Parque de Madureira é criticado por associação de moradores

Eraldo de Oliveira Rosa, presidente da Associação de Moradores da Vila Das Torres, comunidade em Madureira, zona norte do Rio. Foto: Alexandre Magalhães.

Desde que foi anunciado o projeto do Parque de Madureira pela prefeitura, na zona norte do Rio, moradores da comunidade Vila das Torres, na região em que está prevista a construção da área de lazer, têm se reunido para articular a permanência das suas casas no local. As remoções estão em andamento, e os agricultores da horta que também será afetada pelo projeto estão preocupados. O Fazendo Media participou da terceira reunião da Associação de Moradores e sua população com a defensoria pública, e entrevistou sua liderança, Eraldo de Oliveira Rosa, que apontou os problemas relatados a seguir.
Gostaria que você falasse sobre a negociação que está sendo feita com os moradores em função da implantação do Parque de Madureira no local onde existe a Vila das Torres hoje
Está tudo sendo feito de maneira estranha: existe uma diferença de valores, algumas casas com valores razoáveis e outras muito baixos. Tem casas na faixa de R$ 55 mil, até valores superiores, mas também tem casas boas com R$ 10 mil, R$ 8 mil. Teve uma casa com piso, dois pavimentos, toda feita direito por R$ 12 mil. Outra de tijolo, pequena, com telha, foi avaliada em R$ 29 mil, por exemplo.
Eles estão negociando individualmente com as pessoas na Secretaria de Habitação. Passam numa triagem, pela assistência social, que na verdade ela mesma dá o valor pela casa. Eles fotografaram as casas, marcaram, mediram, só que na hora dos pagamentos não estão respeitando essas medidas. Tem casa que a pessoa chega lá e não está com a medida correta, a pessoa não vê nem o desenho. E o apartamento em Realengo é uma opção deles, não do morador. Se a casa estiver avaliada abaixo de 30 mil, já dizem que o cara tem direito a um apartamento ou vai perder. São 290 apartamentos no condomínio, o daqui é o Ipê Branco. Na Vila das Torres são 833 casas, já deve ter ocupado todos os apartamentos lá. A gente já deve estar com mais de 300 casas quebradas.
Quando foi removida a primeira casa na comunidade?
Eles começaram a chamar as famílias no dia 1º de maio, e no dia 28 de maio começou a ter as remoções: na primeira semana de junho cairam as primeiras casas. No começo era combinado com a prefeitura que a associação acompanharia os moradores na negociação, mas esse elo foi quebrado no dia 6 de maio porque os valores eram muito baixos e havia uma pressão muito grande em cima dos moradores para que eles aceitassem as propostas. Aí entrou a subprefeitura com o André Santos e sua equipe, então começou um trabalho corpo a corpo de convencimento: ir para o apartamento quem estava com um valor baixo, ou aceitar o cheque quem não tinha direito a esse apartamento.
Eles usaram várias medidas. No dia 1º de maio ofereceram o aluguel social, a compra assistida com 40% acima do valor e o valor em si. No dia 5 foi a mesma oferta, mas no dia 6 eles suspenderam o aluguel social, o apartamento que eles estavam oferecendo e a compra assistida, passaram a oferecer só a indenização. Eu tenho uma casa, o SMH 548, que eles ofereceram R$ 2,568, uma casa de um cômodo e um banheiro. Até o dia 11, eles já tinham conversado com 122 pessoas e 3 delas tinham fechado com eles. No dia 12 eles fizeram uma mágica, apareceram 290 apartamentos lá em Realengo. O subprefeito veio pessoalmente entregar 50 senhas para as casas pequenas, e as distribuiu no valor de um apartamento de R$ 55 mil reais em Realengo, onde eles só iriam pagar a água e a luz. Acabou, agora eles vão querer mandar para outro lugar. Usaram esses apartamentos para fazer pressão naqueles que tinham casas maiores, porque eles mantiveram um valor baixo pressionando as pessoas que estavam vendo as casas caindo.
"Aqui você não tem tráfico de drogas, as crianças ficavam nas ruas até tarde antes de começarem a demolir as casas, fato que desestabilizou a comunidade", afirmou Eraldo Rosa. Foto: Alexandre Magalhães.

Quando você viu o projeto pela primeira vez?
Na época do Bittar eu peguei um mapa que mostrava onde seriam feitos 540 apartamentos aqui em Madureira, prevendo o parque com essas unidades. Aqui ele já oferecia um valor baixo, isso foi no dia 22/12/2009. As casas estavam dentro do projeto, pegaria da Rua Bernardino de Andrade até a Estrada do Sapê, que é a subestação da Light de Rocha Miranda. O primeiro contato do prefeito com os moradores da comunidade, foi no dia 10/12/2009 quando ele veio mostrar o projeto. Botou um telão, fez um show, também estava o presidente da Light, até porque o terreno é dela, e outros presidentes de agremiações. Nesse dia ele não estava preocupado com morador, estava preocupado em mostrar o projeto do Parque, tanto que estava todo mundo nervoso porque não sabia nada. Foi quando ele falou: “Vocês podem dormir tranqüilos, porque ninguém vai sair de Madureira”. Tanto que nesse momento parecia um gol do Flamengo, só que não foi o que começou a acontecer a partir do dia 01/05/10.
Quantos trabalhadores estão empregados nessa horta que beira a comunidade?
Não dá para precisar, essa Horta vem de Cascadura e vai até quase a Pavuna. É categórico que todos os chacreiros são moradores da comunidade, assim como os funcionários. Em cada horta tem umas oito pessoas trabalhando, eles contam por canteiros. Tem lugar que chega a 40 canteiros. Só a área do parque que ele disse que ia usar chega a 2km, e toda essa área é dentro da Horta. Acabaria um lado da horta, na altura da Vila das Torres sai a horta e todas as casas, da Soares Caldeira até Rocha Miranda. Todos os que trabalham na horta dependem dela, eles só sabem fazer isso há mais de 40 anos, se tirar eu não sei o que eles vão fazer não. Tem gente também que tem pensão, eles vivem do que vendem aqui dentro, o foco deles é são os finais de semana com o pessoal que vem do centro de Madureira. Os comerciantes perdem seus clientes, e o camelódromo que foi realocado para a entrada da comunidade é dos moradores daqui.
Todo esse processo de negociação está registrado?
A prefeitura não dá documento a ninguém desde o início. Os documentos que as pessoas recebem não têm nenhum valor registrado nem nada timbrado, eles assinam mais de 50 folhas e saem só com isso [o entrevistado mostrou uma folha, sem nenhum valor da moradia discriminado].
O que vocês estão reivindicando?
Nossa luta era de que não tirasse a comunidade, que respeitasse a lei orgânica 429, para não nos remover. Mas mediante ao que está acontecendo, a gente quer que ele tire respeitando: para próximo ao local, que é o que a lei determina, para um casa igual ou melhor a que a pessoa reside. Essas quase 300 famílias que foram para Realengo, as crianças estão todas sem escola. E ninguém veio aqui discutir, eles colocaram isso como a única opção.
O Conselho Popular e a Defensoria Pública estão auxiliando como?
Estão auxiliando a gente, nos ajudando nas reuniões, apresentando alguns caminhos que a gente não tinha conhecimento. Talvez se tivéssemos em dezembro não teríamos deixado a prefeitura nem ter marcado as casas, mas na minha mente eu achei que a prefeitura jamais agiria da forma que ela está agindo, principalmente usando de coação. Por exemplo, eles entram para quebrar as casas negociadas com a polícia. A pessoa assina um cheque com eles e leva 60 dias para receber, mas quando recebe tem 10 dias para sair. Se o cara não tem o dinheiro, como ele vai comprar a casa? Ele pode até achar a casa, mas não tem o dinheiro, se o cara não desocupa eles vêm com a polícia ameaçando de que vai recolher os móveis para o depósito e o caramba. A gente ainda tem uma situação de que muitas das famílias não foram nem chamadas, é o meu caso, e eles já estão com essa pressão quebrando as outras casas. Às vezes ameaçam que não vão pagar mais, que vai pagar em juízo, que vai pedir uma reintegração de posse.
Disseram que esse parque vai ser para quando?
Não tem nada definido. Porque quando ele chegou em dezembro falou que a obra já tinha começado, só que a defensoria pediu esse projeto e eles não mandaram. O Ministério Público e outros órgãos também pediram e eles não mandaram. Quer dizer, a gente não tem nenhum projeto de parque nem de Via Light. A única coisa que eles estão cumprindo é que Secretaria de Habitação está chamando, e as casas estão sendo destruídas fazendo com que as pessoas sejam convidadas a se retirar.
Algo a destacar?
O que a gente não consegue entender é que eles estão oferecendo 290 unidades e na comunidade tem 833, ele está tirando essas pessoas e dizendo que esse apartamento vale R$ 55 mil. Então eu não entendo por que ele não paga as indenizações nesse valor para quem não pode ou não quer ir para o apartamento. Eu considero que o piso que eles deveriam usar seria o de R$ 55 mil, que é o que eles estão dando no apartamento, se eles estivessem usando esse critério já teria tirado a comunidade toda. Tem casas boas que estão sendo avaliadas em R$ 27 mil, por exemplo, e aqui você não tem tráfico de drogas, as crianças ficavam nas ruas até tarde antes de começarem a demolir as casas, fato que desestabilizou a comunidade. Tornou a comunidade uma área de risco, tem lugar que é muita casa quebrada e o entulho todo largado.
Melhorou com o auxílio da defensoria pública?
A única coisa que mudou é que eles pararam de chamar, mas a pessoa que vai lá eles atendem.

Diário fundado em 13 de maio de 2000