Agroecologia e feminismo em debate no I Encontro Nacional das mulheres camponesas

Brasília (DF) – Na manhã de ontem (20) ocorreu, no I Encontro Nacional do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), em Brasília, um debate sobre alimentação saudável e feminismo. Nenhuma luta revolucionária foi feita sem a mulher, mesmo que a história depois oculte, destacou Nalu Faria, representante da Marcha Mundial das Mulheres. À medida que se faz esse resgate, o feminismo se mostra presente, complementou.
“A gente vê o feminismo, a crítica ao patriarcado, que está articulado com outras discriminações como o racismo, de uma sociedade que se organiza com domínio dos homens sobre as mulheres. O movimento se inicia no século XIX, e uma de suas marcas é colocar peso na igualdade. Uma história de luta que passa por todos os temas”, destacou.
Para ela, o sistema proporciona privilégios aos homens, que não se manifestam somente em espaços públicos. Nesse sentido, na sua opinião, é preciso rediscutir a divisão do trabalho e a sociedade. Exercer o direito à sexualidade sem o dever de ser mãe é uma das reivindicações feministas. “Trabalhar outra ideia de sociedade, transformar o cotidiano, os homens têm uma grande dívida social”, concluiu.
O patriarcado se estrutura com base em quatro elementos, explicou Silvia Camurça, da Articulação de Mulheres Brasileira: controle do corpo, principalmente em relação à reprodução e sexualidade, explorada pelo capitalismo; impossibilidade da paridade política; divisão do trabalho e violência. Segundo Silvia, a luta patriarcal é a primeira que une as mulheres.
“Não há nada mais radical do que a mulher se organizar contra aquilo que a oprime, que diz que não temos valor. É preciso também discutir o agronegócio, porque ele modernizou o latifúndio. Estamos melhorando graças aos governos de esquerda na região, mas a coalizão com a direita em alguns deles traz o agronegócio por dentro, como no Brasil. Há contradições, críticas e alianças, mas não vamos deixar nos abater. Ainda assim estamos conseguindo oportunidades e espaços”, afirmou Camurça.
A presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Maria Emília Pacheco, anunciou a participação do MMC no órgão vinculado à presidência da república. Ela contextualizou a produção de comida atual no Brasil, alertando para a gravidade da extinção e perda da diversidade de alguns alimentos.
“Falar de alimentação saudável, sem agrotóxicos e transgênicos, é preciso estar atento também para o aumento de produtos industrializados. Não sabemos o que estamos consumindo nos supermercados, alimentos super processados. Outro fenômeno importante é a concentração de alimentos em regiões, como o arroz no Rio Grande do Sul, o que representa um risco à soberania alimentar. Estamos importando feijão da China, enquanto os movimentos agroecológicos mostram que é possível cultivá-lo”, alertou.
Pacheco lembrou ainda que as 3 mil mulheres presentes no encontro não representam somente seus estados, mas também biomas e identidades próprias: extrativistas, ribeirinhas, quebradeiras, camponesas, indígenas, quilombolas, etc. Isso, na sua visão, compõe a riqueza da nossa sócio biodiversidade. Há, no entanto, um processo contínuo de ameaça a esses bens porque o Brasil se baseia num modelo de economia de exportação, como a soja. Precisamos, completou a antropóloga, trabalhar nossa identidade e soberania alimentar através da diversidade.
A LUTA AGROECOLÓGICA
Em paralelo a esse processo hegemônico de produção no campo, Maria Emília contou a trajetória de resistência do movimento agroecológico, representado principalmente na Articulação Nacional de Agroecologia (ANA). Um crescimento em todo país que tem paralelo com a perspectiva feminista, é uma ciência com um conjunto de práticas e agrega diversos movimentos, descreveu. Ela explicou que, baseada em alguns princípios ligados ao conhecimento tradicional, a agroecologia funciona com base na diversidade utilizando ao máximo os insumos locais. É um sistema com a natureza, e não contra ela.
“Capacidade de uso máximo dessa riqueza interna, não se reduz a uma dimensão tecnológica. Tem o ponto de vista social e econômico, não se faz sem o direito à terra. Por isso, defende a retomada da reforma agrária”, descreveu.
Os movimentos em torno da ANA conquistaram recentemente uma Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, decretada em agosto de 2012 pela presidente. Foi proposto um programa específico para mulheres, com assistência técnica, reconhecimento dos saberes e fundos solidários. A ANA defende um plano nacional de redução de agrotóxicos, exigindo que o governo retire o subsídios às empresas, inclusive de venenos banidos no exterior, para apoiar a transição agroeocológica pela vida. A ampliação das compras institucionais, como o PAA e PNAE, é outra pauta junto com uma revisão profunda da DAP, documento necessário para o agricultor acessar as políticas rurais, dentre outras reivindicações.
(*) Fonte: Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).

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