‘Lista suja’ do governo não reduz trabalho escravo. Impunidade é o entrave

Uma em cada quatro empresas incluídas na “lista suja” do trabalho escravo no País nunca regularizou sua situação junto ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e já é veterana no cadastro federal. Por Luze Azevedo, da Pastoral do Imigrante.

A listagem dos exploradores de mão-de-obra em condições análogas à escravidão foi criada, em 2003, pelo governo federal com o objetivo de expor os infratores e forçá-los a sanar as irregularidades. A um mês da listagem completar quatro anos, pode-se constatar que, para 26% dos fichados – 51 de 192 – , a tática não funcionou. A reportagem é de Silvia Amorim e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, em 21/10/2007.

Desde 2000, 23.318 vítimas de trabalho escravo foram libertadas no País – em média, 3 mil por ano, segundo o MTE. O número é muito pequeno perto das estimativas de organizações não-governamentais que atuam nesta área. Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), 25 mil pessoas, no mínimo, são exploradas a cada ano. A fiscalização é considerada insuficiente. De cerca de 300 denúncias anuais, diz a CPT, apenas metade é averiguada.

O combate à exploração desse tipo de mão-de-obra voltou à pauta de discussões no mês passado, quando um grupo de senadores contestou a libertação de 1.064 trabalhadores numa fazenda no Pará. A ação, promovida pelo Grupo Móvel Especial de Fiscalização do Trabalho Escravo do MTE, foi a maior da história. A polêmica levou à interrupção das blitze, que, após 22 dias paralisadas, foram retomadas na segunda-feira passada.

São considerados veteranos da “lista suja” pessoas jurídicas ou físicas que, autuadas, entraram para o cadastro durante o seu primeiro ano de vigência e nunca mais saíram, apesar de todas as penalidades.

Quem aparece na relação fica impedido de obter benefício fiscal do governo federal e de contrair empréstimos subsidiados pela União em bancos. O próprio mercado pune os infratores. Cerca de 300 empresas, em parceria com o ministério, não contratam serviços de quem esteja no cadastro.

O principal motivo de permanência na “lista suja” é o não-pagamento de multas, explica o coordenador do Grupo Móvel, Marcelo Campos. Reincidência na infração ou falta de regularização das falhas também impede a saída do cadastro.

O ministério não soube informar em qual situação se enquadram os infratores veteranos. “Para sabermos o porquê de eles nunca terem saído do cadastro, teríamos que ver processo por processo, mas o mais comum são os débitos financeiros”, disse Campos. A pasta também não sabe o valor da dívida dos autuados. “Todas as multas trabalhistas entram num sistema único.”

“Eles estão radicalizando. Querem transformar irregularidades trabalhistas comuns em trabalho escravo”, reage o presidente da União Democrática Ruralista, Luiz Antônio Nabhan Garcia.

As autuações custam caro. A falta de registro na carteira de trabalho, comum nesses casos, resulta em multa de R$ 400 por funcionário. Para cada ilegalidade é lavrada uma autuação, como manter funcionários em alojamentos inadequados.

Só obtém alforria da lista aquele que, após dois anos de acompanhamento do governo, não reincidiu na infração, regularizou problemas e quitou multas e débitos trabalhistas e previdenciários.

O não-cumprimento das exigências tem feito a lista crescer a cada atualização semestral. Isso porque mais gente entra para o cadastro do que sai dele. Na última relação, divulgada em julho, 51 empregadores novos foram incluídos e só 22, excluídos.

Campos admite que o índice de 26% de infratores veteranos é preocupante. “O cadastro, para nós, é meramente informativo. Prefiro atribuir isso ao desconhecimento do empregador da sua inclusão na lista. A maioria só regulariza quando procura um financiamento e é informado de que está impedido de fazê-lo.”

Para o coordenador da campanha nacional de combate ao trabalho escravo da CPT, frei Xavier Plassat, a impunidade é o maior entrave. “Só metade das denúncias é fiscalizada. O Código Penal prevê prisão, mas nunca ninguém foi preso.”

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