Rádios comunitárias realizam congresso estadual no Rio de Janeiro

Sóter e Maninho falam sobre a realidade das rádios comunitárias no país. Foto: Abraço-RJ.

O I Congresso da Rede Abraço de Rádios Comunitárias do Rio de Janeiro aconteceu na última segunda-feira, durante o feriado do dia 15/11. Com o tema “Rádios Comunitárias, Inovações Tecnológicas e Desenvolvimento Local”, o encontro reuniu na capital carioca a representação de 11 emissoras do estado.
Novos desafios para a radiodifusão comunitária
José Luiz Sotér, coordenador nacional da entidade, falou sobre momentos da história das rádios comunitárias. Ele lembrou que o debate sobre comunicação comunitária se fortaleceu no país durante a formulação da Constituição de 1988. Foram seguidos anos de luta até o surgimento da Abraço, em 1996. Agora, diante do novo quadro político no país, com a eleição da presidenta Dilma Rousseff, Sóter diz que a Rede Abraço vai dar foco à formação política no interior das rádios, inclusive, sobre o debate de igualdade entre os gêneros. O militante disse que a opressão de gênero, uma realidade no país, também está presente no movimento de rádios comunitárias.
“Lembro que uma vez um companheiro levou uma moça da sua comunidade para um dos congressos da Abraço apenas porque queria namorar com ela. É um absurdo. Se nós queremos criar uma entidade que seja dirigente de uma revolução no âmbito da comunicação, temos que respeitar essa entidade”, exemplificou.
Sóter destacou ainda outros três desafios para a Abraço : buscar consultoria jurídica para enfrentar a burocracia imposta pelo Ministério das Comunicações na legalização das emissoras; melhorar a gestão e fortalecer mecanismos de sustentabilidade das rádios; e priorizar a produção e distribuição, com a ajuda das novas tecnologias, de conteúdo informativo.
“Buscamos agora um marco zero após 14 anos de gestação. Vai nascer uma nova Abraço. Estaremos voltados para a formação política dos dirigentes das rádios. A nossa participação pessoal na política tem que ter em vista o fortalecimento da nossa entidade”, ressaltou.
Já José Roberto de Souza, o Maninho, contou um pouco da realidade das comunitárias do Rio de Janeiro. Ele acredita que a participação na Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), realizada em dezembro de 2009, foi um momento de resistência para as emissoras comunitárias. Porém, Maninho disse que no Rio de Janeiro, além das empresas de comunicação, o governo estadual de Sérgio Cabral (PMDB) se mostrou como um obstáculo.
“O poder público esteve fechado para o debate sobre democratização da comunicação. Os empresários também dificultaram ao máximo. Parecia um recado : ‘olha, nós não queremos vocês em Brasília’. Mas a gente resistiu e foi para a Confecom. A Abraço levou 115 representantes do país todo. Conseguimos levar as reivindicações das rádios comunitárias”, garantiu.
Mulheres são fundamentais para a democratização da mídia
Representantes das emissoras relatam as dificuldades da comunicação comunitária. Foto: Abraço-RJ.

Para a radialista Denise Viola, a participação das mulheres nas emissoras comunitárias é essencial na construção de uma comunicação realmente democrática. A integrante da Rede de Mulheres da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC) foi uma das convidadas da Abraço do Rio de Janeiro. Denise ressaltou a importância da contribuição das mulheres no processo de construção da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), apontando o controle social e público da mídia como necessário para avanços nas políticas de gênero. Ela diferenciou: “Controle social não é censura”.
Na opinião da radialista, a ideia de que as mulheres são objetos de mercadoria fortalece o capitalismo, caracterizado por ela como um sistema injusto e desigual. “A censura vem de cima para baixo. Ela não tem nada a ver com controle social da mídia. Essa política, na verdade, pretende dar oportunidade à sociedade de dizer o que ela quer e o que ela não quer ver nos meios de comunicação”, explicou Denise.
Edite Cabral, da Rádio Comunitária Comunidade Ativa, em Realengo, Zona Oeste da cidade do Rio, concorda com Denise. Para ela, debater igualdade de gênero na Rede Abraço de rádios comunitárias deve ser uma prioridade. Edite, que é pastora, contou que recentemente houve um caso de violência contra a mulher na sua igreja. Neste contexto, a rádio comunitária foi uma ferramenta de conscientização. “ Essa moça me ligou e eu fui com ela até a delegacia. Depois, levei esse debate para a rádio. Falamos sobre a Lei Maria da Penha. A violência é uma realidade para diversas mulheres. Então, recebemos muitas ligações na rádio”, disse.
Denise Viola destacou também que as lutas feministas não servem apenas para as mulheres. “As bandeiras das mulheres beneficiam toda a sociedade. É certo que o universo feminino é diferente do universo masculino, o que não quer dizer que um seja melhor que o outro. E essa diferença deve ser respeitada para que não se torne uma desigualdade”, afirmou. Como uma “imagem sonora”, a militante comparou a sociedade a uma ave, em que cada asa do animal representaria um gênero. Nas palavras de Denise: “Hoje essa ave está capenga, a asa masculina pesa mais. Nossa sociedade precisa das duas asas em equilíbrio para voar, para ser realmente livre”.
Criminalização das rádios comunitárias : uma realidade
Rádios comunitárias são agentes da democratização da comunicação. Foto: Rafael Costa/Reprodução.

A vizinhança do bairro São Luiz, em Barra Mansa, cidade da região sul fluminense, não escuta a Rádio Comunitária Dinâmica FM há dois anos. Tom Teixeira, antigo coordenador da emissora, compareceu ao Congresso da Abraço mesmo sem poder levar as notícias e debates para a sua comunidade. Fazia isso todas as manhãs antes da Polícia Federal fechar a comunitária. “Estou aqui na luta para a rádio voltar ao ar. A comunidade pede muito, sente falta”, contou.
Durante o Congresso da Abraço foram vários os relatos sobre a repressão aos comunicadores populares. No caso da emissora de Barra Mansa, segundo Tom Teixeira, todos os equipamentos foram recolhidos de forma arbitrária. “Chegaram com um mandado que não era para a nossa rádio. Não tinha lá o nome Dinâmica FM. Nem o endereço era o nosso. Então, o que estava valendo era fechar a rádio de todo jeito. Muitos que fazem rádio comunitária também são processados e até presos, ficam com a ficha suja”, contou.
Tom Teixeira critica a visão sobre as rádios comunitárias divulgada nos grandes meios de comunicação. “Como pode uma rádio comunitária ser proibida? Será que interagir com a as pessoas, com a sua comunidade, é realmente um crime? Não podemos falar sobre os problemas da cidade, colocar as músicas dos artistas locais que não passam nas rádios comerciais?”, questionou.
Além de debates sobre assuntos em torno da comunicação comunitária, foram escolhidos em plenária os delegados e delegadas que serão enviados ao VII Congresso Nacional da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço). O evento pretende receber em Brasília, entre os dias 16 e 19 de dezembro, representantes de 500 rádios comunitárias espalhadas por todas as regiões brasileiras.

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