Doença de Chagas: abandonada e com poucas opções de tratamento

Com informações do DNDi

Cem anos após a descoberta da doença de Chagas, lembrados em julho de 2009, 100 milhões de pessoas permanecem sob risco de contrair a doença, que continua a debilitar e matar populações extremamente empobrecidas. A iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi) e Médicos Sem Fronteiras (MSF) apelam a governos, comunidade científica, iniciativa privada e sociedade civil por maior investimento em pesquisa e desenvolvimento de melhores medicamentos e por maior acesso a tratamentos.

A campanha global “Acorde Agora. É Hora de Tratar a Doença de Chagas!” foi lançada durante a conferência cientifica internacional pelo 100º aniversário da descoberta da doença de Chagas, organizada pela Fiocruz em julho e que reúne especialistas em Chagas de todo o mundo. Ao mesmo tempo que é publicada uma série de artigos no PloS Neglected Tropical Diseases a respeito da agenda de saúde incompleta para a doença de Chagas.

Colônia de barbeiros da coleção viva de triatomíneos cultivada no laboratório do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), fonte de referência para consultas de pesquisadores brasileiros e estrangeiros. Foto: Gutemberg Brito (IOC/Fiocruz)
Colônia de barbeiros da coleção viva de triatomíneos cultivada no laboratório do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), fonte de referência para consultas de pesquisadores brasileiros e estrangeiros. Foto: Gutemberg Brito (IOC/Fiocruz)

“Nós esperamos que esta campanha traga luz à doença de Chagas e ajude os pacientes desta doença a obterem acesso a melhores opções de tratamento”, comentou Michel Lotrowska, diretor regional da DNDi na América Latina. “Existe atualmente pouco compromisso político ou público para a doença de Chagas, uma vez que ela afeta as populações mais vulneráveis nas regiões mais pobres dos países latino-americanos. Só um esforço global envolvendo os setores público, privado, científico e humanitário poderá garantir à doença de Chagas um espaço de destaque nas agendas nacionais e internacionais”.

Apenas alguns pacientes que necessitam de medicamento para a doença de Chagas chegam a receber tratamento. Quando o recebem, existem apenas dois medicamentos disponíveis – benznidazol e nifurtimox, ambos com uma série de desvantagens: tratamento longo (30 a 60 dias), efeitos colaterais e altas taxas de não adesão dos pacientes. A eficácia é limitada no estágio avançado da doença e não há formulações pediátricas atualmente disponíveis.

“Este encontro internacional mostra que há interesse renovado de médicos e cientistas para encontrar novos e melhores tratamentos na luta contra Chagas, mas nós também precisamos de financiamento sustentável e compromisso político para alcançar estes objetivos”, comentou Carlos Morel, diretor do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS) da Fiocruz. “Precisamos unir as capacidades crescentes dos países em desenvolvimento para combinar inovação em saúde com os avanços científicos que estão sendo realizados em pesquisa e desenvolvimento nos institutos de ponta ao redor do mundo”.

Como registrado nos artigos da PloS, a doença de Chagas permanece hoje no topo da lista das doenças extremamente negligenciadas, apesar dos esforços regionais de pesquisa e de um melhor controle da doença. Dos 1556 medicamentos descobertos desde 1975, apenas 21 foram para doenças consideradas negligenciadas. Nenhum deles, no entanto, foi destinado ao tratamento da doença de Chagas, que recebeu apenas 0,25% (aproximadamente US$10 milhões) dos 2,5 bilhões de dólares investidos em doenças negligenciadas em 2007.

A campanha de Chagas lançada pela DNDi (www.tratechagas.org) tem como objetivo conscientizar sobre o impacto da doença de Chagas e apelar por inovações para esta doença silenciosa, por meio de apoio a parcerias inovadoras em P&D e de mecanismos de financiamento novos e sustentáveis.

“Os pacientes de Chagas foram abandonados porque são pobres e vivem em áreas rurais e remotas, mas vemos que existe conhecimento científico para desenvolver melhores tratamentos”, disse Bernard Pécoul, diretor executivo da DNDi. “O primeiro passo para se progredir em nível internacional é através de financiamento sustentável e forte apoio público tanto nos países endêmicos quanto nos não endêmicos. A proposta de resolução em doenças negligenciadas, que está sendo considerada pela OPAS/OMS este ano, é um exemplo de como estamos avançando e que devemos dar seguimento por meio de ações concretas”.

Doença de Chagas não representa “mercado consumir atraente” para indústria privada

Chagas é transmitida principalmente por insetos conhecidos como barbeiros. Ela é endêmica em 21 países da América Latina. Com uma média de 14.000 mortes por ano, Chagas mata mais pessoas na região do que qualquer outra doença parasitária, incluindo a malária. As vítimas são principalmente pessoas pobres que habitam áreas rurais ou que migraram para as periferias dos grandes centros urbanos e, portanto, não representam um mercado consumidor atraente para a indústria privada.

Sem diagnóstico e tratamento adequados, um em cada quatro pacientes de Chagas desenvolve algum sintoma fatal da doença, normalmente inchaço do músculo cardíaco. Frequentemente, os pacientes necessitam de marcapasso e, em alguns casos, até mesmo de transplante cardíaco. Muitos pacientes, no entanto, morrem subitamente, alguns sem sequer saber que estavam infectados.

As crianças que nascem de mães cientes de que estão infectadadas pelo parasita Trypanosoma cruzi são as que mais podem se beneficiar do tratamento com um alto índice de cura. Mesmo assim, não existem tratamentos pediátricos disponíveis e adaptados às suas necessidades. As crianças são tratadas com medicamento para adultos, que são quebrados em até 12 pedaços, dependendo do peso corporal da criança.

Como o medicamento é insolúvel, as mães precisam triturá-lo e dissolvê-lo em líquido. Este procedimento não apenas coloca em risco a continuidade do tratamento, como também sua eficácia e segurança, já que torna difícil assegurar a dosagem correta. Este problema está começando a ser resolvido com a produção do benznidazol pediátrico, que virá em comprimidos de fácil dissolução, e que estará disponível em 2010 graças a uma parceria entre a DNDi e o LAFEPE (Laboratório Farmacêutico do Estado de Pernambuco), o único produtor de benznidazol do mundo.

DNDi: esforços em todo o mundo

A iniciativa de Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi) é uma parceria de pesquisa e desenvolvimento de medicamentos sem fins lucrativos fundada em 2003 por cinco instituições do setor público – a Fundação Oswaldo Cruz do Brasil, o Conselho Indiano de Pesquisa Médica da Índia, o Instituto de Pesquisa Médica do Quênia, o Ministério da Saúde da Malásia e o Instituto Pasteur da França; uma organização humanitária – Médicos sem Fronteiras (MSF); e uma organização internacional de pesquisa – o Programa Especial para Pesquisa e Treinamento em Doenças Tropicais (TDR), do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Banco Mundial e Organização Mundial da Saúde (OMS), que atua como observador permanente da organização.

A DNDi criou o maior portfólio de P&D de toda a história para as doenças parasitárias e, junto aos seus parceiros, já disponibilizou três novos medicamentos para essas doenças negligenciadas. Para mais informações, visite www.dndi.org.br

Em julho, a DNDi publicou um artigo na PloS NTD sobre as urgentes necessidades para novos tratamentos para a doença de Chagas, examinando as barreiras para o desenvolvimento e avaliação de novos medicamentos, e reportando o progresso na disponibilização de novos tratamentos aos pacientes.

Em suas atividades de curto prazo, a DNDi está trabalhando sobre uma melhor utilização de medicamentos existentes através de mudança de indicação terapêutica, novas formulações (incluindo a primeira formulação pediátrica do benznidazol) e terapias de combinação baseadas no sucesso de tais tratamentos em HIV/Aids, malária e tuberculose.

Os objetivos de longo prazo da DNDi são entregar um novo tratamento eficaz, não tóxico e de baixo custo com eficácia comprovada tanto para a fase aguda quanto a fase crônica indeterminada, e melhorar a capacidade de pesquisa e tratamento em doença de Chagas.

Referências

Especial do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) sobre o Centenário da Descoberta de Doença de Chagas, clique aqui.

Franco-Paredes C, Bottazzi ME, Hotez PJ. The unfinished public health agenda of chagas disease in the era of globalization. PLoS Negl Trop Dis. 2009;3(7):e470.

Ribeiro CH, Lopez NC, Ramirez GA, et al. Trypanosoma cruzi calreticulin: A possible role in Chagas’ disease autoimmunity. Mol Immunol. Mar 2009;46(6):1092-1099.

Yun O, Lima MA, Ellman T, et al. Feasibility, drug safety, and effectiveness of etiological treatment programs for chagas disease in Honduras, Guatemala, and Bolivia: 10-year experience of medecins sans frontieres. PLoS Negl Trop Dis. 2009;3(7):e488.

Moran M, Guzman J, Ropars AL, et al. Neglected Disease Research and Development: How Much Are We Really Spending? PLoS Med. Feb 3 2009;6(2):e30.

Moncayo A, Ortiz Yanine MI. An update on Chagas disease (human American trypanosomiasis). Ann Trop Med Parasitol. Dec 2006;100(8):663-677.

Para mais informações, www.dndi.org.br e www.dndi.org

3 comentários sobre “Doença de Chagas: abandonada e com poucas opções de tratamento”

  1. que coisa mais chata! e o decimo site que eu entro e nao consigo achar um tratamento mais curto para mim escrever no meu trabalho. a e esse site é uma porra.

  2. Resposta para Hele acima
    Não esquenta nenem, vou falar para o triatomineo e para o Trypanosoma cruzi que peguem leve para se adequar as suas necessidades, afinal deve se frustante quando seu mundo nao é cor-de-rosa!

    PS: Mamãe vai lavar a boquinha com sabão, aiaiai
    É feio!

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