Trabalho informal e o baixo índice de desemprego no Rio

Marcio França, de 19 anos, desde criança fica nos sinais fazendo malabarismo com bolinhas. Foto: Eduardo Sá/Fazendo Media.

Se por um lado as estatísticas governamentais apontam para um recorde no trabalho formal do Rio de Janeiro, por outro lado é visível a quantidade expressiva de trabalhadores informais nas ruas cariocas. Além dos camelôs, que vêm sendo impedidos de trabalhar pelo Choque de Ordem da prefeitura do Rio, centenas de pessoas, sobretudo jovens, ficam nas ruas em busca de alguma forma de ganhar dinheiro para sobreviver. Pessoas entregando papeis nas esquinas da capital fluminense e fazendo malabarismo nos sinais, por exemplo, já são cenas rotineiras.    
Marcio França, de 19 anos, por exemplo, desde criança fica nos sinais fazendo malabarismo com bolinhas.  A única vez que trabalhou foi numa obra, mas quando a construção terminou o dispensaram, quinze dias depois. Estudou só até a quarta série, já que precisava trabalhar para ajudar em casa e sua namorada ficou grávida. Ele diz que chega a ficar 9 horas no sinal, mas isso varia de horário e também de acordo com o clima de cada dia. Tem três filhos pequenos, e enquanto ele tenta arrumar uma grana no sinal sua mulher fica na porta do supermercado pedindo um trocado e cuidando das crianças. Eles moram em Belford Roxo, na baixada fluminense, e vêm para a zona sul, na praia de Botafogo, pois é onde “tem mais dinheiro”. Consegue tirar até R$ 40,00 num dia, mas só de passagem gasta quase a metade. Faz malabaris com quatro bolas, em cima de um caixote, enquanto o sinal de trânsito não abre.
“Gostaria de arrumar um serviço melhor, eu trabalho em qualquer coisa. Só que eu fico só aqui. Tem muita gente que tem preconceito, porque vê nós na rua e acha que a gente vai fazer besteira”, diz.
De acordo com a Secretaria Estadual de Trabalho e Renda, com base na Pesquisa Mensal de Empregos (PME), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), a região metropolitana do Rio de Janeiro atingiu em 2010 a menor taxa de desocupação nos últimos oito anos.  Ainda segundo a pesquisa, em dezembro de 2010, havia 10.373 mil pessoas em idade ativa na região metropolitana do Rio de Janeiro, sendo que 51,1% encontravam-se ocupadas, 2,6% desocupadas e 46,3% não economicamente ativas. O rendimento médio real da população ocupada foi estimado em R$ 1.638,80.
A secretaria informa ainda que o Rio de Janeiro está próximo do pleno emprego. O recorde histórico, segundo o secretário de Trabalho e Renda, Brizola Neto, é uma prévia de como estará o ambiente de trabalho nos próximos anos.
“O Rio está na vanguarda da geração de emprego e no avanço de investimentos em áreas como Indústria e Petróleo e Gás. Esse ambiente favorece a aproximação do pleno emprego, que precisa atingir 4%. Estamos muito perto dessa meta. Isso é histórico. A taxa de pleno emprego fluminense é menor que as taxas dos Estados Unidos e da Europa”, afirmou.
Em entrevista coletiva na última terça-feira (15) o ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, afirmou que em fevereiro foram criados 280.799 novos empregos com carteira assinada no Brasil. Todas as cinco regiões brasileiras tiveram um saldo recorde em fevereiro, afirmou o ministro.
Francisco Neto, de 32 anos, trabalha há 3 anos como “panfleteiro”, arrumou esse emprego quando estava desempregado. Já trabalhou em farmácias e supermercados. Atualmente distribui cerca de 3 mil papeis entre 10h e 19h diariamente, no centro do Rio de Janeiro, para duas empresas de empréstimos de dinheiro. Ele recebe uma diária, que lhe rende ao final do mês cerca de R$ 560,00, sem nenhum direito. Dezenas de pessoas igual a ele ficam nas ruas da cidade entregando papeis que, ironicamente, “oferecem” dinheiro.
“Eu sustento as minhas três filhas com esse dinheirinho que cai, não só eu como todos meus amigos daqui. Está muito difícil de a gente achar emprego por causa da forma que a gente trabalha, e tem muita gente trabalhando com isso hoje aqui no centro do Rio”, destaca.
Redução da jornada de trabalho
A proposta de Emenda Constitucional (PEC) 231/95 pela redução da jornada de trabalho sem redução de salário, de autoria do deputado Inácio Arruda (PCdoB/PE), foi aprovada em uma comissão especial do Congresso mas continua travada na Câmara. Além da jornada, o projeto prevê o aumento da hora extra. O ex presidente Luiz Inácio Lula da Silva se posicionou a favor da proposta em 2010. O Ministério do Trabalho informou, por meio de sua assessoria, que o ministro também se posicionou favoralvelmente no ano passado, mas não tem nenhum informe atualizado sobre o tema. Em pesquisa do portal G1, 229 dos novos deputados opinaram a favor da redução contra 116.
Reivindicação histórica dos sindicatos, a redução da jornada só aconteceu duas vezes no Brasil: em 1943, quando Getúlio Vargas regulamentou as 48 horas semanais, e em 1988 quando reduziu para 44 horas de trabalho, de segunda-feira até sábado. Desde então as empresas só têm lucrado.
De acordo com Marcello Azevedo, secretário de relações trabalhistas da Central Única dos Trabalhadores (CUT/RJ), a redução da jornada de trabalho é a principal bandeira dos sindicatos mas essa pauta está muito difícil de tramitar no congresso por causa da bancada conservadora junto aos empresários. Segundo ele, o que falta é vontade política da base do governo e mobilização social para essa lei passar, já que há espaço econômico e necessidade histórica.
“A CUT vê como fundamental, porque a produtividade das empresas está batendo recorde. Hoje reduzir a jornada de trabalho de 44 horas para 40 horas não chegaria a 2% do faturamento das empresas, coisa que eles tranquilamente poderiam absorver. Com isso, seriam gerados imediatamente 2 milhões de empregos no país”, afirma Azevedo.
Azevedo reconhece o avanço na geração de milhões de empregos formais nos últimos anos, mas acha que mesmo com o número expressivo podia ter ocorrido muito mais se o governo e os empresários tivessem maior consciência social. Ele observou que vários setores da economia, como os comerciários de shoppings e o ramo dos laticínios, chegam a prestar 60 horas semanais na jornada de trabalho e vários ramos do trabalho informal, como os camelôs, não têm qualquer tipo de garantia ou direito.
Salário mínimo
O salário mínimo foi aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado em meados de fevereiro, depois de várias semanas de disputas políticas e reivindicações de diferentes setores. O valor passou para R$ 545,00, ou seja, R$ 35,00 a mais que o salário anterior, depois da sanção da presidente Dilma Roussef. A aprovação só ocorreu após a rejeição de duas emendas que previam reajustar o salário mínimo para R$ 560 (do DEM) e R$ 600 (do PSDB). As centrais sindicais defenderam o valor de R$ 580,00.
Com base na determinação constitucional que estabelece que o salário mínimo (desde sua criação nos anos 1940 com Getúlio Vargas) deveria suprir as despesas de um trabalhador e sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência, o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) estima mensalmente o valor do Salário Mínimo Necessário. Em fevereiro, seu valor deveria ser de R$ 2.194,18, o que corresponde a 4,06 vezes o mínimo então em vigor, de R$ 510,00.
Ainda com essa diferença, a avaliação do Dieese é de que tem ocorrido avanços na política salarial brasileira nos últimos anos. De acordo com o supervisor do Dieese no Rio de Janeiro, Cloviomar Cararine, cerca de 47 milhões de pessoas têm entre os seus rendimentos o salário mínimo como referência. Neste sentido, quando o salário mínimo é reajustado em um percentual acima da inflação, torna-se um avanço, pois atinge a maior parte da população.
 “É importante a atual política de reajustes do salário mínimo acertada entre as Centrais Sindicais e o governo federal. A expectativa é de que o reajuste no ano que vem seja superior a 13%. Se o Brasil continuar crescendo sua economia, em paralelo com o acordo [de 4 anos] de valorização do salário mínimo, sem dúvida os salários dos trabalhadores, principalmente para os com menores salários, vão aumentar”, afirma Cloviomar.
O salário mínimo nacional é calculado com base no índice de inflação – segundo o Índice Nacional de Preços do Consumidor (INPC) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – junto à variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos atrás. Em 2009, o PIB foi negativo em 0,6% e o reajuste do salário mínimo de 6,86%, mas a expectativa é de um aumento significativo em 2011. A Nota Técnica nº 93 do Dieese, divulgada em dezembro de 2010, avalia que o salário previsto de R$ 540,00, acumularia um ganho real desde 2002 de 52,83%.

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