Cúpula da cúpula versus cúpula dos povos

O presidente Vicente Fox está perdidinho. Defendeu na sexta (4/11), durante a 4ª Cúpula das Américas em Mar del Plata, a Área de “Livre Comércio” (ALCA) sem a presença do MERCOSUL, que se opõe parcialmente ao projeto, e da Venezuela. No dia seguinte, deu coletiva de imprensa elogiando o Mercosul. “O Mercosul é um bom exemplo de comércio. Se não fosse um sucesso, não estaríamos batendo na porta para entrar”. Uma vez no bloco, entraria em profunda contradição com a barbeiragem econômica que seu país realizou ao se tornar quintal dos Estados Unidos, com a entrada na “NAFTA” em 1994.

O caso, segunda a Agência Brasil, é meio freudiano. Vicente Fox afirmou que tem um “caso de amor” tanto com o Mercosul como com a Alca. “Meu amor é amplo e total pelos dois acordos de livre comércio. Se não existir o ‘sim’ (do Mercosul) à minha proposta de casamento, continuarei fazendo amor com o Mercosul e com a Alca”.

Verissimo escreveu certa vez, citando Groucho Marx: “Groucho como general, cercado por generais, diante de um mapa de campanha: ‘Uma criança de 3 anos entenderia isto.’ E depois de uma pausa: ‘Chamem uma criança de 3 anos, rápido’.” Ele argumenta que uma criança de 3 anos teria dito ao Bush que a invasão do Iraque daria nesse atoladouro, assim como é fácil notar que abrir o mercado de um país com indústria fraca à maior potência do mundo sem contrapartidas significativas que agreguem valor resultaria em um desastre sem precedentes, não só com aumento da pobreza mas também com aumenta da desigualdade social.

Jornalismo sem conteúdo
O tom do JORNAL NACIONAL, principal jornal da TV Globo, na edição do sábado (5/11) era o de que “não havia acordo”, “não foi divulgado documento”, “eles não se entenderam” e por aí vai. Faltou colocar a crítica objetiva ao livre comércio, muito presente no encontro. Como sugestões de fontes, podemos citar muitos economistas independentes brasileiros, como Márcio Pochmann e Paulo Nogueira Batista Jr., o presidente da Venezuela Hugo Chávez ou até mesmo o presidente da Argentina, Nestor Kichner. Ao final da edição, quando o documento havia saído, destacou que havia dois parágrafos divergentes, um com o posicionamento dos países do Mercosul e da Venezuela (que é membro associado juntamente com Bolívia, Chile, Equador, Colômbia e Peru) e outro com a posição de outros 26 países.

A imprensa costuma fazer manchetes como a do Globo Online de hoje (5/11): “Cúpula das Américas não consegue acordo sobre a Alca”. A insistência no tema da Alca ignora o fato de que ela está morta, é inviável tal como foi proposta e, se houver mudanças significativas, os países do Norte não vão aceitá-la. Sua repercussão na mídia só é possível porque estes são os objetivos dos países ricos, que constantemente pautam a grande imprensa.

Estereótipos para ludibriar
As imagens dos protestos, tanto na Argentina quanto em São Paulo, são sempre com foco na violência – cujos culpados seriam os manifestantes. A polícia, mais uma vez, apenas “reagiu” às “pedras” jogadas pelos manifestantes. É uma forma de dizer que quem reclama nas ruas não tem argumentos. É algo que pega: homens de ternos, mesmo que menos capazes que crianças de 3 anos, são sérios, enquanto pessoas nas ruas que gritam por independência sabendo do que falam não.

2 comentários em “Cúpula da cúpula versus cúpula dos povos”

  1. Brilhante texto Gustavo Barreto!

    As evidências nem sempre são “levadas a sério” pelos homens de negócios. Afinal, eles estão mais preocupados com os lucros que podem obter do que nas conseqüências de suas ações. Os estereótipos cumprem a função ideológica da camuflagem.

    Raquel Moraes

  2. Brilhante texto Gustavo Barreto!

    As evidências nem sempre são “levadas a sério” pelos homens de negócios. Afinal, eles estão mais preocupados com os lucros que podem obter do que nas conseqüências de suas ações. Os estereótipos cumprem a função ideológica da camuflagem.

    Raquel Moraes

Deixe uma respostaCancelar resposta