Arquivo da categoria: Racismo & discriminação

É preciso ter coragem!

É preciso ter coragem! Por frei Gilvander Moreira[1]

Por mais que lorotas dos capitalistas fascistas que, para desviar o foco e criar cortina de fumaça, acusam de ser “comunistas” quem luta por justiça socioambiental, por direitos humanos e direitos da natureza, o fato é que (sobre)vivemos em uma sociedade capitalista, que é uma máquina de moer vidas humanas e de toda a natureza, no estágio atual colocando em risco a sobrevivência da humanidade e da maioria das espécies vivas, porque está devastando de forma brutal o ambiente e gerando a emergência climática com eventos extremos cada vez mais frequentes e letais. A opressão, a exploração ou superexploração, violências de mil formas campeiam na sociedade capitalista, seja na forma de superexploração da força de trabalho pela uberização do trabalho, remuneração por produção, terceirização ou quarteirização, seja pelo racismo, pela homofobia, pela discriminação, pelo feminicídio, pelo patriarcalismo, pelo fascismo etc., todas violências que têm como causa maior o sistema do capital idolatrado.

Viver, conviver e agir de forma humana em uma sociedade capitalista é um desafio gigante. A maioria das pessoas, quase todas das classes trabalhadora e camponesa, reduz a vida à luta pela sobrevivência, o que exige muitas vezes se omitir ou se tornar cúmplice de muitas injustiças e violências. Muitos sabem que se tomar partido e denunciar injustiças é perseguido, demitido, censurado ou excluído sumariamente. Em muitos cantos e recantos vigora o ditado popular “aqui quem tem olhos não vê, quem tem boca não fala e quem tem ouvidos não ouve nada, pois se falar morre.” Lamentavelmente uma das estratégias da sociedade capitalista para reproduzir as relações sociais capitalistas, que são escravocratas, é a imposição do medo de muitas formas, pois quem teme fica calado, se omite e, muitas vezes, sem perceber que está sendo cúmplice. Às vezes, salva a própria pele por certo tempo, mas condena indiretamente muitos/as ao sacrifício no altar do mercado idolatrado.

Neste contexto de injustiça institucionalizada e estrutural, é necessário recordarmos a beleza e a necessidade de sermos pessoas de coragem, destemidas, para andarmos na contramão “atrapalhando o sábado”. Afinal, peixe vivo é o que nada rio acima. Em centenas de vezes em que na Bíblia se narra a aparição de um anjo, mensageiro divino, convidando alguém a abraçar uma missão dada pelo Deus, mistério de infinito amor, após propor a missão e constatar que a pessoa treme na base diante do desafio que lhe é proposto, a primeira fala e atitude do anjo é dizer “Não tenha medo. Coragem! Deus está com você.”

A história humana demonstra que quem faz história não tem medo, ou seja, tem coragem, “age pelo coração” que fervilhando de indignação, em ira santa, não se omite e não se torna cúmplice diante de nenhuma injustiça, exploração ou violência perpetrada contra alguém ou qualquer ser vivo, de perto ou de longe. Segundo o livro do Êxodo, na Bíblia, após amargar uns 500 anos de escravidão no Egito, debaixo do imperialismo dos faraós, os povos oprimidos e superexplorados de várias culturas, diante de um Decreto do Faraó que mandava matar os meninos ao nascer – fazer controle de natalidade -, os povos se uniram, se organizaram e partiram para conquistar terra e liberdade: um sonho bom e invencível. No entanto, no início da caminhada, os povos se viram encurralados pelo Mar Vermelho à frente, atrás a tropa de choque dos faraós e montanhas dos dois lados. Nesse apuro, as mulheres parteiras – Séfora e Fua -, Míriam e Moisés convidaram o povo a dar as mãos e de cabeça erguida bradaram: “Coragem! Um passo à frente!” O Mar Vermelho se abriu e os povos seguiram a caminhada para conquistar a terra prometida pelo Deus solidário e libertador, terra sem males. Foi com coragem que entraram para a história Séfora e Fua, duas parteiras escravizadas no Egito, Miriam, Moisés e muitas outras pessoas anônimas, que, enfrentaram o imperialismo dos faraós, no Egito, por volta do ano 1200 antes da Era Cristã,

Foi assim que os profetas e as profetisas da Bíblia e de outros textos sagrados de várias religiões entraram para a história: por enfrentar os opressores, como “Davi enfrentou Golias” e por ter feito opção de classe, pelos injustiçados, consolando-os na luta pela superação das injustiças. Galileu Galilei, Giordano Bruno, muitas mulheres consideradas bruxas, Mahatma Gandhi, Martin Luther King, Che Guevara, Rosa Luxemburgo, “144 mil” mártires que viveram enfrentando os dragões de plantão, Margarida Alves, Marielle Franco, Mãe Bernadete, Chico Mendes, Irmã Dorothy Stang, Padre Josimo, Padre Ezequiel Ramin, Santo Dias …, todos/as, entre as várias qualidades que testemunhavam, demonstraram coragem inabalável diante de ameaças e perigos.

Recordei-me de tudo o que escrevi acima ao contemplar o que foi, fez e lutou e continua sendo e fazendo – de outra forma -, Irmã Neusa Francisca do Nascimento, da Congregação das Irmãs da Divina Providência, que partiu para a vida plena dia 25 de agosto último (2023). Irmã Neusa dedicou a sua vida à luta dos oprimidos, das Comunidades Tradicionais do Norte de Minas Gerais e por anos ajudou a construir o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) no estado de Minas Gerais e o importante Movimento das Pescadoras e Pescadores Artesanais, o MPP, que tanta luta vem travando nas barrancas do Rio São Francisco.

Dia 16 de agosto de 2017, Irmã Neusa Francisca do Nascimento participou de Audiência Pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na Comissão de Direitos Humanos, ocasião em que revelou coragem inabalável para denunciar com contundência os violentos e violentadores das Comunidades Tradicionais e especificamente da Comunidade Tradicional Vazanteira de Canabrava, que estava sendo despejada de forma brutal em Buritizeiro, nas barrancas do rio São Francisco, no norte de Minas Gerais.

A Irmã Neusa Francisca do Nascimento se encantou nas águas do Velho Chico e nas lutas do povo do rio!

Faço questão de transcrever aqui algumas denúncias veementes que Irmã Neusa fez ao vivo pela TV Assembleia, da ALMG, para percebermos a beleza e a necessidade de sermos pessoas corajosas. De cabeça erguida, com voz firme, Irmã Neusa, no microfone da Assembleia Legislativa de Minas Gerais bradou: “Inicio dizendo NÃO a esse processo de retirada de direitos que está violentamente acontecendo no nosso país, o que torna a vida impossível. Manifesto todo apoio ao Movimento das Comunidades Tradicionais, que está em movimento de resistência. Garantir os Territórios das Comunidades Quilombolas e de todas as outras Comunidades Tradicionais e indígenas é necessário. Está em risco toda a tradicionalidade dos territórios das Comunidades Indígenas, Quilombolas e Pesqueiras. ‘Com Deus na frente e paz na guia’ – lema de Irmã Neusa -, queremos fazer deste mundo um lugar bom de viver para todos e todas os viventes da mãe Terra – sonho de Irmã Neusa. A violência que sofre a Comunidade Tradicional Pesqueira e Vazanteira de Canabrava, lá em buritizeiro, no norte de Minas Gerais, não é um fato isolado, mas faz parte da estratégia do latifúndio, agora travestido de agro e hidronegócio. As Comunidades Tradicionais Pesqueiras, ao longo do rio São Francisco, vêm sofrendo violentamente processo de expulsão desde a década de 1960, mas, resistindo a esses mecanismos de expulsão, avançaram na consciência de seus direitos e estão fincando o pé nas Retomadas de seus Territórios, nos processos de permanente enfrentamento aos latifundiários e agronegociantes. A gente fica preocupada com a inércia do Estado, enquanto as Comunidades Tradicionais estão na mira da bala do latifúndio. A gente vê o fazendeiro, no caso da Comunidade de Canabrava, fazer o que fez nos últimos dias, enquanto a Comunidade estava esperando desde fevereiro uma visita do Governo no intuito de demarcar a área da Comunidade. A Comunidade está dentro da área de domínio da União. Isto já foi comprovado pela visita técnica da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) na semana passada. Estão dentro da área da União comprovadamente todas as casas que foram derrubadas no dia 18 pela Polícia Militar com decisão judicial injusta e as que foram derrubadas no dia 20 pelos jagunços e pelos fazendeiros. É inadmissível que o Governo não tenha 120 mil reais para fechar um Convênio com a SPU e uma Universidade para garantir a permanência das Comunidades nos seus territórios ancestrais, mas teve 70 mil reais para despejar uma Comunidade Tradicional Pesqueira, que estava dentro da área da União. Ainda mais inadmissível é aceitar que o fazendeiro tenha investido mais 20 mil reais e tenha participado diretamente da expulsão da Comunidade e tenha colocado seus capangas ali vigiando e pondo a arma no pescoço e na cabeça dos moradores. É inadmissível que a Polícia Militar, chamada desde as 8 horas da manhã e alertada para socorrer a Comunidade de Canabrava tenha se omitido, quando o fazendeiro estava fazendo por conta própria o despejo de forma ilegal, violenta. A Polícia Militar só compareceu depois de muito empenho no final da tarde e dizendo que não estava indo ali para proteger a Comunidade, mas simplesmente para acompanhar um perito do Ministério Público Federal que estava na área aquele dia fazendo estudo antropológico da Comunidade. Durante todo esse tempo, a gente estava com a Comunidade cercada de jagunços com tiroteios ameaçando o tempo inteiro, mas a Polícia Militar só foi comparecer quatro dias depois, mesmo estando a Comunidade de Canabrava cercada pelos tiroteios dos capangas do fazendeiro. No que a Comunidade Tradicional decidir a gente está junto para apoiar a Comunidade na resistência sofrendo toda tentativa de homicídio. A conivência do Estado com os latifundiários e empresários do agronegócio é brutal e nojenta. A gente está aqui para dizer que é preciso justiça urgente, pois o fazendeiro está se aliando a outros fazendeiros. Todas as margens do rio São Francisco, Territórios de Comunidades Tradicionais, estão sob violência de latifundiários, empresários do agro e hidronegócio, e do Estado. Pedimos urgência também ao Governo Federal, através da SPU, para que faça a demarcação de todos os Territórios ao longo do rio São Francisco que estão tradicionalmente ocupados por Comunidades Tradicionais Vazanteiras na mira da bala do latifúndio, encurraladas sofrendo todo esse tipo de pressão e violência. Se essas famílias vão com os filhos para as periferias, lá a polícia bate e mata; se resiste no seu Território Tradicional e luta para ficar lá, a polícia se alia aos latifundiários e as expulsa.”  

Detalhe: a Irmã Neusa fez todas estas denúncias necessárias enquanto morava na cidade de Buritizeiro, no município onde as violências se perpetravam. Por encarnar as virtudes humanas do amor ao próximo, da humildade, da solidariedade, da justiça e da ética e, acima de tudo, por ser mulher corajosa, Irmã Neusa Francisca do Nascimento “combateu o bom combate, completou a carreira, guardou a fé. A coroa da justiça lhe está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, lhe dará naquele dia; e não somente a ele, mas também a todos os que amam a sua vinda” (2 Tm 4,6-8). Guimarães Rosa compreendeu de forma magistral ao conviver com os Povos do Sertão mineiro que “a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.” (Grande Sertão: Veredas, Guimarães Rosa.). Enfim, que tenhamos a grandeza de honrarmos o imenso legado espiritual, ético e profético que Irmã Neusa Francisca do Nascimento nos deixou, com coragem e compromisso de toda a vida ao lado dos empobrecidos na luta pelos seus direitos. É preciso ter coragem!

­­­­30/08/2023.

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 Que continue em nós a CORAGEM e a SENSATEZ ÉTICA de Irmã Neusa Francisca do Nascimento, PROFETIZA!

2 – Chega de mineração! Chega de impunidade! Ir. Neusa (CPP) e Clarindo (Mov. Pescadores). 28/1/19

3 – Irmã Neusa Francisca Nascimento, profetiza e guerreira na defesa dos empobrecidos, de Deus no povo

4 – Despejo da Comunidade pescadora de Canabrava/Buritizeiro/MG: Irmã Neusa Nascimento/CPP. 16/8/17

5 – Verdades que precisam ser ditas em Betim/MG. “O negócio do Medioli é destruir”. Mulher de coragem!

6 – “Fé e coragem!” Culto e Vigília no Beco Fagundes, Betim/MG, sob pressão infernal por despejo injusto

7 – “Não vacilem! Coragem na luta por direitos. Metam o pé no barranco!” (Frei Gilvander na CDD).Vídeo 7

8 – Alvimar da CPT segundo o MST de MG: trabalho de base, unidade e coragem na luta. 27/08/16

 

 

 

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

Rodoanel na RMBH: ilegalidades e violências

Rodoanel na RMBH: ilegalidades e violências. Por frei Gilvander Moreira [1]

Início da 2a Marcha no bairro Nascentes Imperiais, em Contagem, MG, contra o Rodoanel/RODOMINÉRIO do Governador de MG, Zema, e da Vale S/A, dia 20/08/23. Fotos: Alenice Baeta

Em contexto de emergência climática com eventos extremos cada vez mais frequentes e letais, a realidade de uma sociedade capitalista como a nossa, com seus conflitos e contradições, pode ser iluminada por textos sagrados, como a Bíblia, que, se lida a partir da classe trabalhadora injustiçada, pode nos inspirar a assumir posturas de combate às injustiças atuais que se reproduzem cotidianamente. Uma parábola do Evangelho de Lucas narra: “Havia em uma cidade um juiz que não temia a Deus e não tinha consideração para com as pessoas (injustiçadas). Nessa mesma cidade, existia uma viúva que vinha a ele, dizendo: ‘Faz-me justiça contra o meu adversário!’” Pergunta o Evangelho: “Deus não faria justiça a seus eleitos que clamam a ele dia e noite?” (Lc 18,2-3.7). Essa parábola está acontecendo também nos últimos três anos em Minas Gerais com o desgovernador Zema insistindo em empurrar goela abaixo uma obra faraônica, ecocida, hidrocida, cavalo de troia, dragão do Apocalipse, que é o projeto do Rodoanel na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), que se for construído, será na prática um RODOMINÉRIO, infraestrutura para a mineradora Vale S/A e outras mineradoras subalternas a ela continuarem ampliando mineração em Belo Horizonte e RMBH, o que é insuportável. Já passou da hora de termos Mineração Zero na capital mineira e RMBH, após 300 anos de devastação socioambiental apunhalando as montanhas e arrancando das suas entranhas minério, jogando-o no “trem da morte” ou nos minerodutos das mineradoras todos os dias, levando para os portos do Espírito Santo e do Rio de Janeiro, deixando um rastro de devastação inominável nos territórios vítimas da exploração minerária. Já são 170 bilhões de reais de prejuízo ao erário público mineiro o valor que as mineradoras deixaram de pagar de ICMS, por causa da Lei Kandir, agora incorporada na Constituição através da “reforma tributária”, que dispensa o pagamento de ICMS sobre as commodities para exportação. Commodities são mercadorias primárias, entre as quais está o minério.

Em quase três anos de luta contra este famigerado Rodoanel, já fizemos dezenas de Atos Públicos, Marchas, panfletagem, audiências públicas, giros com carro de som em dezenas de bairros denunciando as ilegalidades, as injustiças e as violências socioambientais que esta megaobra absurda e desnecessária trará aos povos e a toda a biodiversidade de Belo Horizonte e da RMBH. Dia 20 de agosto de 2023 realizamos mais uma Marcha contra o Rodoanel/RODOMINÉRIO na RMBH, a 2ª Marcha no bairro Nascentes Imperiais, em Contagem, MG. Lideranças populares de dezenas de Movimentos Sociais e de partidos políticos de esquerda participaram, sob coordenação da Comissão de Nascentes. Ecoaram alto e em bom som as denúncias necessárias contra o Rodominério. Como a viúva do evangelho que não se cansou de ir todos os dias ao tribunal e cobrar insistentemente justiça, não repousaremos em paz até conquistarmos o impedimento do Rodoanel/RODOMINÉRIO na RMBH.

Nós do Movimento Social “Somos Todos Contra o Rodoanel na RMBH” criticamos de forma contundente a construção do Rodoanel na RMBH e temos propostas alternativas para resolver de forma justa, ética e democrática os problemas de trânsito e de mobilidade em Belo Horizonte e RMBH. Para impedir a agudização das injustiças socioambientais, econômicas e políticas reinantes em Belo Horizonte e RMBH propomos quatro alternativas à construção do Rodoanel: 1) Ampliação do Metrô de Belo Horizonte para as várias cidades da RMBH, que volte a ser público e com tarifa a mais barata possível; 2) Resgate do transporte de passageiros/as através de trens entre as 34 cidades da RMBH e Belo Horizonte, realidade que existia até por volta da década de 1970. Existem estudos avançados inclusive no âmbito da própria Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (SEINFRA) do Governo de Minas Gerais e na Comissão de Ferrovias da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) que corroboram estas alternativas; 3) Melhoria do transporte público de ônibus em Belo Horizonte e RMBH; 4) Revitalização, ampliação e duplicação do Anel Rodoviário de Belo Horizonte, o que é viável tecnicamente e será muito menos oneroso e não trará as brutais violações aos direitos socioambientais, históricos e arqueológicos de Belo Horizonte e 13 municípios da RMBH. Sobre esse ponto, deve-se observar que o anteprojeto detalhado de reforma do Anel Rodoviário foi realizado pelo Governo de Minas Gerais e está pronto desde 2016, tendo sido realizado pela empresa Tectran, do grupo Systra. Esse anteprojeto foi total e injustificadamente desconsiderado pelo desgovernador Zema, que optou pelo nocivo projeto do Rodoanel.

Todas essas propostas, por óbvio, devem ser submetidas à Consulta Prévia, Livre, Informada, Consentida e de Boa-fé de Povos e Comunidades Tradicionais que sejam impactadas por elas, conforme prescreve o Tratado Internacional Convenção 169 da OIT[2] da ONU[3]. A apresentação de propostas alternativas cumpre o propósito de demonstrar que existem caminhos menos danosos ao meio ambiente, às pessoas e ao patrimônio histórico e cultural da Região Metropolitana de Belo Horizonte, que devem ser estudados e divulgados antes da implantação do Rodoanel, grande obra que somente irá beneficiar as mineradoras.

O projeto do Rodoanel está eivado de ilegalidades, injustiças e violências socioambientais e econômicas. Eis algumas delas: a) O desgovernador Zema fez leilão do projeto do Rodoanel na Bolsa de Valores de São Paulo, B3, sem discutir o projeto com o povo, sem participação popular, pois as “audiências públicas” realizadas durante a pandemia da covid-19, a toque de caixa, foram farsas de audiências públicas. O princípio da participação popular foi violado; b) O leilão e a assinatura do contrato com uma empresa multinacional italiana, a INC S.P.A., ligada à extrema direita na Itália, foram feitos SEM Consulta Prévia, Livre, Informada, Consentida e de Boa-Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais, conforme prescreve o Tratado Internacional da Convenção 169 da OIT da ONU. Nos 13 municípios da RMBH que estão na mira para serem rasgados brutalmente pelo Rodoanel existem dezenas de Comunidades Quilombolas e dezenas de outras Comunidades Tradicionais, tais como: carroceiros, ciganos, agricultores familiares, povos de terreiros etc.; c) Não foi feito o licenciamento ambiental antes do leilão e da assinatura do contrato. Isto ao arrepio de leis que exigem que primeiro deve-se fazer o licenciamento ambiental, antes de se fazer leilão e assinar contrato. E se o licenciamento ambiental com os necessários estudos de impactos ambientais demonstrar que é inviável a construção do Rodoanel? Em cláusula leonina do contrato para caso de necessidade de romper o contrato, o Governo de Minas Gerais garante pagar uma multa de cinco bilhões de reais, o que, segundo juristas, fere a Lei de Responsabilidade Fiscal; d) E os direitos das mais de 15 mil famílias que serão desapropriadas e terão suas casas demolidas recebendo uma indenização que não cobrirá mais do que 30% do valor justo pelo terreno e construções? Sendo mais de 95% das propriedades sem escritura e sem registro de propriedade, mas só com “Contrato de Compra e Venda”, a indenização será menor e mais injusta ainda. Isso agravará brutalmente a injustiça urbana e metropolitana na RMBH, porque aumentará muito o déficit habitacional, o que eleva a desigualdade social de forma violenta; e) E a brutal devastação de muitos mananciais, áreas de proteção ambiental, sítios históricos e arqueológicos e as dezenas de Comunidades Quilombolas, centenas de Terreiros, outros Povos Tradicionais da RMBH e milhares de famílias de agricultores familiares que há mais de cem anos produzem alimento no chamado “cinturão verde” da RMBH? A Comunidade Quilombola de Pinhões e o Cemitério dos Negros escravizados serão rasgados ao meio; f) O Rodoanel não será uma estrada pública, será pedagiada com pedágio mais caro do Brasil, o que proibirá o povo pobre de passar por ela.

Suspeitamos que atualização do Plano Diretor da RMBH está sendo feita agora, a mando do Zema, para se gerar uma pretensa segurança jurídica. É previsível que nos 13 municípios que serão rasgados brutalmente pelo Rodoanel um grande número de ações judiciais serão impetradas no poder judiciário para impedir tantos crimes anunciados.

Enfim, se o Rodoanel for construído na RMBH, teremos um crime mil vezes mais greve do que o sepultamento de 272 pessoas vivas pela mineradora Vale S/A em Brumadinho dia 25 de janeiro de 2019, às 12H28. E continuaremos marchando rumo ao abismo de desertificação da RMBH, conurbação desenfreada, extinção de muitos mananciais necessários para o abastecimento público. Fome e sede imperarão na RMBH! Estamos avisando. Feliz quem ouvir este aviso e se engajar na luta popular para barrarmos o Rodominério antes que seja tarde.

22/08/2023.

Obs .: As videorreportagens nos links, abaixo, verso sobre o assunto tratado, acima.

1 – 1a parte da 2a Marcha contra Rodoanel na RMBH no Nascentes Imperiais, Contagem/MG: “RODOANEL, NÃO!”

2 – Frei Gilvander: Ilegalidades e violências do Rodoanel. 2ª Marcha nas Nascentes Imperiais, Contagem/MG

3 – 2a Marcha contra o Rodoanel na RMBH, no Nascentes/Contagem/MG: Zema c Rodoanel faraônico e brutal

4 – Frei Gilvander: “Plano Diretor da RMBH deve excluir o Rodoanel, garantir a preservação ambiental”. Vídeo 2

5 – Audiência Pública Plano Diretor da RMBH (PDDI). “Rodoanel vai demolir mais de 15 mil casas na RMBH!”

6 – José Carlos, Cassimiro, Tarcísio e Antonio do Pomar BH: injustiças do Rodoanel, RODOMINÉRIO na RMBH

7 – Keity e Glauco denunciam as brutalidades do Rodoanel, RODOMINÉRIO na RMBH. Fora, Rodoanel! Vídeo 7

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia Bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail:  gilvanderlm@gmail.com  –  www.gilvander.org.br  –  www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Organização Internacional do Trabalho.

[3] Organização das Nações Unidas.

Minerar em AREDES: golpear a história, matar águas!

Minerar em AREDES: golpear a história, matar águas! Por frei Gilvander Moreira[1]

Fotos feitas durante Visita Técnica da Dep. Bella Gonçalves, Dep. Tito e Dep. Ricardo Campos à Estação Ecológica AREDES, em Itabirito, MG, dia 10/08/23: Reprodução/Mov. SOMOS AREDES

Para atender aos interesses capitalistas e particulares da mineradora Minar, o deputado estadual João Magalhães (PMDB) apresentou o PL 387/23, que está tramitando na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Mesmo eivado de inverdades, ilegalidades e inconstitucionalidade, de forma muito estranha e suspeita, este projeto de lei, muito mal escrito, aliás, já foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da ALMG e está agora sendo apreciado pela Comissão de Meio Ambiente da ALMG. Projetos semelhantes ao PL 387/23 para retomar mineração em Aredes já foram arquivados nas últimas legislaturas na ALMG. É a terceira vez que a mineradora Minar insiste em tentar sacrificar de forma brutal e assustadora a Estação Ecológica de AREDES, no município de Itabirito, MG.

Dia 10 de agosto de 2023 aconteceu Visita Técnica da Comissão de Meio Ambiente à Estação Ecológica de Aredes. Participaram a deputada Bella Gonçalves, que defende que o PL 387/23 deve ser arquivado, e os deputados Tito Torres (PSD) e Ricardo Campos (PT). Aredes está distante de Belo Horizonte uns 50 Km. Após deixar a BR 040 e entrar em estrada de terra para chegar à Estação Ecológica de Aredes, assustado, tive a impressão de estar adentrando em uma zona de guerra: carretas de mineração, que são verdadeiros tanques de guerra, em trânsito frenético, indo e voltando; caminhões-pipas molhando a estrada – Haja água para abrandar tanta poeira! Enquanto milhares de bairros sobrevivem com migalhas de água nas 34 cidades da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), caminhões-pipas de mineradoras jogam água em estradas, desperdiçando este bem precioso para auferir acumulação de capital para mineradoras com ganância sem fim. Até quando esta injustiça perdurará?

Atento para não ser atropelado por carretas de mineração, vi barragens e crateras de mineração ao longo de todo o caminho até Aredes. Barragem da mineradora Herculano, que, em 2014, matou três trabalhadores durante o seu rompimento, que inundou de lama tóxica o córrego Silva, afluente do rio Itabirito, vale do rio das Velhas; avista-se a mina Várzea do Lopes, da mineradora Gerdau na Serra da Moeda. Muito difícil chegar a Aredes sem guia que conheça a região, pois a estrada se mistura com muitos outros acessos exclusivos da mineração. No sítio histórico e arqueológico de Cata Branca, próximo a Aredes, aconteceu uma tragédia eufemisticamente chamado de acidente por volta do ano de 1844, no qual dezenas de trabalhadores, a maioria negros escravizados, foram mortos, sepultados vivos com o desabamento de uma galeria subterrânea de mineração. Quem não morreu no desabamento da rocha, morreu afogado, depois que os administradores ingleses desistiram dos trabalhos de resgate e desviaram um curso d’água para inundar a mina. O local é considerado até hoje assombrado devido ao terror causado pela mineração.

Ao chegar à Estação Ecológica de Aredes, somos tomados por uma emoção indescritível por ver e caminhar em um espaço histórico e arqueológico sagrado. Interiormente ouvi a voz de Deus que disse a Moisés no monte Horeb: “Tire as sandálias, pois este lugar é sagrado” (Êxodo 3,5). O ar, as paredes, as portas e os inumeráveis testemunhos históricos e arqueológicos ali existentes gritam exigindo respeito, reverência e cuidado. Uma maravilha histórica e arqueológica rodeada por mineradoras que de forma impiedosa e com ganância sem fim transformam aquele território em “zona de guerra”, território que está sendo sacrificado no altar do ídolo mercado há 300 anos. Sem ser técnica no assunto, uma pessoa sensata, ao contemplar a maravilha da Estação Ecológica Aredes e o entorno já tão brutalmente mutilado pelas mineradoras, conclui que é inadmissível permitir que a mineradora Minar retome mineração em Aredes! Basta de mineração devastadora!

Sob direção de Mauro Souza, foi apresentada uma Peça de Teatro de São Gonçalo do Bação, inspirada na robusta obra “Aredes – recuperação ambiental e valorização de um sítio histórico-arqueológico”, publicada em 2016, pela arqueóloga Alenice Baeta. Emocionante ver e ouvir o resgate da história de Aredes, local que foi o marco zero do município de Itabirito. Também em uma performance magistral denunciando a atrocidade que seria retomar mineração em Aredes, o artista Carlos do Carmo bradou: “Não nos calaremos na defesa das montanhas e das águas de Aredes, do ambiente com todo seus valores históricos culturais. Se nos calarmos, as montanhas gritarão!”

A professora Alenice Baeta, pós-doutora em arqueologia, deu uma aula magna ao narrar um pouco da exuberante história de Aredes, as sucessivas pesquisas e recuperação ambiental desenvolvidas na localidade, indicando o cuidado permanente de vários multiprofissionais com a Estação Ecológica de Aredes.

Foi inesquecível ver também muitas pessoas de Itabirito defendendo com intrepidez que o PL 387/23 precisa ser arquivado urgentemente na ALMG. A Mineradora Minar deixou três crateras de mineração abertas em Aredes, um brutal passivo ambiental. O Ministério Público de Minas Gerais por meio de parcerias e acordos desenvolveu vários projetos de reabilitação e valorização na área; um de reconversão de território, que realizou o preenchimento das três grandes crateras que tinham sido deixadas pela Mineradora Minar no entorno das estruturas arqueológicas; uma delas situava-se rente a trecho de muro da antiga Fazenda Aredes, ameaçando a sua integridade. Este local precioso remanescente tornou-se parte da Unidade de Conservação Estação Ecológica Aredes, em 2010. Se não fosse feita esta reconversão de território com o preenchimento da grande cava/cratera, possivelmente parte do muro histórico e arqueológico já teria desabado.

Agora, em 2023, pela terceira legislatura consecutiva, a mineradora Minar insiste, de forma absurda e injustificável, em voltar a minerar em território já pertencente à Estação Ecológica de Aredes, em uma montanha de campos rupestres e ferruginosos, que está apenas a poucos metros de distância de estruturas históricas e arqueológicas de Aredes. Este PL 387 é um desrespeito, uma violação de várias leis ambientais e patrimoniais e uma agressão infame à história de Aredes  e à sua população.

Além da devastação histórica, paisagística e arqueológica, retomar mineração em Aredes afetará de forma mortal os córregos Silva e Aredes, que são afluentes do rio Itabirito, que abastece a cidade de Itabirito e fundamental para o abastecimento público de Belo Horizonte e Região RMBH por ser um dos principais afluentes do rio das Velhas. Portanto, retomar mineração em Aredes reduzirá ainda mais as já escassas fontes de água que abastecem 6 milhões de pessoas em Belo Horizonte e RMBH.

Os argumentos da mineradora Minar que alegam ser possível compatibilizar retorno de mineração no aquífero de Aredes são falácias, cria mineriodependência e mata muitos empregos que a diversificação econômica e sustentável pode gerar.

Portanto, inadmissível alterar os limites da Estação Ecológica de Aredes já integrados e conectados, para que a mineradora Minar possa de novo sacrificar e mutilar territórios que compõem Aredes, imprescindíveis para a conservação ambiental de Itabirito e da Reserva da Biosfera. Arquive já o PL 387/23 e deixe Aredes em paz!

15/08/2023.

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Alenice Baeta: violência da MINAR sobre a E.E. AREDES e sítio arqueológico, Itabirito/MG. 15/4/19

2 – Visita Técnica de deputados/a à Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG. Arquive o PL 387/23!

3 – Peça de Teatro sobre História de AREDES, Itabirito/MG: Arquive PL 387/23 que visa minerar em AREDES!

4 – Trabalho arqueológico na Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG: Arquive o PL 387/23 na ALMG!

5 – Exposição AREDES na Estação Ecológica de AREDES, Itabirito/MG: Arquive o PL 387/23, que visa minerar

6 – No interior de uma das ruínas da Estação Ecológica de AREDES, em Itabirito/MG: Arquive o PL 387/23!

7 – Crateras deixadas pela Minar foram convertidas ambientalmente: Estação Ecológica AREDES/Itabirito/MG

8 – Em região já sacrificada por mineradoras, Minar insiste em minerar na Estação Ecológica AREDES. NÃO!

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

Mineradoras Santa Paulina e Minar insistem em DEVASTAR Ibirité e Itabirito, em MG: violência brutal inadmissível

Mineradoras Santa Paulina e Minar insistem em DEVASTAR Ibirité e Itabirito, em MG: violência brutal inadmissível. Por frei Gilvander Moreira[1]

Após trinta horas de viagem de ônibus de Belo Horizonte, MG, até Rondonópolis, MG, estamos aqui no 1º dia do XV Intereclesial das CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), com o Tema “CEBs: Igreja em saída na busca da vida plena para todos e todas” e o lema “Vejam! Eu vou criar novo céu e uma nova terra” (Is 65), com cerca de 1.500 representantes de CEBs de todo o Brasil. Estou longe fisicamente de Minas Gerais, mas com o coração em muitas lutas por justiça socioambiental nas minas e nos gerais. Partilho abaixo dois Manifestos que foram escritos de forma coletiva, com minha participação, na esperança de que sejam instrumentos para ampliar a Rede de Apoio às lutas justas, necessárias e urgentes para que o município de Ibirité, na região metropolitana de Belo Horizonte, MG, seja de fato Território Livre de Mineração e que o povo do município de Itabirito, no colar metropolitano da capital mineira, já tão sacrificado pela mineração devastadora, não permita a insanidade de aceitar mineração dentro da Estação Ecológica de ARÊDES. Leiam abaixo e divulguem, por favor.

1 – MANIFESTO PELO FECHAMENTO DA MINERAÇÃO SANTA PAULINA NA SERRA DO ROLA-MOÇA EM IBIRITÉ, DIVISA COM SARZEDO E BELO HORIZONTE, MG

O Parque Estadual da Serra do Rola-Moça (PESRM), situado nos municípios de Belo Horizonte, Brumadinho, Ibirité e Nova Lima, MG, com seus 3.941,09 hectares de área, é o terceiro maior parque em área urbana do Brasil. Criado através do decreto estadual nº 36.071, de 27 de setembro de 1994. É considerado área de proteção especial de mananciais, essenciais para o abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Abrange, em seus domínios, várias nascentes e cabeceiras de rios, destacando-se as Áreas de Proteção Especial (APEs): Taboões, Rola-Moça, Bálsamo, Barreiro, Mutuca e Catarina, mananciais que abastecem parte da população de Belo Horizonte, Ibirité e Brumadinho. Adjacente ao PESRM, a Estação Ecológica de Fechos (EEFechos), um importante remanescente florestal, também um importante manancial de água que abastece a cidade de Belo Horizonte. A grande variedade de ecossistemas encontrados nesta região, contendo formações vegetais tanto da Mata Atlântica, quanto do Cerrado e de campos de altitude, faz com que a mesma seja dotada de uma extraordinária riqueza natural peculiar, que sofre violentas pressões tanto pela exploração mineral quanto pela alocação de empreendimentos imobiliários, em seu entorno. Preservar o PESRM se tornou uma necessidade para a sobrevivência de quase 6 milhões de pessoas da RMBH e de uma riquíssima biodiversidade.

A extração de minério na área do PESRM começaram em 1937 com a concessão de lavra ao Departamento Nacional de Produção, tendo funcionado até o final dos anos 2000 com base nas famigeradas Autorizações Ambientais de Funcionamento quando foram interditadas por força de ação ajuizada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MP/MG). Desde então a Mineração Santa Paulina levou 7 (sete) anos para que ao final tivesse em 2021 indeferido seu pedido de Licença Ambiental para voltar a explorar minério na Mina da Boa Esperança localizada entre Ibirité e Sarzedo, por evidentes razões de inviabilidade ambiental.

Com as atividades minerárias paralisadas em razão da ausência de licenças ambientais necessárias, a Mineração Santa Paulina, embora tenham sido comprovadas operações ilegais nesse período, terminou reduzindo a área a um cenário de destruição – crateras brutais – que permanece há anos sem adoção das medidas de recuperação necessárias. Em nova tentativa de operar legalmente na área, a Mineração Santa Paulina buscou licenciar então a atividade de reaproveitamento de bens metálicos dispostos em pilha estéril ou rejeitos, pedido que teve sua rejeição recomendada por extenso parecer emitido pelo setor técnico da Superintendência Regional do Meio Ambiente (SUPRAM) da Secretaria de estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD).

Entretanto, de maneira incompreensível e absurda o Superintende do órgão resolveu autorizar a retirada de mais de 1 milhão de toneladas sem qualquer tipo de licenciamento ambiental. A retomada das atividades minerárias pela Mineração Santa Paulina causou grande comoção popular, indignação e reinvindicações pelas comunidades atingidas com diversas representações dirigidas ao Ministério Público de Minas Gerais, apontando os múltiplos e brutais impactos negativos, danos ambientais e atividades poluidoras, decorrentes da retomada da retirada de minério e escoamento da produção através do trânsito de veículos de transporte da Mineração Santa Paulina em estrada clandestinamente aberta e em estreitas estradas de terra que interligam os municípios de Ibirité e Sarzedo, causando múltiplos e violentos danos às comunidades lindeiras aos trechos trafegados, especialmente centenas de famílias horticultoras. Inicialmente estão previstas 120 (cento e vinte) viagens diárias com pesados caminhões passando a cada 6 (seis) minutos, das 06H00 às 18H00.

Diante dessa concreta e gravíssima ameaça ao Parque Estadual da Serra do Rola-Moça e a seus mananciais de abastecimento público, aos ecossistemas e ao bem estar das populações atingidas, a produção de alimentos que alimenta a inteira região metropolitana de Belo Horizonte, o Ministério Público de MG ajuizou a Ação Civil Pública 5009765-16.2023.8.13.0114 que tramita perante a 3ª Vara Cível da Comarca de Ibirité. Dentre várias razões exposta pelo Ministério Público de MG (MP/MG), destaca-se que a Fazenda Boa Esperança, onde se encontra a Mineração Santa Paulina, situa-se na zona de amortecimento do Parque Estadual Serra do Rola Moça, nos limites de área de Conservação e Proteção Integral, afirmando que o empreendimento minerário da Mineração Santa Paulina “provoca e provocará impactos negativos, correspondendo, fundamentalmente, à ocupação dos espaços naturais, com prejuízos inevitáveis à fauna e à flora”, porquanto que o empreendimento minerário não conta com licenciamento ambiental clássico, precedido de estudo de impacto ambiental e de relatório de impacto ambiental (EIA e RIMA).

Assim o Ministério Público de MG exige como pertinente ao caso, a) a imediata suspensão de todas as atividades desenvolvidas pela Mineração Santa Paulina; b) a abstenção de promover qualquer intervenção no Parque Estadual da Serra do Rola-Moça e/ou no seu entorno/zona de amortecimento; c) a abstenção de transitar caminhões e transportar minério (ou materiais afins), especialmente no entorno do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça (incluindo a sua zona de amortecimento); d) recuperação de todas as áreas degradadas e alteradas no empreendimento, por meio da elaboração, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, e ulterior execução de Plano de Fechamento de Mina (PAFEM) ou Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD); d.1) O PAFEM/PRAD deve contemplar a efetiva, integral e definitiva reparação ambiental da área onde foram desenvolvidas as atividades minerárias, sendo elaborado por equipe técnica com ART e contando cronograma de execução a ser rigorosamente seguido. d.2) O referido PAFEM/PRAD não poderá contemplar quaisquer medidas que impliquem em lavra de minério existente na área do empreendimento; e) a adoção de todas as medidas emergenciais e de segurança aptas a assegurar a estabilidade de todas as estruturas existentes no empreendimento minerário – nas crateras -, enquanto elas existirem, inclusive daquelas estruturas cuja operação será paralisada, devendo, ainda, ser garantida a neutralização de todo e qualquer risco à população e ao meio ambiente natural, cultural e artificial; f) a contratação, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, de auditoria técnica independente com reconhecida expertise, para o acompanhamento das medidas de recuperação das áreas degradadas e garantia de segurança das estruturas do local, sem prejuízo do cumprimento da legislação no tocante à realização de auditorias ordinárias e extraordinárias e da apresentação dos relatórios previstos em normas específicas e/ou solicitados por órgão competente; g) a observância das recomendações e adoção das providências recomendadas pela equipe de auditoria técnica independente e pelos órgãos competentes, nos prazos assinados, que objetivem a integral recuperação da área do empreendimento; h) no prazo máximo de 30 (trinta) dias, elabore um plano de comunicação com a comunidade, a fim de que as intervenções ocorram de forma transparente com a população diretamente afetada. Todos os trabalhos deverão passar pelo crivo dos órgãos de Estado/Município competentes, no que aplicável. Requereu também o Ministério Público, ainda, cautelarmente, com o objetivo de assegurar a integral reparação de danos, o bloqueio do valor de R$ 20.000.000,00(vinte milhões de reais) em contas de titularidade da Mineração Santa Paulina.

A Juíza Renata Souza Viana postergou a análise da tutela de urgência conforme descrito acima para após a realização da Audiência de Conciliação, que ocorrerá de forma presencial, na quinta-feira, dia 20/07/2023 às 17:00, em Ibirité, MG, razão pela qual é imprescindível a manifestação por escrito por meio de notas próprias de Movimentos Sociais e Organizações de Defesa dos Direitos Humanos, sociais e ambientais a serem encaminhadas ao Ministério Público e à juíza do caso, mas também pela presença no momento da Audiência de Conciliação, de entidades, movimentos socioambientais, coletivos de luta por direitos, lideranças dos âmbitos ambiental, social, cultural, religioso e político. Haverá Ato Público na Praça do Fórum em Ibirité, MG, dia 20/07/23, a partir das 14 horas. Convocamos a quem puder ir participar.

Esse Manifesto pelo Fechamento da Mineração Santa Paulina na Serra do Rola-Moça é destinado a colher assinaturas de todas as pessoas preocupadas com as ameaças de morte ao Parque Estadual Serra do Rola Moça e a seus Mananciais de Abastecimento Público, fundamentais para a vida e o bem estar de todos os quase 6 milhões de pessoas da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Derrotar o projeto de devastação da Mineração é agora mais urgente do que nunca!

2 – MANIFESTO da rede de proteção da ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE ARÊDES (EEA), em Itabirito, MG: repudiamos com veemência o PL 387 que visa minerar em ARÊDES

Nós, representantes da Sociedade Civil, amigos/a e Rede de Apoio da Estação Ecológica Estadual de Arêdes (EEA), em Itabirito, MG, vimos à presença de Vossa Excelência e aos Excelentíssimos (as) Senhores (as) Secretários(as) de Estado e Deputados(as) Estaduais de Minas Gerais, à Senhora Diretora Geral do IEF e ao Ministério Público Estadual expressar a nossa grande indignação quanto às graves consequências da proposta presente no Projeto de Lei 387/2023 que propõe alterar (desafetar) os limites da Estação Ecológica de Arêdes. Esse brutal, violento e injusto PL 387 visa possibilitar que áreas de relevante importância para os objetivos de criação desta Unidade de Conservação sejam destinadas a exploração minerária, atendendo à ganância tão somente de uma empresa mineradora, a Minar, que tanto degradou a região no passado, desconsiderando os demais aspectos socioambientais, tão necessários para garantir o desenvolvimento sustentável no Estado de Minas Gerais.

Não obstante proporcionar uma significativa alteração da dinâmica da Estação Ecológica de Arêdes, criada pelo Decreto Estadual nº. 45.397 de 14 de junho de 2010, alterado pelo Decreto Estadual nº.  46.322 de 30 de setembro de 2013, com fundamento na Lei n°. 19.555 de 09 de agosto de 2011, este Projeto de Lei 387 retira uma grande e importante gleba da área original dessa relevante Unidade de Conservação, sem que os critérios técnicos tenham sido evidenciados e devidamente analisados e segundo a nossa percepção, sem que tenha havido maiores discussões com a sociedade. Essa alteração de limites gera inclusive, os seguintes graves conflitos:

  1. Desafetação de cerca de 280 mil metros quadrados (cerca de 28 hectares) da bacia hidrográfica do Córrego do Bação (cabeceira do Alto Rio das Velhas), que alimenta nascentes que abastecem 80% da população da cidade de Itabirito. A água necessária para abastecimento humano sofrerá risco de ter sua bacia hidrográfica descaracterizada, sob a pena de se perder definitivamente um bem comum que já está escasso. A crise hídrica se agrava em uma progressão geométrica. Preservar as nascentes e os mananciais se tornou uma necessidade para a sobrevivência da população. Não é aceitável, nem justo e ético que uma atividade econômica proponha explorar estas áreas;
  2. A área onde a mineradora Minar pretende ocupar com sua escavação e demais estruturas formará um obstáculo linear de pelo menos mil metros, o que inviabilizará definitivamente o Corredor Ecológico que hoje liga as bacias do rio Paraopeba e rio das Velhas, prejudicando diretamente um dos objetivos de criação do Monumento Natural Estadual da Serra da Moeda. Um corredor ecológico integra porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação, que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a dispersão de espécies e a recuperação de áreas degradadas, bem como a manutenção de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do que aquela das unidades individuais.
  3. Destruição do último campo ferruginoso que restou protegido na Serra de Itabirito. Este campo nativo, que está em alto grau de conservação, é considerado Zona Primitiva da Estação Ecológica sendo essencial para o desenvolvimento de pesquisas, guarda um remanescente embrionário formado a 60 milhões de anos e indispensável para propiciar a recuperação das áreas exploradas pelas mineradoras do entorno (mineradoras Vale S/A, Gerdau, SAFM e Herculano). Para o conjunto de características naturais relevantes da Estação Ecológica de Arêdes, este campo nativo mantem a representatividade dos ecossistemas que antes existiam no quadrilátero ferrífero e aquífero, e na Serra de Itabirito especificamente, e hoje caminham aceleradamente para a extinção. Será a nossa geração a última a poder ver este ecossistema na natureza? O PL 387, se for aprovado, devastará tudo isso.
  4. Redução do valor cultural e paisagístico do Complexo Arqueológico de Arêdes, pela sua fragmentação e destruição de estruturas componentes. Trata-se de Complexo Histórico-Arqueológico oriundo do séc. XVIII composto por conjuntos e unidades isoladas (casas, capela, muros, currais, casa de fundição, canais, catas antigas, dentre outros), confeccionados em alvenaria de pedra, portanto, exemplar raro da arquitetura vernacular mineira, com acabamentos variados, compostos por blocos de canga e ou de quartzito em cantaria. Quem irá querer conhecer um patrimônio em local onde também estará acontecendo a exploração minerária com todos seus impactos, barulhos, poeiras e riscos? Como este patrimônio poderá fruir para nossa sociedade? Hoje a Estação Ecológica pode receber escolas e demais visitantes, no entanto, este PL 387 prevê que, à montante das áreas propícias para visitação e passeios escolares, estará uma atividade com tantos parâmetros de segurança a serem atendidos devido ao grau de risco elevado da atividade. Isto não pode ser conciliado. Não aprendemos nada com os crimes brutais e hediondos das mineradoras em conluio com o Estado em Bento Rodrigues/Mariana e em Brumadinho, que afetaram drasticamente as bacias dos vales dos rios Doce e Paraopeba? Quantos outros crimes cada vez mais brutais deixaremos acontecer com a ação devastadora das mineradoras?
  5. Estamos em um momento de transição, os governos e populações das cidades mineradoras buscam a diversificação econômica e a possibilidade de se desenvolver de forma limpa. Os municípios e as comunidades precisam com urgência se libertarem da mineriodependência que escraviza e superexplora o povo e os ecossistemas cada vez mais. Não é possível mais que uma atividade econômica impeça o desenvolvimento de outras. Assim como o Distrito de São Gonçalo do Bação, o Monumento Natural da Serra da Moeda, a Serra do Curral e a nossa Estação Ecológica de Arêdes, em Itabirito e tantos outros bens potenciais para o turismo e com seu valor intrínseco devem ser leoninamente defendidos, por nós que nos importamos com nossa terra.

Assim sendo, apelamos a Vossas Excelências que arquivem definitivamente o Projeto de  Lei 387, que se for aprovado, abrirá caminho para brutal devastação da Estação Ecológica de Arêdes e sacrificará nascentes e córrego que estão na cabeceira do rio das Velhas e comprometerá inclusive o abastecimento público de Belo Horizonte e Região Metropolitana. A mineradora Minar já degradou de forma brutal esta região no passado. O PL 387 só gerará lucro e acumulação de capital para a mineradora Minar e retirará dos nossos descendentes o restante deste precioso bem cultural, histórico, arqueológico e natural, que temos a obrigação de proteger, como Coletividade. O Governo de Minas Gerais e os deputados/as também têm a obrigação de garantir a preservação da Estação Ecológica de Arêdes. Pelo expresso acima, repudiamos com veemência o PL 387 e exigimos o seu arquivamento. Fora, PL 387/23 que atende a lobby da mineradora Minar e outras mineradoras.

18/07/23

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Henrique Lazarotti defende o Meio Ambiente e repudia mineração Santa Paulina, em Ibirité, MG, na ALMG

 

2 – Alenice, do CEDEFES, na ALMG: mineradora Santa Paulina insiste em devastar ambiente e acabar c águas

3 – Luana, mãe: mineradora Santa Paulina coloca em risco crianças da Comunidade do Capão, em Sarzedo, MG

4 – Frei Gilvander: Mineradora Santa Paulina e Gov de MG acabarão c águas de Ibirité e de 160 de BH/MG?

5 – Mineradora Santa Paulina em Ibirité/Sarzedo/MG acabará c água de 700 mil pessoas /Agricultura Familiar

6 – Crateras da mineração Santa Paulina em Ibirité, MG, clamam por revitalização. Vídeo 7 – 31/10/2019

7 – Veja belezas da Estação Ecológica de ARÊDES, em Itabirito/MG, que podem ser devastadas com PL 387/23

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

Conquista do MST, IV Romaria pela Ecologia Integral, VI Abraço na Serra do Curral e Emergência Climática em MG

Conquista do MST, IV Romaria pela Ecologia Integral, VI Abraço na Serra do Curral e Emergência Climática em MG

Por frei Gilvander Moreira[1]

Ato Público de Declaração de Emergência Climática em MG, na represa de Vargem das Flores, em Contagem, MG, dia 05/06/23. Foto: Frei Gilvander Moreira

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) conquistou sentença judicial da Vara Agrária do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) garantindo a posse do Quilombo Campo Grande para 459 famílias que ocupam o latifúndio da ex-usina Ariadnópolis há 25 anos, no sul de MG, no município de Campo do Meio. Dia 23 de março de 2023, a juíza Janete Gomes Moreira, substituta da Vara Agrária TJMG, baixou sentença negando reintegração de posse ao espólio da ex-usina Ariadnópolis que reivindicava judicialmente o despejo do Acampamento Quilombo Campo Grande, composto por 459 famílias que se auto-organizam e subdividem-se em 12 Acampamentos, quais sejam: Acampamento Girassol, com 45 famílias; Acampamento Potreiro, com 63 famílias; Acampamento Fome Zero, com 30 famílias; Acampamento Resistência, com 43 famílias; Acampamento Tiradentes, com 27 famílias; Acampamento Rosa Luxemburgo, com 76 famílias; Acampamento Irmã Dorothy, com 13 famílias; Acampamento Chico Mendes, com 16 famílias; Acampamento Betinho, com 27 famílias; Acampamento Sidnei Dias, com 78 famílias; Acampamento Marreco-Vitória da Conquista, com 31 famílias e Acampamento Coloninha, com 13 famílias.

Na decisão a juíza fundamentou sua decisão justa, constitucional e sensata usando, dentre outros, os seguintes argumentos jurídicos: “Para obter a procedência de sua pretensão, cabe ao autor provar, nos termos do artigo 561 do Código de Processo Civil, (I) sua posse. Possuidor é aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade, conforme artigo 1.196 do Código Civil. Ou seja, é considerado possuidor aquele que tem, de fato, o exercício dos poderes de fruição, ou utilização, ou reivindicação ou disposição da coisa.” O espólio da ex-usina Ariadnópolis não comprovou ter posse.

Laudo Socioeconômico e Produtivo das Comunidades Rurais da Área da Companhia Agropecuária Irmãos Azevedo (CAPIA), desenvolvido pela Secretaria do Estado de Desenvolvimento Agrário (SEDA) (Id. 6437348032), concluiu que “as famílias organizadas pelo MST realizaram a primeira ocupação das áreas da antiga CAPIA no ano de 1998, o que restou demonstrado através de imagens de satélite de 2004 a 2018 o processo de ocupação das famílias nas áreas”. A requerente CAPIA não comprovou que exerceu a posse anterior sobre o imóvel objeto da Inicial que requeria reintegração de posse, sendo certo que a prova de domínio do bem é irrelevante para fins de proteção possessória, uma vez que não se discute o direito real de propriedade, mas apenas a existência de situação fática que configura a posse.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) se manifestou em recurso sobre reintegração de posse: “Não basta ao autor da ação de reintegração de posse provar o domínio (ter escritura com registro em cartório e pagar tributos). Exige-se que demonstre a sua posse. Recurso não conhecido.”[2] São requisitos para a reintegração na posse a prova da posse anterior do requerente, perdida mediante esbulho; o pedido de reintegração condiciona-se à coexistência dos requisitos previstos na norma do artigo 561 do Código de Processo Civil (CPC).  As ações possessórias têm como objetivo discutir, tão somente, o direito de posse, sendo irrelevantes, portanto, alegações de direito de propriedade, conforme previsto na norma do §2º do artigo 1.210 do Código Civil.[3] Para o deferimento da liminar de reintegração de posse, se faz necessária a comprovação do preenchimento dos requisitos do art. 561 do CPC, quais sejam a posse anterior, o esbulho e sua data, que deverá ser inferior a ano e dia da propositura da ação possessória. Consubstanciando-se a demonstração da posse prévia em alegação de propriedade, deve ser indeferida a liminar possessória. Recurso desprovido.[4] Comprovado que o proprietário não exercia a posse do imóvel, inviável o manejo das ações possessórias para reaver o bem.[5]

Com a decisão acima, está pavimentado o caminho para que o presidente Lula, segundo a lei 4.132, decrete a desapropriação do latifúndio da ex-usina Ariadnópolis e destine definitivamente os quase 4.000 hectares de terra para a reforma agrária, o que vem sendo feito na marra nos últimos 25 anos. Viva o MST e a luta pela terra! O conflito de Terras no Quilombo Campo Grande em Campo do Meio, região sul de Minas Gerais perdura por 25 anos, tendo 459 famílias acampadas e cerca de 2.000 pessoas morando no território. Ao longo de sua trajetória o acampamento passou por 11 reintegrações de posse, a mais recente foi em agosto de 2020, no meio da pandemia, onde 14 famílias tiveram suas casas e lavouras destruídas pelo aparato do estado em conluio com latifundiários, bem como a Escola Popular Eduardo Galeano.

Dia 03 de junho (de 2023) realizamos na Comunidade Quilombola de Pinhões, no município de Santa Luzia, MG, a IV Romaria pela Ecologia Integral da Arquidiocese de Belo Horizonte, MG, que contou com a participação de Movimentos socioambientais e mais uma vez ecoaram fortemente gritos clamando pela anulação do leilão e assinatura do contrato do Rodoanel (Rodominério) na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Tramita na Justiça Federal uma Ação Civil Pública da Federação Quilombola de Minas Gerais – N’Golo – que exige a anulação do leilão do Rodoanel feito de forma ilegal e autoritária pelo governador de MG, Romeu Zema, dia 12 de agosto de 2022, na Bolsa de Valores de São Paulo, SEM ter feito a necessária Consulta Prévia, Livre, Informada, Consentida e de Boa-Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais que serão brutalmente atingidas pelo rodominério. A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) da ONU (Organização das Nações Unidas), tratado internacional ratificado pelo Brasil em 2004 que o Estado faça Consulta Prévia, Livre, Informada, Consentida e de Boa-Fé aos Povos e Comunidades Tradicionais toda vez que um empreendimento do Estado ou de empresas afetar estas Comunidades. O Ministério Público Federal apresentou PARECER contundente exigindo a anulação do leilão do Rodominério, porque foi feito sem a necessária Consulta Prévia . Conseguirmos também na luta popular a revogação da Resolução do Zema/SEMAD/SEDESE, que amordaçava e aniquilava o Direito à Consulta ao tentar impor que em Minas Gerais a empresa que fosse implementar um projeto do grande capital tivesse o direito de fazer a Consulta às Comunidades Tradicionais, em apenas 100 dias, um absurdo inaceitável, pois seria o mesmo que “raposa consultar as galinhas no galinheiro” para determinar a ordem de morte para todas as galinhas.

Dia 04 de junho, realizamos o VI Abraço na Serra do Curral em Belo Horizonte, na divisa com Nova Lima, MG. Após concentração no Parque das Mangabeiras, subimos a pé uns 6 Km de caminhada até o Pico Belo Horizonte, que está tendo sua base carcomida pela mineradora Ipabra, sendo que do outro lado do Pico Belo Horizonte está a cratera da Mina de Águas Claras, que carcomeu quase toda a Serra do Curral, atrás do bairro Mangabeiras. Vimos que a “casquinha” da Serra do Curral, que ainda resiste impedindo que uma “montanha” de água da cratera da Mina de Águas Claras cause um tsunami inundando dezenas de bairros de BH. Filmamos no local um “grampeamento” com “cimento e ferro” desta “casquinha” de Serra do Curral, pois estava em processo de erosão e rachaduras.

Dia 05 de junho (de 2023), Dia do Ambiente, que nos interpela a defender com ardor os territórios, exercitando nosso Direito de dizer NÃO aos grandes projetos do capital e defender a alegria de conviver em um ambiente livre e sadio, dezenas de representantes de Movimentos socioambientais, Povos Indígenas e parlamentares de esquerda, lançamos, em Ato Público, na Prainha da Represa de Vargem das Flores, em Contagem, MG, o Decreto Popular de Emergência Climática em Minas Gerais, considerando que durante o 19º Acampamento Terra Livre realizado em Brasília, entre os dias 24 e 28 de abril de 2023, a Articulação Nacional dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) decretou Emergência Climática Nacional fazendo eco ao clamor de cura da Mãe Terra. No Decreto Popular consta que “nas Minas Gerais não é diferente, pois com o governador Zema, em conluio com as grandes mineradoras, a “boiada” segue passando a todo vapor e, infelizmente, nos Gerais, ela é reforçada pelo trem da mineração, que solapa vidas e o meio ambiente.”

Entre muitas denúncias, no Decreto está que “O megaprojeto de construção do Rodoanel Metropolitano, concessão pública repleta de ilegalidades e violações que, na verdade, deveria se chamar “Rodominério”, talvez seja o melhor  exemplo da opção do governo Zema pelo aprofundamento do rodoviarismo altamente poluente, baseado no veículo individual privado, ao invés do fomento e investimentos em transporte público e modais não motorizados, como determina a Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587/2012). Ainda, o bilionário Rodominério, no qual o Zema quer usar os recursos da reparação dos atingidos pelo crime da Vale em Brumadinho, representa um projeto para viabilizar o escoamento de minério de diversas mineradoras para a criminosa Vale.”

No final do Decreto de Emergência Climática consta: “Para que possamos zelar pelo bem viver, contribuindo com o equilíbrio  climático, decretamos a viva voz Emergência Climática nas Minas Gerais e reivindicamos de todos os poderes do Estado:

  1. Revogação imediata da concessão privada de construção e operação do Rodoanel Metropolitano;
  2. Respeito à Consulta Prévia, Livre, Informada, Consentida e de Boa-Fé da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT);
  3. Demarcação das terras indígenas;
  4. Reconhecimento, proteção e titularização das comunidades quilombolas rurais e urbanas;
  5. Proteção da Serra do Curral, da Mata do Baleia e de todas as serras, matas e águas de nosso estado;
  6. Respeito aos Povos e Comunidades Tradicionais do Norte de Minas,  dos Vales do Jequitinhonha e  do Rio Pardo, fortemente afetados e ameaçados pela política de destruição do governo Zema com projetos como o “Vale do Lítio”, Nova Aurora, SAM e Mineroduto, que envolve a venda destruição de nossos territórios, reduzindo-os a “riquezas minerais”, para o capital estrangeiro. Não somos Vale do Lítio, somos Vale do Jequitinhonha! Somos Gerais e não distritos ferríferos. Em defesa da Serra e dos Povos do Espinhaço.
  7. Regularização dos territórios e Certificação de autorreconhecimento  dos Povos e Comunidades Tradicionais e respeito aos seus modos de vida;
  8. Criação do Comitê Mineiro de Mudanças Climáticas (CMMC) com participação majoritária da sociedade civil organizada;
  9. Atualização e implementação do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, incluindo os planos de ação para a prevenção e o controle do desmatamento nos biomas e os planos setoriais de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas;
  10. Imediata posse e reativação da Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais (CEPCT), com orçamento próprio e condições de funcionamento, para que tenhamos no estado de Minas Gerais um espaço institucional de proteção desses povos;
  11. Revisão  da composição do COPAM garantindo representação paritária entre estado e organizações sociedade civil, representada efetivamente pelas organizações ambientalistas e não pelas concessionárias e entidades representativas do setor econômico;
  12. Estabelecimento de Zonas Livres de Mineração, com respeito e garantia definitiva dos nossos Parques, Reservas e Unidades de Conservação: Gandarela, MONA Moeda etc. no intuito de coibir as permanentes tentativas de ataque e desafetação dessas áreas e suas zonas de entorno.
  13. Manutenção da COPASA como patrimônio público do povo mineiro. Não à privatização!”

Sigamos firmes na luta por direitos, com mobilização popular, na certeza de que somente com a união das forças vivas da sociedade é possível alcançar conquistas e empreender a necessária transformação do Estado e da sociedade, de forma que seja justa, fraterna, com respeito à vida em toda sua biodiversidade.

06/06/2023

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Decreto de Emergência Climática em MG: Mov. Socioambientais/ Partidos de esquerda, Vargem das Flores

2 – Arquidiocese de BH realiza IV Romaria pela Ecologia Integral em Pinhões, Santa Luzia/MG. Vídeo 4

3 – Denúncia da mineração devastadora na RMBH: IV Romaria pela Ecologia Integral, Pinhões, Sta Luzia/MG

4 – Denúncia do Rodoanel, Rodominério na RMBH: IV Romaria pela Ecologia Integral, Pinhões/Santa Luzia/MG

5 – VI Abraço na Serra do Curral em BH/MG: Parque Nacional da Serra do Curral, JÁ! Fora, mineração! Víd1

6 – NÃO AO MARCO TEMPORAL E AO PL 490. Senado e STF, DERRUBEM este PL do genocídio! Por frei Gilvander

7 – IV Romaria pela Ecologia Integral em Santa Luzia MG na Comunidade Quilombola de Pinhões. Vídeo 1

8 – MST conquista sentença judicial q garante posse do Quilombo Campo Grande p 500 famílias, no sul d MG

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] STJ. 4ª Turma. REsp nº 150.267/PE. Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ: 29/05/00, pág. 157.

[3] TJMG – Apelação Cível 1.0024.12.262011-5/001, Relator(a): Des.(a) Cabral da Silva , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/06/2019, publicação da súmula em 14/06/2019.

[4] TJMG – Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.18.112290-4/001, Relator(a): Des.(a) Amorim Siqueira, 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 02/04/2019, publicação da súmula em 12/04/2019.

[5] TJMG – Apelação Cível 1.0433.11.030791-8/001, Relator(a): Des.(a) Claret de Moraes , 10ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 29/01/2019, publicação da súmula em 08/02/2019.

 

NÃO AO MARCO TEMPORAL E AO PL 490! Sinal amarelo para o Governo Lula e vermelho para os Indígenas?

NÃO AO MARCO TEMPORAL E AO PL 490! Sinal amarelo para o Governo Lula e vermelho para os Indígenas?

Por Frei Gilvander Moreira[1]

“Estamos em defesa de nosso território sagrado, de nossos direitos tradicionais, contra o PL 490, contra o Marco Temporal, que quer retirar nosso direito ao território!” – Kaw Gamella, do Povo Akroá-Gamella. Foto: RAMA

Recentemente foi aprovado na Câmara Federal o arcabouço fiscal, que põe cercas para as contas públicas e para os investimentos do Governo Federal. Deixaram totalmente livre a destinação de quase 50% do orçamento para amortização e pagamentos de juros da impagável dívida pública, que quanto mais corta mais cresce. Por que não limitar este montante repassado para os banqueiros? Em breve, o Governo Lula poderá “estar nas cordas” asfixiado pelos ditames do mercado idolatrado embutido no arcabouço fiscal. O Congresso Nacional mais à direita da história do Brasil já está mostrando suas garras. Maioria da Câmara Federal, de direita, do agronegócio, insiste em continuar o genocídio indígena e continuar empurrando a humanidade para seu fim, em decisões tais como a que retira competências dos Ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. Retirar do Ministério dos Povos Indígenas a prerrogativa de demarcação de terras e amordaçar os poderes do Ministério do Meio Ambiente retirando dele a Agência Nacional de Água (ANA), o gerenciamento sobre o saneamento e o Cadastro Ambiental Rural (CAR) significa empurrar o povo brasileiro e toda a biodiversidade para o sacrifício no altar do ídolo capital precipitando a ocorrência de eventos extremos que vem causando desastres e mortandade de pessoas e animais de forma cada vez mais espantosa.

Na última semana, 262 deputados da Câmara Federal, do centrão e da extrema-direita, sob o comando do deputado Arthur Lira, aprovaram “urgência” para o PL 490/2007, que busca legislar sobre o “marco temporal”, assunto que o Supremo Tribunal Federal (STF) já pôs em pauta para ser julgado a partir de 07 de junho próximo. Outros quinze projetos de lei foram apensados ao PL 490. Com o carimbo de “urgente”, o PL 490 deverá ser votado na Câmara Federal hoje, 30 de maio. Isto é violência brutal, pois significa a Câmara Federal “passar a boiada” amordaçando as prerrogativas do poder executivo federal, que tem a missão constitucional de demarcar as terras indígenas. A Constituição de 1988 definiu que as terras indígenas deviam ser demarcadas dentro de cinco anos, a partir de 05 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição, até 1993, mas já se passaram 35 anos e a postergação da demarcação das terras indígenas tem sido a regra. E, injustamente, as terras dos Povos Indígenas continuam griladas por empresas do agronegócio, por latifundiários e madeireiros.

Com isso, o genocídio indígena continua há 523 anos e a devastação ambiental promovida pelo agronegócio, desmatadores e garimpeiros segue em uma progressão geométrica.

Dia 7 de junho de 2023, o STF deve retomar o julgamento da tese do marco temporal, com “repercussão geral” reconhecida, que definirá se as demarcações de terras indígenas no país continuarão ou não, ou pior, se poderão ser canceladas várias demarcações já feitas. A partir de um caso concreto de conflito entre o Povo Indígena Xokleng e o Estado de Santa Catarina, pela “repercussão geral” já estabelecida pelo STF, o julgamento servirá de decisão que será parâmetro para todas as demarcações de terras indígenas no Brasil. Logo, é muito sério o que está em disputa no STF.

O que é a tese do marco temporal? Trata-se de uma farsa perpetrada no Congresso Nacional pela bancada ruralista em 2009, plantada no STF, durante o julgamento da Terra Indígena (TI) Raposa Terra do Sol, situada em Roraima: a inconsistente tese preconiza que os direitos territoriais dos Povos Indígenas só teriam validade se eles estivessem em suas terras em 5 de outubro de 1988 – data da promulgação da atual Constituição Brasileira. Falar em marco temporal é uma jogada, uma ficção jurídica de quem tem grandes interesses econômicos nos territórios indígenas: a turma do agronegócio, dos madeireiros, garimpeiros, latifundiários e empresários do campo, todos os que são adeptos do ídolo mercado, os que não amam o próximo e nem as próximas gerações, pois só pensam em lucrar e acumular capital, mesmo que deixando terra arrasada com sua agricultura mecanizada para produzir commodities para exportação. Marco temporal é marca do atraso, o nome elegante do genocídio, uma máquina de moer a história dos Povos Indígenas e nos empurrar para a dizimação da humanidade por falta de condições ambientais que assegurem a vida humana.

O que os capitalistas pretendem com a legitimação da tese do marco temporal? Pretendem anistiar os crimes cometidos contra os Povos Tradicionais relacionadas à escravidão, torturas, confinamentos em pequenos territórios, aprisionamentos, exílios, remoções forçadas, desterros, separação de familiares, assassinatos, apropriações indevidas de territórios tradicionais, desconsiderando assim as noções de reparação histórica, de dívida histórica com os Povos Originários, de resguardo cultural e imemorial, de direitos congênitos, imprescritíveis, intangíveis e da posse coletiva da terra.

O argumento do marco temporal é inconstitucional e inconvencional, ferindo, em especial, os artigos 231 e 232 da Constituição[2], além de desrespeitar a Convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) n. 169, de 1989, ratificada pelo Brasil, que consagra os direitos culturais e territoriais, bem como a autodeclaração, como instrumento primaz da identidade étnica, além do reconhecimento das diferentes formas de ocupação, manejo e uso da terra.  Segundo a teoria do indigenato (Direito Originário), a terra é “originária” e, portanto, anterior à Constituição do Brasil, independente da data de comprovação da terra.  A tese do marco temporal é inconstitucional, porque, perseguidos, massacrados e expulsos, muitos Povos Indígenas não estavam em seus territórios originais em 5 de outubro de 1988, porque foram arrancados deles. Outros foram arrancados depois, por grileiros, latifundiários, garimpeiros e jagunços. Marco temporal serve ao agronegócio, que é devastador ambientalmente, desertificador dos territórios, concentrador da propriedade privada da terra, produtor da epidemia de câncer e da fome, asfixiador da agricultura familiar camponesa agroecológica, exterminador do futuro da humanidade.

Derrubar a tese do marco temporal se tornou necessário também por uma questão de sobrevivência da humanidade, pois já sabemos que foi o exagero de desmatamento que fez eclodir a pandemia da covid-19, já está comprovado que o agronegócio e seus aliados promovem desertificação dos territórios, desmatamentos sem fim e, portanto, o aquecimento global e a emergência climática. Já está demonstrado que nos territórios indígenas se pratica preservação ambiental, pois os Povos Indígenas são guardiões da floresta. É preciso recordar também que com a demarcação dos territórios indígenas, as terras não passam a ser de propriedade dos Povos Indígenas, que têm apenas o direito de usufruto não podendo vender a terra. As terras indígenas são da União, bem comum do povo. Portanto, derrubar o marco temporal é também caminho para frear a privatização e a grilagem de terras no Brasil.

Quem defende que o marco temporal é constitucional? Os ruralistas, deputados e senadores do centrão e da extrema-direita, os agronegociantes, os garimpeiros, mineradoras, os latifundiários e empresários que, além de ter grandes propriedades na cidade, são também grandes proprietários de terra; a mídia controlada por meia dúzia de famílias riquíssimas. Diz a sabedoria popular: “Diga com quem tu andas e o que defende que direi quem tu és”.

Quem defende a derrubada do marco temporal pelo STF? Todos os Povos Indígenas do Brasil, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o papa Francisco, Associação dos Juristas pela Democracia, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), juristas e constitucionalistas de renome, os Movimentos Sociais Populares e Ambientais, enfim, as forças éticas da sociedade.

Caso não seja derrubada a tese do marco temporal no STF, o Estado não mais demarcará terras indígenas e várias das demarcadas poderão ser desmarcadas e, assim, a ausência de demarcação de terras, causará, no médio e longo prazo, um verdadeiro etnocídio e continuará o genocídio indígena no nosso país. Portanto, o justo e necessário é que o STF julgue derrubando a tese do marco temporal, porque é absurdo, inconstitucional e violação aos direitos dos Povos Indígenas/Originários! Em contexto não apenas de mudanças climáticas e de aquecimento global, mas de emergencial climática com eventos extremos cada vez mais frequentes e letais, impor o absurdo que é a tese do marco temporal é deixar abertas as porteiras para a contínua invasão dos territórios.

30/05/2023

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 – Demarcação de Terras Indígenas, com Shirley Krenak, Moema Viezzer e Célio Turino

2 – STF Urgente. Relator Fachin reconhece a tutela dos territórios indígenas

3 – #LutaPelaVida – Igreja no Brasil reafirma seu compromisso com a causa indígena. Marco temporal, NÃO!

4 – AO VIVO. Semana de protestos no Brasil começa com os Povos Indígenas em Brasília.

5 – Em MG, 17 Povos Indígenas com 16 mil pessoas resistem na luta pelos seus territórios. 09/10/2020

6 – STF definirá em julgamento critérios de demarcação de novas terras indígenas. Fantástico. 24/5/2020

7 – Deus Tupã, o Grande Espírito e os Encantados contra o PL 490 e contra o Marco Temporal. Justiça, JÁ!

8 – “Sem Demarcação de terras indígenas não tem Democracia!”. Ato contra PL 490 e contra Marco Temporal

9 – Ato Público em BH/MG contra PL 490, contra Marco Temporal, por Demarcação das Terras Indígenas. V. 1

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. § 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. § 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei. § 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.

 

Racismo estrutural, racismo algorítmico

Até meados das décadas de 1970, as máquinas fotográficas produziam imagens incapazes de definir com nitidez os rostos e feições de pessoas não brancas, como negros, indígenas e indianos. Isso mudou com uma inovação feita pela Kodak na gama de marrons de suas imagens fotográficas.

Mas a mudança só ocorreu porque uma empresa de chocolates reclamou que em seus anúncios os tons dos chocolates amargo, meio amargo e ao leite não se diferenciavam. Nada a ver com preocupações quanto a atender uma parte considerável do público consumidor de câmeras fotográficas. Tudo a ver com o racismo estrutural prevalecente na maior parte da indústria de publicidade. Para mais detalhes sobre essa história, clique aqui.

Cinquenta anos depois, a indústria publicitária move-se à base de algoritmos pretensamente refinados. Um dos desdobramentos desse avanço tecnológico foi a criação dos aplicativos de reconhecimento facial, cada vez mais desenvolvidos por meio do aprendizado de máquina. O problema é que a pedagogia robótica se baseia em parâmetros definidos geralmente por pessoas brancas, com seus conceitos e, principalmente, preconceitos.

Resultado, os aplicativos apresentam grande dificuldade no reconhecimento de rostos não brancos, causando constrangimentos e restrições em muitas das áreas em que são utilizados. Mas as consequências mais graves surgem quando o reconhecimento facial é empregado em investigações policiais e casos judiciais. Os algoritmos apresentam uma grande margem de erros, levando a prisões e condenações sem qualquer fundamento, a não ser o velho racismo estrutural. Um fenômeno que não só continua firme e forte, como vem ganhando a enorme velocidade e o perigoso alcance dos algoritmos.

Leia também: Parar a inteligência do Capital

Pedagogia camponesa: mística e segredos da luta por direitos

Pedagogia camponesa: mística e segredos da luta por direitos. Por frei Gilvander Moreira[1]

Mística de acolhida, na sombra de uma oiticica, na aula inaugural da EFA Jaguaribana, em abril de 2018 | Foto: Alisson Chaves

É emancipatória a força e a liberdade interior que fez o jovem camponês Sem Terra Oziel Alves Pereira, de 17 anos, durante o massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, dia 17 de abril de 1996, mesmo sob tortura, continuar gritando, até ser massacrado: “Viva o MST!” “A mística também evoca a materialização (geralmente simbólica) desse sentimento na beleza da ambientação dos encontros, nas celebrações, na animação proporcionada pelo canto, pela poesia, pela dança, pelas encenações de vivências que devem ser perpetuadas na memória, pelos gestos fortes, pelas homenagens solenes que se prestam aos combatentes do povo; lembra os símbolos do Movimento, seus instrumentos de trabalho e de resistência, seus gritos de ordem, sua agitação, sua arte” (CALDART, 2012, p. 213).

Em Salto da Divisa, no Baixo Jequitinhonha, MG, a música Religião Libertadora, do padre Zezinho, tem animado a mística das celebrações dos Sem Terra na luta pela terra: Diz a música: “É por causa do meu povo machucado que acredito em religião libertadora. É por causa de Jesus ressuscitado que acredito em religião libertadora …”. Impossível compreender a luta pela terra em Salto da Divisa, nos últimos 30 anos, sem a presença marcante da Irmã Geraldinha (Geralda Magela), das Irmãs Dominicanas, e sem as frequentes celebrações religiosas na linha da Teologia da libertação, como canta, por exemplo, uma música que se tornou o hino da luta pela terra em Salto da Divisa: “Vem Senhor Jesus, vem conosco caminhar, ilumina nossa luta para essa terra conquistar (bis). Em toda a América Latina há muita gente sofrida em busca de libertação, muitos lavradores sem um pedaço de chão. Somos povo de Deus, em toda essa América Latina, a caminho da libertação. Queremos lutar para partilhar o pão. Somos povo de Deus, nesta pátria tão querida, queremos evangelização, para essa terra ser de gente, semente no chão” (HINO DA COMUNIDADE CRISTO LIBERTADOR do P.A Dom Luciano Mendes, em Salto da Divisa, MG).

Com a pedagoga Rosely Caldart afirmamos que “a mística é exatamente a capacidade de produzir significados para dimensões da realidade que estão e não estão presentes, e que geralmente remetem as pessoas ao futuro, à utopia do que ainda não é, mas que pode vir a ser, com a perseverança e o sacrifício de cada um” (CALDART, 2012, p. 213). Na perspectiva da Comissão Pastoral d Terra (CPT), do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Movimento Indígena e dos Povos e Comunidades Tradicionais, na Teia dos Povos, em sintonia com a Teologia da Libertação, a mística é emancipatória também porque desperta nos sujeitos que lutam pela terra um jeito de lidar com as dimensões mais profundas da realidade que, muitas vezes, são imperceptíveis quando ficamos presos a racionalismos ou idealismos. Pela mística praticada pela CPT, MST e Movimentos Sociais as melhores luzes e forças do passado e do futuro potencializam o presente de luta pela terra na terra (MOREIRA, 2015).[2] O passado e o futuro se fazem presentes no presente, quando os sujeitos são enlevados pelo encanto da mística revolucionária e, portanto, emancipatória.

A luta pela terra em perspectiva emancipatória implica necessariamente também emancipação ecológica, o que passa pela mudança radical da agricultura capitalista e pela superação do agronegócio com uso indiscriminado de agrotóxico e inclui a implementação da agricultura camponesa com plantações em sistema agroecológico, o que é algo mais do que apenas adubação orgânica, significa um estilo de vida que leva a uma relação respeitosa com a terra, com as águas e com toda a biodiversidade.[3]

Emancipatória, também, é a formação constante e permanente para o cultivo dos valores humanos que sustentam a perseverança na luta pela terra e por território. Formação que acontece em um processo que envolve estudo, convivência na luta, troca de experiências entre quem está na luta pela terra e por território e, acima de tudo, participação em todas as lutas coletivas por direitos. A pedagogia camponesa é exercitada muito mais pelo exemplo do que pela teoria. Por isso, também, a importância da troca de experiência, pois uma experiência significativa vista com os próprios olhos por um/a camponês/a cativa e desperta o acolhimento de propostas boas que, se fossem apenas comunicadas de forma teórica com argumentação racional, provavelmente não teriam a repercussão de uma experiência vivenciada. A atuação da CPT, do MST, dos outros Movimentos Sociais, dos Povos Originários e Comunidades Tradicionais emancipa, ainda, porque de alguma forma consegue transformar o sem-terra em Sem Terra, o desterritorializado em sujeito com território, o que de ‘coitado que pede ajuda’ é elevado ou se eleva a ‘trabalhador/a camponês/a – indígena ou integrante de Povo Tradicional – que tem direito e merece respeito’ e passa a ser respeitado pelas forças políticas da sociedade como um exemplo de sujeito cidadão emancipador a ser seguido.

Para a CPT, o MST, o Movimento Indígena e os Povos Tradicionais a luta pela terra e por território é mais do que luta pela terra e por resgate de território, pois inclui: a) a luta pela conquista da terra e retomada de território, a resistência na terra e nos territórios com administração autônoma segundo os princípios da autonomia dos Povos que passa por agroecologia, trabalho coletivo e sustentabilidade ecológica; b) a luta por educação para além do capital, educação do campo de forma emancipatória; e c) exige abraçar a luta pela transformação social, política e econômica da sociedade na perspectiva da construção de uma sociedade para além do capital: uma sociedade socialista, sem exploração de classe e sem exploração do trabalho da classe trabalhadora e nem expropriação das terras da classe camponesa, dos Povos Originários e nem dos Povos Tradicionais.

Referências

CALDART, Roseli Salete. Pedagogia do Movimento Sem Terra. 4ª Ed. São Paulo: Expressão Popular, 2012.

MOREIRA, Gilvander Luís. Entre sinais e conflitos, se requer opção de fé (Jo 5,1-8,5). In: SABOYA, Marysa Mourão (Org.). Amar sem limites, nas trilhas das comunidades do Discípulo Amado. São Leopoldo: CEBI, p. 50-65, 2015b.

23/05/2023

Obs.: As videorreportagens nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – “Não ao Marco Temporal! Demarcação de todos os Territórios Indígenas e Tradicionais, JÁ!” Enc. POVOS

2 – Ato Público no início do Encontro de Povos Tradicionais de MG: em defesa dos Territórios e Consulta

3 – Audiência Pública na ALMG: ilegalidades e violências da mineradora Santa Paulina em Ibirité, MG!

4 – Preservação total, integral, 100% da Mata do Jd. América em BH/MG: Dever, direito e necessidade-vida

5 – Mineradora Sta Paulina em Ibirité/Sarzedo/MG acabará c água de 700 mil pessoas /Agricultura Familiar

6 – Ato Público e Marcha denuncia violações aos direitos do Quilombo do Campinho em Congonhas, MG

 

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

 

[2] Cf. MOREIRA, Gilvander Luís. Entre sinais e conflitos, se requer opção de fé (Jo 5,1-8,5), p. 50-65, especialmente p. 55 a 59, onde tratamos da partilha de pães, pedagogia que liberta e emancipa (Jo 6,1-15). In: SABOYA, Marysa Mourão (Org.). Amar sem limites, nas trilhas das comunidades do Discípulo Amado. São Leopoldo: CEBI, 2015b.

[3] Exemplo disso está retratado no vídeo documentário “Resistir e saber cuidar – experiências agroecológicas em Assentamentos da Reforma Agrária”. Direção e roteiro de Cecília Figueiredo. Brasília: MST, Triângulo Produções, 2006. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=-oedHfalprM

A suja história da eugenia: a vitória nazista

Em 1924, os Estados Unidos aprovaram a Lei Johnson-Reed que impedia a entrada de imigrantes da Ásia e estabelecia cotas para aqueles vindos do sul e do leste da Europa.

Em seu livro “Mein Kampf”, Hitler saudou a lei como o início “de uma perspectiva que é específica da concepção racista de Estado”. Não à toa, as relações entre eugenistas estadunidenses e alemães eram estreitas desde antes da Primeira Guerra.

Em nome dessas relações amistosas, a Fundação Rockefeller contribuiu financeiramente para o movimento eugenista tanto nos Estados Unidos como na Alemanha, inclusive entre 1933 e 1939, período de auge do poder de Hitler.

Em 1934, o diretor de Ciências da Natureza da Fundação Rockefeller, Warren Weaver, perguntava “se será possível desenvolver uma genética tão extensiva e bem fundamentada que possa viabilizar a criação, no futuro, de homens superiores”. Era precisamente a esta questão que Hitler pretendeu responder do modo que ficou tragicamente notório nos anos seguintes.

Em 1932, quando era previsível a tomada iminente do poder pelos nazistas, o Eugenical News, verdadeiro órgão oficial do movimento eugenista norte-americano, publicara dois artigos em louvor ao programa racial de Hitler.

Se definirmos o nacional-socialismo como a aplicação à política de critérios procedentes da biologia, então as leis eugenistas promulgadas por vários governos “democráticos” no mundo não foram menos hitlerianas. Com certeza, os princípios eugenistas continuam por trás do racismo e das políticas que o sustentam pelo mundo. O nazismo foi derrotado, mas não algumas de suas principais ideias.

Com essa pílula, encerram-se os comentários sobre eugenia a partir do livro “Labirtintos do Fascismo”, de João Bernardo.

Leia também: A suja história da eugenia nas “democracias”.