Maria Aparecida Aquino: “Não há razão para comemorar um assassinato”

A primeira reação de grande parte da população americana diante da notícia da morte de Osama bin Laden, o rosto mais famoso do terrorismo internacional, foi sair às ruas para comemorar a derrota de seu inimigo. No entanto, a operação contra o terrorista saudita foi um assassinato sumário e como tal não deveria ser comemorado, de acordo com a análise da historiadora Maria Aparecida de Aquino.
“Há meses vem sendo preparada, junto com o governo do Paquistão, toda uma operação para chegar à casa de Osama bin Laden. A ordem que se tinha era metralhar, a ordem era atirar. Fica difícil pensar em motivo para comemoração”, pondera Aquino, professora em História Social da Universidade de São Paulo (USP).
A pesquisadora também questiona os precedentes abertos pela ação americana. “Isso não significa defender o que aconteceu em 11 de setembro de 2001, que foi um ato terrível e ofendeu a humanidade. Não significa negar o direito da população americana de buscar os culpados.
Mas defender a forma como isso foi feito será dar aos Estados Unidos a possibilidade de amanhã entrar em qualquer uma de nossas casas e dizer: ‘olha, imaginei que aqui houvesse um terrorista e andei metralhando’. É muito grave o que aconteceu”.
Acompanhe a íntegra da entrevista.
UOL Notícias: Os americanos reagiram à notícia da morte de Bin Laden com festa e era possível ver cenas de comemoração e euforia nas ruas. Existe razão para comemorar? Essa euforia é justificável?
Maria Aparecida Aquino: Não. Se a gente admitir que existe razão para comemorações neste momento, então estaríamos admitindo que existe razão para comemorar um assassinato. Uma coisa que normalmente não se comenta é que os Estados Unidos gostam de jogar na cara de todos os outros países que eles são os guardiões da democracia do mundo, e sempre interferem em outros países para assegurar a democracia.
Entretanto, o que eles fizeram nesse caso é simplesmente um assassinato. Se houve um crime e você está atrás de uma pessoa que é teoricamente uma das responsáveis por esse crime, você tem o direito de pegar essa pessoa e submetê-la a um julgamento. Mas o que aconteceu foi simplesmente um assassinato.
O que podemos observar é que toda a euforia inicial nos Estados Unidos já baixou um pouco, porque eles têm um temor muito grande – e devem mesmo; pensar que a Al Qaeda se restringe a um homem só, Osama bin Laden, é uma tolice. A Al Qaeda é uma imensa organização. E é muito possível que haja retaliações. Então, em circunstância alguma teríamos motivos para comemorar, mesmo pertencendo à população americana, mesmo sendo o presidente dos Estados Unidos.
Se pessoas como nós, pessoas comuns, simplesmente coadunássemos com a ideia de comemoração, estaríamos coadunando contra todos os princípios que os próprios Estados Unidos dizem defender com tanta força.
UOL Notícias: Então é possível imaginar que os Estados Unidos poderiam ter feito uma captura sem recorrer a assassinato?
Aquino: Lógico. Eles tinham noção da localização. Planejaram a ação muito cuidadosamente. Chegaram até a casa e uma vez lá não havia condições de reação. Eles simplesmente metralharam quem estava pela frente.
UOL Notícias: Com relação ao corpo, como a senhora interpreta essa decisão dos Estados Unidos jogá-lo ao mar?
Aquino: A notícia de que eles teriam jogado o corpo ao mar é mais grave ainda, porque você não só submete o inimigo a um assassinato, como você também impede o ritual da morte.
Mesmo que não haja uma retaliação imediata, em breve essa ficha acaba caindo, mesmo entre a população, de que nem mesmo o direito à morte foi dado. Um dos maiores pilares da democracia é o habeas corpus, que em uma tradução muito simples do latim quer dizer: que se tenha direito ao corpo. Então foi negado um elemento característico do estado de Direito.
Os americanos têm direito de estar muito zangados com o que aconteceu no 11 de setembro? Sim. Têm direito de investigar quem seriam os responsáveis? Sim. Mas a forma como se faz isso pode acabar por retirar todos os direitos que nos restam.
UOL Notícias: É possível imaginar que os Estados Unidos enxerguem a morte de Bin Laden como a morte do “mal”?
Aquino: É o que eles defendem. No fundo, eles pretendem impor ao mundo inteiro uma ideia: de que estão cobertos de razão, de que a humanidade pode respirar aliviada e de que agora estamos livres do mal, já que o mal estava condensado em uma pessoa. Mas isso é uma ilusão de ótica. É como os mágicos fazem: você olha para o outro lado, não presta atenção na prestidigitação que ele está fazendo com as mãos. Não podemos cair nesta história.
Isso não significa defender o que aconteceu em 11 de setembro de 2001, que foi um ato terrível e ofendeu a humanidade. Não significa negar o direito da população americana de buscar os culpados. Mas defender a forma como isso foi feito será dar aos Estados Unidos a possibilidade de amanhã entrar em qualquer uma de nossas casas e dizer: ‘olha, imaginei que aqui houvesse um terrorista e andei metralhando’. É muito grave o que aconteceu. Ou seja, não há motivo para comemoração.
(*) Entrevista realizada pelo Uol Notícias e reproduzida do Vi o mundo.

3 comentários sobre “Maria Aparecida Aquino: “Não há razão para comemorar um assassinato””

  1. Ao meu ver, Maria Aparecida de Aquino está totalmente equivocada. Como historiadora deveria esperar as verdades dos fatos para se pronunciar.

  2. Esta sra. é muito anti-americana. Seus comentários não podem ser levados a sério.
    Porque ela não comenta os cerca de 500.000 assassinatos ocorridos no Brasil nos últimos 10 anos.
    Conversas fora da realidade do planeta, já chegam as do Lula!

  3. Parabéns,
    A Visão de mundo aqui é outra, e a historiadora está correta em suas poucas palavras.
    1 – Matando Osama não mata o terror;
    2 – A Al Qaeda não depende do Osama, na verdade nunca dependeu, não vai enfraquecer com a perda dele.
    3 – Em um estado Democrático de Direito, todo cidadão (qualquer pessoa) tem direito a um julgamento justo, o que Osama fez foi lamentável e triste porém foi mais um ato de terrotismo igual ao que os USA fazem com outras nações, já imaginou se todos os presidentes americanos tiverem que morrer pelos seus atos…? Quantos morreram no 11 de setembro? e quantos enocentes os americanos mataram após o 11 de setembro tando no afeganistão como no Iraque?
    acordem, os americanos querem que o mundo pensem que o povo do Afeganistão e Iraque não “terroristas”, não somente alguns são, há cidadãos americanos que também são integrantes direto da Al Qaeda, os próprios americanos causam terror em suas guerras sem motivo algum, cadê a punição?

Deixe uma resposta