István Mészaros: entrevista a Roda Viva (12/06/2002)

Entrevistadores: Heródoto Barbeiro, Eder Sader, Carlos Nelson Coutinho. Trechos da Entrevista selecionados por Alder (são 9 blocos de cerca de 10 minutos, cada)

BLOCO 1:

Heródoto Barbeiro: Ele fez o que uns filósofos já pensaram, algum dia, em fazer: retomar a obra de Karl Marx, reescrever o Capital, levando em conta o que acontece no mundo atual. O filósofo de quem nós estamos falando, é tido como um dos mais originais pensadores marxistas da atualidade. Crítico severo do Capitalismo, ele defende a idéia de que é possível construir uma sociedade pós-capitalista. Livre das maldades do Capital e também do Capitalismo. No centro do debate de Roda Viva deste noite, o filósofo István Mészáros, professor emérito da Universidade de Sussex, da Inglaterra, formado em Filosofia, em Budapest, em 1954. István trabalhou com o renomado filósofo húngaro Giorgy Lukács. Depois, deu aulas em universidades da Itália, Escócia, Canadá e na Inglaterra. O Prof. István Mészáros já escreveu vários livros, traduzidos em vários países. Nos últimos anos, concentrou seus estudos e análises do mundo globalizado e nos mecanismos de funcionamento do Capitalismo. Este trabalho resultou no livro de 1.200 páginas que ele acaba de publicar no Brasil, cujo título é Para além do Capital. (…) E para entrevistar o filósofo István Mészáros, nós convidamos o sociólogo Emir Sader, professor-doutor e coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da UERJ; Prof. Ricardo Antunes, professor titular de Sociologia da UNICAMP; o ensaísta Carlos Nelson Coutinho, graduado em Filosofia e titular de Filosofia Política da UFRJ; o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da UNICAMP e editor da Revista Carta Capital; a professora de Sociologia Maria Orlanda Pinassi, da UNESP, e o jornalista Haroldo Ceravolo Sereza, do Jornal O Estado de São Paulo.

Prof. István, este ano vai haver eleições no Brasil. E três ou quatro partidos que vão concorrer às eleições, se reclamam de socialistas. Gostaria de saber 1) o que é Socialismo? 2) Que programa um partido socialista deve ter, para ser considerado tal?

István Mészáros: São questões difíceis. Em parte, depende da situação, das circunstâncias. Em tese, ´posso dizer que os partidos socialistas seguem a perspectiva de uma transformação radical, porque muitas coisas devem mudar. Nossa sociedade deve mudar de ponta a cabeça, razão por que os partidos que pretendam ter êxito nisso precisam ter programas radicais de longo alcance, e, ao mesmo tempo, operar em situações históricas particulares. Precisam atender aos seus militantes, aos seus eleitores. Precisam, assim, encontrar alguma forma de dar, no presente, passos em direção ao futuro. (…)

Emir Sader: Uma distinção essencial em sua obra é aquela entre Capital e Capitalismo. Limites diferenciados entre um e outro, Em sua visão, os chamados Estados socialistas que desapareceram recentemente, teriam rompido com o Capitalismo, mas não com o Capital. Eu queria saber o que o Sr. considera importante para se romper com o que o Sr. chama de matabolismo do Capital? E particularmente, no caso da URSS, de que modo ela induziu, em sua visão, esse metabolismo: desde o começo, quando Lênin definiu o Socialismo como a industrialização + Soviets? Ou quando definiu a NEP? Ou quando Stálin definiu a industrialização forçada? Ou se desde o começo, por ser um país periférico que estava condenado ao metabolismo do Capital?

Bloco 2 (cont.)

István Mészáros:
O grande problema da URSS foi o atraso de sua economia, o atraso da sociedade, em geral. Na verdade, quando o processo começou, Lênin e os bolchevistas esperam que a Revolução Russa fosse seguida por outras revoluções. O grande atraso da sociedade pudesse ser corrigida pela revolução nessas mesmas sociedades- Alemanha, Inglaterra e outras que avançaram muito mais na indústria e na agricultura. Essa foi uma das tragédia da situação histórica. Os líderes da Revolução Russa acreditaram em algo sobre que não tinham qualquer controle, porque se a revolução nos outros países não acontecesse, como de fato não aconteceu, o que poderia acontecer? E a resposta de Lênin era uma resposta quase pessimista. Ele disse: “Não podemos devolver o poder ao czar. Temos que prosseguir, como for possível.” É uma operação de manutenção, como costumamos dizer. Uma operação de manutenção até que a situação se torne mais favorável. A posição foi a que, mais tarde, seria a posição de Stálin, que era a de construir o socialismo num so país. É uma idéia fadada ao fracasso. Não é possível construir o socialismo num mundo tão extenso, com base numa economia extremamente atrasada. Para Stálin, essa operação de manutenção, sugerida por Lênin, em termos estritamente temporais, como um modelo, foi terrível, porque causou conseqüências em outras direções, para outros partidos, para todos aqueles partidos que tentaram seguir a linha de Stálin. (…) Uma coisa é o desenvolvimento econômico numa base extremamente primitiva, admitindo-se que há uma bases mais avançadas. Mas, se você sustenta que esse é o modelo para a transformação socialista, isto só vai causar grandes problemas. Ao considerar tais problemas, acho que eles devem ser reexaminados historicamente. Infelizmente, a tendência dos partidos, no contexto em que operam, é ignorar a situação histórica e idealizar a si mesmos. Isto vale, não apenas para o partido de Stálin, mas para muitos partidos de todo o mundo, inclusive alguns que existem ainda hoje. (…)

Heródoto Barbeiro: Após a queda da URSS, a imprensa brasileira sempre diz que o Socialismo ou o Comunismo acabaram com a queda do Muro de Berlin. É fato mesmo que o Comunismo acabou? (…)

István Mészáros: Depende do que você quer dizer com Comunismo. Em primeiro lugar, Marx definia o Comunismo o estágio mais elevado do Socialismo. Mais uma vez, enfatizo que historicamente não é possível saltar para esse nível. É preciso resolver enormes problemas fundamentais da sociedade. Vem de novo a questão da transição: como passar de um tipo de sociedade para outro. Isto só pode ser resolvido sob condições objetivas e também subjetivas. Porque não basta produzir bens materiais. Também é preciso transformar as pessoas. (…)

Bloco 3:

(…)
István Mészáros: (…) O Capitalismo, no período em que Marx viveu, tinha elementos competamente diferentes. Não é possível comparar com o Capitalismo de hoje. Em relação às profundas crises vividas pelo Capitalismo depois de Marx, sobretudo com duas terríveis guerras mundiais, “Marx nunca viu nada parecido.” “Eu diria que as mudanças históricas que aconteceram, mudaram muita coisa para nós.

Bloco 4:
(…)
Ricardo Antunes: faz duas perguntas: 1) que fato(s) mais impactantes caracterizam o início do séc. XXI (se as mobilizações de Seatle, o Fórum Social Mundial, o 11 de Setembro e outros); e 2) qual o papel do Estado, na atualidade.

István Mészáros:
Sobre o papel do Estado, entende que é imenso, contrastando com a retórica neoliberal do “Estado mínimo”, só vem crescendo o papel do Estado na garantia de políticas econômicas e da corrida militarista. Tanto no que diz respeito à lógica do Capitalismo quanto à lógica do Capitalismo,“o Estado está envolvido de todas as formas possíveis, dando garantias políticas e militares, por um lado, e, por outro, concedendo fundos astronômicos para as iniciativas capitalistas.”

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