As políticas do audiovisual e o Conselho de Comunicação

André Setaro e Edgar Navarro já travaram quente discussão sobre os mecanismos de sustentabilidade do audiovisual local na Bahia

O audiovisual representa bem as tênues relações entre a comunicação e cultura, ao ponto de dificultar uma diferenciação entre as duas áreas na organização da produção e também nos mecanismos regulatórios.
No nível nacional há um esforço crescente, desde formulação da abortada Ancinav, em alinhar as ações do audiovisual entre os dois setores. A recente aprovação da nova Lei dos serviços de TV por assinatura dá noção desse momento e seus futuros impactos nos modelos de negócios, fomento e difusão do conteúdo nacional.
A nível estadual também existem pressões para atualizar a arquitetura institucional e forma de intervenção do Estado no audiovisual. Dessa forma a transferência do Irdeb para a Secom é um símbolo inicial dessas mudanças.
A questão é que as mudanças por si só não podem serem consideradas positivas, é necessário que a natureza dessas mudanças seja a caminho de princípios democráticos como participação, transparência e isonomia, além de modelo de desenvolvimento que estimule a diversidade e pluralidade.
A regulamentação do Conselho Estadual carrega potencial ímpar para responder estes anseios. Fruto de reivindicação social que se reverberou por todo país após a I Conferência Nacional de Comunicação, o Conselho coloca na arena atores até então distantes das decisões governamentais, aptos a serem consultados e deliberarem de forma institucional no direcionamento das políticas. Dessa forma, serão diminuídas as possibilidades do Irdeb passar por alterações importantes sem a devida participação social, como se fez a transferência para a Secom e a recente aprovação de novo estatuto.
O fato é que o Irdeb precisa inicialmente de estabilidade e autonomia para se afinar com princípios públicos, através de Conselho Curador nos moldes da EBC, um fundo de financiamento perene, estímulo a produção independente, comunitária e regional, e valorização do quadro funcional. A partir disto será possível preparar a comunicação pública para era digital, tendo principalmente reconhecimento da sociedade para novos investimentos. Pois são visíveis as limitações impostas pela radiodifusão comercial a modelos estéticos e produtivos não alinhados ou subjugados.
Os potenciais do Conselho para o audiovisual não se limitam ao Irdeb. As verbas publicitárias da Secom superam os R$ 200 milhões anuais e podem passar por ampla transformação. O primeiro ponto é retirar das (poucas) agências publicitárias o papel de agenciador do dinheiro público, e dessa forma ter transparência para quando e onde são destinados. O segundo é fazer com que a destinação dos recursos se pulverize, não apenas as mídias e veículos, mas também aos produtores deste conteúdo, levando em consideração não somente audiências ou acumulação de portfólio. O terceiro é o caráter do conteúdo, deixando de ser exclusivamente para propaganda com fins meramente persuasivos, e ser alçado ao fomento do audiovisual, por exemplo.
A concretização destas propostas dependerá muito de como o Conselho irá se comportar e também as pressões externas sob ele. Existem entidades, universidade e até representantes governamentais sensíveis a revisão da atual política. Por outro lado, os produtores do audiovisual que compreenderam o potencial do Conselho, e se habilitaram a participação do pleito que escolheu os membros, são afinados com o atual modelo de investimento do governo do estado, e almejam ir além, ao lado de outros empresários, construir mecanismos de fortalecimento do mercado regional, sob a mesma lógica de concentração nacional.
Enfim, estamos numa das esquinas da história para a comunicação e cultura na Bahia e no Brasil. Aqueles que compreendem o processo terão condições de influenciar decisões, sob condições democráticas mais avançadas. Já os que sofrem de “miopia” e “astigmatismo” ficarão para trás.
(*) Texto reproduzido do Vozes  Baianas.

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