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ADEUS, PRIMEIRO AMOR: Uma abordagem sem clichês

Quem ver o filme: “Adeus, primeiro amor” (Un amour de jeunesse. Mia Hansen-Love, França, 2011) terá uma bela surpresa. A pelicula trata de um tema tão banal e corriqueiro como tomar água ou saber que uma mangueira produz manga, a saber, relacionamento e o seu fim. acredito que meio mundo ou mais da humanidade viveu ou vive ou viverá tal situação (para alguns dificil, tramáutico e para outros nem tanto… mas acabamos quase todos e todas passando por isto… seja heterossexual, homossexual ou os dois ao memso tempo agora! e como diz o ditado popular: “Que ninguém diga deste pão não comerei, desta água não beberei”).

Pois bem, o filme da jovem cineasta francesa (a mulher esta na casa dos 30 anos!!!) trata de um relacionamento de dois adolescentes franceses entre 1999 a 2009 e que chega a seu fim, mas sempre parecendo que ficou “uma porta entre-aberta” com seu “grito de alerta” (Gonzaguinha). Amor juvenil, lindo, utópico, criativo e bem vivido (entenda-se com sexo sem culpa e liberdade sartreana). Camile (entre 15 e 16 anos no inicio do filme) e Sullivan (entre 18 e 19 no inicio do filme), vivem um breve e intenso amor de juventudo. Ela mais apaixonada e mais exigente, ele mais leve e em busca de uma liberdade ainda não explicitada…

Estudam, se divertem, fazem acampamantos nos matos franceses (coisa cada vem menos visiveis na juventude da era neoliberal… quem tem schopping, vai querer o que com “acampamentos selvagens”?). Um primeiro marco no filme é quando Sullivam decide quase do nada fazer uma viagem para a América do Sul (Venzuela rebelde? Bolivia rebelde? Equador rebelde?) no intuito de conhecer novas culturas e “crescer como homem” (a velha e sincera reflexão sobre indentidade) e neste instante os sonhos de Camile vão abaixo e ela entra numa prof unda e visivel melancolia.

A coisa acontece em um breve corte na imagem. Um destaque do filme são os cortes abruptos e bem feitos pela diretora. Sempre deixam algo no ar que impele quem assiste a tirar suas conclusões e imaginar situações. Ela, Camile, fica sempre no aguardo de cartas, mensagens… O que vai acontecendo e rariando cada vez mais. Apartir daqui o filme é todo do ponto de vista da personagem feminina. Seu crescimento a duras penas, sua melancolia, sua saudade infindável, um sofirmento sentido por quem assiste num misto de compreensão e impotência.

Existem sofrimentos alheios que por mais que sintamos, nada podemos fazer… Só o cruel e realista Tempo! Ela muda o visual, entra na universidade, faz arquitetura, conhece breves namoricos, trabalha… Mas aquele sentimento “tão perto, tão longe” lhe acompanham e lhe marca dia-a-dia. Parece que estamos esperando sempre um re-encontro, que acontecerá… Mas em outra situação. Camile vai morar com um pro f essor de arquitetura bem mais velho que ela e bem compreensivo e um pouco anarquico diante do mundo e das relações. Enquanto Sulivam já voltou das Américas e já trabalha como fotografo em outra cidade. O re-encontro acontece e percebem duramente algo como dizia Fernando Pessoa “Quanto a mim, o amor passou”… Mas que continuou algo em Camile e em Sulivan…

Algo que as vezes não passa, mas por equivocos inevitáveis do passado, o que passou não volta mais e ao mesmo tempo fica algo. Confuso? a “dialética do amor” é mais ou menos assim. Tudo isto tratado sem clichês de novela ou pieguismo melodramático de filme Norte-americano em média e por fim, uma nota digna de destaque: em dois momento ouvimos Violeta Parra cantando “Volver a los 17” e “Gracias a la vida”. Uma saudade da América Latina dos anos 60 onde a paixão e a utopia andavam juntas na motocicleta de Che Guevara!!! muito bonito e como tudo que é bonito, tem algo de trágico. Um ótimo filme para se pe nsar e amar com todos os riscos…

O preço da vida

É verdadeiramente lamentabilíssimo que o espectador brasileiro seja obrigado a assistir deturpações da realidade tão grotescas quanto a apresentada ontem à noite por um jornal televisivo cujo nome é melhor não declarar. A matéria era sobre os índios pataxós da Bahia, que vem sendo assassinados por pistoleiros a serviço dos latifundiários, com frequência e intensidade, diante da omissão ou cumplicidade do aparelho policial e judiciário, como é de conhecimento do público.

Mas o que a matéria dizia era o contrário: eram os índios que invadiam as propriedades dos produtores rurais. A gente sabe que o dinheiro compra tudo. Os índios pataxós vem sendo alvo de uma campanha de mentiras difundidas por essa mesma empresa televisiva, que obviamente está a serviço dos grandes proprietários rurais, nesta matéria apresentados como as vítimas da ira dos índios.

Uma figura do sindicato de proprietários rurais reclamava não ter sido ouvido, diante da demarcação de terras indígenas que, segundo eles, foi muito além do justo. Cabe nos perguntarmos o que é que pode ser justo em se tratando de demarcação de terras indígenas, quando é sabido que a terra é dos índios, que vem sendo expulsos sistematicamente do lugar que lhes pertence, empurrados para as periferias urbanas, quando não simplesmente mortos pela pistolagem a serviço do latifúndio.

Hoje me perguntava se os jornalistas não tem consciência. Se o patrão impõe a difusão da mentira para acobertar o crime, e eles simplesmente obedecem. Não há um código de ética jornalística? E a empresa que acoberta a matança de índios, os apresentando como pistoleiros, não tem regras a obedecer? Ou o mercado pode mais, o dinheiro pode tudo? Quanto vale uma vida humana? Para mim, a vida é tudo. A vida não tem preço. É um dom de Deus, e deve ser respeitada a todo custo.

A vida como construção no pensamento de José Comblin

Tenho comentado, em notas anteriores, alguns aspectos do pensamento de José Comblin sobre o amor, e sobre a vida como peregrinação. Agora, gostaria de me referir a dois trechos de obras suas que me chamaram a atenção, e que tem o denominador comum de oferecerem subsídios para que a pessoa se oriente em direção às suas próprias metas, caminhado com esperança, e se conduzindo em direção à realização do seu próprio projeto de vida. São eles um parágrafo de A força da palavra, e outros de O caminho. Ensaio sobre o seguimento de Jesus.

“O que é um homem no sentido completo da palavra? Não é somente um ser dotado de órgãos e de faculdades: inteligência, vontade, sensibilidade, etc. A soma dessas faculdades não faz um ser humano vivo e ativo. O que faz um homem é um projeto de vida, uma obra imaginada por ele e prosseguida pacientemente com constância, inteligência e ate teimosia. O que faz um homem é uma ilusão, uma utopia que persegue durante a vida toda, uma história de fracassos e êxitos na caminhada para os fins que ele se definiu…” (p.37).

Resgato aqui a palavra projeto, a noção de projeto. Existir é ir em direção a uma meta. Passemos agora ao segundo dos livros mencionados de Comblin. O autor explora o tema da esperança do peregrino, da vida como peregrinação: “Há uma esperança para o dia de hoje, outras para a semana, para o mês, para o ano, para um período da vida, para a vida inteira e para além desta vida –ou seja, para a vida eterna” (p. 68) Outra vez a noção de direção, de esforço orientado a um fim. Qual é esse fim?/O fim da vida é ser mais, não ter mais.

A “imagem da peregrinação ajuda a entender o sentido da vida. Pois, para a maioria, a peregrinação não é feita caminhando nas estradas materiais. A caminhada é interior: a pessoa vai buscar no próprio coração o seu verdadeiro ser. Por meio das experiências da vida vai se aproximando pouco a pouco da sua verdade, se uma realização mais completa de si. Pode-se realizar também a mudança, o amadurecimento de si mesmo na vida ordinária. A imagem da peregrinação ilumina essa busca até o próprio coração. A esperança parece mais abstrata, mas realiza a mesma transformação: como o peregrino, o discípulo va abandonando o seu passado, reconhecendo no presente a porta que abre para o futuro, torna-se aberto à etapa seguinte da vida. No final, ele consegue conhecer-se melhor naquilo que era o objeto da sua esperança ao iniciar a caminhada. A nova Jerusalém se encontrará finalmente dentro do coração”. (pp. 68-69)

Salienta Comblin que a caminhada nunca é solitária.

URGENTE: Rede Globo manipula reportagem jogando a sociedade contra os Pataxó Hãhãhãe

Nesta foto, cova de índio Pataxó Hãhãhãe vitimas dos Pistoleiros no inicio desse ano de 2012.

A Comunidade Indígena Pataxó Hãhãhãe, além de sofrer forte perseguições dos Fazendeiros e de seu comparsas, ainda temos de enfrentar perseguição e calunias da rede comercial da Globo. Ontem no Jornal Nacional da Globo, o reporte… fez uma matéria ridicularizando a luta dos Pataxó Hãhãhãe, eles agem parecendo que tem propriedade da verdade. Mais nós indigenas temos a nos defeder e dizendo que ela esta a favor dos pistoleiro que provavelmente está sendo acusado nos sites das região como o principal acusado da morte…

Quem assistiu a matéria percebe que a Globo coloca os fazendeiros como coitadinho, provocando penuria na sociedade, a realidade é que os pistoleiro de armando Pinto (o fazendeiro que chora na filmagem) não aguentaram com os indigenas, pois muito tempo é que eles vem ameaçando a comunidade. Segundo os boatos, ele pagavam a diária de 100,00 para cada pistoleiros, e estava com mais de 30 homens dentro dessa fazenda. E que não aguentou mais pagar o bandido para dá seguranças na sua fazenda.

Para cada ação tem uma reação, os índios retomaram as fazendas, que está dentro da 54,100 Hectare, que o governo a mais de 30 ano não quer julgar, porque eles mesmos são culpados. Esses fazendeiro que hoje se diz donos da nossa terra, nada mais é que usurpadores de nosso territórios. Agente indígena fica triste é que pessoas inocente como Ana Maria Santos Oliveira, está morrendo, ou seja as estradas não estão tendo seguranças, sabe porque, quem mais trafega nessas estradas agora são nós indigenas, e quem faz barreira para matar indios são os pistoleiros dos fazendeiros, por prova disso já fora mais de 25 indigenas assassinado, em sua grande maioria vitimas de tucaia na estrada. O carro que a vitimas Ana Maria Santos Oliveira -não india estava, era semelhante ao carro que está em nossas aldeias prestando serviço pela a FUNAI, ou seja, tem 2 carros parecidíssimo com o carro da vítimas, provavelmente os pistoleiro pensou que seria o carro da FUNAI e disparou contra, causando assim a morte da civil.

Então nós da Comunidade Pataxó Hãhãhãe, temos a declara que o jornal da Nacional da rede Globo está equivocado, a passar informação de impacto negativo para a sociedade Brasileira. Nós indígenas Pataxó Hãhãhãe somos guerreiros e não covardes a ponto de matar pessoas inocentes. A justiça devem apurar e colocar na cadeias o fazendeiro que contratou esses pistoleiros e também punir esse pistoleiro. que fica durante o dia usando drogas e ameaçando os indígenas de morte.
E que o Jornal da Rede Globo venha para a nossa aldeia fazer uma matéria seria e não jogar a sociedade contra os índios Pataxó Hãhãhãe. Fazendo falsas acusações em relação a nós indígenas, sem ter provas.

ATENCIOSAMENTE,
COMUNIDADE INDÍGENA PATAXÓ HÃHÃHAE

Rede Globo Manipula Reportagem jogando a sociedade contra os Pataxó Hãhãhãe

TESES EQUIVOCADAS NA APRECIAÇÃO DO PAPEL DO ESTADO NAS SOCIEDADES DE CLASSES: breves considerações

As relações Sociedade-Mercado-Estado seguem a desafiar sucessivas gerações, na contemporaneidade. Dadas a complexidade e a extensão crescentes do processo de globalização capitalista, todas essas relações suscitam enormes desafios que, sobretudo hoje, nos interpelam, provocando dúvidas e questionamentos às diferentes forças sociais, inclusive os diferentes segmentos que se reclamam de esquerda, aqui tomados como alvo dessa notas, quanto à compreensão e ao enfrentamento teórico-prático das relações Sociedade-Mercado-Estado, aqui focando especificamente (mas sem dissociar) sua compreensão do papel do Estado, de modo a expor alguns questionamentos acerca de como têm lidado com vários aspectos da relação Sociedade-Estado, que considero lamentáveis equívocos.

À exceção de momentos comemorativos mais marcantes, de acontecimentos emblemáticos, no cenário internacional ou nacional, ou de homenagem a figuras e obras de referência dos clássicos revolucionários, a tendência predominante tem sido a de uma contumaz sedução das forças de esquerda pela figura do Estado e seus aparelhos, indo da apologia incontida (caso do Estado socialista), ao famoso “apoio crítico” e a uma defesa incondicional do Estado burguês, passando por uma composição orgânica e copartícipe com os diferentes aperelhos de Estado, notadamente o Executivo e o Legislativo.

Ainda mais intrigante do que essa praxe de efetiva e entusiástica colaboração ou co-habitação de relevantes segmentos das forças de esquerda brasileiras, tem sido sua deliberada omissão em se debater acerca de tal estratégia. Raramente se ouve ou se lê – menos ainda se conversa – a esse respeito. Parece haver um consenso ideológico tão arraigado, que, com raras exceções, tende a já fazer parte da cultura dessas forças de esquerda.

Embora as inquietações-objeto dessas breves considerações se estendam também, no que é cabível fazê-lo, à figura do Estado socialista “realmente existente”, tal como o percebemos nas experiências históricas contemporâneas, inclusive as que são positivamente avaliadas, aqui esboçamos um olhar crítico principalmente quanto ao papel do Estado nas sociedades de classes não-socialistas. Não obstante, não há como ignorar que uma coisa se acha organicamente vinculada à outra. Ou seja: a luta por relações sociais alternativas à barbárie capitalista (ou de outras sociedades de classes, em geral), hão de se tomar na devida conta, a partir das práticas moleculares cotidianas, os mais distintos mecanismos econômicos, políticos e culturais que lhe dão sustentação, sempre em busca de superá-los, por meio de um duplo, articulado e permanente esforço:

– o do compromisso com o desmonte dos mecanismos e relações sociais característicos do velho regime;

– e, ao mesmo tempo, o de mostrar-nos capazes de sinalizar claramente, em todas as esferas de relação, para a criação de mecanismos e sobretudo de práticas coerentes, condizentes com a nova sociedade em construção, ainda que de modo molecular, até porque se trata de um processo a longo prazo e incessante.

Há que se reconhecer que estamos muito longe desse horizonte. Preponderam largamente graves vícios – que, aliás, se aprofundam – que devem ser, primeiro, reconhecidos, e, em se fazendo autocrítica, buscar superá-los, permanentemente. E não se trata de algo recente, em nossa trajetória, ainda que a volúpia pelo “poder” venha causando, cada vez mais, sérios estragos em vastos segmentos de esquerda (não apenas partidária; também, de movimentos sindicais, populares e pastorais sociais) com certa referência de combate. Em determinado período, esse namoro com o Estado se dava, de modo mais discreto, insistindo-se – pelo menos em palavras – em tratar-se de mera tática. Ou seja: os períodos eleitorais deveriam ser aproveitados como espaço de denúncia e de propaganda do programa alternativo aos “partidos da ordem”. A esse propósito, alguns segmentos da esquerda partidária francesa, por exemplo, parecem cumprir bem tal função, a julgar por recente debate público, a poucos dias das eleições presidenciais. Mas, isto é exceção.
O que sucede hoje, abertamente, é a sedução pelo poder, que foi acentuando-se, passando “naturalmente” de tática a estratégia, chegando hoje a sólida parceria com o Estado. Naturalmente, do ponto de vista do discurso, sempre se arrumam “bons” argumentos abstraídos do contexto de uma ou outra obra de algum clássico como pretensa justificativa de legitimação teórica de tal opção.

Se, por um lado, os clássicos não são unânimes quanto à questão de se lidar com o Estado, o Parlamento (e outros aparelhos), há neles, a partir de Marx, referências emblemáticas, a não perder de vista, alertando para a verdadeira natureza do Estado.

De fato, há uma variedade de posições – ora de participação, ora de abstenção – acerca dos pleitos eleitorais. Ainda em alguns números dos anos 80, na Revista Política Operária, de Lisboa, Francisco Martins Rodrigues nos legou valiosas contribuições a esse respeito, recorrendo aos clássicos do Marxismo. Mesmo sem pretender aqui esboçar um espectro sobre tal ponto, convém sublinhar, de passagem, que participar ou não de pleitos eleitorais burgueses depende de uma apurada avaliação da conjuntura, da correlação de forças. E, mesmo nesses casos, não se deve deixar envolver pela lógica dominante, sob pena de sucumbir a uma homogeneização de péssimas conseqüências para as classes populares. É ou não isto, o que tem acontecido, na prática? Nos começos da participação, prevalece o propósito de se tomar tal decisão como mera tática. Com o passar do tempo, isto foi progressivamente transformando-se em estratégia, a ponto de tornar-se inimaginável, por exemplo, esperar-se de quem concorra com êxito a um mandato legislativo ou executivo, retorne à base, tão logo encerre seu período d gestão. Inimaginável pretender-se tal postura por parte dos partidos em geral. Conseqüência: à semelhança dos efeitos fulminantes de dependência provocada pelas drogas sobre seus usuários iniciantes, algo assim se passa em relação aos que se aventuram pela lógica leitoral.

Vamos resumir nas seguintes teses o que avaliamos como equívocos recorrentes a esse respeito.

– AVALIAÇÃO INCONSEQUENTE DA NATUREZA E DO PAPEL DO ESTADO – Ainda parece raro escutamos falar-se e até escrever-se acerca de elementos avaliativos do papel do Estado no processo de dominação capitalista. No pouco que se observa, algo desponta intrigante. Em geral, não se observa, de um lado, objeção alguma quanto ao reconhecimento do lugar do Estado e seus aparelhos no modo de produção capitalista. O problema emerge quando se passa de tal constatação para sua aplicabilidade. Aqui se observa uma distância abissal. Com a maior “naturalidade”, “se esquecem” os clássicos, e passa-se a uma inserção direta e orgânica nos processos de composição com as forças e os “partidos da ordem”. A quem isto interessa? Quais as conseqüências teórico-práticas dessa atitude de chocante inconseqüência?

Aqui também há um agravante considerável. O que, em outras conjunturas, poderia incidir alguma dúvida e até parecer razoável fazer-se alguma concessão, quanto a tal opção, no quadro atual, contudo, o que se observa é uma flagrante sinalização a apontar, cada vez mais, para uma apreciação da existência de completa incompatibilidade entre projetos alternativos de sociedade e priorização de processos político-eleitorais. Tal vem sendo a onda de escândalos graves, que se sucedem em cadeia, envolvendo graúdos agentes estatais, nas distintas instâncias, que não há justificativa plausível, capaz de sensibilizar as classes populares em favor de semelhante aposta. Pode haver – e há, sobretudo em conseqüência da incessante introjeção ideológica – certo eco da parte dos setores de massas, jogados à sua própria sorte.

– PRETENDER O ESTADO COMO PARCEIRO – A avidez pelo poder, por ocupação de cargos e funções, no aparato estatal (não é pequeno o número de ex-militantes hoje a servirem as instâncias estatais, inclusive gozando de situações de privilégio), traduz-se pelo investimento vultoso nos processos de organização, manutenção e fortalecimento do Estado burguês. Daí a tomá-lo como parceiro é um passo. Parceria que se manifesta de múltiplas formas. Graças ao progressivo acesso de membros de agremiações que se pretendem de esquerda a funções e cargos de peso nos espaços estatais (em âmbito municipal, no plano estadual e na esfera federal), vai-se consolidando, mais do que uma aliança eventual, uma efetiva cumplicidade. Daí para frente, já não interessa tanto seguir fazendo críticas como antes, ainda que os fatos sejam, fundamentalmente, continuação atualizada dos fatos de outrora tão acirradamente criticados. Os tempos agora são enfrentados de outra forma. A contundência das críticas cede lugar, primeiro, a uma opinião mais cautelosa, ainda quando seja o mesmo o grau de responsabilidade dos atuais gestores em relação aos antigos. Em seguida, perdendo de vez o pudor, passando a defender incondicionalmente os desmandos praticados. Feita uma concessão de princípio, o caminho torna-se escancarado a reedição de outras, em série, cada uma mais grave do que as anteriores…

– PÚBLICO = ESTADO – Ainda segue, largamente hegemônica, a tendência a uma equiparação imediata entre bens e serviços de natureza pública e gestão estatal. Pouco efeito têm surtido freqüentes alertas de alguns interlocutores contemporâneos, entre os quais me vem a lembrança a reiterada insistência do Prof. Ivandro da Costa Sales, a esse respeito. Segue forte a inclinação de se remeter o que é público automaticamente aos espaços e instâncias do Estado, em suas diferentes esferas (federal, estadual e municipal). Não obstante as crescentes contradições a esse respeito (sucessivos escândalos e ocorrências clamorosos), segue, ainda assim, hegemônica essa tendência.

Ao fazermos tal contraponto, alguém pode reagir abruptamente, recorrendo inclusive a argumentos apelativos do tipo: “Se não é o Estado o lugar do Público, então a solução é entregar para o Mercado?” Não é por aí, claro: nem “privataria” nem estatolatria, contestamos. É evidente que interesse público não rima com interesses de Mercado. Uma ou outra situação que fuja a essa regra, figura apenas como rara exceção. Isto, por outro lado, não nos autoriza a sustentar o caráter PÚBLICO do Estado capitalista e seus aparelhos, até porque são componentes essenciais da engrenagem do Mercado. Se algum diálogo pode aqui haver, trata-se, antes, do “diálogo” entre o pescoço e a guilhotina… O fato de gozar, o Estado, de ampla propaganda de detentor de função pública, não nos deve fazer esquecer a lista copiosa de fatos corriqueiros a atestarem, ad nauseam, a tendência privatista que rege a máquina do Estado e seus aparelhos. Os vícios que são denunciados na lógica de Mercado perpassam os espaços maiúsculos e minúsculos do Estado. Sempre há alguma exceção. Só não vê quem não quer ver.

Urge um sistemático investimento nos mecanismos que apontam para o que temos chamado de “cultura consultiva” (termo correlato a conselho, como se sabe). Trata-se de investir, cada vez mais e melhor, nas potencialidades dos conselhos populares não-oficiais (ou que outros nomes tenham). Os conselhos de gestão que se organizam no formato do sistema vigente acabam, salvo poucas exceções, impregnados por seus vícios, facilmente observáveis. Há que se apostar na cultura consultiva, o que requer, entre outras condições necessárias, um sólido e contínuo processo de formação de setores da base e da militância.

Nessa linha, importa, antes de tudo, enfrentar/combater, nas relações do dia-a-dia, os valores da cultura dominante, historicamente construídos desde as relações colonialistas. O enfrentamento e a superação desse quadro se dão, sobretudo, por meio de um processo formativo contínuo, radicalmente alternativo à grade de valores e de práticas do sistema em vigor. Processo formativo contínuo, cuja alternatividade se reconheça em seus frutos, observáveis pelo lúcido e firme enfrentamento das lutas e pelo esforço organizativo dos protagonistas.

Da farta lista de valores a enfrentar/combater, podem ser destacados alguns:

– o legado da cultura presidencialista: das elites às forças de esquerda; do ambiente familiar à escola; das igrejas às demais instituições, é introjetada, assimilada, assumida e reproduzida, em larga escala, como algo “natural”, a atitude de se atribuir ou confiar a uma pessoa (ou a um pequeno grupo) – o presidente, o governador, o prefeito, o deputado, o senador, o vereador e suas respectivas instâncias – a tarefa de fazer o que é da alçada do conjunto dos cidadãos e cidadãs. “Fulano sabe”; “Beltrano é honesto e competente”; “Ele/ela nasceu para o cargo”… Ao fim e ao cabo, levam vantagem os setores dominantes que sempre arrumam um jeito de garantir nessas instâncias suas maiorias…

Ainda há, aqui, outras conseqüências. Uma delas: a superestimação de um indivíduo ou o culto à personalidade pode descambar para uma situação de uma empatia normótica e até de cumplicidade entre admiradores e admirado, governantes e governados, coordenadores e coordenados, a tal ponto que isto gere uma situação afetiva de cumplicidade tal, que dificulte, ou até impeça aos admiradores tomarem a necessária distância crítica, nas horas cruciais, com perda de autonomia, e favorecendo atitudes que tendem a uma fidelidade mais a pessoas do que à causa defendida: “Amicus Plato, sed magis amica Veritas”;

– o hábito de se manter alguém ou algum grupo num cargo de dirigente por tempo indefinido: esta é uma situação de tal modo comum, que praticamente inexiste objeção a seu respeito. No cenário político-partidário, por exemplo, ocorre abusivamente. Diante de alguém eleito e reeleito indefinidamente por longos mandatos. Não é raro ouvirmos algo como: “Fulano nasceu para ser político”; “É a vocação dele/dela”… Situação similar se passa em outras instâncias institucionais e de movimentos sociais (sindicatos, movimentos populares);

– a indisposição para o trabalho em mutirão: Mesmo quando formalmente se aceita trabalhar em equipe, prevalece a tendência a deixar a uma só pessoa ou a um minúsculo grupo a responsabilidade de tocar as tarefas e tomar decisões que deveriam ser assumidas pelo conjunto dos interessados.

A partir dessa cultura secularmente sedimentada, faz-se possível compreender melhor as práticas de superestimação do papel do indivíduo na construção de uma história coletiva que, sem excluir nem subestimar a participação dos indivíduos, reconheça o lugar do coletivo na construção da cidadania.

– CONCEPÇÃO E PRÁTICAS DISSONANTES ANTE O PAPEL DO ESTADO NAS EXPERIÊNCIAS DE SOCIALISMO – Tal o desespero semeado pela barbárie capitalista, ao longo de sua trajetória, que, ao se superar suas amarras, não se tem dado suficiente atenção ao desempenho das experiências socialistas, especialmente no que se refere ao fato de não se ter conseguido dar passos convincentes em direção a uma sociedade sem classes. Em muitos casos, não se pode nem se deve esquecer o peso especial dos fatores externos. A estes, por outro lado, não se pode nem se deve associar o peso dos fatores internos. Vem-me à lembrança depoimento discreto feito a esse propósito pelo então Ministro da Educação da Nicarágua, Fernando Cardenal. Depoimento comentado num dos textos do Pe. José Comblin.

As experiências históricas – recentes e menos recentes – não têm sido suficientemente avaliadas quanto a este ponto. Mesmo aquelas experiências consideradas mais emblemáticas ou tiveram curta duração ou acabaram incorrendo, pelo menos em parte, nos vícios do velho sistema que se pretendia superar. Embora não seja este o momento de fazer um balanço nessa direção, tratamos apenas de esboçar algumas intuições acerca desse impasse.

Não faltam alertas dos clássicos em relação à natureza do Estado, quanto ao seu real papel (de comitê da classe dominante) em toda e qualquer sociedade de classes – e o Socialismo é, como se sabe, uma sociedade de classes -, de tal modo que o Socialismo é tomado como uma experiência de passagem, um mal menor, até que se consiga reunir condições rumo à extinção do Estado e seus aparelhos e rumo a uma sociedade sem classes (e, portanto, sem Estado).

Não obstante o amplo consenso, no seio das forças de esquerda, a esse respeito, as relações sociais do cotidiano, ainda que positivamente diversas do antigo regime, sob vários aspectos, padecem de vícios recorrentes do antigo regime. Aqui o partido único assume objetivamente o papel de classe dominante, em nome do proletariado, e em orgânica cumplicidade com os aparelhos de Estado. Agindo objetivamente enquanto classe dominante, os novos dirigentes passam a gozar de amplos privilégios em relação ao conjunto dos demais cidadãos. Passam os anos, e não se dão passos concretos em relação à sociedade anunciada. Não há interesse da parte dos privilegiados: a manutenção da situação lhes convém. O que era, na origem, uma passagem, termina sendo institucionalizado, abortando o movimento original. A propaganda, então, passa a tomar um lugar expressivo, a veicular toda uma ideologia que não se sustenta em fatos concretos, mas em discursos bem tecidos. Sempre há exceções, mas estas não infirmam a regra…

A despeito dos objetivos de origem – de construir uma sociedade sem classes, e portanto sem Estado -, tais objetivos ficam adiados indefinidamente. Já não se trata de derrubar a pirâmide social, símbolo da superposição de classes. Contenta-se agora com mera troca de posição entre os antigos dominantes e os atuais. Já não se trata de mudar o modo de organização por meio da derrubada do formato de pirâmide, agora se trata de inverter posições dentro da mesma organização piramidal…

– IMPLICAÇÕES CONCRETAS DESSES EQUÍVOCOS – São bastante amplas as implicações concretas desse quadro, alcançando distintas esferas da realidade. No âmbito econômico, percebe-se que a tendência antes seguida como referência-mor das forças de esquerda, agora passa a ter como meta apenas uma pauta de conquistas fragmentadas e etapistas, de cunho claramente moldado à lógica do establishment, remetendo a um futuro fantasioso os compromissos de transformação estrutural. As políticas econômicas (e as demais) seguem o ritmo da agenda oficial. mais centrada nas metas formais e a serem aplicadas a conta-gotas, em sintonia com a lógica do Estado e seus aparelhos, em indefectível sintonia com os interesses do Mercado. O compromisso constitucional de universalização das políticas públicas – não apenas as de caráter estritamente econômico – resulta uma figura de retórica, mera formalidade.

Assim ocorre em relação a condições dignas de trabalho decente; de democratização da terra (Reforma Agrária); da demarcação e regularização das terras indígenas, das terras de comunidades quilombolas e de outros povos tradicionais; dos serviços públicos e de qualidade de saúde, previdência; dos serviços de educação de qualidade; dos serviços de transporte público; de moradia decente para todos, etc. E isto se deixa de fazer, em proporção direta ao escancaramento do erário, dos recursos naturais, das riquezas públicas, inclusive por via de renúncia fiscal, em favor dos grandes conglomerados transnacionais. Um dos sintomas dessa realidade incide sobre as escandalosas taxas de lucro auferidas pelo sistema financeiro, alguns de cujos segmentos dando-se ao luxo de investirem em aquisições (legais ou por grilagem) de extensas áreas de terras, que deveriam ser destinadas à Reforma Agrária… Incidência não menos grave no que diz respeito às à política ambiental.

Enquanto isso, sucedem-se abusivamente os escândalos, implicando os mais graúdos agentes do Estado, em orgânica cumplicidade com os interesses do Mercado – e do Mercado em sua versão mais abominável. Enquanto isso, um tempo cada vez maior da mídia comercial é tomado para fazer circular, em seu noticiário, em proporão tal, que chega a concorrer com programas de banalização da violência social. As classes populares que, além de vítima de uma crescente violência social, também se vêem obrigadas a sustentarem um Estado perdulário, com agentes que sugam da sociedade até a última gota. Veja-se o caso do Parlamento, envolvido em sucessivos escândalos, que, além de extorquir o erário, também reduz parte expressiva de suas funções e de seu tempo a investigar práticas de bandidagem interna. Enquanto isto, vamos brincar de circo, com os preparativos da Copa (outra sangria escandalosa, além das implicações no aviltamento de valores…). E as eleições?

Nem tudo está perdido! A quem tiver olhos para ver, ouvidos para ouvir, mãos para tocar, pés para caminhar, coração para sentir, é dado acompanhar, com alegria e esperança, o que segue passando-se, em mutirão, nas “correntezas subterrâneas”, nas experiências de “fogo de monturo” (expressão de João Pedro Teixeira), grávidas de um novo amanhecer.

João Pessoa, 14 de abril de 2012.

Memória e justiça na Universidad Nacional de Cuyo (Argentina)

No dia 22 de março deste ano, foi realizada uma homenagem aos estudantes e professores da Facultad de Ciencias Políticas y Sociales da Universidad Nacional de Cuyo, Mendoza, que foram perseguidos pela ditadura cívico-militar argentina. O ato consistiu na inauguração de um mural com o nome dos 136 estudantes que foram expulsos em 1976 sob a alegação de serem ou terem sido subversivos, e mais o nome dos professores que foram demitidos. Há na placa, também, o nome de cinco desaparecidos que pertenceram ao quadro da UNCuyo.

A placa se encontra na aula magna da casa de altos estudos, que leva o nome de Mauricio López, professor e cristão metodista, também desaparecido pela ditadura cívico-militar. Soube deste ato de reparação da memória, pela decana da Facultad de Ciencias Políticas y Sociales, Mgter. Graciela Cousinet, que me convidou ao ato dias antes do acontecimento, me informando que o meu nome estava na placa. O que senti ao saber disto, foi um grande alívio. Agora mesmo, que escrevo estas linhas, suspirei fundo.

No tempo em que fomos expulsos da universidade pela ditadura cívico-militar que matava e sequestrava a torto e a direito em nome de uma luta anti-subversiva mentirosa e implacável, ser chamado de subversivo equivalia a várias coisas, nenhuma delas agradável. A imediata: você está na lista, você poderá desaparecer a qualquer momento, como todos os outros e outras que vinham desaparecendo nesses dias e nos anos anteriores, quando os comandos paramilitares e parapoliciais já vinham matando por toda parte da Argentina. A consequência imediata de termos sido expulsos da universidade foi uma perda total de referências.

Ficamos isolados, ninguém queria contato com subversivos, poderia ser o passaporte para a morte ou para o desaparecimento, que significava tortura e esquecimento. As pessoas diziam, direta ou indiretamente: por algo será. Ou seja, você estava na mira dos algozes, e ninguém queria ficar do seu lado, a não ser a família e alguns amigos desses raros, que valem tudo. Quando, passados 36 anos do golpe militar na Argentina, soube desta homenagem, senti que foi feita justiça. A pecha de que algo de errado tínhamos feito, ficara finalmente afastada.

Nada de errado tinhamos feito, ao contrário. O que fora punido pela delinquência cívico-militar, fora uma atividade construtiva, positiva, legal, que consistira na elaboração de um curriculum da carreira de sociologia, que envolveu a participação de docentes e estudantes, e consulta às entidades sociais e populares, para construir uma sociologia ao serviço das classes populares e dos trabalhadores. Isto era um delito para os delinquentes. Agora que o nosso nome foi limpo, olhamos para a frente, prosseguindo com a tarefa de construir homens e mulheres novos, mais fraternos e mais justos, formas de sociabilidade inclusivas, libertadoras.

FILME/DOCUMENTÁRIO “LA GUERRE PERDUE DU VATICAN”

Apresentamos aqui alguns tópicos do filme acima, de maneira resumida.

– 50 anos após a abertura do Concílio Vaticano II, a Igreja Católica, graças à poderosa reação das forças conservadoras, e ao apoio dos últimos papas, toma crescente distância em relação às decisões do Vaticano II.

– João XXIII, ao ser eleito papa, já idoso (perto dos 80 anos), em 1958, era tido como um papa de transição, isto é, eleito por pouco tempo, tempo suficiente para viabilizar a eleição de um papa mais estável, com força de levar à frente a caminhada da Igreja.

– Foi com enorme surpresa que se tomou conhecimento de sua ousadia de, a poucos meses de sua investidura, ter anunciado, em 1959, a convocação do Concílio Vaticano II…

– Situação emblemática, uma pedra de contradição! Para uns – a grande maioria do Povo de Deus, uma bênção! Para a minoria privilegiada, principalmente a Cúria romana, um escândalo!

– Fase preliminar do Concílio: o embate entre as pretensões abortivas da Cúria e os gestos de coragem de João XXIII, apoiado pelos que apostavam na convocação do Concílio como uma bênção, como a oportunidade de a Igreja abrir-se para o mundo, sem reeditar práticas de condenação da modernidade.

– Tem, enfim, início o Concílio Vaticano II, com a presença de mais de 2.500 bispos católicos de todo o mundo, numa época em que a população de católicos era de cerca de 500 milhões, hoje alcançando mais de um bilhão. O filme também foca cenas dos bastidores do Concílio, do embate entre as correntes opostas, inclusive nas chamadas aulas conciliares, das quais só participavam bispos e cardeais que dominassem o Latim…

– Instalado em outubro de 1962, o Concílio Vaticano II duraria três anos – e ao apenas uns quinze dias, como pretendiam os curiais. Três anos, em sessões anuais com duração de cerca de três meses.

– Dos embates conciliares fazia parte a necessidade de a Igreja mostrar-se humilde e pobre, mais comprometida com a justiça e os direitos humanos, como se apresenta no Documento Gaudiu et Spes, de 1965. Havia também um apelo a que a Igreja fizesse autocrítica, em relação à pompa ostentada inclusive nas instalações do Vaticano.

– João XXIII, filho de camponêses e fiel à causa dos pobres, tinha apreço pela experiência dos padres operários. Ele havia passado um tempo na França, como núncio apostólico, quando passou a acompanhar, de perto, a experiência dos padres operários franceses. Num encontro com um deles, André Depierre, este lembra da simpatia do Núncio pela causa dos padres operários, ao lembrar de suas origens pobres. Na fala do Pe. André Depierre, fica claro que os padres operário não se sentiam “padres do culto”, mas, antes, como enviados por Jesus a evangelizar os pobres, sendo pobres no meio dos pobres e com eles comprometidos.

– Durante o concílio, tornou-se forte, em setores mais sensíveis, o apelo às origens do Cristianismo, inspirando a busca de uma Igreja pobre, a serviço dos pobres, donde o chamamento a uma “Igreja pobre e servidora” (Y. Congar). Desse apelo tornaram-se testemunhas fiéis os famosos signatários do “pacto das catacumbas”.

– Esse chamamento de volta às origens do Cristianismo não não cai das nuvens. Expressa o grande anseio de parcelas significativas de cristãos católicos, a exemplo dos padres operários. Sua atuação desde o final da Segunda Guerra Mundial, junto aos trabalhadores, vários deles ligados ao Partido Comunista, e de quem os padres operários se fizeram companheiros, com singificativos laços fraternos, foi proibida por Pio XII, em 1º de março de 1954: uma tragédia na caminhada dos padres operários. Sob a justificativa de que o padre era homem da paróquia e do culto, Pio XII interrompeu formalmente, de modo brusco, essa frutuosa caminhada. Formalmente, porque, na prática, os padres não a abandonariam.

– O Papa João XXIII e o Concílio representaram um grande alento também para esses padres. Para começo de conversa, os padres operários foram recebidos pelo próprio Papa João XXIII, em sua biblioteca, em 1960.

– Outro ponto focado pelo filme: a Teologia da Libertação, uma fecunda experiência, que a partir das intuições do Vaticano II, vai brotar, da América Latina, no Brasil, nas comunidades do povo dos pobres, com o apoio de figuras como Dom Helder Câmara, Dom Manuel Larraiña, Dom Leônidas Proaño e outros, como lembra Dom Tomaz Balduíno, em seu depoimento, em que saúda o Concílio como um novo Pentecostes.

– Dom Helder, num fragmento de sua fala, denuncia as desigualdades sociais, em que 20% dos humanos detêm 80% das riquezas. Fato que deve inquietar os cristãos, sobretudo porque grande parte desses privilegiados se dizem cristãos…

– Dom Helder não se limita a denunciar. Ele próprio passa a levar uma vida de simplicidade, deixando de morar em palácio e indo abrigar-se nos fundos de uma igreja – a Igreja das Fronteiras, em Recife, em estreito contato com os pobres. Graças também ao seu empenho, prosperaram as CEBs, a Teologia da Libertação, as pastorais sociais, as comunidades de religiosas inseridas no meio popular (PCIs), em breve, a “Igreja na Base”.

– O Vaticano II implicou alterações impactantes:
+ na mudança das celebrações em Latim, passando a ser desde então em vernáculo;
+ na liturgia, celebrada distante ou de costas para o povo, agora com incentivo à participação dos leigos;
+ no incentivo à leitura da Bíblia (fonte de inspiração para os famosos círculos bíblicos e celebrações populares)
+ na consciência ecumênica, em diálogo e abertura aos irmãos evangélicos, aos não cristãos, e aos não crentes (ecumenismo e diálogo interreligioso). Nesse sentido, o filme lembra o grande encontro realizado em Assis, em 1986, promovido pelo Papa João Paulo II, com lideranças evangélicas, judias, mulçumanas, budistas e animistas. Iniciativa considerada uma blasfêmia pelos católicos reaciionários.

+ no reconhecimento explícito da liberdade religiosa, ao reconhecer que todo ser humano pode ser salvo mesmo fora da Igreja. Deus tem seus próprios caminhos.
– O Vaticano provocou várias outras alterações. Sobretudo a partir de 68, graças ao contexto de extraordinária efervescência na França e na Europa e outros continentes, as idéias do Vaticano II inspiraram muitas iniciativas, inclusive ao interno da Igreja. Houve grande mobilização dos padres, a reivindicarem uma atitude mais comprometida da Igreja em apoio aos pobres, e contra posição da lei do celibato.

– Em Roma, reúne-se uma assembléia de centenas de padres europeus, sob o tema “Uma Igreja a libertar para nós significa libertar o mujndo”, em que levantam sua voz profética contra uma Igreja muito empenhada em condenar os “pequenos pecados”, enquanto silencia grandes escândalos: o crescente fosso entre ricos e pobres; o sistema que só visa lucro, etc.

– Foi também em 68 que se dá um grande abalo entre os católicos, em especial as mulheres, em razão da publicação da encíclica “Humanae Vitae”, do Papa Paulo VI. Ele que havia sido ovacionado pela publicação da grande encíclica “Populorum Progressio”, em 1967, deparava-se com uma forte onda de decepção em relação à Igreja, pela proibição dos contracptivos.

– Surge, ainda, a impetuosa onda reacionária, capitaneada pelo bispo francês, Mons. Lefèbvre , a contestar abertamente o Concílio e a provocar um cisma. Ele funda a Fraternidade São Pio X, e, na Suíça, instala um seminário para formar padres tradicionlistas. Movimento que, depois, também tem repercussão em Paris, inclusive com ameaça pelos tradicionalistas de ocupação da catedral de Notre Dame…

– A eleição de João Paulo II vai favorecer um aprofundamento da linha conservadora da Igreja Católica. Seu pontificado começa por seu engajamento na luta contra o “Comunismo”, culminando com a derrocada da ex-URSS, e seu combate aos regimes de esquerda na América Latina.

– No Brasil, nos anos 80, milhares de padres se engajam, sob a inspiração do exemplo de Dom Helder, nas lutas em defesa dos camponeses sem terra. Atividades consideradas, então, como “subversivas”. Palavra-chave tomada pelas ditaduras militares de então, para incriminar os aliados dos pobres.

– Em 1980. é assassinado Dom Oscar Romero, pelas forças de repressão que, por ocasião do enterro do mesmo, não hesitam em atirar contra a multidão reunida. João Paulo visita El Salvador, visita o túmulo de Dom Oscar, sem dizer uma palavra: entendia que isto pudesse render em benefício da Teologia da Libertação, que ele e seu assessor próximo, Ratzinger, queriam punir. Foi essa,a atitude do Papa, ao visitar a Nicarágua, em 1983: em abençoar o Pe. Ernesto Cardenal, que, reverente, lhe pedia a bênção, dele recebeu uma repreensão em público. Fato que se refletiria em certa atitude de protesto pela multidão, por ocasião da fala do Papa, ao celebrar a Missa…

– O entusiasmo semeado pelo Concílio Vaticano II, saudado por D. Balduíno como um “novo Pentecostes” é substituído, durante o pontificado de João Paulo II, “or outra coisa”: controle dos seminários, mudança dos seus superiores, suspeição contra a Teologia da Libertação. Isto vai ser especialmente reforçado a partir do Sínodo de 1985,

– Em 1985, João Paulo II substitui Dom Helder por um bispo conservador, Dom José Cardoso, radicalmente contrário à Teologia da Libertação. (São exibidas belas imagens e músicas carnavalescas, bem populares, em memória e em homenagem a Dom Helder, falecido em 99).

– João Paulo II beatifica e canoniza (em 1992) a grande referência do “Opus Dei”, José Escrivã. Tão ou ainda mais graves são a familiaridade e a aproximação do fundador da Seita Legionários de Cristo, conhecido como Maciel, com o Papa João Paulo II e com outras figuras da alta hierarquia (inclusive o Cardeal Sodano). Maciel é um grande milionário mexicano, de vida desregrada (tendo mulheres e filhos clandestinos, abusador de crianças e adolescentes), traços que conseguiu ocultar, durante décadas, não sem o emprego de propinas e muita corrupção, sobretudo com altas altoridades eclesiásticas. Quando isto foi denunciado em dossiê de cerca de quatrocentas páginas, entregue e recebido pelo então Cardeal Ratzinger, o dossiê foi engavetado, até estourar , descontrada, outra onda de denúncias… A “saída” encontrada pelo Vaticano foi a de simular uma condenação de Maciel, sem abrir mão da parceria com os “Legionários de Cristo”…

– Mais recentemente, passos importantes foram dados pelo pontificado de Bento XVI, no sentido de recuperar de volta ao seio da Igreja Católica a Fraternidade São Pio X, de Mons. Lefebvre, retirando-lhe a excomunhão e fazendo-lhe significativas concessões, inclusive a liberdade de criticar o Concílio Vaticano II… E há poucos anos, sob o pontificado de Bento XVI, foi restabelecida a celebração da Missa em Latim, ampliando ainda mais o campo de manobra e de expansão dos segmentos reacionários, nos diversos países.

– Apesar de tudo, há experiências fecundas protagonizadas pelas “correntezas subterrâenais” ou, como dizia D. Helder, pelas “minorias abraâmicas”, que nos infundem esperança. Há experiências de evangélica convivência ecumênica entre católicos, muçulmanos, budistas… Há muitos padres, bispos que, em silêncio, resistem às ordens reacionárias e anti-evangélicas de Roma, quanto a situações tais como a discriminação contra as mulheres, a lei do celibato, o uso de preservativos, etc.

– Em 2011, mais de 300 padres austríacos romperam o silêncio, e publicaram um manifesto de desobediência às proibições descabidas por parte de Roma. Também na Áustria, em 1995, foi criado o Movimento Internacional Nós Somos Igreja, hoje espalhado por dezenas de países no mundo católico.

La vida como misión

Escribir puede ser una misión. Creo que vivir es una misión, o puede serlo, si uno le da un sentido de amor y de servicio a la vida. No basta estar vivo para que la vida tenga un sentido. Se puede estar vivo mecánicamente, que es una manera ausente de estar aquí. Cuando digo que la vida puede tener un sentido de misión, es que me parece que si uno está aquí, debe hacerse responsable del hecho de estar vivo. Creo que todas las personas pasan o han pasado por circunstancias difíciles. Los días pasados pueden haber sido muy arduos. Pero si estás, aquí, hay todavía una razón muy importante para que estés en este mundo. El mundo no sería el mismo sin vos.

Cada uno de nosotros tiene un lugar, y ese lugar es insubstituible. Cuando escribo, ocupo mi lugar. Y no se escribe solamente cuando se ponen palabras en un papel, como ahora. Estamos escribiendo siempre. Cuando salimos a la calle y vamos al mercadito o a la fisioterapia, o cuando vemos a alguien o pasamos por una vereda, estamos escribiendo. Alguien está leyéndonos, y, lo que es aún más importante, estamos leyéndonos a nosotros mismos. Cada paso, cada respirar, es una letra en el libro del tiempo. Cada día es una nueva posibilidad abierta, aunque todos los caminos puedan parecerte cerrados ahora. Hay una rendija, una puerta abierta por la que se puede pasar, aún en la situación más difícil.

Cuando escribo, todo ocupa su lugar, todo está como debe ser. Y cuando vivo con atención y con mucho amor por esta oportunidad única de estar vivo, la vida me va incluyendo, me voy fundiendo cada vez más con esa totalidad que es el existir. No podemos eliminar la muerte física en el final del camino. Pero podemos evitar a toda costa la muerte en vida, que es un mal que nos puede sobrevenir si desistimos de darle un sentido todo especial a cada segundo, al hecho de estar formando parte de la gran marea de la vida. Cada uno de nosotros es una posibilidad única del infinito, una forma única como la vida se manifestó. Y entre todos, entre todas, somos un tejido en movimiento que se puede ir moviendo hacia más amor, más justicia, más verdad. En esto creo, y sé que no estoy solo.

Unidad con la vida

Ayer pensaba que un amor entrañable, muy profundo por la vida, nos funde con ella, nos unifica a tal punto con el existir, que ya somos uno o una con la eternidad. Esto no es algo abtracto o genérico, sino concreto, y paso a explicarlo si me permiten por un momento esto que podría llegar a ser o parecer petulante. Estoy hablando de una experiencia que vengo haciendo, y no de una creencia o idea que pueda haber tomado de alguien y estuviera repitiendo. Hay que aclarar, porque si no por ahí te puede venir alguien con algún comentario que te la voglio dire. Si digo que uno se va fundiendo con la vida por amor, o si digo que uno puede ir eternizándose al unirse a lo que existe, debido a un amor entrañable por la existencia, estoy hablando de cosas que hago.

Cosas que todo el mundo hace o puede llegar a hacer, si se deshace de un cansancio vital impuesto por la rutina, por el hábito de haber adquirido la creencia falsa de que el vivir se repite, de que lo que ocurre se repite, y de que después de toda esa repetición falsa, inexistente, no hay más nada, o, al contrario, está el reino de los cielos. Yo no voy a discutir creencias o religión con nadie. Cada uno con sus creencias, ¿vio? Para mí lo más extraordinario, es que si una hoja de parra produce un sonido muy leve al arrastrarse por el viento sobre la tierra seca, y ese sonido tan delicado me conmueve y me llama la atención, entonces es posible que, por ese encantamento entre la hoja de parra y ese su ruidito tan particular, la hoja de parra y yo, ese sonidito tan delicado y yo, vayamos fundiéndonos, vayamos siendo una sola cosa.

Y esto tiene que ver con la unidad, con ser uno, el objetivo de la vida. La vida es unidad, no disociación, aunque nos quieran convencer de lo contrario, o aunque nos hayamos creído lo contrario durante años. Un día uno despierta y ve que no, que la inmortalidad no está en el más allá, sino en el más acá, en este aquí y ahora tan fascinante en que voy disolviendo las falsas fronteras que me separaban de todo lo que existe, y me voy uniendo con todo lo que existe. Les pido que me disculpen todas estas repeticiones. Uno repite a veces por descuido, o también, y espero que sea este el caso, por el entusiasmo de estar compartiendo algo muy lindo, algo muy bueno.

Una puerta hacia la eternidad está al alcance de cada uno, de cada una, si amamos intensamente la vida, y vamos borrando por este amor excesivo y por una atención y cuidado extremados con todo lo que ocurre, las falsas barreras que nos separaban e iban convenciéndonos de que estábamos solos, que éramos algo extraño y diferente, separado. Repito y repito y no me canso de repetir, pues de tanto repetir, un descubrimiento se va haciendo nuestro. Así como nos convencieron a fuerza de repeticiones, de que este vivir era un sufrimiento sin fin, podemos convencernos de lo contrario, de que es una pura plenitud, si lo repetimos incansablemente. Esa atención y afecto, ese cuidado continuo con la vida, nos abren puertas a la eternidad.

La literatura y la poesía están en esa búsqueda, en esa construcción de puentes hacia la unidad. También lo está la actitud religiosa auténtica, esa fascinación por la creación, por la vida de uno mismo y por la vida de cada insecto o flor o por la nube que anda por el cielo y por el sol que a esta hora debe estar escondido no se sabe adónde, en qué países o lugares. Estas cosas las comparto para que se eternicen en tí y en mí, y que entre todos y todas, vayamos sacándonos de la cabeza esa falsa noción de que esto no es nada más que lo mismo que ya fue. Y está también la memoria, la que nos trae el recuerdo de la infancia y de todo lo bueno y maravilloso que fuimos viviendo en la juventud y después, hasta aquí, y este recuerdo continuará.