicos en crisis. (En rigor eran sus padres los que estaban en crisis). Chicos en ratos muy violentos, y en seguida en ternura; que pasaban como ráfagas por nuestra Escuela Nacional, peleados ya con la vida y a la vez desesperados por bebérsela toda de un trago.

Los Juri tenían “algo”, creo, una enigmática seducción. Que se multiplicaba cuando nos dimos cuenta que a ratos se llamaban “Juri” y ratos se llamaban “Favio”.

Ni nos habíamos dado por enterados. “Laura Favio” era el nombre de una de las autoras de radioteatro que en mi casa, y en todas las otras, más se admiraba, con verdadero asombro y pasión. Para todos era una autora internacional, de Buenos Aires por lo menos. El radioteatro arrasaba con todo, y “La bestia acorralada”, de Laura Favio, cortaba el aliento durante una hora y media.

Nadie hubiera creído, era increíble, que Laura Favio vivía (bueno, algunas noches, digamos…) en la “Calle de la Costa”, en un lugar de conventillos. Que era la madre de varios Juri y de Leonardo. Que a lo mejor tuvo a Leonardo de Juri, porque, ahora se sabe, el padre de los Juri era un hombre turbio, promiscuo, y ella, por un tiempo, una próxima, luego su mujer.

¿De dónde sacó tanto talento esta mujer? ¿De dónde su escritura prodigiosa, el guion perfecto, el manejo apabullante de las emociones? No importa. Pero sí importa que lo transmitió a sus hijos.

Apurados por marcar el prodigioso salto del origen carenciado a la genialidad artística, los atropellados biógrafos de Leonardo han ignorado casi por completo a su madre. Una madre abandónica de a ratos, es cierto; sin cumplir con los deberes ancestrales a veces, pero dándole la leche nutricia de la pasión artística, el rescate de la miseria por la dignidad de los sueños, la salvación por la belleza. Casi sin padre, Favio tuvo una madre. Gracias a ella llegó a ser quien fue.

En su última película, “Aniceto”, Leonardo puso una dedicatoria: “A Laura Favio, amiga, madre divina”.

Fuente: Edición Cuyo

HISTÓRIA E DOCUMENTÁRIO, nota miúda

O cinema documental no Brasil tem uma tradição, pelo menos desde os anos 60. Os documentários produzidos por Thomaz Farkas que teve o nome de “A condição brasileira” é um dos exemplos interessantes de como o documentário tem papel importante no cinema brasileiro. E mais ainda, o documentário brasileiro, na sua maioria, optou por mostrar o “Brasil profundo” a partir das camadas populares.

O povo teve certo protagonismo raro na história do país. Os livros sobre o cinema documental é que são poucos. Nos últimos anos (década de 2000) começou um movimento interessante na produção bibliográfica. São dissertações de mestrado ou teses de doutorado, são ensaios e artigos e coletâneas de estudiosos que têm aparecido cada vez mais no mercado editorial brasileiro.

A mais recente publicação sobre o gênero foi: “História e Documentário”, coletânea organizada por Eduardo Morettin, Marcos Napolitano e Mônica Almeida Kornis, publicada pela editora da FGV (Fundação Getúlio Vargas). O livro tem 11 artigos em que abarca as diversas faces do documentário, mas tendo o fio condutor das temáticas historiográficas.

Dois aspectos podem ser levantados para demonstrar a importância da obra: o primeiro deles diz respeito à consolidação da pesquisa histórica que privilegia como fonte o cinema, apreendido em sua especificidade (não se trata apenas de fazer do cinema documental instrumento para a história, mas entende-lo como cinema, arte). O segundo aspecto importante se relaciona ao papel decisivo que o documentário vem desempenhando nos debates culturais do país desde o chamado “cinema da retomada”.

Os filmes documentais de Eduardo Coutinho, por exemplo, atestam o empenho de refletir sobre o momento presente de maneira crí tica e reveladora, dando continuidade ao caráter de intervenção que notabilizou esse tipo de produção cinematográfica desde o cinema novo. Os estudiosos do cinema documental tem uma obra séria e fruto de pesquisas na área. Encontram-se artigos de Ismail Xavier sobre “o documentário silencioso brasileiro”, de marcos napolitano sobre as produções de Silvio Tendler e de Rosane Kaminski sobre os filmes de Sylvio Back.

O autor é docente na UFS.

NOTAS MIÚDAS SOBRE CINEMA, OS ÁRABES E NOSSOS DIAS

Ninguém duvida mais do potencial ideológico do cinema desde que D. W. Griffith lançou em 1915 o seu filme “O nascimento de uma Nação”. Película claramente racista, em que brancos atores pintados de negros são difamados como violentos contra brancos e ainda que os negros são destituídos de inteligência. O filme dava um reforço aos escravistas americanos ainda descontentes com a libertação dos escravos. Os rumos do filme e as reações que sofreu mesmo nos EUA e as mudanças de Griffith não vem ao caso, o que nos importa é que ele abriu um portal que não se fechará jamais na arte cinematográfica: a “sétima arte” tem poder ideológico de manipulação coletiva das massas. Como bem afirmava Walter Benjamin, o cinema pode tornar-se um “poderoso aparelho publicitário”. C hegamos a isto, também. A mais recente noticia deste papel a que pode se prestar a imagem cinematográfica foi nos apresentado esta semana (setembro de 2012) no You tube com trechos do filme: Innocence of Muslims do estreante “diretor” Sam Bacile. Ele mesmo se intitula de judeu israelense que mora nos Estados Unidos.

Em algumas palavras que encontramos em sites de jornais pronunciadas pelo próprio, o filme foi financiado por 100 judeus ricos e custou o equivalente a 5 milhões de dólares. Pouco para os grandes filmes Norte-americanos, mas muito para se fazer um filme de propaganda contra a religião árabe em um momento difícil e de grandes tensões no Oriente Médio e nos EUA. Em trechos relativamente longos que encontramos na internet do filme, podemos ver claramente a intenção do “diretor”: difamar a figura histórica de Maomé. Em vários momentos do filme o fundador da religião islâmica é apresentado como a d últero, pedófilo, bissexual e um instigador de violência gratuita. O problema de tais informações é que não encontram respaldo histórico algum. Lendo o trabalho acadêmico do historiador francês especialista em história Árabe Dominique Sourdel, intitulado: História do povo Árabe, não encontramos jamais indícios desse comportamento de Maomé ou dos seus seguidores. Então, de onde vem a “licença poética” para a “arte” do ilustre desconhecido Sam Bacile? Sem dúvida, dos debates ideológicos bem rebaixados e incentivados diariamente pela mídia e pela direita Norte-americanas.

Desde o lamentável “11 de setembro” de 2001 e um pouco antes dele, se criou nos EUA da América uma “cultura contra os árabes e sua religião Islâmica”. Obviamente, capitaneada pela “era Busch” de triste memória. Isto não significa uma posição totalmente acrítica em relação à religião Muçulmana de nossa parte. Destacamos o livro virulento do filósofo Michel Onfray Traité d´Athéologuie, publicado em 2005 pela editora francesa Grasset. O livro é uma tentativa de fundamentar o ateísmo a partir do histórico e das práticas politicas das religiões monoteístas (cristã, judia e islâmica). O filósofo francês faz duras críticas às práticas históricas das religiões monoteístas a ponto de defender a tese de que o mundo estaria mais seguro sem elas. Nas suas críticas, em nenhum momento o autor faz acusações do tipo podofilia ou bissexualidade dos fundadores de cada uma das religiões. A questão para ele não é de alguma “fofoca moral”, mas de caráter politico.

Ele usa fontes de obras das próprias religiões e assume sua postura ateia. Independente de concordarmos ou não com Onfray, temos uma obra séria e de argumentos fundamentados em bases sólidas, o que falta hoje aos opositores mais delirantes do Islã nos Es ta dos Unidos e Europa. Não temos dúvida alguma das contradições do Islã ou de qualquer religião existente. Uma religião como fenômeno histórico é tão contraditória como qualquer instituição, por mais que seus fiéis digam o contrário. Existe no Islã fundamentalistas, como existem liberais. Existe no Islã regras morais como existe em toda religião que mereça o nome. Por fundamentalismos e moralismos, boa parte dos cristãos e judeus Norte-americanos não tem a menor razão de criticar os muçulmanos. São tão reacionários quanto qualquer “Talibã” do Afeganistão. Chegam a ser patéticos se não fossem poderosos em termos políticos nos EUA.

O filme Innocence of Muslims vem em péssima hora e da maneira mais infeliz possível. O saldo atual: morte do embaixador americano na Líbia e mais três funcionários da embaixada Norte-americana como reação ao filme e à politica dos Estados Unidos no mundo Árabe. Por enquanto. O apoio do Estado de Israel ao filme é desastroso e só coloca mias lenha na fogueira dos conflitos Árabe/Judeu. O irônico nessa história de cinema e ideologia religiosa é o fato do Estado de Israel ser crítico violento dos filmes de Amos Gitai por considerá-los ofensivo ao povo judeu que vive em Israel. Gitai é um judeu e profundamente critico da politica de Israel contra os Palestinos e nos seus filmes também faz críticas ao fundamentalismo judaico e da condição da mulher nesses guetos ortodoxos. Merece citar aqui um a obra prima do cineasta israelense intitulada: Kadosh (1999). Em nada Gitai cai em antissemitismo ou preconceito racial. Seus filmes são uma espécie de “documento” do mundo Árabe e da posição de Israel nesse contexto. Filme com caráter ideológico sim, mas sem serem panfletários.

Não há interesse de Gitai em fazer campanha contra judeus, mas desmistificar as politicas do Estado de Israel no mundo Árabe. Há em seus filmes as periferias de Israel, a condição contraditória das mulheres, o fundamentalismo judaico tão danoso quanto o islâmico, a situação da juventude pobre, os rituais repetitivos e vazios de mística. Diferente do que fez Sam Bacile. O filme do israelita/americano ínsita o ódio gratuito a Maomé e aos Árabes e reforça a política equivocada dos Estados Unidos no mundo Árabe. Pouco sabemos do cinema produzido no Oriente Médio . Sal vo os filmes iranianos sempre premiados fora do Irã, sabemos pouco do que se produz naquela região, mas o que vemos do cinema do Oriente Médio no Ocidente é de encher os olhos. São filmes delicados, simples e de narrativa que primam pela memória, muito diferente desses panfletos idiotas feitos por alguns Norte-americanos com a intenção nitidamente de macular a imagem do povo Árabe. Não é assim que se faz “geopolítica internacional” com o cinema e não ajuda em nada a suposta liberdade e democracia que defendem tão ardorosamente os mesmos Norte-americanos.

O autor é docente no Depto. de Filosofia da UFS